Colhi em algum lugar que as cinco maiores vantagens de ser idoso são estas: comprar objetos de qualquer natureza com a garantia de que não chegarão a ficar velhos; discutir, num círculo de idosos, sobre o que fazer na aposentadoria, com total compreensão dos circunstantes; ter a certeza de que os investimentos em plano de saúde finalmente começam a valer a pena; ser avisado para ir devagar, não pelo policial, mas pelo médico; estar seguro de que os segredos confiados aos amigos estão bem guardados porque eles os esquecem.
São apenas, como se percebe, frases de humor. Na verdade a grande vantagem de envelhecer é desfrutar do magno privilégio de ser Avô.
O Avô e a Avó são personalidades indispensáveis na família e na sociedade. Feliz do povo que cultua e venera os ancestrais. Esse povo não se extraviará nos descaminhos da identidade perdida. Fará da ternura um guia nos momentos mais difíceis. Construirá uma ponte que ligará as gerações. Acumulará sabedoria, mais que tesouros perecíveis e enganosos.
O Avô é o pai multiplicado. Ser Avô é reviver, em plenitude e em êxtase de poesia, o itinerário da paternidade.
Uma das mais queridas reminiscências de minha infância prende-se à figura de meu Avô pela linha materna. Sua idade avançada contrastava com a cor preta dos cabelos, a firmeza do olhar e a juventude da alma. Enfrentava com alegria os velhos trens da Leopoldina para o percurso do Rio, em direção a Cachoeiro de Itapemirim.
Sua vida era metódica. Acordava muito cedo e embrenhava-se na escrita de páginas primorosas exaltando a Paz. Usava caneta com pena, molhada no tinteiro. Eu era seu secretário. Lia para ele textos sobre os mais variados assuntos. O avô alegava que seus olhos já não lhe permitiam enxergar muito bem. Hoje desconfio que, através desse expediente, o que ele pretendia era incutir, no neto, o amor dos livros. Também pedia que eu lhe datilografasse os manuscritos, numa bela máquina de escrever de fabricação alemã. De vez em quando, depois que todo o texto estava batido, ele resolvia intercalar um parágrafo, no miolo do escrito. Eu tinha então de bater tudo de novo.
À noite, sentava-se perto da janela, para ver o movimento de pessoas passando pela Rua Vinte e Cinco de Março. Bebia, infalivelmente, seu copo de leite, cochilava e às 9 horas já se ia deitar.
Que grande nobreza tinha aquela alma! No fim da vida, quando só se tem passado, meu Avô descortinava o horizonte infinito – uma civilização de Amor, Justiça, Paz, Fraternidade.
Como a vida passa. O neto que fui ontem tornou-se hoje um Avô. Quero ser tão bom para minha netinha Lis quanto foi bom para mim o Vovô Estellita.
João Baptista Herkenhoff, Juiz de Direito aposentado, palestrante Brasil afora e escritor. E-mail:jbherkenhoff@uol.com.br Homepage: www.jbherkenhoff.com.br