Neste doze de janeiro comemoramos o centenário de Rubem Braga, cronista brasileiro e universal nascido em Cachoeiro de Itapemirim.
Depois que José Castello publicou “Na cobertura de Rubem Braga” não é possível fazer qualquer acréscimo biográfico ao que foi escrito nesse livro. Curioso é que José Castello não conheceu pessoalmente o cronista. Valeu-se do depoimento de pessoas que privaram da convivência do grande poeta da crônica. A vida e a obra de Rubem Braga são abordadas de maneira encantadora, bem humorada. Castelo realçou os aspectos mais significativos e interessantes da personalidade de Rubem Braga, sem prejuízo da profundidade da análise.
O título da obra é uma referência à cobertura, cheia de árvores e de livros, que o cronista tinha em Ipanema, na rua Barão da Torre, n. 42, atrás da Praça General Osório.
O que posso acrescentar a José Castelo é um fato do qual o biógrafo não tem conhecimento.
Meu irmão Paulo visitou Rubem Braga na cobertura acima citada. Paulo tinha paixão pelos livros produzidos pelos coestaduanos. Centenas de obras de autores capixabas integram esse tesouro. Nenhuma biblioteca particular ou pública supera tal acervo. Ao perceber o zelo do Paulo no cultivo da memória literária espírito-santense, Rubem não resistiu:
“Meu querido conterrâneo, eu vou aumentar esta sua coleção. Vou lhe dar todos os meus livros, devidamente autografados, inclusive aqueles que publiquei sob pseudônimo e que ninguém sabe que foi este seu conterrâneo que escreveu.”
Na escolha do destino dos seus livros, além do carinho do bibliófilo Paulo, mais um fato pesou: Rubem quis depositar suas obras em Cachoeiro. Este destino superava em relevância o da Biblioteca Nacional, Biblioteca da Academia Francesa ou Biblioteca do Congresso Americano. Afinal foi Rubem Braga que disse: “Modéstia à parte eu nasci em Cachoeiro”.
Agora para fechar, cito trecho de uma crônica de Rubem Braga – “Recado ao Senhor 903”:
“Vizinho – Quem fala aqui é o vizinho do 1003. Recebi, outro dia, consternado, a visita do zelador, que me mostrou a carta em que o senhor reclamava do barulho em meu apartamento. Quem trabalha o dia inteiro tem direito ao repouso noturno e é impossível repousar no 903 quando há vozes, passos e músicas no 1003. Peço-lhe desculpas, prometo silêncio… mas que me seja permitido sonhar com outra vida e outro mundo, em que um homem batesse à porta de outro e dissesse: ´Vizinho, são 3 horas da manhã e ouvi música em tua casa. Aqui estou.´ E o outro respondesse: ´Entra, vizinho e come do meu pão e bebe do meu vinho!”
João Baptista Herkenhoff é Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo, professor itinerante Brasil afora e escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br