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Gilson Dipp assume vice-presidência do STJ

Coordenador da Comissão da Verdade, ex-corregedor nacional de Justiça, presidente da comissão de juristas que elaborou a proposta de reforma do Código Penal, o ministro Gilson Dipp assume nesta sexta-feira (31) a vice-presidência do STJ. “Tudo o que aconteceu comigo não foi programado, inclusive ingressar na magistratura”, revela o ministro, aos 67 anos. Natural de Passo Fundo (RS), graduou-se na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e foi advogado durante 20 anos em Porto Alegre, até que o conterrâneo Ari Pargendler, já no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o convenceu a concorrer a uma vaga destinada ao quinto constitucional e a vestir a camisa da magistratura.

No TRF4 permaneceu por dez anos, ocupando inclusive a presidência, para então chegar ao STJ por indicação de Fernando Henrique Cardoso. Há 14 anos ministro do STJ, ele sempre atuou na Seção de direito penal. Neste período, julgou quase 70 mil processos.

Crime organizado

É impossível pensar no nome de Gilson Dipp sem relacioná-lo ao combate ao crime organizado e à lavagem de dinheiro. Especialista na área, ele comemora os avanços que matérias como crimes financeiros, lavagem de dinheiro, organizações criminosas e cooperação internacional sofreram nos últimos anos no país. Dipp participou como coordenador geral da Justiça Federal de uma comissão para interpretar por que, depois de quatro anos de vigência, a lei de lavagem de dinheiro tinha tão pouca aplicação no Brasil.

“A partir daí, surgiu um grupo de trabalho que deu uma visão diferente aos crimes financeiros e que foi o embrião da chamada estratégia nacional de combate à lavagem de dinheiro”, lembra o ministro. Hoje, o alvo do trabalho é também o combate à corrupção, que reúne 70 órgãos nos três poderes da República e no Ministério Público.
 Ele foi o proponente da especialização de varas para julgamento de crimes praticados por organizações criminosas.

Corrupção

Mas o ministro adverte que essa “evolução” no pensamento da Justiça brasileira não é suficiente para fazer a corrupção recuar. “Não é apenas uma lei penal bem feita que vai solucionar os problemas estruturais do Brasil quanto à corrupção. É preciso implantar políticas públicas que estejam inseridas nos três poderes”, aconselha.

Para Dipp, o Legislativo deve ser atuante e elaborar leis específicas; o Judiciário deve ser mais célere no exame dessas questões; ao Ministério Público devem ser dadas melhores condições de elaborar boas ações penais; e, principalmente, a polícia deve ter autonomia e recursos financeiros para promover uma boa investigação.

“A lei é apenas a plataforma, a mola propulsora que vai detonar uma série de outras providências que não dependem apenas do Judiciário”, diz o ministro, que vê na sociedade brasileira “uma sensação de insegurança e impunidade”. Dipp acredita que o país está no caminho certo – tem os instrumentos, a consciência e a cobrança da sociedade. Mas ele é realista: “Nunca serão completamente erradicadas a corrupção, a impunidade e a sensação de insegurança. Isso não acontece nem nos países mais desenvolvidos.”

Filtros recursais

Dipp não se diz tão preocupado com o número de recursos que chegam ao STJ, mas com a deformação pela qual o sistema processual passa. Para o ministro, o volume de processos é uma consequência da grande confiança da sociedade no Judiciário. “Acontece que o nosso sistema processual constitucional está desvirtuado”, critica.

A função básica do STJ é dar efetividade e aplicação à lei federal e interpretá-la de modo uniforme para que tenha repercussão nos tribunais estaduais, nos tribunais regionais federais e na Justiça de primeiro grau. “Uma certa deformação do sistema processual fez com que o STJ, muitas vezes, estivesse agindo como terceira instância do Judiciário”, lamenta.

Dipp entende que um exemplo típico disso é o uso do habeas corpus como substitutivo de todo e qualquer recurso, desde o recurso ordinário, a apelação, até o recurso extraordinário para o STF. “O habeas corpus não pode ser banalizado, é uma pérola a ser conservada para ser utilizada de maneira adequada. Tudo o que se banaliza, se desperdiça em termos de qualidade e de importância”, lamenta.

“O que a população reclama é a celeridade. E a falta de celeridade também é decorrência desse sistema que é inapropriado na sua prática, até mesmo pelo excesso de recursos e pela permissividade na sua admissão”, critica. Mas ressalva: “Isso não quer dizer, de modo nenhum, que a ampla defesa e o contraditório possam ser de qualquer forma deturpados.”

Código Penal

A ideia da comissão de juristas que presidiu durante sete meses foi fazer do Código Penal o centro do sistema penal, com uma linguagem inteligível ao cidadão. “O cidadão comum vai entender de forma clara os seus direitos e o que o estado considera lesivo à sociedade, em termos penais. Ele vai ter uma noção mais ampla de todos os tipos penais que podem influenciar a sua vida, o que o estado permite e não permite fazer”, assegura Dipp.

Mais de 120 leis extravagantes ou extraordinárias, que dizem respeito à matéria penal, e em especial ao Código Penal, foram analisadas pela comissão, num trabalho exaustivo que reuniu pessoas oriundas da magistratura, da advocacia, do Ministério Público, da Defensoria Pública e da universidade. “Revogamos leis e tipos que não tinham mais sentido e trouxemos para o código tipos penais consentâneos com a realidade de hoje, voltados para o futuro”, diz o ministro.

Dipp acredita que o Código Penal é a lei mais importante depois da Constituição, porque define os limites do estado na invasão do direito mais essencial do cidadão, que é a sua liberdade. Nenhum tabu deixou de ser enfrentado – uso de drogas, homofobia, aborto, eutanásia, ortotanásia, racismo. “Essas questões polêmicas agora vão ser enfrentadas no parlamento, que é o repositório de todas as diferenças culturais, religiosas, filosóficas, econômicas, num país tão desigual, tão diferente e tão peculiar como é o Brasil.”

Comissão da Verdade

Nos próximos dois anos, quando ocupará a vice-presidente do STJ, o ministro Dipp acumulará a função de coordenador da Comissão da Verdade. Instalada pela Presidência da República em maio de 2005, o grupo de sete integrantes vai reconstruir o passado recente, investigando violações aos direitos humanos.

Gilson Dipp diz que o convite para integrar a comissão era irrecusável: “Nenhum país se consolida democraticamente na plenitude se o seu passado não for bem compreendido”.

“A comissão, no Brasil, foi criada tardiamente, mas temos uma grande vantagem, porque poderemos aproveitar o trabalho de duas comissões – de anistia e de mortos e desaparecidos –, com uma gama de documentos que estão no arquivo nacional e nos arquivos estaduais”, destaca.

Fonte: STJ

Fonte: AJUFE

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NOTÍCIAS,. Gilson Dipp assume vice-presidência do STJ. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2012. Disponível em: https://investidura.com.br/noticias/ajufe/gilson-dipp-assume-vice-presidencia-do-stj/ Acesso em: 08 dez. 2025