“Investiment Grade” e Amarras
Ives Gandra da Silva Martins*
A euforia que se seguiu a declaração da agência Standard & Poor’s de que o Brasil atingiu o grau mais baixo de uma nação onde o investimento é seguro (- BBB), ou seja, abaixo do Chile, Rússia ou Croácia, mas acima dos níveis que ostentava até então, deve ser analisada, com cautela e ponderação, para que os males que ainda atormentam a economia do país não sejam esquecidos.
À evidência, a notícia é boa. O Brasil, graças à pujante iniciativa privada e que poderia ter crescido muito mais, se não houvesse tantas amarras, está de parabéns.
Méritos também do Presidente Lula que, beneficiando-se do “boom” econômico mundial, deu continuidade à política monetária de seu antecessor e manteve a estabilidade da moeda. Méritos de Fernando Henrique, que, em período de crise econômica internacional, soube manter a moeda estável e os fundamentos da economia, com inteligência e sacrifício. Estou convencido de que a política monetária e cambial de ambos os governos, apesar das críticas, constitui-se no grande mérito do Plano Real, que extirpou a chaga inflacionária.
As preocupações, contudo, permanecem. O equilíbrio fiscal, inclusive com alguma redução do endividamento público, faz-se mais à custa de uma opressiva política tributária, do que uma sábia política de redução da esclerosada burocracia, considerada, nessa matéria, a mais retrógrada do mundo. Já não falo em relação à arrecadação de tributos, exigidos legal e ilegalmente, mas nos encargos que são transferidos ao pobre empresário brasileiro, obrigado a perder, segundo o Banco Mundial, em média, 2.600 horas por ano, para atender às exigências fiscais, enquanto, na Alemanha, são necessárias 105 horas e, nos Estados Unidos, 350 horas.
Continua-se a inchar a máquina administrativa, principalmente com amigos do rei, de forma censurável.
Por outro lado, a insegurança jurídica, com 409.000 escutas telefônicas autorizadas por magistrados, segundo a imprensa noticiou, ferindo a privacidade do brasileiro – pois, em grande parte, de absoluta inutilidade, visto que nem 10%, conforme se comenta, resultaram em ações penais -, torna o residente no país um habitante de um mundo “orwelliano”. O genial romancista inglês certamente jamais pensou que algum país democrático viesse a hospedar suas teorias…
O desrespeito à propriedade pública e privada, por movimentos como o dos “sem terra” e dos “sem teto”, prestigiados e financiados pelo governo federal, faz com que se tema pelo futuro da livre iniciativa, se continuarem a crescer e a desrespeitar a ordem jurídica, pretendendo fazer prevalecer sua ideologia, sem se submeterem ao teste das urnas.
Entregar 15% do território nacional a menos de meio milhão de índios, considerando-os nações diferentes do povo brasileiro – ao ponto de “cidadãos brasileiros” serem expulsos de suas terras e de quem lá quiser entrar, sendo não-índio, só poder fazê-lo com autorização da FUNAI e por algumas horas -, põe em risco a própria integridade nacional, principalmente porque o mundo continua cobiçando a Amazônia.
Por fim, as discriminações a favor de afro-descendentes, carentes e homossexuais, que hoje adquiriram, no país, status superior a brancos, hetero, e à classe média, graças aos sistemas de cotas e privilégios, que se multiplicam, estão modificando o perfil do povo brasileiro. De solidário e fraterno está se dividindo em castas, ódios e rancores. Neste sentido, é de se louvar a iniciativa em prol de um país sem discriminações, do movimento dos “113 cidadãos anti-racistas contra as leis raciais”.
Enfim, estamos avançando e retrocedendo ao mesmo tempo e, por isto, devemos refletir sobre como eliminar as amarras que dificultam o desenvolvimento e solidariedade entre os brasileiros.
* Professor Emérito das Universidade Mackenzie e UNIFMU e da Escola de Comando e Estado maior do Exército. Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, da Academia Paulista de Letras e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: http://www.gandramartins.adv.br
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