Leite e Pinga
Tom Coelho*
“Óia como bebe
Esse povo do Brasil
Inxugaum garrafom
Mais depressa que funi.”
(Adágio Popular)
O mês de março de 2004 ficará marcado na históriada publicidade brasileira pelo caso envolvendo duas marcas, Brahma eNova Schin; duas empresas, Ambev/Interbrew e Schincariol; doispublicitários renomados, Nizan Guanaes e Eduardo Fischer; e um únicogaroto-propaganda, Zeca Pagodinho.
No rastro de toda a celeuma causada pela mudança delado do Zeca enquanto a partida ainda era jogada, veio asuperexposição gratuita dos protagonistas na mídia. E, a reboque,debates sobre dinheiro, quebra de contrato e ética. Debates travadosem mesas de bar, regados a cerveja e possivelmente concluídos em umapizzaria.
Debates que não se propuseram a abordar a questãodo alcoolismo entre os jovens, sua participação nos índices deacidentes automobilísticos, seu custo social pelas vidas ceifadas epela esperança abreviada.
Nossos jovens começam a beber cada vez mais cedo,influenciados pela publicidade, que projeta uma imagem adultaidealizada, e pela facilidade em adquirir bebida, face à ausência defiscalização e punição pela comercialização de produtos alcoólicos amenores, em que pese o rigor da legislação existente.
O CONAR, Conselho Nacional de Auto-RegulamentaçãoPublicitária, entidade respeitada em seu meio, editou em 1o deoutubro de 2003, em vigor desde 31 de dezembro, as novas resoluçõespara normas éticas de publicidade de bebidas alcoólicas. A primeiranorma, denominada “Regra Geral”, diz: “Deverá ser estruturada com afinalidade precípua de difundir a marca do produto e suascaracterísticas de maneira socialmente responsável. Assim, éaconselhável que o respectivo slogan não empregue apelo de consumoem seu enunciado”.
Curiosamente, o slogan de uma das empresassupracitadas é “Experimenta”, no imperativo. Não seria isso apelo aoconsumo? E ser socialmente responsável não envolve também incentivarpráticas éticas?
Ainda na faculdade, estudando “Técnicas deComunicação com o Mercado”, meu então, e eterno, mestre MarcusVinícius definiu o que é uma agência de publicidade: “É uma empresacomo outra qualquer com fins lucrativos onde se pratica ao extremo ocapitalismo selvagem”. Sábias palavras…
Segundo dados do IBGE, ano-base 2000, o Brasilapresenta consumo anual per capita equivalente a
Produto |
Embalagem |
Preço Unitário |
Preço/Litro |
Refrigerante Coca-Cola |
|
R$ 2,48 |
R$ 1,24 |
Refrigerante Guaraná |
|
R$ 1,89 |
R$ 0,95 |
Refrigerante Convenção (Tubaína) |
|
R$ 1,35 |
R$ 0,68 |
Cerveja Antarctica |
355 ml |
R$ 0,79 |
R$ 2,23 |
Leite Longa Vida Bom Cheff |
|
R$ 1,05 |
R$ 1,05 |
Aguardente de Cana |
970 ml |
R$ 2,00 |
R$ 2,06 |
Fonte: http://www.paodeacucar.com.br/, em 05/04/2004)
A triste constatação da realidade permite-nosconcluir que o brasileiro médio gasta por ano mais com cerveja,seguido por refrigerante e, por último, leite. Isso sinaliza para umproblema cultural, pois há uma percepção de valor agregado superiordos dois primeiros produtos.
Reflexo da política neoliberal que dogmatiza o“Estado mínimo”, vivemos numa nação onde um litro de aguardente decana, com teor alcoólico de 40 graus Gay Lussac, é tão acessívelquanto um alimento fundamental como o leite.
Necessitamos de políticas públicas para educar osconsumidores, restringir a publicidade, elevar os preços e limitar avenda de bebidas alcoólicas. Ou teremos que canalizar recursos paracombater, além da cirrose, a osteoporose.
* Formação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP, especialização em Marketing pela Madia Marketing School e em Qualidade de Vida no Trabalho pela USP, é consultor, professor universitário, escritor e palestrante. Diretor da Infinity Consulting, Diretor Estadual do NJE/Ciesp e VP de Negócios da AAPSA.
Contatos através do e-mail
tomcoelho@tomcoelho.com.br
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