Inacreditável Exemplo de Litigância de Má-Fé
Mario Guerreiro
Não estivessem todas as cortes de justiça atoladas por um impressionante número de processos e ainda há uns “espertinhos” que entram com ações de dano moral e coisas semelhantes totalmente improcedentes, com vistas a “faturar uma grana fácil”, e com isto tomam o precioso tampo dos magistrados com bobagens. Infelizmente somos um povo sem nenhuma ética e um país onde se encontra amplamente disseminada a execrável “Lei de Gérson”: o brasileiro gosta de levar vantagem
Eis aqui um inacreditável exemplo de litigância de má-fé, que devia servir de exemplo a futuros litigantes mal-intencionados.
Rio de Janeiro
Regional da Pavuna
Cartório do 25º Juizado Especial Cível
Processo nº:2008.211.010323-6
Movimento:1
Tipo do movimento: Conclusão ao Juiz
Sentença: “Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95. Primeiro registro que é absolutamente incrível que o Estado seja colocado a trabalhar e gastar dinheiro com uma demanda como a presente, mas… ossos do ofício! Ressalto, desde já, estarem presentes todos os pressupostos de regular desenvolvimento do processo e as condições para o legítimo exercício da ação.
O autor é capaz e está bem representado, o juízo é competente e a demanda está regularmente formada. As partes são legítimas, há interesse de agir, já que a medida é útil na medida em que trará benefício ao autor, necessária, já que sem a intervenção judicial não poderia ser alcançado o que se pede, e o pedido, por sua vez, é juridicamente possível, tratando-se de compensação por dano moral e pedido de retratação. O que não existe nem de longe é direito a proteger a absurda pretensão do reclamante.
A questão é de direito e de mérito e assim será resolvida evitando-se maiores delongas com esse desperdício de tempo e dinheiro do Estado. O reclamante, cujo time foi derrotado na final da Libertadores, sentiu-se ofendido com matérias publicadas pelo jornal reclamado, que, segundo ele, ridicularizavam os torcedores, incitavam a violência e traziam propaganda enganosa. As matérias, no entanto, são apenas publicações das diversas gozações perpetradas pelas demais torcidas do Estado em razão da derrota do time do reclamante.
Tais gozações são normais, esperadas e certas de vir sempre que um time perde qualquer partida, quanto mais um título importante que o técnico, jogadores e torcedores afirmavam certo e não veio. Mais. As gozações são inerentes à existência do futebol, de modo que sem elas este não existiria porque muito de sua graça estaria perdida se um torcedor não pudesse debochar livremente dos outros. É certo que o reclamante ´zoou´ os torcedores de outros times da cidade em razão de derrotas vergonhosas na mesma competição em que seu time foi derrotado, em razão de um dirigente fanfarrão ou em razão de uma choradeira com renúncia, e nem por isso pode o mesmo ser processado.
Ressalto que se o reclamante viu tudo isso e ficou quietinho, sem mangar de ninguém e sem se acabar de rir, – não ficou, mas utilizo-me dessa (im)possibilidade para aumentar a argumentação – deve procurar outros esportes para torcer, porque futebol sem deboche não dá! Ainda que a matéria fosse elaborada pelo jornal reclamado, é possível à linha editorial ter um time para o qual torcer e, em conseqüência lógica de tal fato, praticar ´zoações´, o que, em se tratando de futebol, é algo necessário e salutar à existência do esporte.
Registro que há jornais que não só têm a linha editorial apoiando um ou outro clube, como há os que são criados pelos torcedores para, dentre outras coisas, escarnecer os rivais, o que é perfeitamente viável. Evidente, por todo o ângulo em que se olhe, que não há a menor condição de existir a mínima lesão que seja a qualquer bem da personalidade do reclamante. ´Zoação´ é algo inerente a qualquer um que escolha torcer por um time de futebol e vem junto com a escolha deste. O aborrecimento decorrente do deboche alheio é inerente à escolha de uma equipe para torcer e, portanto, não gera dano moral, ainda que uma pessoa, por excesso de sensibilidade, se sinta ofendida e ridicularizada. Continua o reclamante na sua petição afirmando que o reclamado incita a violência com sua conduta. É engraçado, porque o próprio reclamante afirma que teve que dar explicações à diretoria de seu local de trabalho em razão de desavenças com seus colegas. A inicial não é clara neste ponto, mas se houve briga em razão do reclamante não aceitar as gozações fica ainda mais evidente que o mesmo deve escolher outro esporte para emprestar sua torcida, porque, como já dito, futebol sem deboche, não dá!
E o que é pior! O reclamante, se brigou, discutiu ou se desentendeu foi porque quis, porque é de sua vontade e de sua índole e não porque houve uma publicação
Qualquer um que leia a reportagem, inclusive toda a torcida de tal time e em especial o reclamante, sabe, por óbvio, que jamais poderia existir foto da equipe indo à disputa do título mundial no Japão, porque isso nunca ocorreu. A pretensão é tão absurda que para afastá-la a sentença precisaria apenas de uma frase: ´Meu Deus, a que ponto nós chegamos??!!!´, ou ´Eu não acredito!!!´ou uma simples grunhido: ´hum, hum´, seguido do dispositivo de improcedência. É difícil encontrar nos livros de direito um conceito preciso do que seria uma lide temerária, mas esta, caso chegue ao conhecimento de algum doutrinador, será utilizada como exemplo clássico para ajudar na conceituação.
O reclamante é litigante de má-fé por formular pretensão destituída de qualquer fundamento, utilizar-se do processo para conseguir objetivo ilegal, qual seja, ser compensado por dano inexistente, além de proceder de modo temerário ao ajuizar ação sabendo que não tem razão e cuja vitória jamais, em tempo algum, poderá alcançar. Isto posto, julgo improcedente o pedido. Condeno o reclamante como litigante de má-fé ao pagamento das custas, nos termos do caput do artigo 55 da Lei 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após as formalidades legais, dê-se baixa e arquivem-se.”
Data maxima venia de Sua Excelência, embora me considere totalmente imcompetente para fazer uma apreciação do mérito da supracitada sentença, aos meus olhos leigos ela pareceu corretíssima, porém demasiadamente prolixa: um tiro de canhão para matar uma formiga. Na realidade, está tudo dito no último parágrafo. Ainda bem que, como diziam aqueles notáveis espíritos práticos romanos: Quid abundat non nocet.
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