Ação Civil Pública

Ação Civil Pública para adequar os Tótens de Publicidade à NBR 9050/1994 da ABNT.

 

 

 

Ementa: A finalidade da inicial é adquar os tótens à NBR 9050/1994 da ABNT, a fim de que sua placa não possua qualquer angulação vertical em relação ao abrigo que se encontrar fora da área destinada para instalação de equipamentos e mobiliários urbanos nas calçadas, respeitando-se, nos abrigos que se encontrarem dentro dessa área, limite de angulação que preserve faixa livre e contínua para circulação, sob pena de multa diária.Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública Municipal de Vitória

 

(espaço de costume)

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, com respaldo dos artigos 127, incs II e III do art 129, da Constituição Federal, art 3º da lei nº 7.853, de 24.10.1989, art 1º da lei nº 7.347 de 24 de julho de 1985, vem na forma respectiva, propor a presente

 

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

COM PEDIDO DE TUTELA LIMINAR

 

em face da Srª SECRETÁRIA MUNICIPAL DE TRANSPORTES E INFRA ESTRUTURA URBANA de Vitória e o MUNICÍPIO DE VITÓRIA – ES, pessoa jurídica de direito público interno, com sede no Palácio Municipal “Jerônimo Monteiro”, sito na Avenida Marechal Mascarenhas de Moraes, 1927, Bento Ferreira, nesta Cidade e CONSÓRCIO PUBLICIDADE SARMIENTO VITÓRIA, que não se qualifica plenamente, no termo de contrato, fls. 73, mas acrescenta ser formada de outras ali mencionadas, a primeira com o mesmo nome, CPS PUBLICIDAD SARMIENTO S/A, com sede em Belo Horizonte MG, inscrita no CNPJ sob nº 02.939.448/0001-09, sita na Rua Lavras, nº 176, na capital retro citada, pelos fundamentos de fato e de direito que passa a expor:

 

1. DOS FATOS E DO DIREITO

 

Mediante as justificativas que constam de fls. 28 e demais itens, até fls. 301 da documentação reunida (anexa e visando a presente), constam as razões que moveram o Chefe do Executivo Municipal a decidir pela concessão de uso a exploração de publicidade em abrigos de pontos de ônibus e de táxis, no município de Vitória.

 

Fala de falta de recursos e o não divisamento em breve de existirem os mesmos para tal fim, pelo que, justificou-se dizendo ter adotado o permissivo constitucional do art. 175 e seu correspondente, art. 56, da Lei Orgânica Municipal. Aquele, verbis:

 

Art 175. Incumbe ao poder público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”.

 

Em seguida, publicou o Edital de Concorrência 03/2000 visando executar o que planejara, o qual tem os termos que constam de fls. 43 a 72.

 

É curioso notar que nos dois documentos referidos não se verifica em nenhum momento, ter sido considerado que Vitória é uma cidade quadricentenária, que suas calçadas ainda seguem parâmetros dos primeiros tempos, não comportando inovações, ditadas por métodos e meios modernos que ainda mais as reduzam.

 

Sobretudo, não houve ocorrência de preocupação com os limites dos cidadãos de um modo ou outro, privados da própria capacidade de locomoção, ou seja, com os deficientes físicos.

 

Neste sentido, a Carta Para o Terceiro Milênio, aprovada no dia 9 de setembro de 1999, em Londres, Grã-Bretanha, pela Assembléia Governativa da REHABILITATION INTERNATIONAL, estando Arthur O’Reilly na Presidência e David Henderson na Secretaria Geral2 .

 

“Nós entramos no Terceiro Milênio determinados a que os direitos humanos de cada pessoa em qualquer sociedade devam ser reconhecidos e protegidos. Esta Carta é proclamada para transformar esta visão em realidade.

 

“Os direitos humanos básicos são ainda rotineiramente negados a segmentos inteiros da população mundial, nos quais se encontram muitos dos 600 milhões de crianças, mulheres e homens que têm deficiência. Nós buscamos um mundo onde as oportunidades iguais para pessoas com deficiência se tornem uma conseqüência natural de políticas e leis sábias que apóiem o acesso a ? e a plena inclusão em ? todos os aspectos da sociedade.

 

“Nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, nos hemisférios norte e sul do planeta, a segregação e a marginalização têm colocado pessoas com deficiência no nível mais baixo da escala sócio-econômica. No século 21, nós precisamos insistir nos mesmos direitos humanos e civis tanto para pessoas com deficiência como para quaisquer outras pessoas.

 

“No século 21, nós precisamos estender este acesso ? que poucos têm ? para muitos, eliminando todas as barreiras ambientais, eletrônicas e atitudinais que se anteponham à plena inclusão deles na vida comunitária. Com este acesso poderão advir o estímulo à participação e à liderança, o calor da amizade, as glórias da afeição compartilhada e as belezas da Terra e do Universo.

 

(….)

 

Olvidou-se o disposto no Código Municipal de Posturas Lei 2.481 de 11.02.77, que assim previa, (26/11/99):

 

Art 81 – É proibido embaraçar ou impedir, por qualquer modo, o livre trânsito nas estradas e caminhos públicos, bem como nas ruas, praças e passeios do Município.

 

Hoje, é outra a lei. Lei 6.080 de 29 de dezembro de 2003 que se constitui no Código Municipal de Posturas, mas que continua dispondo:

 

Art. 61. Fica proibido nas calçadas e sarjetas:

 

I – criar qualquer tipo de obstáculo a livre circulação dos pedestres;

 

No entanto, o que se vê foi a multiplicação de abrigos nos pontos de ônibus e de táxis, multiplicados nos últimos dias, dois acabam de aparecer na recém (re)construída pracinha do tradicional bairro de Jucutuquara e outros se vêem até onde não tem calçada, e onde o espaço a elas destinado não comporta tais abrigos.

 

Tudo ao mesmo tempo em que mediante folders expressivos, os habitantes da cidade, são convidados a declarar seu amor por Vitória, onde a “Garota Vitorinha” apresenta como devem ser as calçadas da cidade, livres de árvores ou de qualquer planta, de lixeiras, de escadas nas frentes das residências, com meio fio de ao menos 15 cm de altura, sem ressaltos de modo a não dificultar o trânsito em cadeira de rodas ou de cegos e transcrevendo o art. 163 e o 165 do Código de Obras e Edificações, Lei 4.821/98. (fls. 95).

 

Código de Obras e Edificações – Lei 4.821/98

 

Art 163 – A construção e a reconstrução das calçadas dos logradouros que possuam meio-fio em toda a extensão dos testadas dos terrenos, edificados ou não, são obrigatórias e competem aos proprietários dos mesmos, atendendo aos seguintes requisito: (V. fls. 95)

. Na mesma oportunidade foi editado o livreto CUIDE DE SUA CALÇADA, cujas fotos mostram calçadas bonitas, espaçosas, regulares, sem abrigos em pontos de ônibus e táxis, logo, sem totens. (fls 105).

 

No livreto, é lembrado que:

 

As últimas estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU) mostram que aproximadamente 10 % da população dos países em desenvolvimento, é constituída por pessoas com deficiência permanente ou temporária. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que 14,5% da população brasileira são portadoras de deficiência

.Acrescentando:

Já no Espírito Santo, perto de 15 % das pessoas vivem essa realidade. Para os próximos anos no Brasil prevê-se que quase 30 % dos brasileiros deverão ter mais de 60 anos. Além disso o número de obesos, gestantes e acidentados temporários aumenta a cada dia. São fatores que criam um quadro grave. Num dado preliminar, metade dos brasileiros acaba prejudicada pela falta de acessibilidade em nosso país.

 

Sabe-se que idosos que caminham com auxílio de bengala, requerem ao menos 0,75 cm do espaço; gestantes, ao menos 80 cm; acidentados, 95 cm; o giro de uma cadeira de rodas requer ao menos o diâmetro de 1,50m. Estas dimensões não existem onde surgiram citados abrigos.

 

Daí não se poder pensar em qualquer iniciativa que não contemple tais necessidades, a exemplo do que vem sendo feito, como está sendo feito.

 

Quanto à empresa concessionária.

 

Ao lado das obrigações que resultam para a Empresa Concessionária, decorrem sobejas vantagens: “correlata à sua obrigação de concepção, fornecimento, instalação e manutenção de todos os abrigos/acessórios que se constituem em objeto do contrato, adquiriu o direito de explorar tótens de publicidade, cujas especificações, são as constantes do item 3, do anexo II do Contrato, em obediência ao anexo II do Edital de Concorrência, nos seguintes parâmetros:

 

• elemento desagregado do módulo de abrigo e dos seus demais acessórios;

• dimensões não superiores a 1,00 m x 1,40 m x 0,15 m;

• estrutura no mesmo material e com o mesmo acabamento do módulo de abrigo;

• poderá ter haste de sustentação de 0,50m de altura em relação ao nível do piso da calçada;

• deverá funcionar em esquema “back light”, ficando a mensagem publicitária protegida por vidro laminado como o do painel de informações ao usuário;

• deverá ser instalado em local e posição definidos pela PMV/SETRAN.

Foram d e f i n i d o s pela PMV/SETRAN, portanto, não se dirá da ocorrência de eventual equívoco. Acha-se tudo previamente delimitado.

 

Houve alerta

 

Em reunião da Comissão Interinstitucional de Acessibilidade, presente representante das pessoas portadoras de deficiência, realizada em 26 de fevereiro de 2002, o Promotor de Justiça Luiz Antônio de Souza Silva, então Dirigente do Centro de Apoio de Defesa do Cidadão, apresentou diversas fotografias de placas de publicidade inseridas nos abrigos da capital (fls. 09 a 25 e 96 a 104), fazendo as seguintes considerações:

 

“… sem deixar de reconhecer que hoje existe uma maior preocupação com o assunto, além da situação envolver também a responsabilidade de cada proprietário, a omissão do poder público, no que diz respeito a planejamento, controle e fiscalização, muito contribuiu para que as calçadas do Município de Vitória sejam hoje esse amontoado de irregularidades. Por isso, não pode deixar de chamar a atenção que o cumprimento da obrigação de melhorar as condições dos abrigos nos pontos de ônibus ocorra com a criação de mais obstáculos nas já diminutas calçadas, através de placas de propaganda colocadas no caminho, rente ao chão, como as dezenas de fotografias demonstram. Não bastasse, ferem legislação em vigor e em especial a Norma Técnica 9050 da ABNT, que trata da acessibilidade de pessoas portadoras de deficiência. Resta evidente que as placas de publicidade não podem se constituir em mais esse obstáculo frontal e afrontoso, que além de seus próprios problemas, ainda produz um péssimo efeito didático para a letárgica adequação das calçadas ao seu verdadeiro objetivo”.

 

Na oportunidade, a comissão deliberou que fosse solicitada informação ao Município de Vitória, este a apresentou em 14 de março de 2002, fazendo várias ponderações, protestando sua atuação atenta na construção da necessária acessibilidade, ressaltando ainda sua “determinação em estar encontrando a forma mais adequada para conciliar a segurança na circulação nas calçadas com a veiculação da publicidade nesse importante equipamento urbano”.

 

Acrescentou querer “tranqüilizar” a Comissão, informando que “a Prefeitura comunga com essas(aquelas) preocupações, na medida em que (iria) buscar a mobilidade plena, a acessibilidade universal como diretriz do Governo”.

 

E que estava “motivado por observações da fiscalização do contrato – dentre as quais a questão dos totens fixos à estrutura construtiva e posicionados em 90º em relação ao meio-fio, muitas vezes até impedindo a circulação na calçada, e que em conseqüência:

 

…a implantação de novas unidades está suspensa até que a empresa contratada viabilize as condições necessárias ao pleno atendimento das cláusulas contratuais celebradas com o Município. Estamos, portanto, promovendo as adequações pertinentes, inclusive em atenção às preocupações manifestadas pelo Ministério Público Estadual (original sem grifo ou destaque).

 

O tempo passou e aquelas informações e falas não correspondem a expectativa gerada.

 

Merece realce, também, a justificativa que se torna cada vez mais comum ou o que se refere às desobrigações que o poder público se concede, através de transferência para a iniciativa privada de parte de suas responsabilidades, a título de uma gama de interesses pelas quais lhe compete velar, como o faz, quando alega que:

 

“a adoção da publicidade em mobiliário urbano tem sido a condição de viabilizar, em diferentes cidades do país e do mundo, o financiamento de projetos de interesse público , sem ônus financeiro para o Município que estará utilizando o recurso economizado em outros projetos sociais4 ”.

 

É importante, ao invés, que seja realçado um outro aspecto, o de ser inegável que através da concessão se transfere para a iniciativa privada a possibilidade de exploração de uma atividade econômica sem penas executada e altamente rentável.

 

Não é a toa, como inclusive alega o Município, que diferentes cidades do país e do mundo vêm trilhando esse caminho, pois, afinal, nas mais variadas modalidades de atividades do Estado, seja ela de maior ou menor importância, encontra-se fortemente sedimentado o apelo de empresas que se agigantam na exploração de atividades concedidas pelo poder público.

 

Logo, a manutenção e modernização de abrigos, seja pelo poder público ou por terceiros, não representa apenas custos, é evidente e clara sua viabilidade econômica de exploração, seja pela forma encontrada, ou qualquer outra equivalente.

 

Toda essa digressão, se destina a demonstrar que a realização desses serviços por empresas privadas, através da concessão de uso para exploração da publicidade, não se deve confundir com qualquer espécie de benevolência por parte da concessionária, sendo inegável o interesse econômico que lhe está atrelado, como demonstram consórcios internacionais que se dedicam à exploração da atividade.

 

Partindo mais especificamente para a questão legal, naquilo que importa à acessibilidade, pois dela nem o poder público e nem a iniciativa privada podem fugir, o assunto encontra-se disciplinado de forma exuberante no direito positivo.

 

Comece pela Constituição Federal, que baseada em sua proposta de integração social da pessoa portadora de deficiência estabelece:

 

“A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.” (art. 227, § 2º)

 

Aliás, podemos avançar ainda mais, para reconhecer a questão diretamente relacionada a princípios e objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, destacando-se a cidadania, a dignidade da pessoa humana, construção de uma sociedade solidária e promoção do bem de todos (artigos 1º, II e III e 3º I e IV).

 

Reportemo-nos à lei 7.853, de 24.10.1989, que expressa a integração social da Pessoa Portadora de Deficiência como obrigação nacional de todos, estabelecendo, dentre seus dispositivos:

“Art. 2º Ao poder público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico.

 

Parágrafo único. Para o fim estabelecido no caput deste artigo, os órgãos e entidades da administração direta e indireta devem dispensar no âmbito de sua competência e finalidade, aos assuntos objetos desta Lei, tratamento prioritário e adequado, tendente a viabilizar, sem prejuízo de outras as seguintes medidas:

 

V – NA ÁREA DAS EDIFICAÇÕES:

 

a) a adoção e a efetiva execução de normas que garantam a funcionalidade das edificações e vias públicas, que evitem ou removam os óbices às pessoas portadoras de deficiência e permitam o acesso destas a edifícios, a logradouros e a meios de transportes.”

Aventemos também sobre o Decreto nº 3.298. de 20.12.1999, que dez anos após a vigência da lei de apoio à integração social da pessoa portadora de deficiência, a regulamentou e dispôs sobre a política nacional para essa integração, estabelecendo uma série de medidas e responsabilidades governamentais e da sociedade, com relação às várias áreas que importam à promoção da dignidade e da cidadania.

 

E a lei nº 10.048, de 08.11.2000:

 

Art 4º – Os logradouros e sanitários públicos, bem como os edifícios de uso público, terão normas de construção, para efeito de licenciamento da respectiva edificação, baixadas pela autoridade competente, destinadas a facilitar o acesso e uso desses locais pelas pessoas portadoras de deficiência.”

 

A lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, assim dispõe:

 

“Art. 2º. Para os fins desta Lei são estabelecidas as seguintes definições:

 

I – acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida;

 

 

Art. 5º O projeto e o traçado dos elementos de urbanização públicos e privados de uso comunitário, nestes compreendidos os itinerários e as passagens de pedestres, os percursos de entrada e de saída de veículos, as escadas e rampas, deverão observar os parâmetros estabelecidos pelas normas técnicas de acessibilidade da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT.”

 

Nem se olvide que mediante o Decreto nº 3.956, de 08 de outubro de 2001, tornou-se obrigatória a execução e cumprimento da Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, inclusive os obstáculos arquitetônicos.

 

No âmbito estadual, legislação também é o que não falta, valendo mencionar principalmente a Constituição Estadual, em seus artigos 203 e 271; a Lei nº 6.068, de 04.10.2000, que dispõe sobre obrigatoriedade de adaptações de órgãos estaduais à NBR-9050 da ABNT; e lei nº 7.050, de 03 de janeiro de 2003, que consolida normas estaduais relativas às pessoas portadoras de deficiência.

 

Quanto ao Município, a situação se repete. Podemos citar as Leis 4167/1994 (plano diretor urbano), 4.821/1998 (Código de Edificações), 5.713/2002 (simplifica procedimentos administrativos e autoriza Poder Executivo a construir e recuperar calçadas), 5954/2003 (estabelece regulamento para divulgação de mensagens em logradouros públicos e em locais visíveis ao transeunte no Município de Vitória) e 6080/2003 (Código de Posturas).

 

Destaque-se o disposto na lei nº 5.954/2003:

 

“Art. 23. A ordenação da divulgação das mensagens na paisagem do Município de Vitória tem os seguintes objetivos:

 

I – organizar, controlar e orientar o uso de mensagens visuais de qualquer natureza, respeitando o interesse coletivo e as necessidades de conforto ambiental;

II – garantir a segurança das edificações e da população;

III – garantir as condições de segurança, fluidez e conforto no deslocamento de veículos e pedestres, respeitando-se os conceitos de acessibilidade universal conforme definido nas normas da ABNT;”

 

E na lei 5713/2002, em especial no pertinente à nova redação do artigo 17 da lei nº 4.821, transcrevendo-se parágrafos:

 

“§ 4º. As intervenções nas calçadas deverão observar o padrão estabelecido pelo município para a área, bem como às normas da ABNT.

 

§ 5º. As intervenções em calçadas para instalação de mobiliário urbano e/ou equipamentos de infra-estrutura urbana dependerão de licença do poder público municipal.”

 

Abra-se um parêntese para lembrar que até mesmo o Código de Trânsito Brasileiro (lei nº 9.503/97) definiu a calçada como sendo:

 

“parte da via, normalmente segregada e em nível diferente, não destinada à circulação de veículos, reservada ao trânsito de pedestres e, quando possível à implantação de mobiliário urbano, sinalização, vegetação e outros fins”.

 

Ora, se as cidades foram construídas repletas de obstáculos à acessibilidade, inclusive com enorme contribuição ativa e passiva do poder público, necessitando de inúmeras batalhas sociais para a adaptação preconizada pelo já adolescente Texto Constitucional, resta evidente que além da mobilização para o rompimento dos existentes, não pode haver qualquer tipo de complacência para o surgimento de novos obstáculos, sendo ainda mais absurdo quando esse é perpetrado na realização de serviço público da responsabilidade do poder público.

 

Evidente que a concessão a terceiros para executar os serviços relativos a abrigos, não retira do poder público a sua responsabilidade, especialmente quando ao planejamento e gerenciamento a que não pode renunciar.

 

A Norma Técnica NBR 9050/94 é explícita ao estabelecer que:

 

“Para a implantação de qualquer mobiliário urbano, devem ser garantidas a acessibilidade e a faixa livre e contínua de 1,20 de largura para circulação.”

 

Aliás, a NBR 9050/94 é ponto destacado no projeto calçada cidadã (“o que diz a lei”), inclusive sendo explicitada a regra técnica supra como “faixa de percurso seguro”, ou seja:

 

“local na calçada correspondente a uma faixa de no mínimo 1,20m de largura onde as pessoas podem caminhar livre de obstáculos que atrapalham ou impedem a circulação”.

 

Não é o que ocorre! Não bastassem os transtornos existentes em significativo número de calçadas do município que as deixam intransitáveis, os totens de publicidade estão se constituindo em novos obstáculos e um péssimo exemplo. E apesar de formalmente comunicada há dois anos sobre as irregularidades evidentes, inclusive mediante farta comprovação fotográfica e que se repete anexa, a situação não só perdura, mas se multiplica no Município, como demonstram fotografias atualizadas.

 

A situação se torna mais grave se considerarmos que os tótens de propaganda, elementos desagregados do abrigo, mesmo se preservassem a faixa livre e contínua de 1,20 (um metro e vinte centímetros) para circulação, ainda assim estariam em total descompasso com os mobiliários urbanos, pois, via de regra, não estão localizados na faixa de serviço, como, aliás, muito apropriadamente orienta o projeto “calçada cidadã”, “in verbis”:

 

“Faixa de serviço. É a área na calçada reservada junto ao meio-fio para a instalação dos equipamentos urbanos como postes e placas de sinalização, orelhões e outros mobiliários urbanos, que deixa a faixa de percurso livre de obstáculos. A norma 9050 (ABNT) estabelece que o piso da faixa de serviço deverá ser de cor e textura diferentes do piso usado na faixa de percurso seguro para servir de alerta tátil para os portadores de deficiência visual (a maioria é capaz de perceber a diferença entre as cores). No mercado, existem dois tipos de piso para a faixa de serviço: o ladrilho hidráulico pastilhado 20 x 20cm e o piso de cimento intertravado perceptível ao tato dos pés (podotátil).

Tudo isto apesar de à época a municipalidade ter expressamente sugerido a “tranqüilização” dos que a perquiriam, inclusive afirmando (vale a pena repetir) que “a implantação de novas unidades está(va) suspensa até que a empresa contratada viabilize(asse) as condições necessárias ao pleno atendimento das cláusulas contratuais celebradas com o Município. “Estamos, portanto, promovendo as adequações pertinentes, inclusive em atenção às preocupações manifestadas pelo Ministério Público Estadual”.

 

Em verdade, as placas de publicidade traduzem uma espécie de opulência à acessibilidade, ou, como já mencionado no documento encaminhado à municipalidade, um “obstáculo frontal e afrontoso, que além de seus próprios problemas, ainda produz um péssimo efeito didático para a letárgica adequação ao seu verdadeiro objetivo”.

 

Não existe outra forma de encarar o problema, já que existindo o dever de retirar as barreiras existentes, se incorpora ao cotidiano um novo e moderno obstáculo, de dimensões exageradas para as diminutas calçadas, de maneira frontal, rente ao chão, exatamente no caminho…enfim, sendo altamente agressivos: os tótens de publicidade!

 

Não se tolhe a discricionariedade no que tange à questão, mesmo porque seguramente existem alternativas que não ofendem a legislação vigente, desde que, obviamente, se parta do respeito a princípios e limites que não podem ser sufocados por qualquer tipo de apelo.

 

Nesse passo, como a municipalidade cuidou em mostrar os ônus que representam os abrigos, é bom salientar, primeiramente, que não se pode desobrigar de um serviço de sua responsabilidade impondo novos percalços à população; segundo: se o ônus do abrigo lhe era inerente, o bônus de exploração, seja pela forma encontrada, seja por outra que se pudesse encontrar ou direcionar, originariamente, pertence-lhe, sendo essa a contrapartida cedida à iniciativa privada, sem que possa extrapolar os limites legais.

 

Evidente que nessa condição o primeiro requerido deveria exigir e o segundo cumprir condições inerentes ao exercício do poder de polícia, conceituado por HELY LOPES MEIRELLES como “a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado” (Direito Administrativo Brasileiro, RT, 15ª edição, pg. 110).

 

Aliás, saliente-se que assim dispõem as cláusulas 1.2, 2.7 e 3.1 do contrato. E nem de outra forma poderia ser, pois, se o posicionamento dos tótens ficasse ao talante do consórcio a ofensa seria ainda mais gritante ao Texto Magno e legislação ordinária decorrente, impondo a nulidade das cláusulas que fossem contrárias. Transcreva-se, pois:

 

“1.2 – A concessionária, segundo as diretrizes e as especificações técnicas constantes no anexo II do Edital será responsável pela concepção, fornecimento, instalação e manutenção de todos os elementos que constituem o objeto deste Contrato, bem como pelo remanejamento dos abrigos existentes nas proximidades ou no local exato onde cada módulo novo for ser instalado, além de recuperar as calçadas (conforme Quadro ANEXO III do Edital)”

 

“2.7 – Correrão por conta da CONCESSIONÁRIA todas as despesas de remoção e de remanejamento das unidades preexistentes e de instalação, manutenção e conservação das unidades construtivas, que deverão obedecer às normas técnicas vigentes.”

 

“3.1 – A fiscalização da remoção, remanejamento, fornecimento, instalação e manutenção e conservação dos abrigos e, quando necessário das calçadas, será de competência e responsabilidade exclusiva do Município ou de quem este indicar, a quem caberá verificar se, no seu desenvolvimento, estão sendo cumpridos os termos do Contrato, o projeto, suas especificações e demais requisitos, assim como participar de todos os atos que se fizerem necessários para sua fiel execução.

 

Sem prejuízo de providências com relação a outras irregularidades que eventualmente venham a ser constatadas no que tange a exploração de totens de publicidade no Município de Vitória, diante do exposto, requer:

 

Considerando que são relevantes as razões expostas e que se verifica continuidade em construção de novos abrigos com colocação de totens da forma ilegal, irregular e em total desrespeito às pessoas e às normas técnicas, o que se constitui no fumus boni júris e periculum in mora, requer concessão da tutela antecipada, no sentido de que os requeridos procedam, no prazo de trinta dias, a adequação dos tótens de publicidade à NBR 9050/1994 da Associação Brasileira de Normas Técnicas, a fim de que sua placa não possua qualquer angulação vertical em relação ao abrigo que se encontrar fora da área destinada para instalação de equipamentos e mobiliários urbanos nas calçadas, respeitando-se, nos abrigos que se encontrarem dentro dessa área, limite de angulação que preserve faixa livre e contínua para circulação, sob pena de multa diária no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), para ambos os requeridos, relativamente a cada tótem de publicidade que não obedeça ao presente comando, tudo, sem prejuízo de regresso perante aqueles que ensejarem lesão ao erário em razão de eventual ação/omissão;

 

Requer a citação do Secretário Municipal e do Município de Vitória, na pessoa de seu representante legal, o Prefeito ou Procurador-Geral de Município (artigo 12, II, do CPC) e do CONSÓRCIO PUBLICIDADE SARMIENTO VITÓRIA, no endereço anteriormente indicado, para contestarem a presente ação, sob as penas da lei.

 

Finalmente, requer o julgamento procedente desta, mantendo a tutela antecipadamente reconhecida com a condenação dos requeridos ao pagamento da taxa judiciária e custas do processo.

 

Protesta provar o alegado por todos os meios permitidos em direito, pericial, documental, testemunhal, depoimento pessoal e inspeção judicial.

 

Tratando-se de ação visando a defesa de interesses inestimavelmente considerados, dá-se à causa o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).Notas de rodapé da petição

 

1. A numeração de folhas referir-se-á sempre a da documentação que arrima o presente, (está devidamente autuada).

 

2. Inteiro teor, fls. 106 e 107.

 

3. Quais foram viabilizados aqui?

 

4. Mas na justificativa falou de ausência de recursos para tal implantação, logo não se há de falar que os economiza empregando alhures.

 

N. termos

P. deferimento.

 

Vitória, 08 de outubro de 2004

 

Marlusse Pestana Daher

Promotora de Justiça.

 

 

* Marlusse Pestana Daher, Promotora de Justiça, Ex-Dirigente do Centro de Apoio do Meio Ambiente do Ministério Público do ES; membro da Academia Feminina Espírito-santense de Letras, Conselheira da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Vitória – ES, Produtora e apresentadora do Programa “Cinco Minutos com Maria” na Rádio América de Vitória – ES; escritora e poetisa, Especialista em Direito Penal e Processual Penal, em Direito Civil e Processual Civil, Mestra em Direitos e Garantias Fundamentais.

 

Como citar e referenciar este artigo:
DAHER, Marlusse Pestana. Ação Civil Pública para adequar os Tótens de Publicidade à NBR 9050/1994 da ABNT.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/peticoes/acao-civil-publica/acao-civil-publica-para-adequar-os-totens-de-publicidade-a-nbr-90501994-da-abnt/ Acesso em: 28 mar. 2024