Direito Constitucional

Ação Civil Pública

Ação Civil Pública

 

 

            Guilherme Gouvêa Pícolo*

 

 

            Sumário: 1. Definição – 1.1 Classificação da Ação Civil Pública quanto ao plano Normativo – 1.1.1 Ações Civis Públicas Constitucionais – 1.1.2 Ações Civis Públicas InfraConstitucionais – 2. Objeto – 3. Sobre os interesses jurídicos a tutelar na Ação Civil Pública – 3.1 Interesses Difusos – 3.2 Interesses Coletivos – 3.3- Interesses Individuais Homogêneos – 4. Competência – 5. Legitimação – 6. Tutela Antecipatória e Cautelar – 7. Fase pré-processual: Inquérito Civil e sua natureza – 8. Efeitos da sentença – 9. Referências Bibliográficas.

 

1. DEFINIÇÃO

 

            Com o condão de investigar a abrangência e fisiologia deste instituto processual, faz-se necessário, a primeiro plano, buscar o seu significado mais elementar, sua cronologia e os principais objetivos jurídicos que busca tutelar, além dos entes que ele vincula para que seja possível uma compreensão mais apurada de suas especifidades técnicas.

 

            Conceito direto e amplo pode ser encontrado nas palavras dos mestres Edis Milaré, Antônio Augusto Mello de Camargo Ferraz e Nelson Nery Junior


 

[1]: “ação civil pública é conceituada como o direito ao Ministério Público de fazer atuar, na esfera civil, a função jurisdicional”.

 

            Ainda que a lição dos eminentes mestres revista-se de termo de partida, ela ainda não é suficiente para esgotar o conceito. O que se haure, de primeiro plano, é a Ação Civil Pública se atém ao juízo civil e não criminal. Ela não busca, a despeito da participação do Ministério Público, a persecução penal e a satisfação do jus puniendi do Estado, mas sim matérias inerentes à responsabilidade civil do réu.

 

            A lei 7.347/85 é o fulcro legal que disciplina o instituto da Ação Civil Pública no Brasil. Ela nos permite uma conceituação legalista a partir da interpretação do corpo dispositivo legal. Sobre isso, Paulo Affonso Leme Machado[2], escreveu:

 

“A ação civil pública foi elaborada pela Lei número 7.347 de 24.7.85. A ação é denominada civil porque tramita perante o juízo civil e não criminal. Acentue-se que no Brasil não existem tribunais administrativos. A ação é, também, chamada pública porque defendem bens que compõem o patrimônio social e público, assim como os interesses difusos e coletivos, como se vê do art. 129, III, da Constituição Federal de 1988. As finalidades da ação civil pública são: cumprimento da obrigação de fazer, cumprimento da obrigação de não fazer e/ou a condenação em dinheiro. Visa defender o meio ambiente, o consumidor, os bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.”

 

            A lição retro possibilita melhorar nossa precisão conceitual através de novos elementos, quais sejam: o caráter constitucional da Ação Civil Pública; quanto aos interesses tutelados, aqueles que tratam interesses coletivos lato sensu; quanto à legitimidade, a presença do Ministério Público e entidades co-legitimadas no pólo ativo; quanto aos efeitos pretendidos, verificamos os de natureza cominatória na esfera civil.                

           

A partir destes elementos, podemos trazer à baila um conceito próprio de Ação Civil Pública: é o instrumento processual de origem constitucional[3], normatizado pela lei 7.347/85 e outros diplomas posteriores, que visa à atuação da função jurisdicional do Estado na esfera cível, promovida pelo Ministério Público e instituições co-legitimadas, que busquem a satisfação de interesses coletivos lato sensu[4], individuais indisponíveis, ou ainda, de acordo com Voltaire de Lima Moraes[5], aqueles “em defesa da ordem jurídica ou do regime democrático”.

 

A lei no. 6.932/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, foi o grande marco a instituir uma modalidade de ação civil pública, em seu art. 14, § 1º., ao dispor que “O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente”.

 

A lei de no. 7.347/85 buscou ampliar o leque de interesses e direitos a serem protegidos, dispondo expressamente, em seu artigo 1º sobre os bens e direitos que ela tutela. Há severas críticas a respeito desta limitação na doutrina clássica, ora com autores advogando que o art. 5º., LXXVIII, da CF tenha revogado o art. 1º. da lei 7.347/85, ora com estudiosos defendendo a revogação do dispositivo que limita a propositura da Ação Civil Pública em razão da matéria, com fim de mais ampla e célere prestação jurisdicional em assuntos que versem sobre direitos coletivos lato sensu. A opção escolhida pelo legislador foi a ampliação do rol de possibilidades para a interposição da Ação Civil Pública paulatinamente, quer pela inovação legislativa, quer pela edição expressa do art. 1º. Da lei 7.347/85, o que se deu, por exemplo, com a inserção do inciso V (infração da ordem econômica), por conta da promulgação da lei 8.884/94.

 

 

1.1   Classificação da Ação Civil Pública quanto ao plano normativo

 

A divisão a seguir é proposta por Voltaire de Lima Moraes[6], que também adotamos para fins de nosso estudo.

 

1.1.1          Ações Civis Públicas Constitucionais

 

São as que emanam dos dispositivos da Carta Magna. Essa terminologia deriva do art. 129, III, da CF/88, que descreve como uma das funções do Ministério Público a propositura deste tipo de ação para proteção de patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

 

Exemplos: ação que busca defender os interesses dos indígenas; ação de responsabilidade civil embasada em Comissão Parlamentar de Inquérito; assim como a ação declaratória de constitucionalidade de ato normativo federal (art. 102, I, a).

 

1.1.2          Ações Civis Públicas Infraconstitucionais

 

São ajuizadas pelo Ministério Público com base na lei 7.347/85 e outros diplomas infraconstitucionais. É considerada Ação Civil Pública matriz aquela incorporada imediatamente através das disposições da lei 7.347/85; já as ações derivadas surgem de outras leis inspiradas no espírito da última e de sua grande aceitação popular e que aumentaram o rol de possibilidades de sua aplicação. São exemplos de ações civis infraconstitucionais derivadas: aquelas baseadas na Lei 7.913/89, que “Dispõe sobre a ação civil pública de responsabilidade por danos causados aos investidores do mercado de valores mobiliários”, ou a ação para proteção de interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e adolescência definidos no art. 201, V, do Estatuto da Criança e Adolescente.

 

Existe ainda uma terceira modalidade de Ação Civil Pública infraconstitucional: as inominadas. São aquelas possíveis, dado os interesses que afetam e a legitimidade do Ministério Público em propô-las, embora o legislador não as tenha assim denominado. Exemplos desta modalidade: a lei 8.078/92, Código de Defesa do Consumidor, que confere legitimidade ao Ministério Público para intentar ação em favor de interesses coletivos lato sensu dos consumidores; a lei 10.671, de 15.5.2003, ao observar, em seu art. 40 que “a defesa dos interesses e direitos dos torcedores em juízo observará, no que couber, a mesma disciplina de defesa dos consumidores (…)”. Algumas ações civis públicas inominadas podem também ser encontradas no Código Civil: a de declaração de ausência, a de nulidade de casamento e a ação de suspensão de poder familiar são algumas delas.

 

 

2. OBJETO

 

O artigo 1º. da lei 7.347 de 24.7.85 é taxativo quanto aos direitos tutelados para fins da interposição da Ação Civil Pública.

 

“Art. 1º. Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

 

I.                    ao meio ambiente;

II.                  ao consumidor;

III.                a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

IV.                a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;

V.                  por infração da ordem econômica.”

 

 

Nós observamos que, à guisa das explicações anteriores, esta lista ainda é acrescida de outras possibilidades mais bem delineadas, propostas em leis subseqüentes. São leis que também versam sobre a ação civil pública: a lei no. 7.853, de 24.10.89 – Defesa dos Interesses da Pessoa Portadora de Deficiência; a lei no. 7.12.89 – Mercado de Valores Mobiliários: Lei Protetiva dos Investidores; a lei 8.069 de 13.7.90 – Estatuto da Criança e do Adolescente, a lei 8.429, de 2.6.92 – Lei da Improbidade Administrativa, entre outras, sendo estas as principais.

 

            De acordo com o artigo 3º. da lei 7.347/85, o objetivo imediato, ou ainda o pedido que fundamenta a ação é a condenação ao réu à obrigação de fazer ou não fazer determinada conduta e/ou reparação civil dos danos causados, inclusive com apuração do dano moral.

 

            Sobre o descumprimento do ato de fazer ou não fazer determinado em sentença ou liminar, a lei segue o diploma do Código de Processo Civil, em seu artigo 11, determinando que o juiz imponha multa cominatória diária, independente de requerimento do autor.

                                                                      

            Já o produto da reparação de danos, no caso de indenização, se reverte para um fundo gerido por um Conselho Federal ou Estadual que apurará como o numerário será aplicado a fim de reparar os danos causados. Obviamente, o Ministério Público é parte presente deste Conselho.     

 

 

3. SOBRE OS INTERESSES JURÍDICOS A TUTELAR NA AÇÃO CIVIL PÚBLICA

 

            Como é cediço, Ação Civil Pública tem a ver com a defesa de interesses coletivos lato sensu e deve ser promovida pelo Ministério Público e órgãos co-legitimados que, por sua própria prerrogativa funcional, dirigem-se à defesa do interesse público.

 

            Cabe aqui fazer um adendo sobre a dicotomia entre as esferas pública e privada no que concerne ao interesse jurídico.  Com efeito, Celso Antônio Bandeira de Mello define o interesse privado em dois momentos:

 

“Não é problema definir o interesse privado juridicamente relevante. No direito positivo brasileiro, interesse privado é aquele interesse substancial que integra o núcleo de um direito objetivo do particular. Tem-se aí, o aspecto do interesse privado sob aspecto material. Mas, numa definição jurídica, não se pode marginalizar o aspecto formal. Sob esse ângulo, interesse privado é aquele submetido ao regime jurídico do direito privado. Caracteriza-se principalmente, por sua disponibilidade e pela equivalência com interesses privados (princípio da autonomia da vontade e da igualdade das partes na relação jurídica)”. [7]

 

              a expressão interesse público tem sido utilizada para alcançar os interesses sociais, os indisponíveis do indivíduo e da coletividade, os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.

 

            Assim, podemos dizer que “o conceito jurídico positivo de interesse público corresponde àquele interesse que deve ser curado com prevalência e, para tanto, com a outorga da titularidade de poder à Administração e, além disso, com prerrogativas especiais”.[8]

 

            3.1- Interesses Difusos

 

            Pertencem a grupos menos determinados de pessoas, que não necessariamente possuem vínculo jurídico entre si ou mesmo fático. Na expressão de Hugo Nigro Mazilli, “são como um feixe de interesses individuais, com pontos em comum”.

 

            Os interesses difusos pertencem a uma pluralidade de sujeitos mais ou menos vasta, mais ou menos determinada, a qual pode ser unificada mais ou menos estreitamente em uma coletividade. Embora o bem ou direito em voga seja passível de fruição por um grande número de pessoas, não é possível precisar corretamente quantas delas usufruem ou se interessam em defender este interesse.

 

            3.2- Interesses Coletivos

 

            Compreendem uma categoria determinada, ou um número de pessoas determinadas, ligadas por uma mesma relação jurídica básica e não por meras circunstâncias fáticas. Um exemplo é o direito dos alunos de determinada escola de ter assegurada a mesma qualidade de ensino em determinado curso.

 

            3.3- Interesses Individuais Homogêneos

 

            São interesses individuais, divisíveis e perfeitamente mensuráveis individualmente que possuem origem numa circunstância fática comum. Por exemplo, uma fraude financeira, que venha a causar prejuízos a um número determinado de pessoas. Neste caso, opta o interessado: ou defende seu interesse per si, ou aguarda a defesa coletiva do mesmo, com as vantagens dela decorrentes.

 

 

4. COMPETÊNCIA

 

            Sobre a fixação de competência, a lei 7.347/85 dispõe que:

 

“Art 2º. As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo Juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa”.

 

Neste sentido a jurisprudência já tem se pronunciado contra a alteração e prorrogação da competência:

 

“A ação civil pública deve ser proposta sempre no local onde ocorrer o dano (ou ameaça de dano, nos casos cautelares) e interesse metaindividual. Trata-se de competência absoluta, que afasta inclusive a conexão com outras demandas, mesmo no caso de comprovado interesse da União.”[9]

 

 

            Alguma hipóteses controvertidas para fixação da competência:

 

            1- Ocorrendo lesão ou ameaça em mais de uma comarca, com mais de um juízo competente, o critério será o de prevenção, na forma que o Código de Processo Civil disciplina, já que a própria lei 7.347/85 prevê a possibilidade da aplicação subsidiária do CPC, e este critério atende à regra sob análise;         

 

            2- Se de âmbito estadual a lesão ou ameaça, a competência será da justiça comum estadual, ajuizada no foro da efetiva lesão ou ameaça. A competência será da justiça comum federal se a lesão ou sua iminência ultrapassar um único Estado-membro.

 

 

5. LEGITIMAÇÃO

 

Os legitimados para a ação civil pública são aqueles que integram o rol do art. 5º. Da Lei 7.347/85, ou aqueles constantes do rol do art. 82 da Lei 8.078/90, estes últimos no que atine ao direito do consumidor exclusivamente.


                        “Art. 5o  Têm legitimidade para propor a    ação   principal e a ação cautelar:

        I – o Ministério Público;

        II – a Defensoria Pública;

        III – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
        IV – a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;
        V – a associação que, concomitantemente:


        a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

        b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

 

        § 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei.

 

        § 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.

 

          § 3° Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa.

         § 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

        § 5.° Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei.

            § 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial.

 

 

            Vejamos as considerações feitas por Kazuo Watanabe[10] sobre a legitimação das pessoas jurídicas de direito público interno:

 

“A ampla legitimação dos entes públicos para a tutela dos interesses ou direitos dos consumidores decorre do mandamento constitucional.

            …………………………………………………………

 

A legitimação será concorrente e disjuntiva sempre que todos os entes públicos tenham, pelas características da lide, seja pela amplitude de ameaça ou da lesão, seja ainda pela quantidade e localização dos titulares dos interesses ameaçados ou lesados, a atribuição de promover a defesa dos consumidores no caso concreto, em razão do vínculo que possuam com esses consumidores.


            Se nenhum nexo mantém, porque os consumidores pertencem a outro Município ou Estado Diverso, evidentemente a legitimação não lhes diz respeito”.

 

            O Ministério Público é o ente principal na propositura da ação civil pública, ainda que não seja o único legitimado, como já vimos. Dado suas atribuições constitucionais (art. 129) e sua natureza intrínseca de tutelar os interesses coletivos em lato sensu, é dever do M.P. propor a ação civil pública sempre que admissível, independente de provocação de entidades ou interessados.

 

            O Código do Consumidor, neste tocante, ampliou as prerrogativas do Ministério Público, alterando sua Lei Orgânica, que em seu art. 25, dispõe:

 

“Art. 25 – Além das funções previstas na Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

                                                          

……………………………………………………………………..

            IV- promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei;”[11]  

                                              

 

            Com relação aos critérios para delimitação da legitimidade passiva, não existe nenhuma condição excepcional para alguém, sendo pessoa física ou dotada de personalidade jurídica, figure no pólo passivo de uma ação civil pública. Basta que esta pessoa realize condutas que causem lesão ou iminência da mesma a quaisquer interesses metaindividuais: meio ambiente, consumidor, patrimônio público, cultural etc.

 

            Em raríssimos casos, a lei exige uma condição especial do legitimado passivo, como no caso do agente público acusado de atos de improbidade administrativa.

            É admitido o litisconsórcio e a assistência em relação aos co-legitimados. Inclusive o litisconsórcio ulterior com a demanda já em andamento.

 

 

6. TUTELA ANTECIPATÓRIA E CAUTELAR

 

            A ação civil pública, conforme o art 3º. da Lei 7.347/85 comporta pedido de condenação (fazer ou não fazer) e de reparação pecuniária do dano causado, estendendo-se ao dano moral, inclusive. Em relação à classificação da ação, ela poderá ser de conhecimento ou cautelar. Permite também a pretensão cautelar, diante a satisfação dos requisitos afeitos a este tipo de provimento: fumus boni iuris e periculum in mora. Além disso, para sua concessão deve haver ameaça real e iminente a interesse transindividual protegido.

 

            Sobre este aspecto, vale a leitura dos artigos 4º. e 12 da Lei 7.347/85:

”Art. 4o Poderá ser ajuizada ação cautelar para os fins desta Lei, objetivando, inclusive, evitar o dano ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem urbanística ou aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

 

Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.

§ 1º A requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, poderá o Presidente do Tribunal a que competir o conhecimento do respectivo recurso suspender a execução da liminar, em decisão fundamentada, da qual caberá agravo para uma das turmas julgadoras, no prazo de 5 (cinco) dias a partir da publicação do ato.”

 

 

            O mandado liminar referido pelo artigo 12 é o concedido não em sede de ação cautelar e sim no próprio bojo da ação de conhecimento. Não se confunde, igualmente, com antecipação de tutela. Sua concessão pode ser deferida mesmo fora do processo cautelar, mas possui requisitos diversos daqueles exigidos pelo art. 273 do Código de Processo Civil, sendo uma medida excepcional de urgência.

 

 

7. FASE PRÉ-PROCESSUAL: INQUÉRITO CIVIL E SUA NATUREZA

 

                        Temos, no art. 8º. da Lei 7.347/85:

                                              

“§ 1º. O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis.”

 

            A exemplo, do que ocorre com o inquérito policial, o inquérito civil é uma fase preparatória ao processo principal, que busca investigar indícios de autoria da lesão ou ameaça, bem determinar sua gravidade e dimensões econômicas. Sua instauração e andamento são exclusividade do Ministério Público, que possui a faculdade e não obrigação de instaurá-lo. Tanto que seu arquivamento não depende de autorização do magistrado para tanto.

 

            A instauração do inquérito civil se faz de duas formas: ex officio, mediante portaria do órgão de execução do MP, ou em despacho exarado nos requerimentos a ele dirigidos pelos interessados (lembrando que qualquer pessoa pode provocar a atuação do MP, nos termos do art. 6º. Da Lei 7.347/85). Mas não existem normas rígidas quanto à forma dos atos do inquérito civil, razão pela qual, muitas vezes, os representantes do Ministério Público optam por fazer algo análogo ao inquérito policial. 

           

            Para a elaboração do inquérito civil, o Ministério Público pode proceder a notificações e requisições, investigando documentos, consultando especialistas e ouvindo testemunhas, por exemplo.

 

 

8. EFEITOS DA SENTENÇA

 

            Diferentemente das ações comuns, o efeito suspensivo em caso de interposição de recursos é a exceção. Tanto é que o artigo 14 da lei 7.347/85 disciplina o efeito suspensivo como uma faculdade do magistrado e não como regra.

 

            No artigo 16 da mesma lei, verificamos que a sentença civil fará coisa julgada erga omnes, exceto se a ação for julgada improcedente por deficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

 

            A execução da sentença, transitada em julgado, será promovida pela associação que houver proposto a ação e ao Ministério Público, se for o proponente original da ação, ou em 60 dias subsidiariamente à associação que promoveu a demanda, se esta silenciar.

 

            Cabe aqui mencionar que as custas, honorários advocatícios da parte contrária, emolumentos e honorários periciais não serão devidos pela associação autora, independente do resultado da ação, exceto no caso de manifesta má-fé. Trata-se, mais uma vez, de uma manobra que privilegia o interesse público, evitando que as ações civis públicas sejam barradas em sua gênese por questões meramente financeiras.

           

 

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 19ª. Ed. São Paulo: Saraiva.

DINAMARCO, Pedro da Silva. Ação Civil Pública. São Paulo: Saraiva, 2001.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Ação Civil Pública (ambiente, consumidor, patrimônio cultural) e tombamento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986.
VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Ação Civil Pública. 5ª. Ed, São Paulo: Atlas, 2005.
MORAES, Voltaire de Lima. Ação Civil Pública: alcance e limites da atividade jurisdicional. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2007

 

 

 

* Jornalista e graduando em Direito pela faculdade Carlos Drummond de Andrade (SP)

 

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[1]           FERRAZ, Antônio Augusto Melo de Camargo; MILARÉ, Edis, NERY JÚNIOR, Nelson. Ação Civil Pública e a tutela Jurisdicional dos interesses difusos. São Paulo, Saraiva, 1984, p. 22.

[2]           MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 2ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992, p. 214

[3]           Art. 129, III, CF/1988

[4]           O Código de Defesa do Consumidor, Lei no. 8.078/90, em seu art. 81, parágrafo único, incisos I, II e III, considera os interesses difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos, respectivamente, como espécies do gênero interesses coletivos lato sensu.

[5]           MORAES, Voltaire de Lima. Ação Civil Pública: alcance e limites da atividade jurisdicional. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2007, p. 22.

[6]           MORAES, Voltaire de Lima, Op. Cit, p. 35-38.

[7]           Sobre o conteúdo do regime jurídico de direito público, consulte-se MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p. 3 ss.

[8]           FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Ação Civil Pública – Gizamento Constitucional – Revista Eletrônica de Direito do Estado. Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, julho/agosto/setembro de 2006, p. 2.

[9]           RJTJESP no. 133. p. 151 (Agravo de Instrumento no. 12.589/0 – Franca – Câmara Especial do TJ-SP, VU, Relator Torres de Carvalho, j. em 16-5-91

[10]          Cf. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense Universitária, p. 516

[11]          Lei 8.265, de 12.2.93

Como citar e referenciar este artigo:
PÍCOLO, Guilherme Gouvêa. Ação Civil Pública. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/acao-civil-publica/ Acesso em: 19 mar. 2024