Antropologia Jurídica

Conceitos de Direitos dos Povos Ágrafos, Etnia, Alteridade e Fricção Interétnica, etnocentrismo e Genocídio Cultural,Tolerância, Estados Nacionais, Autodeterminação e Direitos Humanos

por Paula
Cargnin Pereira*

DIREITO DOS POVOS ÁGRAFOS

1-Direito vinculado
ao Estado: Modelo Ocidental – esses povos ágrafos são contra isso.

a) “Sem fé
(religião), sem lei (direito), sem rei (estado). Quando os colonizadores chegaram aqui, diziam
isso desses povos. Desprezam sua cultura, pois eles tinham sua próprio fé, seu
Direito Costumeiro e os mais velhos da tribo geralmente que comandavam.

b) Sociedades
Homogêneas. A política, o jurídico, a
religião, o social, são todos os setores vinculados e entrelaçados pelo direito
costumeiro; não é possível distingui-los separadamente, estão confundidos. É a
“indiferenciação”.

c) Fontes de
Pesquisa. Eram elaboradas por outros povos, por isso não se pode ter 100% de
certeza nas fontes, pois eles põem seus próprios valores. São os relatos de
“antropólogos de gabinete”, que assim trabalhavam.

2-Princípios:

a) Solidariedade.
Prestar algum serviço, favor, sem esperar nada em troca.

b) Reciprocidade.
Dar, receber, retribuir – formando um ciclo.

c) Interesses
Coletivos. Interesses individuais ficam em segunda plano.

d) Responsabilidade
Coletiva. Uma pessoa pratica um ato e a família toda responde por ele.

3-Divisão Artificial: Porque foi feito pelos estudos
paralelos, de acordo com nosso sistema.

a) Forma de Liderança. Chefes políticos que
chegavam ao poder pelo consenso de todos (tinha que ser bom caçador, orador,
solidário, carismático). Só tinham o poder absoluto durante a guerra, pois é o
único momento em que ele manda e desmanda e faz o que quer. Fica no poder o
tempo que o povo quiser.

b) Guerra. Para
um povo entrar em guerra antes tinha que haver consenso (anciãos). A guerra
seria a reciprocidade negativa. Eles tinham prisioneiros de outras tribos e
durante guerra eles os comiam para se vingar ou para adquirir suas qualidades,
este antes tinha uma vida normal com a tribo que o aprisionou. Depois começaram
a trocar o prisioneiro por alguma coisa.

c) Direito Penal.
A responsabilidade coletiva é o que prevalece, é forte. Antigamente as mulheres
não tinham muitos filhos e praticavam o aborto (o que importa é o coletivo). Os
muito doentes ou crianças defeituosas são mortas, seriam um “peso” para a
coletividade. A covardia e a feitiçaria eram crimes de esfera pública (chefe
julgava). O homicídio e a vingança eram da esfera particular.

d) Direito Civil.
Propriedade, família (muito importante o casamento). A posse é coletiva e
existe a rotatividade dela. Só objetos pessoais não são coletivos, como
flechas, colares, etc.

e) Relações de
Trabalho. Os momentos de trabalho e de prazer não são separados. O excedente é
utilizado nas grandes festas. A diferença do trabalho era pelo sexo; as
mulheres plantavam e colhiam (produziam muito, eram importantes). Os homens
caçavam, pescavam, construíam casas e guerreavam.

ETNIA

É diferente de raça. É um poço com cultura comum que lhe dão
identidade própria (o que caracteriza a etnia). Têm o mesmo passado, língua,
forma de ver o mundo, mesma identidade, valores comuns, com mesmo modo de se
vestir, chorar pelos mortos, preferências alimentares, festas, crenças
espirituais. Identidade está
estritamente ligada à diferença, e essa relação é chamada identidade
contrastiva, ou seja, para perceber os limites da minha identidade preciso
comparar com a identidade do “outro”.

ALTERIDADE, FRICÇÃO INTERÉTNICA

Alteridade trata-se das relações entre os desiguais do ponto
de vista étnico.

Fricção interétnica é o processo de dinâmica da cultura
externa (um absorve a cultura do outro, etnias se relacionam) não passivo, com
choques violentos físicos e simbólicos (sutil) (processo complexo e tenso de
atrito). Mais forte domina mais fraco geralmente. A existência de uma tende a
negar a existência da outra. Não aceitam as diferenças, o distante, o desigual
é visto na perspectiva de uma humanidade diminuída, inferior. É estigmatizar o
outro, opinião generalizada, um preconceito. Um dos motivos pode ser a
necessidade humana de elevar sua auto-estima, de melhorar o valor da própria
pessoa ou do próprio grupo diminuindo outros.

Quanto maior a autoconfiança de um povo, maior seria o nível
de tolerância com os outros povos, pois o processo de estigmatização tem muito
a ver com o sentimento de medo que paira entre os povos. Uma maior tolerância só será possível com a redução
do temor recíproco, tanto no plano individual como coletivo.

ETNOCENTRISMO E GENOCÍDIO CULTURAL

Etnocentrismo: Visão do “outro” como diminuído. Vê a própria
etnia como referência absoluta de humanidade; a do outro, quando não perseguida
é inferiorizada. Podem ser de várias
formas: estigmas, segregações e genocídios.

Genocídio cultural ou Etnocídio: imposição de um processo de
aculturação de uma cultura por outra, conduzindo à destruição dos valores
sociais, morais e tradicionais da sociedade dominada. Negar a um povo o direito de desfrutar,
desenvolver e transmitir sua própria cultura, mudar modo de vida. Tanto os
crimes de apartheid como o etnocídio buscam a eliminação e a degradação do
“outro”, seja pela segregação e isolamento (apartheid) ou pela integração
forçada, ou aculturação (etnocídio).

TOLERÂNCIA

Tolerância: Reconhecimento mútuo de que o outro é um
verdadeiro ser humano e um interesse em conhecer-se, apreciando uma diversidade
cultural do mesmo contexto geográfico e social. Não advém de um sentimento
caridoso, nem da resignação diante de um acontecimento inevitável. Tolerar o
outro não significa um conformismo diante de uma convivência não desejada, mas
antes de tudo, um olhar de respeito à singularidade do “outro”, além Também de
uma percepção diferenciada, ou abrandada, da própria singularidade. Aceitando a
existência do outro, nós vamos aprendendo a reconhecer no mundo um lugar de
muitos povos. Superar as diferenças sem eliminá-las, tornando-as não como fonte
de estranheza e adversidade, mas como fonte de riqueza e solidariedade.
Respeitar diferença, conviver e manter o diálogo, não querer impor teu padrão
ao outro; assim pode até gerar dinâmica da cultura, sem fricção, só influência.

Intolerância se dá com regimes de exclusão, como o
apartheid, como quando jogaram bombas em áreas indígenas e outros. Pode ser
religiosa, sexual, etc.

ESTADOS NACIONAIS

Criação dos estados e homogeneizaram (unificaram)
forçadamente vários povos (categoria puramente antropológica) em uma mesma
nação. Pegaram um território e separaram até etnias no espaço geográfico.
Brasil é um exemplo, várias etnias no mesmo território.

Constituem o Estado: povo, território e governo ou poder
político.

Na nação todos são iguais perante a lei. É Heterogenia na
realidade, vários povos a constituem, não é homogêneo como é falado (mito).
Modelo de sociedade monista, quando na verdade é pluralista.

Estado é um pacto político sustentado por um sistema
jurídico. No aspecto antropológico, ocorre a subjugação de um povo pelo outro;
onde deveria existir um espaço político para cada povo.

Três modelos de Estado-Nação:

1º – Monista, uno e homogêneo (ocupado por um só povo).

2º – Estado Nacional opressor, mais de um poço com minorias
subjugadas, apenas pvo dominante dispõe de espaço político necessário à sua
sobrevivência. Poder centralizado e absolutista, que se faz de monista e uno,
apesar de ter vários povos. Usa de mecanismos de exclusão, assimilação forçada
e até perseguição étnica.

3º – É o ideal do ponto de vista interétnico, em que com um
arranjo político complexo se reconheceria a pluralidade dos povos existentes.
Cada povo teria espaço político interno, autonomia, contornado por um vínculo
político e jurídico mais abrangente, o da nacionalidade. Esse estado pluralista
é um pacto político complexo, baseado na tolerância e no reconhecimento da
heterogeneidade étnica.

Para ser colocado na prática seria necessário um grande
levantamento étnico nacional, para que conheça sua própria constituição humana
e tornando de domínio público para que todos reconheçam a diversidade de povos
no seu território. Em um segundo momento, desenvolver uma educação voltada à
tolerância, para que seja possível a constituição de espaços políticos
internos, em que cada povo possa, nos limites do seu vínculo jurídico e
político com a Nação que o integra, preservar seus costumes, crenças, tradições, língua.

AUTODETERMINAÇÃO

Autonomia ou autodeterminação tomamos como conceito o
respeito à diversidade étnica, possibilitando que cada povo viva conforme sua
cultura, tradições, costumes.

É a propriedade que têm as sociedades de criarem suas
próprias regras, e de viverem sem interferência de outrem. Os povos tem direito
de decidir o que fazer com suas questões internas.

Pra que isso seja possível é necessário superar a
juridicidade moderna, que está em considerar desigual os desiguais,
considerando a existência da desigualdade real não para consagrá-la, mas
superá-la. As injustiças devem ser superadas.

Os Estados têm medo dessa autodeterminação dos povos com a
possibilidade de criação de comunidade políticas independentes que ameaçam a
soberania nacional. Em contrapartida não vacilam diante dos interesses
financeiros das transnacionais, estas verdadeiramente perigosas.

DIREITOS HUMANOS

Universalização ou relativização dos Direitos Humanos

-Os Dir. Hum. Foram construídos historicamente.

-É um processo inacabado. Por isso vai mudando conforme as
novas sociedades e novas necessidades.

-Declaração francesa dos Dir. Hum. e dos Cidadãos

-Declaração Universal dos Dir. dos Homens (ONU-1948).

Dimensões (falando primeiramente da Europa):

1ª – Direitos individuais (à vida, liberdade, propriedade,
liberdade de expressão, à nacionalidade) e direitos políticos (ser eleito e
eleger, voto universal, igualdade formal perante a lei). Todos dentro de um contexto em que a
burguesia queria seus direitos individuais protegidos e direitos políticos para
limitar poder dos monarcas (garantias contra o Estado).

2ª – Direitos coletivos gerados a partir da industrialização
(exploração da mão-de-obra). Buscam-se direitos econômicos, sociais e culturais
(à educação, saúde, moradia). Com a legislação trabalhista justa foi possível
amenizar a exploração (drt. a greve, etc). Liberdade por intermédio do Estado,
não só mais perante ele.

3ª – Surge no séc. XX, para a proteção de grupos humanos.
São direitos de titularidade coletiva ou difusa (a um ambiente saudável e
equilibrado, à paz (para garantir vida), ao desenvolvimento sustentável, ao
patrimônio comum da humanidade, a uma vida digna). Meio ambiente!

4ª – Refere-se novamente à proteção de uma coletividade (drt
à democracia direta, à informação, ao pluralismo cultural), mas está mais
ligado às questões de alguns grupo étnicos que começam a lutar para garantir
seus direitos (indígenas, mulheres, negros, homossexuais, idosos, crianças,
adolescentes).

5ª – Relacionados à biotecnologia – bioétnica e engenharia
genética Estão relacionados à informática, a questão de limites dessas
experiências, e tmb as questões relativas à religião (novos tipos de
problemas).

O Fundamento da universalidade dos drtos Humanos é a DIGNIDADE
da pessoa humana (cada sociedade tem um conceito sobre dignidade, que é
diferente, porque o que é liberdade e vida boa muda de acordo com as
sociedades).

Universalidade dos Direitos humanos X Relativismo Cultural:

A Universalidade dos Direitos humanos, a pretensão é
universal porque se estende a todos. Em
contrapartida é usado para legitimar intervenções em outros países, com exemplo
o Iraque; mas essas intervenções ferem os direitos humanos.

Relativismo Cultural, nem sempre o nosso conceito de drts
humanos é o dos outros povos. Por isso os críticos dizem que querer
universalizar os drts humanos de determinada etnia é etnocentrismo (querer
padronizar todos os povos a partir de uma concepção única) e se usa isso para
invadir outros povos. (seria mesma coisa que querer impor a outras etnias outra
cultura).

*aluna de direito da UFSC, 1ª fase Noturno e da Esag –
Administração Empresarial, 3ª Fase Vespertino.

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Como citar e referenciar este artigo:
PEREIRA, Paula Cargnin. Conceitos de Direitos dos Povos Ágrafos, Etnia, Alteridade e Fricção Interétnica, etnocentrismo e Genocídio Cultural,Tolerância, Estados Nacionais, Autodeterminação e Direitos Humanos. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/resumos/antropologia-juridica/conceitosantr2/ Acesso em: 25 abr. 2024