Direito Civil

Legislação alterada

Legislação alterada

 

 

J. A. Almeida Paiva *

 

 

O novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10/01/2002) (i), que entrará em vigor no dia 11 de janeiro de 2003 traz substanciais alterações em certos institutos com reflexos na vida das pessoas. Uma delas refere-se aos prazos para a aquisição tanto do usucapião extraordinário como do ordinário, que foram reduzidos.

 

No Código atual (ii) (1916), a questão dos prazos para aquisição do domínio imóvel por usucapião extraordinário e ordinário está normada nos artigos 550 e 551. Quanto ao usucapião extraordinário, o prazo que inicialmente era de 30 (trinta) anos de 1916 a 1955, passou para 20 (vinte) anos de 1955 a 2002 e a partir de 2003 passará a ser de 15 (quinze) anos.

 

Para se obter o domínio do imóvel pelo usucapião extraordinário exige-se hoje (CC 550) o prazo de 20 (vinte) anos de posse, sem interrupção, nem oposição, independentemente de título e boa-fé para aquele que possuir como seu um imóvel e pretender ver declarado por sentença o reconhecimento de seu domínio.

 

Pelo artigo1.238 do novo Código Civil (2002), o prazo do usucapião extraordinário, que hoje é de 20 (vinte) anos será reduzido para 15 (quinze) anos. Foi introduzido neste artigo o parágrafo único, segundo o qual, “o prazo estabelecido no artigo será reduzido a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo”.

 

Isto quer dizer que o prazo do usucapião extraordinário vai ser reduzido a partir de janeiro/2003, conforme a situação, podendo ser de 15 (quinze) ou 10 (dez) anos.

 

A inovação trazida pelo parágrafo único do art. 1.238 do novo Código Civil diz respeito a um plus exigido para que o prazo para usucapir o imóvel extraordinariamente seja reduzido ainda mais, de 15 (quinze) para 10 (dez) anos, desde que o interessado prove que se estabeleceu no imóvel onde passou a ter sua moradia habitual, ou tenha nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

 

São duas situações distintas que permitirão o possuidor ter o prazo de usucapião extraordinário reduzido para dez anos: a) ter moradia habitual no imóvel; b) realizar nele obras ou serviços de caráter produtivo. É curial que tais requisitos, como dissemos acima, devem ser adicionados aos gerais do caput do art. 1.238 (CC 2002).

 

Quanto ao usucapião ordinário, o CC 1916, originariamente previa os prazos de 20 anos entre ausentes e 10 entre presentes, situação que vigorou entre 1916 a 1955. Pela Lei nº 2.437 de 7/3/55 tais prazos foram alterados e atualmente para adquirir o domínio do imóvel ordinariamente o prazo é de “10 (dez) anos entre presentes, ou 15 (quinze) entre ausentes”, desde que o possuidor tenha o imóvel como seu, “contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé”.

 

Pelo novo Código Civil, que entrará em vigor em janeiro de 2003, os prazos do usucapião ordinário serão reduzidos, respectivamente para 10 (dez) e 5 (cinco) anos. Vejamos o que diz o art. 1.242 e seu parágrafo único do CC 2002:

 

“Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos. Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base em registro constante do respectivo cartório, cancelado posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimento de interesse social e econômico”.

 

Não pretendemos neste trabalho analisar os pressupostos para a aquisição do domínio do imóvel e nem eventuais alterações introduzidas pelo novo Código Civil. Nosso propósito é simplesmente alertar para a redução dos prazos, que foi considerável e poderá pegar muitos proprietários de surpresa.

 

Como forma originária de aquisição do domínio (CC 1916, 530, III) no sistema atual, temos o usucapião extraordinário (CC 550), o ordinário (CC 551) mais as modalidades de usucapião constitucional urbano (CF/88 183) e rural (CF/88 191). A partir de janeiro de 2003, a aquisição da Propriedade Imóvel por usucapião será toda ela normada nos artigos 1.238 a 1.244, incluindo as modalidades hoje previstas na Constituição (CF/88, 183 e 191).

 

Assim os prazos para usucapir imóvel de uma maneira geral irão variar de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos, não tendo havido alteração alguma nos prazos relacionados às atuais modalidades de aquisição por usucapião constitucional, quer urbano (CF/88 183) ou rural (CF/88 191), que continuarão a ser de 5 (cinco) anos e estarão normados no Capítulo II, do Título III, do Livro III, do CC 2002, que trata “Da Aquisição da Propriedade Imóvel”.

 

En passant consignamos que o CC 1916 usa a expressão usucapião no masculino e o CC 2002 passou a usá-la no feminino; no nosso livro “Procedimentos em Defesa da Posse e da Propriedade” a ser lançado brevemente, dedicamos um capítulo exclusivo sobre o título “Gênero: o usucapião ou a usucapião”, onde concluímos:

 

“Ainda que por suas origens possa ser até mesmo do gênero feminino, pelos usos e costumes, a tradição já consagrou o termo usucapião no gênero masculino, razão pela qual não vemos porque mudar a variante morfológica ou mesmo etimológica da palavra, quando a língua portuguesa usada no Brasil, tem centenas de palavras com incerteza de forma, tais como: “ouço e oiço”, “ouro e oiro”, “taberna e taverna”, “apostila, apostilha ou postilha” e inúmeras outras expressões.”

 

Fica aí registrada mais uma das inúmeras críticas que o novo Código Civil já vem recebendo. Mas, nosso propósito é apenas e tão somente alertar sobre a redução dos prazos para aquisição do domínio imóvel por usucapião.

 

Para tanto reiteramos que inicialmente quando entrou em vigor o Código Civil de 1916, o art. 550 fixava em 30 (trinta) anos o prazo para a aquisição do domínio pelo usucapião extraordinário e o art. 551 fixava em 20 (vinte) anos o prazo para o possuidor com justo título e boa-fé adquirir o domínio do imóvel entre ausentes.

 

A Lei nº 2.437, de 7-3-1955 reduziu o prazo do art. 550, de 30 (trinta) para 20 (vinte) anos para o usucapião extraordinário, assim como de 20 (vinte) para 15 (quinze) anos o prazo para usucapião ordinário entre ausentes, prazos estes que o novo Código Civil voltou a reduzir ainda mais.

 

Na época da Lei 2.437 (após a 1955) surgiram inúmeras discussões se a lei nova atingia os prazos então em curso ou não. É evidente que muitos juristas entendiam que o prazo reduzido só começaria a contar após a entrada em vigor da Lei 2.437/55, mas outros defendiam que a redução do prazo deveria ser aplicada às prescrições já iniciadas anteriormente à lei nova.

 

A discussão foi solucionada pelo STF em inúmeros Recursos Extraordinários entre 1960 a 1964 até ser editada a Súmula nº 445, com a seguinte redação: “A Lei nº 2.437, de 07.03.55, que reduz prazo prescricional, é aplicável às prescrições em curso na data de sua vigência (01.01.56), salvo quanto aos processos então pendentes”

 

Com tal pronunciamento o STF firmou o entendimento segundo o qual, ao entrar em vigor a Lei 2.437/55 que reduziu o prazo do usucapião extraordinário de 30 (trinta) para 20 (vinte) anos e o prazo do usucapião ordinário entre ausentes de 20 (vinte) para 15 (quinze), a lei nova deve ser aplicada aos prazos em cursos, ressalvando-se tão somente as hipóteses de processos pendentes.

 

Quando a lei ordinária entra em vigor alterando prazo prescricional atinge e beneficia os possuidores, aqueles que estiverem na posse usucapienda, salvo se já houver processo pendente.

 

Diversamente, os prazos para aquisição do usucapião constitucional (rural e urbano) introduzidos pela CF/88 (191 e 183) só começaram a fluir a partir da entrada em vigor na CF/88, pois foram modalidades de aquisição do domínio que não constavam no ordenamento ordinário.

 

(Usucapião especial urbano – Artigo 183 da Constituição Federal – Prazo – Termo a quo. O termo inicial da contagem do qüinqüênio para saber-se configurado, ou não, o usucapião previsto no artigo 183 da Constituição Federal coincide com a entrada em vigor desta última – Precedente: Recurso Extraordinário n.º 145.004, Primeira Turma, Rel. Min. Octavio Gallotti, Diário da Justiça de 13-12-96, p. 50.180).

 

Hoje, no que se refere à redução de prazo para modalidade de usucapião já existente no ordenamento jurídico a situação é análoga. Uma lei ordinária reduziu o prazo outrora fixado por outra lei ordinária, o que vale dizer que com o precedente sumulado pelo STF (445), os prazos reduzidos pelo novo Código Civil, a partir de 11-01-2003 serão aplicados às prescrições em curso, com exceção dos processos que estiverem pendentes de julgamento.

 

Para prevenir discussões e ressalvar direitos, é aconselhável que os interessados que se sentirem ameaçados com a nova lei ordinária civil, já comecem a tomar providências acauteladoras para defesa de seus interesses.

 

O art. 553 do atual Código Civil, embora com pequena mudança de redação foi reproduzido no art. 1.244 do CC 2002 e estabelece que “as causas que obstam, suspendem, ou interrompem a prescrição, também se aplicam ao usucapião (art. 619, parágrafo único), assim como ao possuidor se estende o disposto quanto ao devedor”.

 

As causas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição estão normadas nos artigos 168 a 176 do atual Código Civil (1916) e no CC 2002 estarão nos artigos 197 a 204 e, de uma maneira geral, são as mesmas. Assim, será possível interromper qualquer prazo prescricional interpondo protestos interruptivos de prescrição, notificações, interpelações, vistorias, ou outras quaisquer medidas processuais pertinentes para romper o liame da prescrição aquisitiva do possuidor, demonstrando oposição a ele, bem como protegendo o direito à propriedade que não será afetada por eventual alegação de prescrição extintiva.

 

Nunca é demais lembrar que o usucapião é a conjugação de duas prescrições simultâneas: uma extintiva contra o proprietário e outra aquisitiva em favor do possuidor; a interrupção de uma, descaracteriza o direito à aquisição do domínio e propriedade imóvel em favor de eventual possuidor.

 

Notas de Rodapé

 

i – DJU de 11-01-2002, p. 1

 

ii -Lei nº 3.071, de 01-01-1916

 

 

* Advogado e Professor. Website: http://www.almeidapaiva.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
PAIVA, J. A. Almeida. Legislação alterada. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-civil/legislacao-alterada/ Acesso em: 19 mar. 2024