Novo CPC

Comentários ao Novo CPC – Art. 16 a 19

 

Neste comentário examinaremos o capítulo referente à ação. Como há uma grande semelhança entre a redação atual e a redação proposta, resolvemos fazer um quadro sistemático.

 

Na coluna da direita está o CPC atual, com uma pequena inversão no que se refere ao artigo 6º, a fim de preservar a ordem natural dos artigos do projeto.

 

 

 

 

 

 

ATUAL CPC 

NOVO CPC 

CAPÍTULO II 

DA AÇÃO 

CAPÍTULO IV

  DA AÇÃO 

Art. 3o Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade. 

Art. 16. Para propor a ação é necessário ter interesse e legitimidade.

Art. 6o Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei. 

Art. 17. Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado por lei.

Art. 4o O interesse do autor pode limitar-se à declaração: 

I – da existência ou da inexistência de relação jurídica; 

II – da autenticidade ou falsidade de documento. 

Parágrafo único. É admissível a ação declaratória, ainda que tenha ocorrido a violação do direito. 

Art. 18. O interesse do autor pode limitar-se à declaração:

I – da existência ou da inexistência de relação jurídica;

II – da autenticidade ou da falsidade de documento.

Parágrafo único. É admissível a ação declaratória ainda que tenha ocorrido a violação do direito.

Art. 5o Se, no curso do processo, se tornar litigiosa relação jurídica de cuja existência ou inexistência depender o julgamento da lide, qualquer das partes poderá requerer que o juiz a declare por sentença. 

Art. 19. Se, no curso do processo, se tornar litigiosa relação jurídica de cuja existência ou inexistência depender o julgamento da lide, o juiz, assegurado o contraditório, a declarará por sentença, com força de coisa julgada

 

 

De se observar que o art. 16 do Projeto repete a redação do atual art. 3º, que menciona apenas interesse e legitimidade como requisitos para a propositura da ação.

 

Com efeito, muito se tem falado sobre a supressão da possibilidade jurídica do pedido do rol das chamadas condições para o regular exercício do direito de ação.

 

No atual CPC, no art. 267, inciso VI, a possibilidade está expressamente ressalvada.

 

Contudo, no Projeto, o art. 467, inciso VI, realmente exclui a possibilidade jurídica do pedido do elenco de hipóteses de sentença sem resolução de mérito.

 

O art. 17 mantém a regra da legitimação ordinária, colocando a extraordinária como exceção condicionada à autorização legal expressa.

 

Talvez seja uma das raras vezes em que o CPC adote o critério “ope legis” e não o “ope iudicis”.

 

Embora alguns autores apontem diferenças entre a legitimidade extraordinária e substituição processual (Alexandre Câmara, Lições de Direito Processual Civil, vol I, Lumen Juris), pensamos que não há muita relevância prática nesta distinção.

 

Por outro lado, forçoso reconhecer que há diversas espécies e subespécies de legitimidade, como a primária e secundária, originária e superveniente, privativa e concorrente, que terão grande aplicação prática, sobretudo, na tutela coletiva. Para maiores informações sobre os desdobramentos dessas modalidades, recomendamos vivamente um texto antigo, mas ainda hoje insuperável, de Barbosa Moreira (BARBOSA MOREIRA. José Carlos. Apontamentos para um estudo sistemático da legitimação extraordinária. Revista dos Tribunais, RT, vol. 404: São Paulo, junho/1969).

 

Resenhas deste trabalho podem ser encontradas em algumas dissertações de mestrado apresentadas na UERJ, sobretudo nos excelentes trabalhos apresentados por Edward Carlyle e Clarissa Guedes, ambos disponíveis na biblioteca da Faculdade de Direito.

 

O art. 18 do Projeto repete, palavra por palavra, a redação do atual art. 4º, acerca da explicitação do alcance do interesse em agir.

 

Por fim, o art. 19 apresenta uma novidade digna de registro, modificando a redação de seu correspondente, ou seja, o art. 5º do atual CPC.

 

Este art. 5º é complementado pelo art. 325, também do CPC vigente, e que trata da chamada “ação declaratória incidental”, que busca obter a declaração judicial acerca de uma questão prejudicial suscitada no curso dos autos.

 

Como é cediço, há dois grandes grupos de questões na teoria do processo: as prévias e a principal. Entre as prévias temos as preliminares e as prejudiciais.

 

Numa distinção muito rápida, podemos dizer que a questão preliminar é aquela que, se acolhida, impede o exame do mérito da causa, ou seja, da questão principal. A prejudicial, por seu turno, uma vez examinada, não impede, mas condiciona o exame do mérito.

 Em outras palavras, a questão prejudicial funciona como um antecedente lógico da principal. O juiz não tem como julgar esta sem primeiro examinar aquela.

 

Em muitos casos, as partes podem querer apenas que o juiz examine a prejudicial, mas não profira julgamento sobre ela.

 

Nessas hipóteses, será ela apreciada por ocasião da fundamentação, mas não integrará o dispositivo da sentença (art. 469 do atual CPC).

 

Caso uma das partes deseje que aquela prejudicial seja efetivamente decidida, deve solicitar isso ao juiz por meio da referida ação declaratória incidental. Aí, tal questão será parte do dispositivo da sentença, que é justamente a terceira e última parte da decisão que “transita em julgado”, na forma do art. 470.

 

De se observar, portanto, que no sistema atual, para que uma questão prejudicial possa transitar em julgado, é preciso que seja proposta a medida do art. 325.

 

Isso vale para a chamada questão prejudicial interna homogênea (interna porque surge no mesmo processo da principal e homogênea porque pertence ao mesmo ramo do direito).

 

Pela leitura do art. 19 do Projeto, e como já foi expressamente referido na Exposição de Motivos e nas Audiências Públicas com a Comissão, fica claro que a ação declaratória incidental será extirpada de nosso ordenamento.

 

É uma decorrência lógica de uma das premissas básicas do trabalho da Comissão: a simplificação e a deformalização do procedimento.

 

Como última observação, podemos dizer que pela redação deste art. 19 temos a impressão de que não haverá necessidade de pedido expresso da parte interessada para que o juiz tome a iniciativa de incluir a prejudicial no dispositivo da sentença.

 

Vejam que o verbo é usado no modo imperativo (o juiz declarará por sentença). Obviamente, deve respeitar o contraditório, mas não há indicativo de que deva se manter inerte e se omitir na sentença caso não haja requerimento da parte (requerimento este que assumirá a forma de simples petição, que ocasionará, no máximo um incidente processual, mas nunca uma nova demanda).

 

Esta interpretação se coaduna com os princípios da instrumentalidade e da efetividade da prestação jurisdicional e não parece ofender o princípio dispositivo. Não será o juiz o responsável por suscitar a questão prejudicial; mas uma vez que ela surgiu, que foi apresentada por uma ou ambas as partes, o juiz aproveita a relação processual já instaurada e julga aquela questão, evitando, assim, uma omissão que pode gerar insegurança jurídica, ou mesmo alimentar novas pretensões a serem postas em juízo.

 

 

*Humberto Dalla Bernardina de Pinho, Promotor de Justiça no RJ. Professor Adjunto de Direito Processual Civil na UERJ e na UNESA. Acesse: http://humbertodalla.blogspot.com

 

Como citar e referenciar este artigo:
PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Comentários ao Novo CPC – Art. 16 a 19. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/colunas/novo-cpc/comentarios-ao-novo-cpc-art-16-a-19/ Acesso em: 25 abr. 2024