Processo Civil

Os recursos cabíveis contra as sentenças parciais de mérito

Resumo: O presente artigo tem por objetivo discorrer acerca de qual recurso cabível para atacar a sentença parcial de mérito. Assim, discorreu-se sobre a possibilidade de aplicação dos recursos de agravo de instrumento, de apelação ou de apelação por instrumento. Falou-se na divergência entre doutrinadores e jurisprudência acerca de qual recurso aplicar para os casos de sentenças parciais de mérito. Concluiu-se sugestionando um artigo para dirimir o referido conflito.

Palavras-chave: Recursos. Apelação. Agravo de instrumento. Apelação por instrumento. Princípios da fungibilidade. Unicidade. Taxatividade.

Sumário: 1. Introdução. 2. Dos recursos cabíveis contra as sentenças parciais de mérito. 3. Conclusão. 4. Referências.

Abstract: This article aims to discuss about which appropriate resource for attacking the partial judgment on the merits. Thus spoke on the possibility of applying the resources of interlocutory appeal, appeal or appeal by instrument. Spoke up in disagreement between scholars and jurisprudence about which resource apply to cases of partial judgments of merit. It concluded by suggesting one article to resolve conflicts.

1. Introdução

 O presente artigo tem por finalidade discorrer acerca dos recursos cabíveis contra as sentenças parciais de mérito. Assim, iniciou-se o trabalho relatando sobre  o princípio da taxatividade que dispõe só poder haver um recurso para cada decisão. Ocorre que no caso em questão há doutrinadores e jurisprudência divergindo. Há aqueles que entendem que sentença é a decisão que põe fim ao processo e que , portanto, as sentenças parciais de mérito teriam que ser atacadas via agravo de instrumento, porque não colocam fim ao processo.

De outro lado, há aqueles que perfilham do entendimento que cabe apelação contra a sentença tendo o provimento posto fim à relação processual, ou não, já que o conceito de sentença alterou-se com a nova redação dada pela lei 11.332/2005.

Ainda, existem aqueles dizendo que as sentenças parciais de mérito devem ser atacadas por uma apelação por instrumento ,ou seja, a parte recorrente constituiria um instrumento para recorrer à instância superior de parte da decisão, permitindo-se o desenrolar do processo na primeira instância quanto ao pedido ainda não definitivamente julgado.

Ademais, relatou-se acerca do princípio da fungibilidade e da possibilidade de se ingressar tanto com agravo de instrumento, de apelação e de apelação por instrumento nesses casos e também dos requisitos para a aplicação do referido princípio.

Por fim, sugeriu-se um projeto de artigo de apelação por instrumento para atacar as sentenças parciais de mérito.

2. Dos recursos cabíveis contra as sentenças parciais de mérito.

A alteração no artigo 162, § 1º, do Código de Processo Civil, fez surgir problemática acerca da recorribilidade de cada decisão, visto que não há previsão legal acerca de qual recurso cabível contra as sentenças parciais de mérito.

Nesse sentido, é importante salientar a relevância do princípio da taxatividade no ordenamento processual civil vigente.

(DIDIER JR E DA CUNHA, 2007, p.46) conceituam o princípio da taxatividade:

O princípio da taxatividade “Consiste na exigência de que a enumeração dos recursos seja taxativamente prevista em lei. O rol legal dos recursos é numerus clausus. É o princípio segundo o qual o recurso é somente aquele previsto em lei, não se podendo criar recurso por interpretação analógica ou extensiva, nem por norma estadual ou regimental”.

Acerca do referido princípio, o STF também já se manifestou:

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. RECURSO. NÃO CABIMENTO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. EXTEMPORANEIDADE. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. NÃO APLICAÇÃO. 1. Este Supremo Tribunal Federal não pode conhecer e julgar pedido de habeas corpus cuja causa de pedir ainda não tenha sido objeto de apreciação pelas Cortes ordinárias e pelo STJ, sob pena de supressão de instância, em afronta às normas constitucionais de competência. 2. O denominado “Recurso ao Pleno”, interposto contra acórdão proferido pela 2ª Turma desta Corte, não foi admitido em razão da manifesta falta de previsão legal, da extemporaneidade e da ausência de substrato jurídico. 3. A aplicação do princípio da fungibilidade se restringe aos casos de dúvida fundada acerca do recurso cabível. Assim, não há, no presente caso, como prestigiá-lo quando se deduz espécie recursal imprópria e impertinente em substituição àquela expressamente indicada (AI-AgR n° 134.518-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 1ª Turma, DJ 28.05.1993). 4. É uníssono o entendimento desta Corte no sentido de que a interposição de recursos somente é cabível após a publicação, no Diário da Justiça, da decisão contra a qual se recorre. E, na hipótese de o protocolo das razões recursais realizar-se antes da veiculação do ato judicial a ser impugnado, a parte deve, após a divulgação no órgão oficial, ratificá-las. Precedentes. 5. Agravo regimental improvido. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal.  Habeas Corpus 92173, Segunda Turma, Relator:Min. Helen Gracie,  julgado em 10/03/2009.

Ocorre que quanto às sentenças parciais de mérito, embora sendo uma realidade no nosso ordenamento jurídico, o legislador ainda não denominou qual o recurso atacável contra elas, fazendo surgir polêmica a respeito do assunto.

Assim, há autores, como Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart que entendem somente poder ser considerada sentença as decisões definitivas, sendo elas de mérito ou terminativas. Por consequência, o que não estiver enquadrado nesse conceito, será considerado decisão interlocutória atacável por agravo de instrumento.

Nesse sentido,( MARINONI E ARENHART, 2007, p.524-525) lecionam que:

A apelação é o primeiro, e mais genérico recurso previsto pelo Código de Processo Civil. Trata-se do recurso padrão, no sentido de que sua disciplina aplica-se, no que for cabível, também aos demais recursos.

Esse recurso tem cabimento, como preceitua o art. 513 do CPC, sempre que se tiver interesse em impugnar uma sentença proferida em qualquer espécie de procedimento ou processo- seja de jurisdição voluntária ou contenciosa – pode ser objeto de recurso de apelação, desde que a decisão judicial possa enquadrar-se na definição dada pelo art. 162, § 1º, do CPC. Note-se que sentença será apenas a decisão que possa, virtualmente (e desde que ausente o prolongamento do procedimento decorrente da interposição do recurso), pôr fim ao processo em primeiro grau.  Não é, por isso, sentença, e não pode ser atacado pela apelação, o ato que extingue ação, sem, todavia, dar fim ao processo, como é o caso da decisão que julga, incidentalmente, a ação declaratória incidental, ou daquela que rejeita um dos pedidos cumulados na petição inicial. Na realidade, qualquer decisão que não ponha fim ao processo não pode ser chamada de sentença, ainda que tal decisão possa apreciar o direito objeto do processo.

Outrossim, há exceções à previsão genérica, contida no art. 513. Há verdadeiras sentenças que não se submetem ao regime da apelação, pois, segundo alguma lei especial, prevê-se recurso específico para elas. Pode-se mencionar, exemplificativamente, a sentença proferida em execução  fiscal de menos de 50 OTNs, da qual cabem embargos infringentes( art.34 da Lei 6830/80) o recurso inominado previsto contra sentenças proferidas nos Juizados Especiais ( arts. 41 e SS.da Lei 9099/95); e o recurso  ordinário constitucional, cabível contra sentenças ( acórdãos, na maioria  dos casos, exceto a hipótese do art. 105, II, C, da CF, em que  ele será  cabível efetivamente contra sentença de primeiro grau) previstas em situações especiais pela Constituição Federal. ( art. 105, II).

De outro lado, há parte da doutrina e jurisprudência entendendo que com o novo conceito de sentença está-se a dizer caber apelação da sentença definitiva, pois essa é qualquer situação definida “o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts.267 e 269” do Código de Processo  Civil.

Compartilham desse posicionamento:

(BATISTA, 2008, p.330) relata:

Podemos, agora, depois que a instituição como processo de conhecimento não mais existe em nosso sistema, tratar aqui das sentenças que além de “descobrir e formular“ a regra legal aplicável ao caso concreto, desde logo a imponha, na mesma relação jurídica processual de modo a “tornar efetivo o conteúdo daquela regra que o juiz restabelecera como disciplinadora do caso concreto”, que poderão estar na mesma relação processual de que  haja nascido a sentença segundo o art. 475- I.

No sistema do Código de Processo Civil, denomina-se apelação o recurso cabível contra as sentenças, assim consideradas os provimentos  jurisdicionais  definidos pelo art.162, § 1 º. Tenha o provimento posto fim à relação processual, ou não, se ele enquadrar-se em uma das hipóteses indicadas pelos arts. 267 ou 269, o recurso cabível será o de apelação (art.513).

Nem sempre foi assim em nosso direito.

No regime do Código de Processo Civil de 1939 a apelação passou a ser recurso cabível apenas contra as sentenças definitivas (art.820) sendo impugnáveis por agravo de petição todas as decisões que implicassem a terminação do processo sem resolver o mérito da causa (art.846).

 SANTOS (2009, p.110-111), que dispõe:

No sistema do Código de Processo Civil, conforme dispõe o art. 513 “da  sentença  caberá apelação” ( arts. 267 e 269). A referência no dispositivo transcrito dos arts. 267 e 269 está a dizer caber apelação da sentença definitiva como “o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts.267 e 269 desta lei. (Código de Processo Civil, art. 162,§1º). É a apelação, assim, o recesso destinado à impugnação das sentenças que  extinguem o processo com resolução de mérito (  Código de Processo Civil, art.269) ou  que extinguem sem resolução de mérito ( Código de Processo Civil, art. 267). Por outras palavras, a apelação é o recurso cabível contra sentenças finais, sejam definitivas, sejam  terminativas.

Tratando-se de ato de juiz do primeiro grau, que ponha termo ao processo, caberá apelação, seja proferido em processo de conhecimento, de execução ou cautelar ( ver  1º – Vol, nº 220); em processo de conhecimento ordinário ou sumário ( ver  2º vol, nº 374); em processo  de jurisdição  contenciosa ou de jurisdição voluntária ( Código de Processo Civil, art.1.110, ver 1º – Vol, nr.52-55); em processo principal ou incidente.

(…) Cabe apelação da sentença no processo incidente, não das decisões incidentes em qualquer processo (…).

Outrossim, necessário falar sobre o princípio da unicidade, pois reza esse que não é possível a utilização simultânea de dois recursos contra a mesma decisão. Sendo assim, diante de tamanha controvérsia, será que não se está infringindo tal princípio?

(DIDIER JR,2007, p.45):

De acordo com o princípio da unicidade, (…) “não é possível a utilização simultânea de dois recursos contra a mesma decisão; para cada caso, há um recurso adequado e somente um. Ressalvadas as exceções adiante mencionadas, a interposição de mais de um recurso contra uma decisão implica inadmissibilidade do recurso interposto por último. Trata-se de princípio implícito no sistema recursal brasileiro- no CPC/39, estava previsto no art. 809”.

Em contrapartida, será que pela aplicação do princípio de fungibilidade recursal também aplicável no ordenamento jurídico brasileiro não seria possível admitir-se nos casos de aplicação de sentenças parciais de mérito os recursos de apelação ou de agravo de instrumento?

Quanto ao princípio da fungibilidade, merece salientar, o pensamento de (DIDIER JR, 2007, p.44):

           

O princípio da fungibilidade dos recursos “é aquele pelo qual se permite a conversão de um recurso em outro, no caso de equívoco da parte, desde que não houvesse erro grosseiro ou não tenha precluído o prazo para a interposição. Trata-se de aplicação específica do princípio da instrumentalidade das formas.

O CPC/39 continha regra expressa neste sentido (art.810).

Á luz das diretrizes que informam o CPC, sobretudo em matéria de nulidades dos atos processuais, a despeito da inexistência de regra expressa, deve entender-se aplicável tal princípio.

Atualmente, trazem os doutrinadores os seguintes pressupostos para a aplicação do princípio da fungibilidade: a) “Dúvida objetiva”: não obstante a expressão um pouco equívoca, pois dúvida é sempre subjetiva, significa que é necessário existir uma dúvida razoavelmente aceita, a partir de elementos objetivos, como a equivocidade de texto da lei (sentença incidente do art.325 do CPC; art.17 da Lei de Assistência Judiciária) ou as divergências doutrinárias (indeferimento liminar de reconvenção, p.ex); b) Inexistência de erro grosseiro: fala-se em erro grosseiro quando nada  justificaria a troca de um recurso pelo outro, pois  não há qualquer controvérsia  sobre o tema ( ou seja, não será  grosseiro o erro quando houver dúvida  razoável sobre o cabimento do recurso;c) Observância do prazo: o recurso  interposto há que respeitar o prazo daquele que deveria ter sido – não se reputa  correta a exigência deste pressuposto, pois as situações  de dúvida podem envolver recursos com prazos diferentes ( agravo de instrumento e apelação, por exemplo) quando, então, o respeito ao prazo seria imposição que esvaziaria a utilidade do princípio”.

Frisa-se, ainda, o que dispõem ( MARINONI E ARENHART,2005,P.513-514) acerca do mesmo princípio:

Se, como visto, somente deve ser cabível um único recurso contra cada espécie de decisão judicial, a escolha desse meio recursal assume importância ímpar. A utilização do recurso equivocado, em princípio, não deve ser admissível, sob pena de violar-se a taxatividade enumerada em lei, o princípio da unirrecorribilidade e, ainda, as regras específicas que disciplinam os recursos.

Na normalidade dos casos, o erro na interposição do recurso adequado acarretará seu não- conhecimento, tendo em conta seu não cabimento. Porém, situações podem ocorrer em que não se tenha “certeza” sobre qual o recurso é adequado para enfrentar certo ato judicial. Muito embora tenha o Código de Processo Civil de 1973 buscado superar a disciplina dos recursos, fornecida pela lei anterior, deixando claras as figuras recursais e seu cabimento – esclarecendo a finalidade de cada uma e definindo adequadamente as espécies de atos judiciais (sentença, decisão interlocutória e despacho) e seus correspondentes recursos- algumas dúvidas ainda existem, e para tais casos, diante da impossibilidade de se criar um sistema absolutamente seguro, não há como operar com rigidez.

 O princípio da fungibilidade presta-se, exatamente, para não prejudicar a parte que, diante de dúvida objetiva, interpõe recurso que pode não ser considerado cabível. Nesses casos, autoriza-se que o recurso incorretamente interposto seja tomado como o adequado, sob determinadas circunstâncias. O Código de Processo Civil de 1939 era expresso em admitir esse princípio – especialmente diante da maneira assistemática com que tratava o tema dos recursos- prevendo, em seu art.810, que “salvo hipótese de má-fé ou erro grosseiro, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso por outro, devendo os autos ser enviados à Câmara, ou Turma, a que compete o julgamento”.  O Código de Processo Civil atual não prevê regra semelhante; todavia, tem-se como decorrente do sistema, em especial dos princípios que o informam, razão pela qual ainda deve ser admitido o uso do princípio da fungibilidade.

A fim de que possa ter aplicação o princípio da fungibilidade, é necessária a reunião de alguns critérios, tendentes a, na linha do que previa o art. 810 da lei revogada, demonstrar a ausência de má-fé e de erro grosseiro. Nesse sentido é que se exige, para o conhecimento do recurso equivocado pelo correto:

I- Presença de dúvida objetiva a respeito do recurso cabível. A legitimação do princípio da fungibilidade reside, precisamente, ao aproveitamento do ato processual praticado, ainda que equivocadamente e fora dos critérios legais, em situações em que seria excessivo exigir o acerto em sua forma específica. A fungibilidade não se destina a legitimar o equívoco crasso, ou para chancelar o profissional inábil; serve, isto sim, para salvar o ato que, diante das circusntâncias do caso concreto, decorreu de dúvida objetiva.

 (…) Deseja-se dizer, com isto, que a dúvida não pode ter origem na insegurança pessoal do profissional que deve interpor o recurso ou mesmo sua falta de preparo intelectual, mas sim no próprio sistema recursal. Essa dúvida pode derivar: i) da lei processual, que denomina sentenças por decisões interlocutórias ou vice-versa, induzindo a parte a errar na escolha do recurso idôneo; ii) da discussão  doutrinária ou jurisprudencial a respeito da natureza  jurídica de certo ato processual, como acontece com a  decisão que, antes da sentença final da causa principal, decide a ação declaratória incidental; e iii)  do fato de ser  proferido  um ato judicial por outro, chamando-se ( e dando-se  forma) de sentença  a uma decisão interlocutória ou vice-versa.

Em todas as hipóteses, tem-se que o interessado é levado a cometer o equívoco, ficando demonstrada a ausência de má-fé, na interposição do recurso equivocado.

II- Inexistência de erro grosseiro na interposição do recurso. Outro dos pressupostos para a utilização do princípio da fungibilidade é a ausência de erro grosseiro na interposição do recurso.  Não se pode aplicar o princípio em exame quando o recurso interposto evidentemente não tiver cabimento. Assim, embora em certas circunstâncias seja possível admitir a dúvida objetiva entre algumas espécies recursais ( como o agravo e a apelação), não se pode  admitir  a incidência  da fungibilidade, se o interessado se vale de recurso completamente incabível na espécie, como seria o caso de algum recurso constitucional.

(…)

III- Prazo adequado para o recurso correto. Por fim, exige a jurisprudência nacional que o prazo m que foi interposto o recurso seja o correto para a interposição do recurso adequado. É dizer que, por hipótese, se o recurso adequado no caso tinha prazo de dez dias para interposição, o recurso erroneamente oferecido somente poderá ser conhecido, por meio da aplicação do princípio da fungibilidade, se for oferecido também no prazo de dez dias.

Assim já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

Processual civil. Não há nos autos petição de recurso extraordinário. Princípio da fungibilidade recursal. Inaplicabilidade. Erro grosseiro. Agravo improvido. I – é inaplicável o princípio da fungibilidade recursal ante a clara existência de erro grosseiro. Ii – agravo regimental improvido. BRASIL. Supremo Tribunal Federal.  Agravo de Intrumento 688447, Primeira Turma, Relator: Ricardo Lewandowski, julgado em 12/08/2008.

Resta demonstrado, então, que é possível a utilização desse princípio no direito processual civil vigente.

Ademais, podemos ainda depreender pela análise do Projeto de Lei 4076/08, que o legislador quer restabelecer o instituto da fungibilidade recursal no direito processual civil vigente, como era previsto no Código de Processo Civil de 1939, dispondo que, em caso de erro na apresentação de recurso judicial ficará garantido o julgamento do recurso que o autor pretendia apresentar, observados os prazos legais.

Além da possibilidade de aplicação dos dois recursos acima citados, com a utilização do princípio da fungibilidade, há construção no ordenamento jurídico no sentido de que, nesses casos, o recurso a ser aplicado seria o de “apelação por instrumento”, ou seja, a parte recorrente constituiria um instrumento para recorrer à instância superior de parte da decisão, permitindo-se o desenrolar do processo na primeira instância quanto ao pedido ainda não definitivamente julgado. Tudo isso se  daria nos mesmos moldes do atual agravo de instrumento, com simples comunicação e juntada do acórdão nos autos principais.

 Observa-se, com isso, que não se estaria dando tratamento diferenciado para atos da mesma espécie, em correspondência ao princípio da unicidade recursal.

Outrossim, o grande problema no reconhecimento desse recurso seria o que toca o princípio da independência dos poderes, visto que se aplicando a “apelação por instrumento”, poder-se-ia entender que o poder judiciário está interferindo na competência primordial do poder legislativo, qual seja, a de inovar o ordenamento jurídico.

De outro lado, talvez fosse melhor admitir-se a aplicação do já citado recurso, entendendo que esse seria somente uma interposição do recurso tradicional de apelação e não uma inovação pelo poder judiciário, resolvendo a problemática e dando maior segurança jurídica às partes que não ficariam à mercê do reconhecimento pelo juiz de qualquer dos recursos, ou de um deles, ou de ambos pela aplicação do princípio da fungibilidade.

Ademais, diante de tamanha celeuma poderia o legislador atento às inovações no poder judiciário resolver a problemática, editando novo dispositivo que sugestiono fosse, nesse sentido:

Art. Das decisões parciais de mérito caberá apelação por instrumento, no prazo de 15 (quinze) dias.

Art. A apelação por instrumento será instruída:

I-             Com cópias da decisão recorrida, da certidão da respectiva intimação e das procurações outorgadas aos advogados das partes.

II-            Facultativamente, com outras peças que o apelante entender úteis.

 § 1º: A apelação por instrumento será dirigida ao juiz, que verificando a constituição do instrumento com as peças necessárias, mandará dar vista ao apelado para responder no prazo de 15 (quinze) dias.

Art. Apresentada a resposta, deverá o juiz remeter o instrumento ao Tribunal de Justiça e prosseguir no andamento do feito quanto à questão não definitivamente julgada.

Art. A apelação por instrumento será recebida em ambos os efeitos.

Pelo acima exposto, vê-se que a adoção da “apelação por instrumento” seria uma alternativa viável para que tenhamos maior segurança jurídica quanto ao tema.

3. Conclusão:

Enfim, pelo acima exposto, conclui-se que é ainda de grande polêmica o tema do recursos atacáveis contra as sentenças parciais de mérito, uma vez que não há hipótese taxativa prevista em lei de recurso contra essas.

Assim, merece a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, atendendo aos requisitos exarados na jurisprudência, enquanto não houver hipótese previsível de lei para o ataque dessas decisões.

Ademais, refere-se ser necessário que o legislador ponha fim as controvérsias fazendo artigos que disponham sobre os referidos recursos, como se sugestionou no presente ensaio jurídico. Desse modo, haverá uma maior segurança jurídica nessas decisões.

4. Referências:

BRASIL. Supremo Tribunal Federal.  Habeas Corpus 92173, Segunda Turma, Relator:Min. Helen Gracie,  julgado em 10/03/2009.

_____ Supremo Tribunal Federal.  Agravo de Intrumento 688447, Primeira Turma, Relator: Ricardo Lewandowski, julgado em 12/08/2008.

DIDIER JR, Fredie e DA CUNHA, Leonardo José Carneiro. Curso de Direito Processual Civil. 4 ª Ed. Salvador: Edições Podivm, 2007.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz.Manual do Processo de Conhecimento. 4ª E.d., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005 p.2v.

_____. Curso de Processo Civil. 6ª E.d., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, 2 v.

SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 23ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva 2009, 3 v.

SILVA, Ovídio A. Batista. Curso de Processo Civil. 8ª E.d., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008, 330 p.1 v.

Como citar e referenciar este artigo:
MOREIRA, Carine Brum da Costa; MOREIRA, Henrique Giusti; NOBRE, Ana Luiza de Lemos; ROLIM, Taiane da Cruz. Os recursos cabíveis contra as sentenças parciais de mérito. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2014. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/os-recursos-cabiveis-contra-as-sentencas-parciais-de-merito/ Acesso em: 29 mar. 2024