Direito Previdenciário

Aposentadoria Especial no Contexto da Seguridade Social

 

RESUMO: Desde a edição da Lei Orgânica da Previdência Social, Lei n° 3.807/60 busca-se dar tratamento adequado à aposentadoria do trabalhador que exerce atividade que o exponha a riscos. Com muita sabedoria a Constituição Federal de 1988 tratou mais detalhadamente da previdência social. A razão é exercer a justiça social a fim de que se possa atingir o objetivo constitucional primordial: a igualdade entre os cidadãos.  Dentro deste contexto a previdência social emerge de um conjunto de ações constitucionais protetivas ao cidadão.  Objetiva principalmente prover condições ao trabalhador, quando este perde sua capacidade laborativa. É um seguro social para aquele que contribui.  A aposentadoria especial é uma das várias formas de percepção de aposentadoria, sendo destinada aos trabalhadores que laboraram por tempo fixado em lei, expostos a agentes nocivos e condições prejudiciais à integridade física do trabalhador.

Palavras chave: Justiça social. Igualdade. Aposentadoria especial.

 

RÉSUMÉ: Depuis l’édition de la Loi Organique de la Sécurité Sociale, Loi n° 3.807/60, on cherche à donner un traitement adéquat à la retraite de travailleurs engagés  dans une activité qui lui expose à des risques. La Constitution Féderale de 1988 à traité avec intelligence et précision les textes inhérents, à la sécurité sociale. La raison est à rechercher la justice sociale afin que on puisse atteindre l’objectif constitutionnel primaire: l’égalité entre les citoyens. Dans ce contexte émerge le bien-être d’un ensemble de mesures de protection constitutionnelle aux citoyens. Vise principalement à fournir des conditions pour le travailleur, quand il perd sa capacité de travail. Il s’agit d’une assurance sociale pour ceux qui contribuent. La retraite spéciale est l’une des formes de la perception de la retraite, et pour les employés qui ont travaillé pour le temps fixé par la loi, exposés à des agents nocifs et dangereux pour les conditions physiques du travailleur

Mots clé: Justice sociale. L’égalité. Retraite spéciale.

 

SUMÁRIO : 1. INTRODUÇÃO. 2. DA SEGURIDADE SOCIAL. 2.1. Da saúde. 2.2. Da assistência social.  2.3. Da previdência social. 2.3.1. Aposentadoria especial. a. Conceito. b. Beneficiários. c. Requisitos. c.1.

Periculosidade e penosidade. c.2. Insalubridade. d. Data de início. e. Renda mensal. f. Conversão de tempo de trabalho especial em especial. g.Conversão de tempo de trabalho especial em comum. 3.CONCLUSÃO. 4. REFERÊNCIAS. 5. BIBLIOGRAFIA.

 

 

1.       INTRODUÇÃO

 

Primeiramente se faz necessária uma ligeira abordagem da questão da seguridade social, dado que a previdência social constitui-se num dos componentes da seguridade social. Conforme consta na Constituição Federal, a Ordem Social veio tratada no Título VIII, que se estende do Capítulo I ao VIII, sendo que para este estudo se restringirá ao Capítulo II, que trata da Seguridade Social.

 

A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social (art. 194, caput, da Constituição Federal). Conclui–se portanto, que a seguridade social é composta de três braços, dos quais a previdência social é um deles.

 

Ainda com referência à seguridade social esta se reveste de caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados (art. 194, VII, CF/88). O conjunto da seguridade social é composto pela saúde, pela assistência social e pela previdência social.

 

 

2.      DA SEGURIDADE SOCIAL

 

2.1                Da Saúde

 

É o ponto abordado na Seção II.  Conceitua-se saúde como o direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (art. 196, CF/88).

 

Como regra, a União estabelece as políticas gerais, assim como a assistência à saúde pode ser franqueada à iniciativa privada, sendo vedada a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros na assistência à saúde, salvo nos casos previstos em lei. Do sistema de saúde participam, de forma ordenada, todos os entes federativos.

 

 

2.2               Da assistência social

A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social. Conceituando podemos dizer que a

Assistência Social é um conjunto de princípios, de regras e de instituições destinado a estabelecer uma política social aos hipossuficientes, por meio de atividades particulares e estatais, visando à concessão de pequenos benefícios e serviços, independentemente de contribuição por parte do próprio interessado[1].

De sua própria expressão resta evidente não haver uma contribuição específica, nem prévia filiação ao sistema. Não há exigência de contrapartida. É um vasto campo de atuação, que vai da proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice, passando pela promoção da integração ao mercado de trabalho, habilitação e reabilitação de pessoas portadoras de deficiências, assim como o pagamento de uma renda mensal vitalícia às pessoas portadoras de deficiência ou idosos.

2.3               Da previdência social

 

De acordo com o Dicionário Houaiss, previdência é a qualidade daquele que é previdente (que se previne, toma medidas antecipadas para evitar transtornos; precavido).

 

Pode-se conceituá-la como

 

Conjunto de princípios , de normas e de instituições destinado a estabelecer um sistema de proteção social, mediante contribuição, que tem por objetivo proporcionar meios indispensáveis de subsistência ao segurado e a sua família, quando ocorrer certa contingência prevista em lei [2].

 

O art. 201 da Constituição Federal, cuja redação original foi alterada pela Emenda Constitucional n. 20/98, passou a ser como segue:

 

Art. 201 – A previdência social será organizada sob s forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei[3].

 

De acordo com Fabio Zambitte Ibrahim, o sistema brasileiro compreende os regimes básicos (compulsórios) e os regimes complementares (facultativos). Os regimes básicos são o Regime Geral de Previdência Social e os Regimes Próprios de Previdência Social. Aquele está regido pela Lei n. 8.213/91, regulamentada pelo Decreto n. 3.048/99. Os regimes próprios são relativos aos servidores efetivos da União, Estados, Distrito federal e Municípios que o possuam. Os regimes complementares não excluem o regime básico e são facultativos[4]

 

No Plano de Benefícios da Previdência Social de que trata a Lei n. 8.213/91, regulamentada pelo Decreto n. 3.048/99, uma das principais prestações é a aposentadoria, que poderá ser por invalidez, devida ao segurado considerado incapaz, sem possibilidade de reabilitação; por tempo de contribuição, conforme o nome diz aos 35 anos de contribuição para o homem e 30 para a mulher; por idade, para os homens com 65 anos e aos 60 para as mulheres; e aposentadoria especial.

 

 

2.3.1          Aposentadoria especial

 

a)     Conceito e especificidades

 

Aposentadoria especial é o benefício decorrente do trabalho realizado em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado, de acordo com o previsto em lei[5]. O art. 201, § 1° da Constituição Federal trata da questão das aposentadorias especiais, cuja nova redação foi dada pela Emenda Constitucional n. 47/2005:

 

Art.201 (…)

 

§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.  

 

Convém ponderar que a nova redação pretende esclarecer que o princípio da igualdade é prevalente na previdência social, considerando que ela é organizada sob a forma de regime geral, no qual deve haver universalidade de cobertura e atendimento, bem como uniformidade e equivalência dos benefícios e dos serviços às populações urbanas e rurais[6].

 

Nesse sentido, mostra-se evidente a necessidade de lei complementar para regular a problemática. Enquanto essa não é editada socorre-se dos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91e art. 64 a 70 do Decreto n. 3.048/99, naquilo que não conflitar com a Constituição Federal.

 

Com muita propriedade, Ibrahim pondera que a aposentadoria especial, ao contrário do que possa parecer, é um dos mais complexos benefícios previdenciários[7]. Isto se dá em decorrência das muitas alterações legislativas, algumas derrubadas pelo Judiciário.

 

Este tipo de aposentadoria ocorre quando o beneficiário houver trabalhado em atividades sujeitas a condições especiais que prejudiquem sua saúde e integridade física, como nas atividades insalubres, penosas e periculosas. Conforme o caso, o período de trabalho poderá ser de 15, 20 ou 25 anos. São determinadas em lei, as condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador e este, via de consequência, deverá fazer prova de trabalho.

 

Há divergências quanto a sua natureza jurídica. Para alguns é considerada como uma aposentadoria por tempo de contribuição, qualificada em razão da nocividade da atividade desenvolvida. Outros a compreendem como uma aposentadoria por invalidez antecipada, já que o beneficiário se aposenta antes de ser atingido pelos males dos agentes nocivos a que está exposto. Uma terceira corrente a considera como uma nova espécie de aposentadoria. Corrobora este entendimento, partilhando da terceira corrente, Fábio Zambitte Ibrahim[8]

 

Ao final do governo de Juscelino Kubitschek foi assinada a Lei Orgânica da Previdência Social, Lei n. 3.807/60, que estabeleceu pela primeira vez a aposentadoria especial. No entanto, essa lei exigia um limite mínimo de idade, equivalente a 50 (cinqüenta) anos, além do trabalho em exposição a agentes nocivos. Através da Lei n. 5.440-A/68, ocorreu a supressão do quesito idade. Com o advento da Lei n. 5.890/73, o requisito passou a ser determinado pelo art. 9:

 

Art. 9º – A aposentadoria especial será concedida ao segurado que, contando no mínimo 5 (cinco) anos de contribuição, tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos pelo menos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, forem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.

§ 1º – A aposentadoria especial consistirá numa renda mensal, calculada na forma do § 1º do artigo 6º, desta Lei, aplicando-se-lhe ainda o disposto no § 3º, do artigo 10[9].

 

Com o advento da Lei n. 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social também não ocorreram mudanças significativas. Como já dito anteriormente a questão está albergada, na Secção IV, Da Aposentadoria Especial, nos artigos 57 e 58.

 

Os termos de ambos os artigos estão conforme a redação dada pelas leis n. 9.032/95 e 9.732/98. Em especial aquela, impôs um novo regramento à questão das aposentadorias especiais, eliminando algumas aberrações anteriormente existentes. Até então, muitas categorias profissionais acabavam por legitimar aposentadorias ditas especiais a trabalhadores que jamais se expuseram a agentes nocivos, por uma interpretação errônea: bastava ao empregado pertencer à determinada categoria. Atualmente a categoria não é mais importante. O trabalhador deverá comprovar o efetivo serviço em exposição aos agentes nocivos, conforme determinado em lei.

 

Outra peculiaridade é o fato de não haver diferenciação entre homens e mulheres. Ambos devem provar o tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, sujeito aos agentes nocivos.

 

A comprovação será feita mediante formulário específico estabelecido pelo INSS, com base em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, que será emitido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, tudo de acordo com a legislação trabalhista.

 

 

b)     Beneficiários

 

O artigo 57, caput, da Lei nº 8.213/91 dispõe que em sendo devidamente cumprido o tempo de carência exigido, o segurado que tiver laborado em condições especiais, terá direito ao recebimento da aposentadoria especial.

 

No mesmo diapasão, é de suma importância transcrever os ensinamentos de Sérgio Pinto Martins:

 

É devida a aposentadoria especial ao segurado (art. 57 da Lei nº 8.213). A lei não distingue que espécie de segurado é que terá direito à referida aposentadoria, o que importa dizer que pode ser qualquer um deles. A condição fundamental é o trabalho comprovado em atividade que coloque em risco a saúde e a integridade física do segurado.

O segurado contribuinte individual não faz jus à aposentadoria especial, pois não trabalha em atividade que lhe prejudique a saúde e é livre para fazer o horário que desejar.

Não se aplica a aposentadoria especial a segurados facultativo, doméstico e eclesiástico, pois não exercem atividade que lhes prejudique a saúde.

As disposições legais sobre a aposentadoria especial do segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social aplicam-se, também, ao cooperado filiado à cooperativa de trabalho e de produção que trabalha sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física (art. 1º da Lei nº 10.666).

O segurado cooperado passa a ter direito a aposentadoria especial, até diante do fato de que há custeio específico para esse fim.[10]

 

Ainda nesse sentido, postam-se Wagner Balera e Cristiane Miziare, ipsis litteris:

 

Critério pessoal:

Sujeito ativo: segurado empregado, trabalhador avulso e con-

tribuinte individual, este somente quando cooperado filiado à cooperativa de trabalho ou de produção.

Sujeito passivo: INSS.[11]

 

No que diz respeito aos contribuintes individuais não cooperados e sua exclusão do rol de beneficiários da aposentadoria especial, Fábio Zambitte Ibrahim afirma que:

 

Seria flagrante violação à isonomia e à Lei nº 8.213/91 não estender esta prestação a outros contribuintes individuais que, devido a sua profissão, tenham necessariamente que se expor a agentes nocivos. Acredito que tudo dependerá do caso concreto, cabendo a extensão se provada a nocividade inerente à atividade desenvolvida, de modo permanente.[12]

 

O entendimento esposado pelo ilustre doutrinador supracitado é compatível com o que se extrai da idéia de justiça, por não ser razoável a concessão de privilégios exclusivamente a alguns, embora estes se encontrem na mesma situação fática de outros não privilegiados.

 

 

c)      Requisitos

 

Para que o segurado faça jus ao recebimento da aposentadoria especial, precisará fazer prova de que exerce sua atividade de forma permanente, com exposição direta a agentes que causem dano à saúde. Nesse sentido, utiliza-se, novamente, dos ensinamentos de Wagner Balera e Cristiane Miziara Mussi:

 

1. a concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, exercido em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo de 15, 20 ou 25 anos.

2.   o segurado deverá comprovar a efetiva exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício.[13]

 

Ainda no mesmo diapasão, assevera o eminente doutrinador Fábio Zambitte Ibrahim:

 

O segurado deverá comprovar a efetiva exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou à associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício.[14]

 

Saliente-se, por oportuno, que o artigo 65 do Decreto nº 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social) traz o significado de trabalho permanente, aduzindo ser aquele

 

(…) exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.[15]

 

Vale destacar, outrossim, que “quanto maior a concentração do agente nocivo, menor o tempo necessário de exposição, e vice-versa” [16].

 

Fábio Zambitte Ibrahim ensina que de acordo com o Instituto Nacional da Seguridade Social – INSS, agentes nocivos são definidos da seguinte forma:

 

I – físicos – os ruídos, as vibrações, o calor, as pressões anormais, as radiações ionizantes etc.;

II – químicos – os manifestados por névoas, neblinas, poeiras, fumos, gases, vapores de substâncias nocivas presentes no ambiente de trabalho, absorvidos pela via respiratória, bem como aqueles que forem passíveis de absorção por meio de outras vias;

III – biológicos – os micro-organismos como bactérias, fungos, parasitas, bacilos, vírus etc.[17]

 

O segurado conseguirá provar que a atividade exercida por ele, de forma permanente, enquadra-se nas condições exigidas para o recebimento da aposentadoria especial – trabalho com exposição aos agentes nocivos retro mencionados -, por intermédio de um documento denominado “perfil profissiográfico previdenciário”, o qual será elaborado pelo responsável da empresa onde labora “com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.” [18]

 

Nesse diapasão, deve ser salientado que a exposição ocasional aos agentes nocivos, ou seja, aquela que chega a ser comprovadamente aceitável, e mais, a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI’s), impedem a concessão da benesse.

 

 

Nada mais acertado, tendo em vista que a não ocorrência do fenômeno que assegura o recebimento da aposentadoria especial, qual seja, exposição efetiva a agentes causadores de danos à saúde do trabalhador, deve sim obstar sua outorga.

 

Passa-se, agora, à análise dos requisitos específicos, em outras palavras, ínsitos à atividade exercida, que devem ser comprovados para que o operário receba a aposentadoria em sua forma especial.

 

 

c.1. Periculosidade e penosidade

 

 A menção a atividades perigosas, penosas ou insalubres foi excluída do texto do artigo 57, § 4º, da Lei nº 8.213/91, o qual prevê tão-somente o exercício do trabalho mediante exposição às agentes nocivos. Aquelas, porém, deverão ser consideradas para verificação da possibilidade de concessão da benesse pleiteada pelo segurado.

 

Nos dizeres do escritor jurídico Sérgio Pinto Martins, o ambiente laboral eivado de periculosidade é aquele que submete o trabalhador à prestação de “serviços em contato permanente com elementos inflamáveis ou explosivos. O contato permanente tem sido entendido como diário.” [19]

 

O mesmo doutrinador afirma, ainda, que atividades perigosas são “aquelas que, por sua natureza ou método de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado.” [20]

 

A penosidade, por sua vez, mostra-se configurada “quando o trabalho é desgastante, tanto física como mentalmente.” [21]

 

Consoante o escólio de Fábio Zambitte Ibrahim, para efeitos de aposentadoria especial o Estado teria se posicionado no sentido de que o trabalho em condições perigosas ou penosas não permite a concessão da benesse.

 

Ainda sobre a aposentação especial, muito se discute sobre sua relação com a insalubridade, periculosidade e penosidade. De acordo com o entendimento estatal, somente os trabalhadores submetidos a condições insalubres estariam albergados pela aposentação especial.[22]

 

O que ocorre simplesmente porque a periculosidade não acarreta, por intermédio de agentes nocivos, a degradação da qualidade de vida, com o consequente prejuízo à saúde do trabalhador, mas somente o coloca em situação de risco, com a possibilidade de acidente laboral, que pode ou não ocorrer.

 

Ressalte-se, porém, que não existe justificativa plausível para que o Estado entenda que o trabalho exercido em condições penosas não enseja necessidade posterior de concessão de aposentadoria especial, pois no que diz respeito à penosidade, a efetiva exposição a agentes nocivos, em sua maioria, físicos, é inconteste.

 

O entendimento explicitado acima não mais prevalece, uma vez que o Regulamento da Previdência Social, em seu artigo 68, § 3º, é claro ao estabelecer que o laudo elaborado por expert no tema em questão deverá observar a CLT.

 

Ainda persiste, todavia, a dúvida quanto à periculosidade, em especial no trabalho com explosivos. Entende a Administração que este labor escapa ao conceito de trabalho especial, restando seus obreiros fora da esfera de percipientes da aposentadoria especial. Sem embargo, se demonstrada a efetiva nocividade do meio em que laboram, com evidente prejuízo a higidez física, deve o mesmo ser concedido. O mesmo há que se falar da penosidade.[23]

 

Destarte, em sendo devidamente comprovado que o empregado exerce sua atividade em condições perigosas ou penosas, fará jus ao recebimento da aposentadoria especial, desde que respeitado o tempo mínimo de trabalho exigido para a atividade despendida.

 

 

c.2. Insalubridade

 

No que diz respeito à insalubridade, o abalizado doutrinador Sérgio Pinto Martins ensina que, in verbis:

 

Considera-se atividade ou operação insalubre aquela que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponha o empregado a agente nocivo a sua saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos (art. 189 da CLT).[24]

 

Destarte, “insalubre é o prejudicial à saúde, que dá causa à doença” [25]. Sem sombra de dúvidas, a comprovação de que o trabalhador exerce sua atividade em condições insalubres lhe confere o direito de recebimento da aposentadoria especial, pelo simples fato de que referida benesse tem “por objetivo compensar o trabalho do segurado que presta serviços em condições adversas à sua saúde” [26].

 

A aposentadoria especial é vista, portanto, como uma forma de recompensar o empregado por todo trabalho árduo realizado durante anos, o qual lhe deixara de herança sequelas acompanhadas de sérios problemas de saúde, ensejando sua aposentação de forma especial. 

 

 

d)     Data de início

 

Como já explicado é necessária somente a comprovação efetiva de trabalho, sem necessidade de comprovação de dano físico sofrido em razão da atividade exercida.

 

O art. 64 do Decreto n. 3.048/99 estabelece:

 

Art. 64.  A aposentadoria especial, uma vez cumprida a carência exigida, será devida ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual, este somente quando cooperado filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, que tenha trabalhado durante quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física[27].

 

A data de início segue o padrão estabelecido para a data de início de aposentadoria por idade, conforme o art. 52

 

I – ao segurado empregado, inclusive o doméstico:

a) a partir da data do desligamento do emprego, quando requerida até noventa dias depois dela; ou

b) a partir da data do requerimento, quando não houver desligamento do emprego ou quando for requerida após o prazo da alínea “a”; e

 II – para os demais segurados, a partir da data da entrada do requerimento[28].

 

 

e)      Renda Mensal

 

A renda mensal será calculada na forma prevista no art. 39, “V – aposentadoria especial – cem por cento do salário-de-benefício.” Impende notar que para o caso em comento não há aplicação do fator previdenciário. Nesse sentido observa Fábio Zambitte Ibrahim que o aposentado pela especial:

 

Que retornar ao exercício de atividade exposta a agente nocivo ou permanecer nesta, terá seu benefício cancelado. (…) o mais correto seria suspensão já que se o segurado afasta-se das atividades nocivas, o benefício deve voltar a ser pago, pois se trata de direito adquirido deste. (..) Não sofrerá sanção se retornar à atividade comum.

 

 

f)       Conversão de tempo de trabalho especial para especial

 

O segurado que tiver exercido sucessivamente duas ou mais atividades em condições prejudiciais à saúde ou integridade física, sem completar em qualquer delas o prazo mínimo para aposentadoria especial, poderá somar os referidos períodos seguindo a seguinte tabela de conversão, considerada a atividade preponderante[29]:

 

Tempo a converter

Multiplicadores

Para 15

Para 20

Para 25

de 15 anos

1,33

1,67

de 20 anos

0,75

1,25

de 25 anos

0,6

0,8

 

g)     Conversão de tempo de trabalho especial em tempo comum:

A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela[30]:

 

   Tempo a Converter

Multiplicadores

Mulher (para 30)

Homem (para 35)

de 15 anos

2

2,33

de 20 anos

1,5

1,75

de 25 anos

1,2

1,4

 

 

3.      CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

À guisa de arremate, não se pode olvidar que a idéia de justiça está intrinsecamente ligada ao tratamento desigual conferido aos desiguais, na mesma medida em que se desigualam.

 

A aposentadoria especial, desse modo, é um benefício previdenciário que visa tutelar os direitos de trabalhadores que laboraram, durante anos, em condições sobremodo prejudiciais à sua saúde, sendo justo e compatível com as necessidades desse grupo específico.

 

Destarte, empregados que não trabalharam em exposição permanente a agentes nocivos, não poderiam reivindicar igual tratamento, tendo em vista que situações distintas precisam ser tratadas de modo diferente, para o alcance efetivo da tão almejada justiça.

 

 



REFERÊNCIAS

[1] MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social (Série Fundamentos Jurídicos). – 11 ed. São Paulo : Atlas, 2010, p. 129.

[2] __________.Op. cit. p. 75.

[3] MELO, Adriana Zawada. Constituição Federal Interpretada: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. / Antonio Cláudio da Costa Machado (organizador); Anna Candida da Cunha Ferraz (coordenadora). – Barueri : Manole, 2010. p.1104.

[4] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. – 14 ed., rev. e atual., Rio de Janeiro : Impetus, 2009. p.541.

[5] MARTINS, Sérgio Pinto. Op. cit. p.101.

[6] MELO, Adriana Zawada. Op. cit. p.1109.

[7] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Op. cit. p.630

[8] ___________. Op. cit. p. 630.

[9] BRASIL. Legislação de Previdência Social. Disponível em:

< http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/1973/5890.htm>. Acesso em: 22 nov. 2010.

[10]MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 29ª edição. São Paulo: Atlas. 2010, p. 354.

[11]BALERA, Wagner. MUSSI, Cristiane Miziara. Direito Previdenciário. São Paulo: Método. 2009, p. 176-177.

[12]IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 14ª edição. Niterói: Impetus. 2009, p. 637.

[13]BALERA, Wagner. MUSSI, Cristiane Miziara. Direito Previdenciário. São Paulo: Método. 2009, p. 177.

[14]IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 14ª edição. Niterói: Impetus. 2009, p. 632.

[15]BRASIL. Decreto nº 3.048/99.  Disponível em:

<http://www3.dataprev.gov.br/SISLEX/paginas/23/1999/3048.htm>. Acesso em 20 nov. 2010.

[16]IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 14ª edição. Niterói: Impetus. 2009, p. 632.

[17]___________. Op. cit. p. 633.

[18] ___________.Op. cit. p. 633.

[19]MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 24ª edição. São Paulo: Atlas. 2008, p. 234.

[20]___________. Op. cit. p. 355.

[21]___________. Op. cit. p. 354.

[22]IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 14ª edição. Niterói: Impetus. 2009, p. 638-639.

[23]___________. Op. cit. p. 639.

[24]MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 29ª edição. São Paulo: Atlas. 2010, p. 354.

[25]___________. Op. cit. p. 231.

[26]___________. Op. cit. p. 353.

[27] BRASIL. Regulamento da Previdência Social. Decreto n. 3.048/99. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048compilado.htm>. Acesso em 22 nov. 2010.

[28] Id.

[29] BRASIL. Ministério da Previdência Social. Aposentadoria Especial. Disponível em:

< http://www.previdenciasocial.gov.br/conteudoDinamico.php?id=14>. Acesso em: 22 nov. 2010.

[30] Id.

 

BIBLIOGRAFIA

BALERA, Wagner. MUSSI, Cristiane Miziara. Direito Previdenciário. São Paulo: Método. 2009.

BRASIL. Legislação de Previdência Social. Disponível em:

< http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/1973/5890.htm>.

BRASIL. Ministério da Previdência Social. Aposentadoria Especial. Disponível em:

< http://www.previdenciasocial.gov.br/conteudoDinamico.php?id=14>.

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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048compilado.htm>.

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* Daniela Intrabartolo e Regina Maria de Paula.

Alunas da 9ª etapa do curso de Direito, da Faculdade de Direito Laudo de Camargo, da Universidade de Ribeirão Preto – SP.

Como citar e referenciar este artigo:
PAULA, Daniela Intrabartolo e Regina Maria de. Aposentadoria Especial no Contexto da Seguridade Social. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/previdenciario/aposentadoria-especial-no-contexto-da-seguridade-social/ Acesso em: 19 abr. 2024