Em audiência pública conjunta nesta quarta-feira, seis comissões do Senado debateram o projeto de lei da Câmara que cria o Fundo Social a ser criado com os recursos advindos da exploração do petróleo da chamada camada pré-sal (PLC 08/10). Em comum, os cinco expositores destacaram a importância do debate democrático de um fundo que deve perdurar por gerações; e a necessidade de um planejamento prévio e de metas e objetivos para a utilização dos recursos advindos da riqueza mineral.
A reunião foi realizada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ); Comissão de Assuntos Sociais (CAS), Comissão de Educação, Esporte e Cultura (CE); Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT); Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA); e Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).
O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Márcio Pochmann, mostrou índices de avaliação de educação e saúde, bem como de bens públicos como bibliotecas e hospitais, em municípios hoje beneficiados com royalties do petróleo, para concluir que esses recursos não necessariamente contribuíram com a diminuição da pobreza. Para o presidente do Ipea, é necessário uma reforma do Estado e uma reforma das políticas públicas brasileiras, uma vez que o estado hoje delimita o problema em situações estanques: o ministério da Educação cuida da educação, enquanto o ministério do Trabalho cuida do emprego e assim por diante.
– A qualidade da educação não é vinculada apenas ao professor, à escola e à sala de aula, mas também ao aluno, ao lugar onde ele mora, sua estrutura familiar e tantas outras coisas – exemplificou.
O presidente do Ipea enumerou as grandes dificuldades de desenvolvimento social do Brasil: a densidade demográfica concentrada no litoral; a concentração econômica nas regiões Sudeste e Sul; a desigualdade da renda, condicionada pela queda continuada da participação do trabalho em sua distribuição; a desigualdade ambiental, representada pelos vários biomas nacionais; e a rápida transformação por que passa o povo brasileiro, com o rápido envelhecimento da população.
O economista do Ipea Marcelo Piancastelli enfatizou a necessidade de o Congresso Nacional opinar na aplicação dos recursos do Fundo Social do Pré-Sal. Segundo ele, o projeto é omisso com relação a isso, e o risco de má aplicação dos recursos deve ser minimizado. Ele salientou a importância de que a aplicação dos recursos do Pré-Sal para o desenvolvimento social seja feita por meio de um fundo, o que dilui a volatilidade da arrecadação, influenciada pela variação dos valores do petróleo.
O consultor Legislativo do Senado Federal Paulo Springer de Freitas destacou a necessidade da compatibilização do PLC 08/10 com os outros três projetos de lei que tratam do Pré-Sal, uma vez que eles trazem referência ao Fundo. Citou especialmente o PLC 16/10, que, para ele, traz algumas inconstitucionalidades.
Transparência
O secretário de Macroavaliação Governamental do Tribunal de Contas da União (TCU), Maurício de Albuquerque, destacou a necessidade de transparência na aplicação dos recursos, fundamental para que o TCU avalie se estes estão tendo boa aplicação. Enfatizou também a necessidade de estudos e diagnósticos prévios e detalhados, antes da definição dos gastos a serem efetuados com o Fundo. Também defendeu que o projeto explicite o acesso do TCU às informações das aplicações do Fundo nas instituições financeiras, que eventualmente criam dificuldades nesse tipo de caso.
O secretário de Políticas Econômicas do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmou que a previsão do governo é de que o fundo gere uma renda estável de 1% a 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro nos próximos 70 ou 100 anos. Ele explicou que o projeto encaminhado pelo governo tem seis vertentes principais: o combate à pobreza; o desenvolvimento da educação; a melhoria da cultura; a melhoria da saúde pública; o desenvolvimento da ciência e da tecnologia; e a mitigação e adaptação do país às mudanças climáticas.
O presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras, Fernando Siqueira, considerou o projeto ideal, a não ser pela possibilidade de o governo continuar a realizar leilões para concessão das áreas do petróleo da camada do pré-sal. Para ele, “os leilões não ajudam em nada ao país, que paga um valor altíssimo a empresas estrangeiras que não correram risco algum” na pesquisa e no descobrimento das jazidas.
A reunião conjunta foi presidida pelos senadores Renato Casagrande (PSB-ES), Flexa Ribeiro (PSDB-PA), Rosalba Ciarlini (DEM-RN) e Flávio Arns (PSDB-PR).
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) indagou sobre as principais diferenças do regime de partilha para o de concessão. Fernando Siqueira afirmou que a partilha tem a vantagem de o governo ser remunerado com parte da produção de petróleo, e não em dinheiro. Ele informou que, pela proposta do governo, 55% da produção ficariam com o governo. Na Câmara dos Deputados, esse índice caiu para 29,4%.
Respondendo a indagação do senador Flexa Ribeiro, o engenheiro da Petrobras disse ser favorável à urgência pedida pelo governo para a votação dos projetos, uma vez que, antes das eleições, os parlamentares responderão mais prontamente ao clamor da opinião pública. A resposta provocou indignação do senador, que pediu que ela fosse retirada das atas da comissão, uma vez que o expositor teria dado uma resposta política, e não técnica. Na presidência da reunião, o senador Flávio Arns ponderou que, por ser uma audiência pública, era saudável a pluralidade de opiniões, mantendo a resposta de Fernando Siqueira.
Nelson Gonçalves disse que o projeto que trata da capitalização da Petrobras é o mais urgente dos quatro que tratam da exploração do petróleo do pré-sal. Segundo ele, os projetos podem ser votados separadamente, desde que haja uma interação entre seus relatores, como houve na votação da Câmara dos Deputados. Para Paulo Springer, a capitalização da Petrobras não precisaria ser feita por projeto de lei. Ele teme que a concessão à Petrobras do direito de exploração, sem licitação, possa significar transferência de patrimônio público para o setor privado, uma vez que a empresa é uma sociedade anônima e que 60% de suas ações estão na mão de particulares.
Também respondendo a Flexa Ribeiro, Marcelo Piancastelli afirmou que a quantidade de resgate do fundo deveria ser decidida anualmente pelo Congresso Nacional, tendo em vista a garantia de sustentabilidade do Fundo Social.
Fonte: Senado