Previdenciário

Reexame de Sentença e Apelação Cível. Ação Revisional e de Cobrança de Pensões Vencidas com pedido de tutela antecipada. IPASEP. Integralidade de pensões. Redutor constitucional. Emenda Constitucional nº 19/98. Teto único. Falta de fonte de custeio. Crime

Reexame de Sentença e Apelação Cível. Ação Revisional e de Cobrança de Pensões Vencidas com pedido de tutela antecipada. IPASEP. Integralidade de pensões. Redutor constitucional. Emenda Constitucional nº 19/98. Teto único. Falta de fonte de custeio. Crime de apropriação indébita. Falta de trânsito em julgado dos mandados de segurança. Emenda Constitucional nº 20/98. Nova redação dos dispositivos constitucionais sobre a integralidade das pensões.

 

 

Fernando Machado da Silva Lima*

 

 

 

EGRÉGIA XXXXXX CÂMARA CÍVEL ISOLADA

PROCESSO : N° XXXXXXXXX

REEXAME DE SENTENÇA E APELAÇÃO CÍVEL

SENTENCIANTE: JUÍZO DE DIREITO DA Xª VARA CÍVEL DA CAPITAL

SENTENCIADO/APELANTE: IPASEP – INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA DOS SERVIDORES DO ESTADO DO PARÁ

 

SENTENCIADOS/APELADOS: XXXXXXXX E OUTROS

 

RELATOR : EXMO. DES. XXXXXXXXXXX

 

PROCURADORA DE JUSTIÇA : XXXXXXXXX

 

 

Ilustre Desembargador Relator :

 

 

 

Trata o presente de Reexame de Sentença e Apelação Cível, nos Autos da Ação Revisional e de Cobrança de Pensões Vencidas, com Pedido de Antecipação de Tutela, ajuizada por XXXXXXX e outras trinta e cinco pensionistas do IPASEP, contra ato abusivo e ilegal do Presidente desse Instituto.

 

 

 

Em síntese, os Autos informam  que :

 

       

 

Em sua Exordial, de fls. 3 a 13, ajuizada em 20.05.97, as Impetrantes disseram que são  viúvas de Promotores, Procuradores de Justiça, Auditores, Ministros e Conselheiros do TCE-PA, Magistrados do Estado do Pará, Escrivão de Cartório, Oficial de Justiça, Tenente-Coronel da PME-PA, Fiscal de Tributos e Odontólogo da SEAD-PA. Disseram que o IPASEP descumpriu o prazo constitucional de 180 dias para proceder à revisão das pensões, que expirou em 1o de abril de 1.989, e que vem pagando apenas uma parte do que elas deveriam receber. Citaram os §§ 4o e 5o da Constituição Federal de 1.988, a respeito do direito à integralidade das pensões. Disseram que, desde 1o de abril de 1.989, foi impunemente praticado contra elas o crime de apropriação indébita. Citaram doutrina e jurisprudência. Falaram também sobre a aplicação do redutor constitucional. Pediram a concessão da tutela antecipada, para que o IPASEP proceda, no prazo máximo de 30 dias, à revisão das pensões, atualizando e pagando às autoras as diferenças relativas aos últimos cinco anos. Juntaram documentos (fls. 14 a 285).

 

O MM. Juiz a quo despachou, às fls. 286, negando a concessão do pedido liminar, tendo em vista que seria satisfativo.

 

         O IPASEP prestou informações (fls. 292- 306). Inicialmente, alegou a inobservância dos arts. 14 e 15 do CPC. Disse que os servidores aposentados são isentos de contribuição. Disse ainda que alguns mandados de segurança ainda não transitaram em julgado. Pediu a extinção do processo sem julgamento do mérito. Falou sobre fonte de custeio e negou o crime de apropriação indébita. Falou sobre o redutor constitucional. Citou doutrina. Citou jurisprudência. Citou a Lei estadual nº 5.011/81, que manda pagar 70% (setenta por cento) do salário de contribuição. Citou a Constituição Federal, no § 5o do art. 195, a respeito da fonte de custeio.

 

         As Autoras impugnaram a Contestação, às fls. 387- 396. Rebateram a alegada desobediência aos arts. 14 e 15 do CPC. Disseram que os aposentados são contribuintes facultativos. Disseram que a crise estrutural dos institutos de previdência não deve ser debatida neste feito. Quanto à falta de trânsito em julgado dos mandados de segurança, disseram que a presente ação tem objeto distinto. Disseram que estão presentes todas as condições de admissibilidade da ação. Disseram que o redutor constitucional não é aplicável nas pensões. Juntaram documentos (fls. 397- 398)

 

          As Autoras requereram, às fls. 440- 441, o julgamento antecipado da lide.

 

          A Ilustre Promotora de Justiça, Dra. Agar da Costa Jurema, opinou, às fls. 443- 445, pelo indeferimento desse pedido. Disse, ainda, que o redutor constitucional é legal.

 

          As Autoras requereram, às fls. 450, o chamamento do processo à ordem, para prolação da sentença de mérito. Juntaram documentos (fls. 451- 490).

 

         A Mma. Juíza Titular da 14ª Vara Cível, Dra. Marta Inês Antunes Jadão, decidiu, em 02.12.99 (fls. 501- 510). Relatou o Processo. Disse que as preliminares não podem prosperar. Transcreveu jurisprudência. Citou o art. 40, § 5o da CF de 88. Transcreveu jurisprudência a respeito. Julgou procedente o pedido, para determinar o pagamento das diferenças das prestações vencidas, relativas aos reajustes dos cinco anos anteriores, obedecendo aos limites do art. 37, XI da CF. Determinou o reexame, com base na MP 1561/97.

 

         O IPASEP interpôs Embargos de Declaração, às fls. 511- 516, a respeito da obscuridade da Sentença no pertinente à aplicação do redutor constitucional sobre as pensões.

 

 

         A Mma. Juíza manifestou-se sobre os Embargos, às fls. 519- 523. Citou jurisprudência do STJ, e disse que é sabido que o servidor inativo deve receber os mesmos vencimentos que o servidor da ativa recebe, em decorrência dos princípios da legalidade e da moralidade, que norteiam a conduta da administração. Disse que é pertinente a aplicação do redutor constitucional. Transcreveu o inciso XI do art. 37 da CF. Transcreveu jurisprudência do STJ e do STF. Acolheu os embargos, e determinou que seja aplicado o redutor constitucional, na forma do art. 37, XI, da CF/88 e do art. 17 do ADCT, ocasionando o pagamento das pensões integralizadas em 100% sobre o teto máximo correspondente aos vencimentos dos Ministros do STF.

 

          O IPASEP recorreu, em 15.03.00 (fls. 525- 530). Insistiu na tese da constitucionalidade da Lei estadual nº 5.011/81 e na tese referente ao pagamento dos 70% (setenta por cento). Citou o § 5o do art. 40 da CF. Citou o § 5o do art. 195 da CF, a respeito da fonte de custeio. Pediu a reforma da Sentença.

 

         A Mma. Juíza a quo, em Despacho de fls.532, recebeu a Apelação em ambos os efeitos.

 

          As Autoras, ora Apeladas, apresentaram Contra-Razões, às fls. 534- 537. Disseram que a Sentença deve ser integralmente mantida. Disseram que o Réu, ora Apelante, de forma contumaz, se recusa a aplicar o preceito constitucional que acabou com o tratamento discriminatório das pensões. Falaram sobre a argumentação do IPASEP. Citaram jurisprudência do STF. Falaram sobre o tema da fonte de custeio. Pediram a manutenção da Sentença.

 

         Distribuídos os Autos, vieram a esta Procuradoria de Justiça, para exame e parecer.

 

 

         É o Relatório. Esta Procuradoria passa a opinar.

 

                  O litígio em questão versa  sobre a aplicabilidade da Lei Estadual nº 5.011/81, modificada pela Lei n. 5.301/85. O Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado do Pará – IPASEP, ora Apelante,  continua insistindo na tese de que o aludido Diploma Legal teria sido recepcionado pela Constituição Federativa de 1988, face à expressão contida em seu artigo 40, § 5º, até o limite estabelecido em Lei, o que permitiria negar a existência de uma isonomia estipendiária absoluta entre vencimentos, aposentadorias e pensões.

 

Observe-se ainda que o IPASEP, ora Apelante, para defender essa tese, com intuito claramente protelatório, continua citando o mesmo § 5o do art. 40 da Constituição Federal, que já foi revogado, há quase dois anos,  pela Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.98 !

 

Para o Instituto Previdenciário, o referido dispositivo constitucional seria o que os constitucionalistas denominam de norma de eficácia contida ou limitada, ou seja, necessita de um mecanismo infra-constitucional para ter eficácia.

 

 No entanto, o direcionamento da maioria dos doutrinadores pátrios, bem como o dos Tribunais, volta-se  no sentido de que o artigo 40, § 5º, da Lex Legum (anterior à Emenda Constitucional no. 20/98) , possui natureza de norma auto-aplicável,  destarte, de eficácia imediata, não necessitando ser complementado por legislação ordinária, conforme ensina o jurista Wolgran Junqueira Ferreira:

 

Constitucionalmente fica estabelecido que o benefício de pensão por morte, corresponderá aos vencimentos ou proventos do servidor público falecido. Não há mais o que se discutir sobre o assunto, e nem que se ingressar na Justiça para obter a totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, dada a clareza do texto (art. 40, § 5º).

 

Esta disposição é válida para os três níveis de administração do Estado, isto é, União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios. (Comentários à Constituição de 1988, p. 493)

 

 A lei, mencionada na parte final do salientado dispositivo constitucional, possui relação com o inciso XI do art. 37 da Lex Legum, que estabelece o teto salarial para os servidores públicos, incluindo os inativos, o que por corolário atinge os pensionistas (artigo 40, § 4º, da CF/88, na redação anterior à Emenda Constitucional no 20/98).

 

Mas a Emenda Constitucional nº 19/98 (Reforma Administrativa) unificou o teto, alterando a redação do inciso XI do art. 37 da CF, e estabelecendo o limite máximo correspondente ao subsídio de um Ministro do Supremo Tribunal Federal. Aliás, esse limite máximo, ou teto, também não existe, exatamente porque ainda não foi apresentado ao Congresso Nacional o projeto de lei (art. 48, XV da CF) do qual falaremos posteriormente, quando tratarmos do tema do redutor constitucional.

 

 Ademais, inúmeros Acórdãos, dos diversos níveis de jurisdição, dão posição favorável à integralidade da pensão, na mesma proporção dos proventos do servidor público inativo, verbi gratia:

 

EMENTA: Pensão. Valor correspondente à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido. Constituição Federal, artigo 40, § 5º. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Mandado de Injunção  211-8, proclamou que o § 5º do art. 40 da Constituição Federal encerra um direito auto-aplicável, que independe de lei regulamentadora para ser viabilizado, seja por tratar-se de norma de eficácia, como entenderam alguns votos, seja em razão de a lei nele referida não poder ser outra senão aquela que fixa o limite de remuneração dos servidores em geral, na forma do art. 37, XI, da Carta, como entenderam outros. Recurso extraordinário não conhecido. (STF. RE 140863-4/AM. Rel. Min. Ilmar Galvão. 1ª Turma. Decisão: 08/02/94. DJ de 11/03/94, p. 4.113.)

 

 

EMENTA: Constitucional. Administrativo. Pensão. Totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido. I – A incidência do §5º do artigo 40 da Constituição Federal é imediata, e o art. 215 da Lei 8.112/90 esclareceu que o teto previsto na Constituição é o limite da remuneração dos Ministros de Estado. II – O disposto no art. 4º da Lei 3.378/58, que diz corresponder a pensão por morte a 50 % dos vencimentos do servidor falecido, não dispõe de eficácia, pois uma vez promulgada a Carta Magna, não há mais que se falar  na coexistência de qualquer norma legal que com ela conflite. III – Remessa necessária improvida, para manter a sentença. ( TRF – 2ª Região. REO 93.02.18402/RJ. Rel. Juiz Henry Barbosa. 1ª Turma. Decisão: 13/04/94, DJ 2 de 26/05/94, p. 25.662)

 

EMENTA: Previdência Social. Ipesp. Pensão. Beneficiário de servidor falecido. Valor integral dos proventos. Art. 40, § 5º, da Constituição da República. Admissibilidade. Recurso provido. Da conjugação do preceituado nos §§ 4º e 5º  do art. 40 da Constituição da República infere-se que a Lei Magna assegurou, ineludivelmente, paridade de vencimentos, proventos e pensões, de modo que todos se reajustam quando os vencimentos são reajustados. Se assim é, a pensão previdenciária não poderia ter expressão qualitativa e quantitativa diversa, porque todos caminham na mesma direção. Isto quer dizer que a Constituição da República assegurou a isonomia estipendiária entre servidores em atividade, servidores inativos e pensionistas de servidores falecidos ( TJSP. AC 180985-1/ São Paulo. Rel. Des. Renan Lotufo. 1ª Câmara Cível. Decisão: 02/03/93. TJ/SP –LEX – 146, p. 141.)

 

 Por último, dispunha o antigo § 5º do art. 40 da Constituição Federal de 1988 (redação anterior à Emenda Constitucional no. 20):

 

 

 

“Art. 40. ………………………………….

 

 

 

§ 5º – O benefício da pensão por morte corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, até o limite estabelecido em lei, observado o disposto no parágrafo anterior. (o grifo é nosso)

 

 É certo que o aludido preceito constitucional se refere a vencimentos e proventos, dois termos juridicamente distintos. O primeiro aplica-se ao caso do servidor que falece na ativa. O segundo, logicamente, para aquele que morre já aposentado, ou seja, na inatividade. Essa é a interpretação, conforme o ilustre José Afonso da Silva:

 

Finalmente, a Constituição se lembrou dos pensionistas, quando no art. 40, § 5º, determina que os benefícios da pensão por morte correspondem à totalidade dos vencimentos (caso em que o servidor faleceu em atividade) ou proventos do falecido (caso em que o servidor faleceu quando já aposentado) (José Afonso da Silva – Curso de Direito Constitucional Positivo)

 

 Essa distinção, feita pelo Constituinte, não é gratuita, tendo em vista as várias espécies de aposentadorias previstas nos incisos do art. 40, sendo que as mesmas podem ser de proventos integrais ou proporcionais.

 

Deve ser ressaltado que citamos os §§ 4o e 5o do art. 40, na redação anterior, porque toda a doutrina e a jurisprudência citadas nos Autos se referem a essas normas. Mas a Emenda Constitucional no. 20, de 15.12.98, alterou o art. 40 da Constituição Federal, que passou a ter dezesseis parágrafos, deixando ainda mais evidente a garantia de isonomia estipendiária entre servidores, aposentados e pensionistas.

 

 

 

A norma do § 7o do art. 40, de acordo com a Emenda Constitucional no. 20/98, garante que a pensão por morte  será igual ao valor dos proventos do servidor falecido, ou ao valor dos proventos a que teria direito o servidor em atividade na data do seu falecimento,  e assim é evidente que as Autoras têm direito à integralidade das pensões.

 

O parágrafo 3o, por sua vez, garante a igualdade dos proventos da aposentadoria, verbis:

 

§3o – Os proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão calculados com base na remuneração do servidor no cargo efetivo em que se der  a aposentadoria e, na forma da lei, corresponderão à totalidade da remuneração. (grifamos)

 

Em suma, quer em face do antigo § 5o do art. 40 da Lei Maior, quer de acordo com o seu novo § 7o, não resta dúvida de que a Lei estadual que estabelece a alíquota de 70%  (setenta por cento) para incidir sobre uma base de cálculo relativa ao valor dos proventos do ex-segurado, não foi recepcionada pelo sistema constitucional, o que garante a pensão integral inerente aos proventos do servidor inativo, de acordo com a espécie de aposentadoria. A lei referida no final do antigo § 5o do art. 40 referia-se ao teto salarial, que não pode ultrapassar o subsídio de um Ministro do STF, valendo a mesma premissa aos pensionistas, por força do antigo § 4º do mesmo artigo. Na redação atual, vigora a norma do §  8o do art. 40 da Constituição Federal, verbis:

 

§8o – Observado o disposto no art. 37, XI  (grifamos), os proventos de aposentadoria e as pensões serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei

 

No que pertine ao redutor constitucional, cuja aplicação foi determinada pela Mma. Juíza a quo, com supedâneo no art. 37, XI, da Constituição Federal de 1.988, esta Procuradoria entende de forma diversa, mesmo porque a Ilustre Magistrada disse, em seu Decisum, que “é sabido que o servidor inativo deve receber os mesmos vencimentos que o servidor da ativa recebe, em decorrência dos princípios da legalidade e da moralidade, que norteiam a conduta da administração”, e apesar disso, concluiu ser pertinente a aplicação do redutor constitucional, que não é aplicado para os servidores em atividade, e determinou “o pagamento das pensões integralizadas em 100% sobre o teto máximo correspondente aos vencimentos dos Ministros do STF” tudo com fundamento nos arts. 37, XI, da CF/88, e 17 do ADCT.

 

                   Anteriormente à entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 19/98, o artigo 37, XI, da Carta Magna de 1988 assim disciplinava:

 

“Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

 

                      ………………………………………………….

 

XI – A Lei fixará o limite máximo e a relação de valores entre a maior e a menor remuneração dos servidores públicos, observados, como limites máximos e no âmbito dos respectivos poderes, os valores percebidos como remuneração, em espécie, a qualquer título, por membros do Congresso Nacional, Ministros de Estado e Ministros do Supremo Tribunal Federal e seus correspondentes nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios e, nos Municípios, os valores percebidos como remuneração, em espécie, pelo Prefeito.”

              

 

                   Ressalta evidente, pelo exame da antiga redação do texto constitucional, que ela proibia, expressamente,  que a retribuição dos servidores públicos, pensões e aposentadorias, excedesse, em espécie, a qualquer título, a remuneração também percebida em espécie e a qualquer título pelos titulares dos cargos balizadores elencados no referido inciso (Parlamentares, Ministros de Estado, Ministros do Supremo Tribunal Federal e seus correspondentes nos Estados e nos Municípios).

 

                       O texto originário da Constituição de 1.988 determinava portanto, repetimos, que  a remuneração a ser considerada para esse efeito, da aplicação do redutor constitucional, haveria de ser apenas a retribuição percebida em espécie, isto é, em dinheiro, ficando assim evidente que as retribuições indiretas, não pagas em dinheiro, não integravam o conceito de remuneração para fins de determinação do teto constitucional.

 

                       A  Constituinte se preocupou em evitar os abusos que vinham sendo praticados, no tocante à remuneração do funcionalismo público, aí incluídos os aposentados e pensionistas, estabelecendo clara e objetivamente as diretrizes que deveriam orientar a incidência do teto cogitado no artigo 37, XI, da Constituição do Brasil, e consequentemente a aplicação do redutor constitucional previsto no artigo 17 do ADCT, verbis :

 

 “Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título”.

 

Em decorrência das normas suso referidas,  desenvolveu-se pacífica jurisprudência, quer na Suprema Corte como nos outros Tribunais, aí se incluindo essa Egrégia Corte, no sentido de excluir  do cômputo da remuneração dos servidores públicos, para fins de aplicação do redutor  constitucional, as parcelas referentes às vantagens pessoais, assim consideradas a de representação incorporada, o adicional por tempo de serviço, a gratificação por produtividade e o salário família, de acordo com a casuística jurisprudencial.

 

Mas a  Emenda Constitucional n.º 19, de 04.06.98, introduziu profundas modificações no texto constitucional:

 

 

 

“ Art. 37 – ………………………………………………

 

 

 

XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes  da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza , não poderão exceder  o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.”

 

Como podemos observar, a Emenda Constitucional nº 19/98 alterou radicalmente o texto constitucional, no pertinente à limitação dos proventos do funcionalismo público, incluindo-se nessa limitação as pensões e as aposentadorias. Mas a mesma Emenda Constitucional nº 19/98 acrescentou ao art. 48 da Constituição Federal, que trata da competência legiferante do Congresso Nacional, um inciso que disciplina o modo pelo qual deverá ser feita a fixação desse teto, até esta data inexistente:

 

“XV- fixação do subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, por lei de iniciativa conjunta dos Presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, e do Supremo Tribunal Federal, observado o que dispõem os arts. 39 § 4o , 150, II, 153, III, e 153, § 2o , I”.

 

Esse projeto, até o momento, não existe, exatamente porque os quatro Presidentes não chegaram a um acordo a respeito da fixação do teto constitucional, que deverá excluir a possibilidade do pagamento de qualquer outra parcela, a qualquer título.

 

O § 4o do art. 39 da CF, na redação da Emenda Constitucional nº 19/98, estabelece:

 

“O membro de poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI”. 

 

Se inexiste, portanto, lei formal, fixando o subsídio a ser pago aos Ministros do Supremo Tribunal Federal,  não se pode cogitar, evidentemente, de um teto constitucional como parâmetro, para nele se fazer incidir o redutor constitucional, com alegado supedâneo no art. 37, XI da CF/88, conforme foi decidido neste Processo, em relação às Autoras, ora Apeladas.  E este é o entendimento dessa Egrégia Corte, como se verifica pela recente Decisão a seguir transcrita:

 

EMENTA: Mandado de Segurança. Servidores públicos estaduais. Proventos da aposentadoria. Vantagem de representação incorporada pelo exercício de cargo de Secretário de Estado. Aplicação do redutor constitucional. I- Ilegal e abusivo ato que determinou inclusão no teto das parcelas relativa a vantagens pessoais, ferindo direito líquido e certo dos impetrantes. II- Não são auto-aplicáveis as normas inscritas no art. 37, XI e no artigo 39, § 4o , da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda 19/98, por força de entendimento do S.T.F. – Sessão Administrativa de 24.06.98. Segurança concedida à unanimidade.  (TJPA, Mandado de Segurança, Processo nº 98303913, Acórdão nº 39.858/2000, Rel. Desa. Rutéa Nazaré Fortes, Câmaras Cíveis Reunidas, j. 27.06.2000)

 

         Idêntico é o entendimento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, em Decisão de maio do ano passado:

 

Ementa – Constitucional e Processual Civil. Mandado de Segurança Coletivo impetrado pelo Sindicato dos Procuradores do Distrito Federal – SINDPROC. Preliminares de carência da ação, ilegitimidade ativa, irregularidade na representação processual e falta de interesse de agir. Rejeição. Coisa julgada. Inocorrência. Teto remuneratório (art. 37, XI, CF). Inclusão das vantagens pessoais. Decreto nº 17.128/96. Inconstitucionalidade. Segurança concedida. I – Estando o Sindicato dos Procuradores do Distrito Federal legalmente constituído e em funcionamento há mais de um ano, não há que se falar em carência da ação mandamental.  Desnecessária a prévia autorização do sindicato por seus filiados para o ajuizamento de mandado de segurança coletivo. III – A lei não  exige que se prove desde logo, a regularidade da representação da pessoa jurídica. Só quando existe dúvida séria é que deverá determinar o julgador que seja feita essa prova. IV – A informação do Governador do DF de que teria determinado a observância ao art. 37, XI da Constituição Federal, o que implicaria o retorno ao status quo ante, não retira o interesse de agir do sindicato. – Sendo a causa de pedir deste mandamus diversa das ações noticiadas, descabida é a alegação de coisa julgada. VI – As retribuições pecuniárias devidas ao servidor público, em razão de circunstâncias de ordem pessoal ou de caráter funcional, não se incluem no cômputo geral da remuneração para efeito de incidência do teto constitucional, eis que traduzem benefícios resultantes da situação funcional particular de cada servidor. Nem mesmo através de lei poderá o Distrito Federal, sem ferir a Constituição, fixar, para efeito de teto constitucional, um valor global que também abranja, para efeito do seu cômputo, vantagens de ordem meramente individual. VII – No momento jurídico do país, não existe teto nem subteto a serem obedecidos nos pagamentos dos procuradores do GDF. VIII – Para efeito do denominado “teto salarial” dos servidores públicos do DF, enquanto não for editada a lei regulamentadora dos arts. 3º e 5º da emenda constitucional nº 19/98, deverá ser observada a regra estabelecida no art. 37, inciso XI, c/c o art. 39, § 1º, ambos da Constituição Federal, em sua redação original, incluídas no cálculo as parcelas de caráter pessoal recebidas pelos secretários de estado nos termos da lei nº 237/92, bem resguardado o direito adquirido concernente às vantagens pessoais devidamente incorporadas. (TJDF-MS 19980020018819, Relator Nívio Gonçalves, publicado no DOU de 05.05.1999)

 

Sobre a questão, Diógenes Gasparini assim se manifesta:

 

“a remuneração atualmente significa a somatória de todos os valores percebidos pelo servidor, quer sejam pecuniários, quer não. Assim abrange o vencimento, as vantagens e as quotas de produtividade.

………………………………………………………………………

 

Ademais, vale repetir, o Egrégio Supremo Tribunal Federal, em Sessão Administrativa, realizada no dia 24.06.98, firmou entendimento de que não são auto-aplicáveis as normas inscritas no artigo 37, XI, e no artigo 39, §4º, da Constituição da República, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 19/98”.

 

 

 

         Esta Procuradoria entende, portanto, que descabe, na hipótese vertente, a aplicação do redutor, com base na existência de um suposto teto constitucional, pela aplicação da norma do inciso XI do art. 37 da CF, que manda incluir as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, porque  violaria os princípios constitucionais da legalidade, haja vista que o dispositivo constitucional é de eficácia contida, bem como o da irredutibilidade de vencimentos, e o da igualdade perante a lei, porque aplica aos pensionistas tratamento diverso do que tem sido aplicado aos servidores da ativa, que sem exceção continuam recebendo seus vencimentos sem aplicação de qualquer redutor constitucional, e ainda o da isonomia estipendiária entre aposentados, pensionistas e funcionários em atividade,  sobejamente consagrada na caudalosa e uniforme jurisprudência de nossos Tribunais.

 

         Finalizando, cabe aqui ponderar que é patente a litigância de má-fé do IPASEP, no pertinente à negativa da integralidade da pensão, porque o Órgão Previdenciário, sabendo muito bem que seus argumentos são totalmente improcedentes, continua interpondo infindáveis recursos às Instâncias Superiores, fazendo tabula rasa do Poder Judiciário, com o único intuito de procrastinar o pagamento da integralidade dos direitos que o legislador constitucional assegurou aos pensionistas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. A nosso ver, além da patente procrastinação, que vulnera o direito líquido e certo das pensionistas, há perda de tempo, papel e tinta…

 

         Imperioso que esse Egrégio Tribunal de Justiça dê um basta a tantas manobras jurídicas perpetradas pela autarquia recorrente, apenas para retardar o reconhecimento do direito de pessoas que passaram a vida toda labutando em prol do Estado do Pará e que, no momento em que mais precisam, seu direito lhes é negado, porque o Órgão Previdenciário  faz de tudo para não ver reconhecido, no Estado do Pará, esse direito constitucionalmente assegurado aos inativos e pensionistas.

 

Com efeito, o art. 17 do Código de Processo Civil, dispõe que:

 

” Art.17. Reputa-se litigante de má-fé aquele que:

I – deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso:

 

 Ao lado dessa norma processual, a Jurisprudência Pátria, inclusive do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, é clara ao assentar que:

 

” É litigante de má-fé a parte que deduz pretensão contra fato incontroverso e altera a sua verdade, postergando o princípio da lealdade processual.” (RSTJ 88/83 e STJ-RTJE 157/225)

 

         É evidente que a pretensão deduzida pelo IPASEP em centenas de casos similares e em especial em mais este, demonstra a clara intenção de postergar o cumprimento de um direito assegurado no Texto Constitucional, e é também evidente que seus argumentos, pretensamente jurídicos, caíram por terra em vários outros processos julgados pela Instância Máxima deste País. Apesar de tudo, as pensionistas do Estado do Pará continuam à mercê de filigranas jurídicas incompatíveis com a nova ordem constitucional que vigora, aliás, desde o ano de 1988, precisando enfrentar prolongados trâmites processuais, antes de receberem as pensões integrais que lhes são claramente devidas.

 

Na hipótese vertente, observa-se que este processo já tramita há três anos e quatro meses, e que as Autoras têm direito a receber as diferenças referentes aos períodos anteriores à impetração dos Mandados de Segurança, não atingidos pelo prazo prescricional, e que apesar disso o Órgão Previdenciário continua insistindo em suas desgastadas alegações, já inteiramente fulminadas pela pacífica jurisprudência de nossos Tribunais, e continua desconhecendo, ou pretendendo desconhecer,  a existência da Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.98, que revogou o § 5o do art. 40 da CF, e cuja cláusula ‘até o limite estabelecido em lei’ tem servido, durante todos esses anos, para que o IPASEP defenda a constitucionalidade da Lei estadual que limita em 70% o valor das pensões, com base na primária alegação de que a garantia constitucional de que o pensionista terá direito à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido está sujeita a uma limitação, que depende única e exclusivamente da vontade do legislador estadual. Ou seja, em outras palavras, o que o IPASEP afirma, e vem insistindo há muito anos, é simplesmente que a CF determinou que o benefício da pensão por morte corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, MAS que essa totalidade poderá ser livremente limitada em 10% ou 20% do total, pelo legislador estadual !!!

 

O Apelante chegou ao cúmulo de pretender, em relação às pensionistas, a aplicação do redutor constitucional, que nunca foi aplicado aos aposentados, nem aos servidores da ativa, inclusive pela interposição dos Embargos de Declaração, porque, segundo ele,  “a Sentença foi obscura quanto à aplicação do redutor constitucional sobre as pensões”, o que inadvertidamente foi deferida pela Mma. Juíza.

 

         Esta Procuradoria de Justiça pede, portanto, que essa Egrégia Corte aplique a multa específica, a ser fixada, pela nítida litigância de má-fé praticada pelo Órgão Previdenciário Estadual, in casu, o IPASEP, porque, como demonstrado alhures, desde a promulgação do Texto Constitucional no ano de 1988 até a presente data,  continua em seu firme propósito de não cumprir a Norma Maior, e de prejudicar as pensionistas, pela protelação dos pagamentos que lhes são devidos.

 

                  Ex positis, este Órgão Ministerial se manifesta pelo conhecimento do Recurso oficial e da Apelação, porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade, e no mérito, pelo provimento parcial, para que seja reconhecido o direito das Autoras, XXXXXXXXX e outras, a receberem pensões em valor correspondente à totalidade dos vencimentos ou proventos que os ‘de cujus’ receberiam, se vivos fossem, e conseqüentemente para que lhes sejam pagas as diferenças referentes aos períodos não atingidos pelo prazo prescricional, tudo sem a aplicação de qualquer  redutor constitucional, e ainda com a aplicação da pena pela litigância de má-fé, em ‘quantum’ a ser determinado por esse Egrégio Tribunal.

 

É O PARECER.

 

                   Belém,         setembro de 2.000.

 

 

* Professor de Direito Constitucional da Unama

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Como citar e referenciar este artigo:
LIMA, Fernando Machado da Silva. Reexame de Sentença e Apelação Cível. Ação Revisional e de Cobrança de Pensões Vencidas com pedido de tutela antecipada. IPASEP. Integralidade de pensões. Redutor constitucional. Emenda Constitucional nº 19/98. Teto único. Falta de fonte de custeio. Crime. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/estudodecaso/previdenciario-estudodecaso/reexame-de-sentenca-e-apelacao-civel-acao-revisional-e-de-cobranca-de-pensoes-vencidas-com-pedido-de-tutela-antecipada-ipasep-integralidade-de-pensoes-redutor-constitucional-emenda-constitucional-no-1/ Acesso em: 19 abr. 2024