Direito Penal

Apologia ao nazismo é crime

Resumo: Dois episódios recentes de manifestações em prol do nazismo foram traumáticos à realidade brasileira. Porém, há de ressaltar que a apologia ao nazismo é crime, não apenas no ordenamento jurídico brasileiro, mas, igualmente na Alemanha e, outros países europeus.

Palavras-Chave: Nazismo. Apologia ao crime. Liberdade de expressão. Direitos Fundamentais. Garantias Constitucionais.

O nazismo[1] é originário de período pós-Primeira Guerra Mundial, consolidando-se no Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães foi movimento ditatorial que governou a Alemanha entre os anos de 1933 a 1945, e um de seus principais líderes foi Adolf Hitler.

É considerado como uma das expressões do fascismo europeu entre a Primeira e a Segunda Grande Guerra Mundial e que reúne entre suas principais características o nacionalismo, militarismo e autoritarismo. Essa ideologia foi responsável pela morte de milhões de judeus e, outas pessoas no conhecido holocausto, onde também se aprisionaram, torturaram e assassinaram negros, homossexuais, ciganos, comunistas bem como todos aqueles que não eram considerados pertencentes à raça superior ariana.

O maior símbolo do Partido Nazista era a cruz suástica, originalmente eram uma imagem que significavam prosperidade e sucesso e sua reprodução em locais públicas é atualmente proibida e configura apologia ao nazismo.

A apologia ao nazismo corresponde ao ato ou atos de promoção e prática sob qualquer argumento ou meio as ideias, doutrinas ou instituições adotadas pelo Partido nazista, é considerada crime no Brasil, conforme a Lei 7.716/1989.

No artigo 20, a legislação afirma ser crime “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça[2], cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Em seguida, seu 1º parágrafo, é descrito ainda que “veicular símbolos” do nazismo “para fins de divulgação” pode gerar pena de multa e prisão de dois a cinco anos.

O mesmo dispositivo legal classifica como criminosos aqueles que produzem, vendem ou distribuem material que contenha símbolos nazistas e também os que utilizam publicações e meios de comunicação para disseminar as ideias do nazismo.

A saudação nazista ou saudação de Hitler (em alemão: Hitlergruß), muito conhecida na época da Alemanha nazista como Deutscher Gruß (saudação alemã), é uma variação da saudação romana, adotada pelo Partido Nazista como um sinal da lealdade e culto da personalidade de Adolf Hitler. Ganhou popularidade, concomitantemente, com à ascensão de Hitler. Consiste em levantar-se o braço direito enquanto se diz as palavras Heil Hitler (“Salve Hitler”).

A expressão é uma adaptação de Sieg Heil (“Salve a Vitória”). Foi, primeiramente, usada por Joseph Goebbels, ministro da propaganda da Alemanha nazista. É-lhe atribuído o número 88, por ser H a oitava letra do alfabeto, formando 88 as letras HH, ou Heil Hitler.

Para a saudação de Hitler o braço direito é levantado em um ângulo de aproximadamente 45 graus na horizontal e ligeiramente na lateral, embora muitas vezes seja utilizado em 90 (noventa) graus (principalmente em multidões onde não haveria espaço para colocar o braço estendido para a frente), e acompanhado das palavras Sieg Heil!, Heil Hitler! Heil mein Führer! (Salve, meu líder – quando endereçada ao próprio Hitler), ou simplesmente Heil!, geralmente dito em voz alta e repetidas três vezes.

O próprio Hitler usava, frequentemente, a saudação, e há muitas fotografias dele fazendo-a em multidões e em carros abertos. No caso de uma pessoa saudar a outra, as palavras são pronunciadas ao mesmo tempo.

A saudação nazista desde cerca de 1925 foi uma saudação habitual no partido nazista, principalmente em reuniões, especialmente após um discurso de Hitler.

De 1933 a 1945 a saudação a Hitler era um cumprimento alemão comum. Hitler copiou a saudação de Benito Mussolini (a saudação romana). Embora os fascistas italianos associassem a saudação com Roma Antiga, Hitler e Heinrich Himmler do SS, acreditaram que ele se originou dos antigos povos germânicos.

Ao final do século XIX, o gesto foi reconhecido como um símbolo da aclamação comunal, uma versão sua foi adotada como a saudação olímpica, com os braços levantados para o lado do corpo, como no Juramento dos Horácios. O gesto foi retratado também como uma saudação em uma série de filmes sobre a Roma antiga, tal como Ben Hur (1907), Nerone (1908), Spartaco (1914) e Cabiria (1914).

As reivindicações de Hitler e Himmler eram justificadas, pois os historiadores discutem há muito tempo que gestos similares à saudação romana já eram usados na coroação de reis alemães antigos.

As ilustrações que reconstroem tais eventos, e mostram a saudação, datam de meados do século XIX. A Enciclopédia Brockhaus[3] repete tais reivindicações, dizendo que a saudação deriva dos gestos usados durante a coroação de reis alemães medievais juntamente com a exclamação de “Heil”.

De acordo com alguns nazistas, aspectos presentes na Roma Antiga vieram do norte da Europa, e assim, em sua opinião, seria provável que tivessem trazido a saudação para Roma da Alemanha.

A saudação romana, no qual a saudação de Hitler foi baseada, foi usada em muitos países diferentes para muitas finalidades diferentes antes da Segunda Guerra Mundial. Por exemplo, a Saudação de Bellamy, usada como garantia de fidelidade nos Estados Unidos no século XIX, e no século no início do século XX, era uma versão da saudação romana com algumas similaridades à saudação nazista.

A saudação romana é uma saudação em que o braço é levantado para a frente, com a palma da mão para baixo. O braço pode ficar paralelo ao chão ou não, por vezes, com o braço mais ou menos erguido. Apesar do nome do gesto, desconhece-se se os romanos o usavam como cortesia militar e a interpretação atual como uma “saudação” parece ter surgido recentemente.

A saudação de Bellamy[4] foi abandonada desde 1942 por causa dessa similaridade. O mesmo aconteceu com à maioria das outras formas de saudações romanas ao redor do mundo.

O uso da saudação e das frases do acompanhamento foi proibido por lei na Alemanha e na Áustria desde o fim da segunda guerra mundial. A saudação é usada atualmente por grupos neonazistas.

Os Ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal utilizaram seus perfis do Twitter diante da recente polêmica criada por locutor de podcast ao defender a existência de partido nazista brasileiro, apontaram que é crime fazer apologia ao nazismo. Em meio à polêmica criada, o ex-apresentador do podcast Flow, conhecido pela alcunha (ou nome artístico) de Monark foi demitido e desligado dos Estúdios Flow.

Conveniente ainda sublinhar que conforme ressaltou o Ministro Alexandre de Moraes: “A Constituição consagra o binômio: liberdade e responsabilidade. O direito fundamental à liberdade de expressão não autoriza a abominável e criminosa apologia ao nazismo”.

Os Estúdios Flow emitiram nota comunicando seu desligamento da companhia, porém, não ficou claro se o locutor deixou de integrar a sociedade da empresa que fundou.

Outro episódio envolveu Adrilles Jorge que fora igualmente demitido por gesto nazista e, ainda, o Ministério Público

solicitou a abertura de processo criminal contra o comentarista da Jovem Pan e ainda a retirada do programa de todas as plataformas. O gesto que seria um suposto “adeus” feito pelo apresentador, ocorreu justamente ao fim de debate conturbado sobre caso grave de nazismo onde tentou emplacar brincadeira maldosa e cruel. O apresentador assim como Monark defendem a criação de um partido nazista brasileiro.

A Confederação Israelita do Brasil (Conib) condenou o gesto repugnante de saudação nazista feito por Adrilles Jorge no programa da Jovem Pan “O nazismo propaga uma visão de mundo racista, antissemita e totalitária, que causou a morte de 6 milhões de judeus e minorias, como homossexuais, negros, ciganos e outras, e detonou uma guerra mundial catastrófica para a humanidade. Episódios de apologia ao nazismo devem ser combatidos com todo o rigor da lei brasileira e repelidos pela sociedade como um todo”, esclareceu a comunidade, em nota ao Metrópoles.

Vide ainda: Alvo de Denúncia do MPF, usuário do Facebook vira réu por apologia. O número da ação penal por apologia ao nazismo é 5000901-41.2020.4.03.6181 a tramitação se dá em segredo de justiça. ao nazismo. Disponível em:  http://www.mpf.mp.br/sp/sala-de-imprensa/noticias-sp/alvo-de-denuncia-do-mpf-usuario-do-facebook-vira-reu-por-apologia-ao-nazismo Acesso em 10.02.2022.

No afã de defesa, tanto Monark como o deputado Kim Kataguiri que apontou que foi um erro a Alemanha ter criminalizado o partido nazista. O primeiro postou em suas redes sociais que estava bêbado e, ainda, o deputado, afirmou que sua fala estava no contexto, onde afirmou que a sociedade era mais paciente com o comunismo.

A Constituição Federal brasileira de 1988, na cabeça do seu art. 17, diz que é livre a criação de partidos políticos desde que se respeitem, dentre outras coisas, os direitos fundamentais da pessoa humana.

A Lei 7.716/89, em seu art. 20 e parágrafo primeiro, diz que será punido com reclusão de dois a cinco anos e multa aquele que “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” bem como “fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo”.

Há a previsão no Código Penal brasileiro, no seu art. 287, diz que fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime sujeita seu autor à detenção, de três a seis meses, ou multa.

Conclui-se que o nazismo ou neonazismo no Brasil é criminalizado e inconstitucional e, defendê-los corresponde a crime bem como ao outro delito, portanto, tipificado como apologia criminosa. Segundo estudiosos quem defende o nazismo, não apenas defende um sistema político, mas aquele que permite a existência de partido nazista, defende igualmente as premissas racistas.

Portanto, o nazismo fere de morte tanto o direito positivado bem como o espírito da Constituição Federal vigente que defende a igualdade e vida e, preservação da dignidade de toda vida humana.

O nazismo não é comparável ao comunismo visto que se trata de sistema de ideia lastrado na propriedade coletiva e também na repartição de renda conforme as necessidades individuais. A existência de um partido comunista não autoriza nem credencia a criação de partido nazista. E, não há no sistema comunista, a previsão de superioridade racial ou mesmo extinção de pessoas. Não obstante vários regimes comunistas em todo mundo tenham perpetrado vários crimes e, sejam, também imperdoáveis.

Os comunistas originalmente teorizam a abolição da propriedade privada e o coletivismo. Convém ainda, destacar que a reação das empresas de comunicação os demitindo é natural iniciativa e está na esfera da liberdade destas.

Dr. Augusto Aras, atual Procurador-Geral da República, ordenou investigação a respeito do possível cometimento de crime de apologia do nazismo em face do deputado federal Kim Kataguiri, do Partido Democratas, e pelo apresentador do podcast Flow, Monark. Na transmissão do podcast, referido apresentador demonstrou explicitamente que deveria existir partido nazista no Brasil e, defendeu o direito de ser antijudeu.

Por sua vez, o referido deputado federal apontou como erro a Alemanha ter criminalizado o partido nazista. As falas do deputado e do apresentador provocaram protestos de entidades judaicas.

Ressaltou a Associação nacional dos Procuradores da República que o direito à liberdade de expressão não é absoluto e, que repudiar o nazismo é tarefa permanente a ser reiterada por todos. O crime de apologia do nazismo é punível com até cinco anos de prisão. Estudiosos apontam que os grupos neonazistas no Brasil cresceram 270% em três anos, o trazem o temor por futuros ataques violentos.

O deputado Kim Kataguiri afirmou que a decisão do PGR tem cunho político, que vai colaborar com as investigações. Alegou que fez um discurso antinazista e que defendeu que o nazismo seja repudiado com veemência no campo ideológico para que as atrocidades nunca sejam cometidas novamente.

O direito à livre expressão do pensamento e de opinião não se reveste de caráter absoluto, porque se submete às limitações de natureza ética e jurídica. Os abusos no exercício da liberdade de expressão se legitimarão a posteriori, a reação do Estado, expondo aos infratores às sanções jurídicas tanto de índole penal como também de natureza cível.

Recordemos a tese defendida pelo Ministro Celso de Mello, do STF ao negar habeas corpus pedido pelo editor nazista Siegfried Ellwanger que foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul pelo crime de racismo e recorreu ao STF e, por oito votos a três, decidiu o Pleno do STF em negar o pedido.

Na mesma ocasião, salientou Ministro Celso de Mello que é certo que “publicações que extravasam, abusiva e criminosamente, os limites da indagação científica e da pesquisa histórica, degradando-se ao nível primário do insulto, da ofensa e, sobretudo, do estímulo à intolerância e ao ódio público pelos judeus (como se registra no caso ora em exame), não merecem a dignidade da proteção constitucional que assegura a liberdade de manifestação do pensamento”. (Vide: HC 82.424-2 RS).

O final da Segunda Grande Guerra Mundial traduziu total ruptura com o Positivismo Jurídico, considerado ser o maior responsável por conferir legitimidade às atrocidades do nazismo. Renegou-se as teorias que até então tinham servido de alicerce ao direito. E, a mais relevante era a obra de Kelsen, a Teoria Pura do Direito que fora colocada em evidencia servindo de legitimação do nazismo. Afinal, na visão de Kelsen, o fundamento de validade do direito estaria na hierarquia normativa, havendo subordinação das normas inferiores a outas superiores, o que na concepção não positivista afastaria qualquer possibilidade de que fosse conjecturado determinado conteúdo valorativo dentro do ordenamento jurídico.

A Lei do Reich seria legítima por derivar de uma estrutura estatal que validaria tal legislação positiva dentro da mais estrita legalidade. Assim, a teoria kelseniana servia de contribuição à manutenção do totalitarismo.

Contrapondo-se às teorias positivistas, por considerá-las omissas a uma valoração jurídica concernente ao conteúdo das normas, baseadas no uso da força para dar legitimidade ao direito, Radbruch desenvolve uma teoria de proteção aos direitos fundamentais, conhecida como fórmula de Radbruch3 , direcionada a resolver o conflito entre segurança jurídica e justiça, de forma que se deixasse em aberto a possibilidade de rejeitar a existência de leis que não fossem direito por apresentarem em seu conteúdo casos de extrema injustiça.

Assim, renegado estaria o lema segundo o qual “antes de tudo as hão de cumprir as leis, que propiciara a Adolf Hitler a criação e manutenção da mais terrível ditadura legal de nossos tempos.

O direito natural renascia no Velho Continente como uma alternativa desesperada para fundamentar uma ordem jurídica livre de injustiças, tendo em vista que já se encontrava consagrada a visão deturpada do Positivismo Jurídico associado ao Nacional-socialismo. Todavia, essa proposta de superação filosófica se baseava em argumentos infecundos, repetindo-se acusações pouco fundamentadas e reduzidas a mais pura retórica.

A aceitação de valores absolutos na construção do direito de determinada sociedade pressupõe a concepção de verdades que independem da experiência, fundamentando-se em uma realidade a priori. Como o positivismo jurídico “se caracteriza pela negação do direito natural e pelo apego ao direito que se dá na experiência” (TRAVESSONI GOMES, 2004), sua inclinação só pode ser oposta, de cunho relativista, coroada pelo mais puro ceticismo.

O relativismo filosófico se propõe a separar realidade e valor, promovendo uma distinção entre proposições realísticas e juízos de valores genuínos que, em última instância, não são baseados em um conhecimento racional da realidade, mas nos fatores emocionais da consciência humana. No campo jurídico, a tese relativista afastou da ciência do direito “quaisquer considerações sobre a legitimidade do direito, restando o papel descritivo, que considera apenas a validade de determinada norma ou de determinado ordenamento” (TRAVESSONI GOMES, 2004).

A ideia de que exista uma valoração absoluta sobre a qual se fundamenta determinado sistema político, estampa na ordem normativa um conteúdo emocional que lhe retira a neutralidade, abrindo-se precedentes para que o direito se estabeleça não só pelos fundamentos da lei, mas pelo que Hart denomina “sentimento do povo” (2002), verdadeiro contributo para que a sociedade se torne vulnerável ao fortalecimento de regimes despóticos, autocratas, cerceadores das liberdades individuais e opostos à égide democrática. Sob esse prisma, a autocracia seria o absolutismo político, encontrando paralelo no absolutismo filosófico, enquanto a democracia seria o relativismo político, tendo sua contraparte no relativismo filosófico (KELSEN, 2000).

Na democracia, é o relativismo filosófico que possibilita ao indivíduo participar do processo de conhecimento que conduz à criação de uma ordem jurídica democrática.

O equívoco originado a partir da formação de uma espécie de argumento geral contra o Positivismo Jurídico – reductio ad Hitlerum – é confirmado no curso da própria história, tanto é que o Nacional-socialismo, longe de ter se concebido a partir de uma legislação substancial, ergueu-se nos moldes de um movimento contra legem, impondo uma posição de subordinação das leis aos interesses do Reich.

Na visão de Bobbio (1995), “a ideologia jurídica do Nazismo era nitidamente contrária ao princípio juspositivista, segundo o qual o juiz deve decidir exclusivamente com base na lei, sustentando, ao contrário, que o juiz devia decidir com base no interesse político do Estado”.

O fundamento jurídico nacional-socialista é bem anterior à própria ascensão do regime e remonta a um período em que “os juízes se sentiram afrontados não só socialmente como funcionalmente, reagindo com irritação à exigência de atuarem como meros ‘serviçais das normas’” (MAUS, 2000).

As ambições do regime nazista, sustentadas na ideia de um sistema jurídico no qual prevalecesse o sentimento popular como um valor superior ao estrito cumprimento do dever legal, eram totalmente contrárias aos dogmas do positivismo[5].

As evidências históricas claramente demonstram que as grandes modificações perpetradas pelo Nazismo se basearam em maior medida em argumentos que evocavam valores suprapositivos, tendo em vista que o Estado alemão se encontrava diante de um típico regime de exceção, com a suspensão da ordem jurídica e sua substituição pelo comando do Terceiro Reich. Esse ambiente se mostrava completamente hostil às teorias juspositivistas que, defensoras de um relativismo filosófico, negavam a existência de verdades absolutas.

Segundo a valiosa doutrina do eminente Professor Miguel Reale Júnior, cujo parecer encaminhado à apreciação do Tribunal, analisa, com propriedade, a questão de parâmetros constitucionais que devem informar o processo de indagação da cláusula inscrita no artigo 5º, XLII da Constituição da República: In litteris:

   “Ressaltam, portanto, os valores fundamentais da dignidade da pessoa humana e da igualdade, como princípios básicos conformadores de nosso ordenamento jurídico. A igualdade a ser examinada neste parecer diz respeito à igualdade jurídica, que se apresenta outorgada e garantida a todos pelo reconhecimento da cidadania (art. 1º, II), que vem a ser o ‘o direito de ter direitos’, o primeiro dos direitos humanos, em razão do qual alguém se insere como um igual no seio da sociedade”.

Assim, é a cidadania um direito básico, na expressão do juiz Warren, citado por Celso Lafer, sem o qual se restará humilhado e degradado frente aos demais compatriotas.

O racismo, como posição político-ideológica que discrimina e segrega um grupo de pessoas em face de sua raça, etnia, origem nacional ou descendência, visa, antes de tudo, a retirar-lhes exatamente a cidadania, a participação igualitária no espaço público, “o direito de ter direitos”.

Apesar da extrema relevância que desempenham as ordens jurídicas democráticas, os direitos fundamentais não são absolutos diante da necessidade de proteção de outros bens jurídicos diversos, também revestidos de envergadura constitucional, o que pode acarretar restrições aos direitos fundamentais.

Segundo o Ministro Barroso em sua doutrina afirma que não existe hierarquia em abstrato entre os princípios, devendo a precedência relativa de um sobre o outro ser determinada à luz do caso concreto.

Conclui-se, obviamente, que os direitos fundamentais[6] não são absolutos, e ipso facto, seu exercício resta sujeito aos limites e, por serem, em geral, estruturados como princípios, os direitos fundamentais em diversas situações, são aplicados mediante a ponde reação.

Referências

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[1] O nazismo, sendo uma das expressões do fascismo se caracteriza por: nacionalismo (pois colocava os interesses da nação como primordiais); militarismo (radicando na ação militar como meio de solução de problemas econômicos e sociais do país, principalmente, na garantia de estabilidade da ordem social); autoritarismo (restringindo a participação política e centrando o poder na figura do líder); anticomunismo (apontando os comunistas como os responsáveis por todos os problemas sociais); e idealismo (estimulando a irracionalidade como meio de adesão às propostas políticas de solução de problemas nacionais). Enfim, o nazismo se destacou dos demais fascismos por seu caráter racista e, por acreditar existir uma raça superior, formada pelos ariados, povos do norte da Europa e identificados nos povos germânicos. Hitler apontava a extrema necessidade de exclui os judeus considerados como culpados pelos problemas alemães e pelo comunismo, bem como os homossexuais e ciganos. Quanto aos eslavos, Hitler pretendia transformá-los em escravos por serem considerados sub-homens.

[2] Ao longo das últimas décadas, as pesquisas genéticas revelaram duas grandes verdades a respeito das pessoas. A primeira é que todos os seres humanos são estreitamente aparentados – um parentesco mais próximo do que o existente entre os chimpanzés, por exemplo. Todas as pessoas têm a mesma coleção de genes, mas, fora os gêmeos idênticos, todos carregamos versões ligeiramente diferentes de alguns desses genes. Os estudos sobre essa diversidade genética permitiram aos cientistas traçar uma espécie de árvore genealógica das populações humanas. E assim eles chegaram a uma segunda verdade fundamental: num sentido muito concreto, todas as pessoas que vivem hoje são de origem africana. Para os cientistas, raça é uma ideia sem nenhum fundamento – apenas um rótulo, usado para nos separar uns dos outros. In: KOLBERT, Elizabeth. Não há base científica para raça – trata-se de rótulo inventado. Disponível em:  https://www.nationalgeographicbrasil.com/2018/04/raca-nao-existe-conceito-cientifico-racismo-revista Acesso em 11.02.2022.

[3] A última edição de 2005 engloba 30 volumes com 24,5 mil páginas, cerca de 300 mil entradas e 40 mil gráficos e fotos. Esta edição também está disponível de forma digital, cabendo num cartão de memória USB.

[4] A Saudação de Bellamy é o gesto de mão descrito por Francis Bellamy (1855-1931), claramente baseada na saudação romana, em que se ergue o braço para cima para acompanhar a garantia americana de fidelidade. Durante o período que foi usado como garantia de fidelidade, também era usada às vezes como “saudação à bandeira”. Foi usado primeiramente em 12 de outubro de 1892 de acordo com instruções publicadas de Bellamy para “a celebração nacional da escola do dia de Columbo”. A saudação civil inicial foi substituída com o gesto da mão no coração, seguido pela extensão do braço como descrita por Bellamy. Por causa da similaridade entre a saudação de Bellamy e a saudação à Hitler, o presidente Franklin D. Roosevelt instituiu o gesto da mão sobre o coração como a saudação a ser feita por civis durante a garantia da fidelidade ao hino nacional dos Estados Unidos, em vez da saudação de Bellamy. Isto foi feito quando o congresso adotou oficialmente o código da bandeira em 22 de junho de 1942.

[5] As definições dadas por autores que pertencem ao positivismo jurídico no sentido amplo do termo coincidem na afirmação que o direito é um conjunto de normas formuladas e postas em vigor por seres humanos. Austin observava que o direito “decorre de fontes humanas” e Kelsen considerava que “somente o direito posto por seres humanos é direito positivo”. O direito surge de atos de vontade da autoridade legislativa cujos titulares e procedimentos são diferentes em cada período histórico, sendo, porém, sempre vinculantes. Isso é um ponto de partida teórico que vale independentemente do grau de liberdade “criativa” que será reconhecida aos órgãos encarregados da aplicação das normas positivadas. Nessa perspectiva, o positivismo jurídico no sentido amplo define o direito com base em elementos mutáveis no tempo. Esse posicionamento é indicado como: – tese do fato social ou tese social (social fact thesis; social thesis); – tese da fonte (source thesis) ou das fontes sociais (social sources of the law); – tese convencionalista (conventionality thesis). Esses termos indicam que a validade das normas jurídicas depende de condutas humanas (individuais e coletivas) que criam as normas, isto é, tornam certos comandos juridicamente existentes e vinculantes. Exclui-se, assim, a possibilidade de encontrar normas jurídicas que não decorram da vontade de um legislador humano. Quem possui a capacidade de criar o direito são certas constelações de condutas humanas que constituem os fatos sociais nos quais se consubstancia a legislação (law-determining facts). O positivismo jurídico no sentido amplo é uma teoria monista sobre o direito, contrastando o dualismo jurídico que admite a existência de um direito natural ao lado do direito criado por legisladores humanos.19 Em virtude disso, o positivismo jurídico no sentido amplo se define, de forma negativa, a partir da categórica e absoluta exclusão do direito natural da definição do direito vigente.

[6] Desta forma, os princípios e os direitos fundamentais revelam-se como efetivos parâmetros à atividade de criação judicial, exigindo uma interpretação concretizadora, que lhes dê o máximo de proteção e satisfação, resultado de uma tarefa de hierarquização entre os valores em jogo, em que o juiz contemporâneo há de estar consciente de seu papel e missão, não podendo se eximir da responsabilidade decorrente de suas escolhas, em um espaço discricionário que lhe é próprio, pois não é mero reprodutor das palavras da lei (a boca da lei), detrás das quais se pode ocultar um tempo passado. É, sim, autêntico criador do Direito, operário das transformações desejadas pela sociedade à que serve.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele. Apologia ao nazismo é crime. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2022. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/apologia-ao-nazismo-e-crime/ Acesso em: 19 abr. 2024