Direito Penal

Baseado na Lei de Drogas

BASEADO NA LEI DE DROGAS[1]

Elioenai Araújo Mendonça[2]

1 DESCRIÇÃO DO CASO

No caso em tela, trata-se de uma abordagem policial que cominou em revista ao veiculo automotor e pessoal. Entretanto o amigo o qual eu estava dando carona no veiculo, estava trazendo consigo quinhentos gramas de maconha acondicionados em papel filme, sem meu conhecimento.

Diante da revista policial, foi encontrado no bolso do meu amigo a substancia ilegal, o qual admitiu a posso da droga e informando meu total desconhecimento do ilícito. Pelo ocorrido, o meu amigo foi levado ate a delegacia de plantão mais próxima.

Através do fato questiona-se: Em qual crime a conduta do seu amigo pode ser tipificada?

2 POSSÍVEIS DECISÕES

2.1 No caso em tela a conduta do rapaz possuir das 500 gramas de maconha, é tipificada como tráfico de drogas.

2.2 No caso em tela a conduta do rapaz possuir das 500 gramas de maconha, é de posse de drogas para consumo pessoal.

3 ARGUMENTOS CAPAZES DE EMPASAR CADA POSIÇÃO

3.1 Primeiramente é importante expor que o núcleo do tipo penal do crime de tráfico de drogas possui dezoito possibilidades de incidências para que a conduta do agente se enquadre no tipo penal em questão, somente no caput do art. 33 da Lei nº 11.343/06. Trazendo o descrito legal ao caso em tela, o vizinho, ao trazer consigo a quantidade de quinhentos gramas de maconha sem determinação legal, enquadrou-se no rol das condutas para a tipificação do crime de trafico de drogas. (BRASIL, 2006)

É importante citar a conduta dolosa do rapaz, visto que o dolo se reflete através da vontade do agente em produzir o resultado ou assumindo o risco de produzir um resultado. Entretanto, como o crime de trafico de drogas é um crime de mera conduta, bastando apenas a conduta do agente para a configuração do crime, o agente assumiu o risco da sua conduta criminosa e, por conseguinte reafirmando a sua vontade no cometimento do crime em foco. (JESUS, 1998). Como supedâneo para o entendimento da conduta do agente, Capez conceitua a conduta:

A exteriorização da conduta por meio de uma ação ou omissão não é suficiente, porém. O Direito Penal só empresta relevo aos comportamentos humanos que tenham, na vontade, a sua força motriz. As pessoas humanas, como seres racionais, conhecedoras que são da lei natural da causa e efeito, sabem perfeitamente que de cada comportamento pode resultar um efeito distinto (sabe-se que o fogo queima, o impacto contundente lesiona ou mata, a falta de oxigênio asfixia, a tortura causa dor etc.). (CAPEZ, 2011. p.137)

Neste diapasão, corrobora com o posicionamento da vontade em desempenhar tal conduta pelo vizinho, o STJ de Paraná através do enquadramento da consumação do crime em comento pela mera conduta do agente em um dos núcleos do crime:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. REVOLVIMENTO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. […] 2. Cumpre ressaltar que o crime de tráfico é de ação múltipla, pois apresenta várias formas objetivas de violação do tipo penal, bastando, para a consumação do ilícito, a prática de um dos verbos ali previstos (adquirir, vender, expor à venda, ter em depósito, transportar, trazer consigo, etc.). […] 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 736729/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 23/04/2013, DJe 02/05/2013). (BRASIL, 2013.p.1)

Através dos argumentos por expostos doutrinários e jurisprudências, confirmação o enquadramento da conduta do agente em foco, como crime de trafico de drogas, pelo art. 33 da Lei nº 11.343/06.

3.2 Deste foco, é importante ressaltar que a diferença para a tipificação de uma conduta em crime de posse de drogas para consumo pessoal e tráfico de drogas é muito tênue. Caso não se tenha elementos contextuais para a tipificação, como a flagrância no ato de consumir, para configurar o primeiro crime, ou a flagrância no ato de mercantilizar através de venda ou oferecimento, para um enquadramento claro e concreto do segundo crime, torna a diferenciação muito delicada. Diante disto, cabe a identificação do elemento subjetivo do agente para que tal distinção seja feita, ou seja, a vontade do agente que possuía a substância em ter a mesma apenas para consumo próprio ou para que fosse mercantilizada (SANTOS, 2010).

Entretanto, podemos usar de uma vertente para corroborar a necessidade de imputação ao vizinho da conduta que lhe seja menos gravosa, pela duvida e falta de provas suficientes e carência de ações do agente no ato do flagrante. Ou seja, tomando como base o princípio do “in dubio pro reo”, o qual pela duvida de quando a materialidade do crime, o réu processado é beneficiado de alguma maneira. Trazendo tal vertente para o caso em foco, na duvida em questão, onde não se tem a pratica de uma mercantilização da maconha, visto que a erva foi encontrada sob o poder do vizinho, porem este não exercia atividade nenhuma sobre a mesma. (MIRABETE, 2002) É importante citar que a estipulação de penalização vem através do grau de reprovabilidade e consequências a sociedade, deste modo, a conduta a qual o vizinho foi pego, tem menor grau de lesividade do que de fato uma venda ou oferecimento de substancia entorpecentes ilegais. Para corroborar a tal ideia de reprovabilidade e pena, cita-se:

Se os cálculos exatos pudessem aplicar-se a todas as combinações obscuras que fazem os homens agir, seria mister procurar e fixar uma progressão de penas correspondente à progressão dos crimes. […] Bastará, contudo, que o legislador sábio estabeleça divisões principais na distribuição das penas proporcionadas aos delitos e que, sobretudo, não aplique os menores castigos aos maiores crimes. (BECCARIA, 1997. p. 127)

Através de tal fato, e corroborando a conduta em tela com o principio da culpabilidade, a reprovabilidade da conduta citada possui menos efeito do que a conduta propriamente dita de mercantilização (o ato de estar vendendo ou oferecendo). Com isto a pena para uma conduta com menor grau de gravidade e reprovabilidade deve ter sua pena mensurada de forma equiparada, e não uma tipificação e mensuração de pena mais gravosa.

O principio da culpabilidade deve ser entendido, em primeiro lugar, como repudio a qualquer espécie de […] ou responsabilidade objetiva. Mas deve ser igualmente entendido como exigência de que a pena não seja infringida se não a conduta do sujeito, mesmo associada causalmente ao resultado, lhe seja reprovável. Para além de simples laços subjetivos entre o autor e o resultado objetivo de sua conduta, assinala-se a reprovabilidade da conduta como fundamento para o limite da pena. (BATISTA, 2007. p. 103)

4. QUESTÕES SECUNDARIAS

4.1 Existe legitimidade policial para efetuar a prisão em flagrante do seu amigo?

Sim. Através do exposto nas argumentações anteriores, fica evidente o cometimento de um crime pelo vizinho/carona, não precisando ser especificada a tipificação no art. 28 ou art. 33 da Lei de Drogas, para a conduta ser prevista com delituosa. Diante disto, a legitimidade de prender em flagrante delito é chancelada pelo Código de Processo Penal (CPP) à qualquer um do povo, conforme depreende no art. 301 do CPP. Por tal fato os policiais além de possuírem o dever legal de combater a criminalidade, também lhes é reafirmado a legitimidade de prender em flagrante delito. (BRASIL, 1941) Através da conduta criminosa, configura-se o delito presenciado em tela pelos milicianos, enquadrando o fato no art. 302 do CPP:

 Art. 302.  Considera-se em flagrante delito quem: I – está cometendo a infração penal; II – acaba de cometê-la; III – é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV – é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração. (BRASIL, 1941)

4.2 Qual a relação existente entre o discurso oficial do direito penal e do Estado sobre o crime em questão e a prática das Instituições do sistema penal?

A relação do discurso oficio do direito penal e do estado aos crimes em geral, estes tem a ideia de um sistema de controle social justo e eficaz. Tais entes procuram mostrar que o agente causador de u delito irá ser levado a condenação somente depois de todas etapas processuais penais cumpridas de forma legal, sem ferir nenhum principio norteador do direito processual penal. Ou seja, e enquanto sob a tutela estatal todos os seus direitos serão garantidos, e caso seja preso, o indivíduo que regressará à sociedade, devidamente ressocializado e pronto para ter uma vida digna como qualquer outro cidadão, concluindo-se, dessa forma, um ciclo sistemático.

Entretanto, a realidade prática das instituições do sistema penal foge a tal discurso garantista. O próprio Zaffaroni coloca que o discurso legal do direito penal e do estado, quando comparado com a realidade fática destoa do perfil pregado (ZAFFARONI, 2001). Tal critica é reafirmada por Nilo Batista:

[…] Assim, o sistema penal é apresentado comoigualitário, atingindo igualmente as pessoas em função de suas condutas […] O Sistema penal é também apresentado comojusto, na medida em que buscaria prevenir o delito, restringindo sua intervenção aos limites da necessidade […] quando de fato seu desempenho érepressivo,seja pela frustração de suas linhas preventivas, seja pela incapacidade de regular a intensidade das respostas penais, legais ou ilegais. Por fim, o sistema penal se apresenta comprometido com a proteção da dignidade humana […] quando na verdade é estigmatizante, promovendo uma degradação na figura social de sua clientela. […](2007, p. 25-26)

Neste diapasão tem-se uma contraposição entre o discurso legal e principiológico do Direito Penal e Estado, com a realidade pratica das instituições penais.                                                                                                                                                           

5. CRITÉRIOS E VALORES

Os critérios utilizados no presente trabalho tiveram como base dispositivos legais, princípios fundamentais do Direito Penal e Processual Penal, elencados no decorrer da pesquisa. Ainda, posições doutrinárias sobre o enquadramento do caso em questão. E como suplementação, posicionamento do Supremo Tribunal de Justiça em um Agravo de Recurso Especial, para dar maior embasamento prático ao fato.

REFERÊNCIAS

BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 11ª Ed. 2007.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: RT. 2º Ed. 1997.

BRASIL. LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 31 mar. 2017

BRASIL. LEI Nº 11.343, DE 23 DE AGOSTO DE 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências.. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em: 31 mar. 2017

BRASIL STJ, 736729 – PR, rel. Min. Geraldo Og Nicéas Marques Fernandes j. 23/04/2013, DJ 02/05/2013. Disponível em: < https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23315692/agravo-regimental-no-recurso-especial-agrg-no-resp-736729-pr-2005-0046081-9-stj>. Acesso em 1 de abril de 2017.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, volume I. São Paulo: Saraiva, 11º Ed. 2011.

JESUS, Damásio de. Direito Penal parte geral. São Paulo: Saraiva, 21º Ed. 1998.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, volume I. São Paulo: Atlas, 18º Ed. 2002.

SANTOS, Juarez Cririno dos. Direito penal, parte geral. Florianópolis: Conceito Editorial, 4ª edição. 2010.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal. Rio de Janeiro: Editora Revan. 5ª Ed. 2001



[1] Case apresentado à disciplina Direito Penal Especial na Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluno(a) do quinto período, do curso de Direito, da UNDB.

Como citar e referenciar este artigo:
MENDONÇA, Elioenai Araujo. Baseado na Lei de Drogas. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2017. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/baseado-na-lei-de-drogas/ Acesso em: 29 mar. 2024