Em mais que boa hora, a CPI da Tortura adota diligências há muito reclamadas pela sociedade. Tortura é crime hediondo, terrivelmente perverso! Data de outras eras, quando com requintes de crueldade, de desrespeito pelo ser humano, pela sua origem, pela sua dignidade, foi praticado largamente.
Em outro contexto, mas como naqueles outros tempos, a prática de torturar continua em vigor. Não obstante a repulsa que causa, pode-se dizer que não há punição. Entre outros motivos, se inclui a omissão da parte dos que devem apurá-los. Outras, porque na ausência de perquirição do iter criminis, de tudo, acabam restando simples lesões corporais que retêm a atenção de quem examina o inquérito, não sendo diferente na ocorrência de lesões graves.
Felizmente a ênfase dada aos direitos humanos mudou a ótica daqueles a quem compete agir. Uma observação mais aguçada passa a ter vez e já se pode contar com um número, se não considerável de denúncias, ao menos evidenciador da chegada de novos tempos.
A lei que trata deles é clara, bem lida será melhor assimilada.
A conduta no ato de torturar pode-se dar por ato comissivo isto é, pela prática tal e qual de violência ou ameaça que causa sofrimento físico ou moral, ou por omissão. Fixo-me nesse segundo caso, traduz a inércia, o não agir da parte de quem está obrigado por ofício e ao invés se queda complacente, em face dela. Deveria evitá-la. Daí, incorrerer no § 2º do art. 1º da lei: – “Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos”.
Pode ser caso do secretário de segurança pública, do chefe de polícia civil, do comandante geral da polícia militar ou do corregedor geral, do delegado de polícia civil, do garante ou quem por determinação legal ou regulamentar tiver obrigação de apurar sempre que tomar conhecimento da ocorrência de tortura.
A Lei é enérgica, prevê penas altas, veda o direito de graça ou indulto, o crime se inclui entre os considerados hediondos.
O destaque não significa esquecimento de que a pena na sua origem, não se destina à aflição de qualquer sorte, antes se constitua em fator que iniba a prática do crime. Mas não havendo apuração, como haverá ação e quanto mais pena!?
Crime como toda ação humana é resultado de um complexo de precedentes que se desenvolvem pelo caráter do indivíduo. Bons ou maus os sentimentos, as tendências, enfim, qualquer modelador do caráter terá um momento de plenitude em que se manifesta e o faz de acordo com a forma com que tiver sido a seu tempo, progressivamente modelado.
Na sua encantadora sabedoria, os antigos diziam “é preciso cortar o mal pela raiz”. Penso que ainda não se conheça caso em que tenha sido apurada a responsabilidade dos torturadores por omissão.
Esta se pode configurar na melhor forma para começar a reduzir a ocorrência do crime, via de conseqüência, de termos que pagar um preço tão alto pelas suas conseqüências.
* Marlusse Pestana Daher, Promotora de Justiça, Ex-Dirigente do Centro de Apoio do Meio Ambiente do Ministério Público do ES; membro da Academia Feminina Espírito-santense de Letras, Conselheira da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Vitória – ES, Produtora e apresentadora do Programa “Cinco Minutos com Maria” na Rádio América de Vitória – ES; escritora e poetisa, Especialista em Direito Penal e Processual Penal, em Direito Civil e Processual Civil, Mestra em Direitos e Garantias Fundamentais.