STF

STF – RE 158.676-1 – MG

Supremo Tribunal Federal

Coordenadoria de Análise de Jurisprudência

DJE n° 117 Divulgação 04/10/2007 Publicação 05/10/2007

DJ 05/10/2007

Ementário nº 2292-3

 

14/08/2007 – PRIMEIRA TURMA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 158.676-1 MINAS GERAIS

RELATOR ORIGINÁRIO: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

RELATOR PARA O ACÓRDÃO: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE

RECORRENTE(S): TELEMAR NORTE LESTE S/A

ADVOGADO (A/S): MARCELO LUIZ ÁVILA DE BESSA E OUTROS

RECORRIDO (A/S): ENAC EDITORA NACIONAL DE GUIAS LTDA

ADVOGADO (A/S): NARCISO MOURA MACHADO COELHO E OUTROS

 

EMENTA: Serviços de Telecomunicações. Exploração. Edição de Listas ou Catálogos Telefônicos e Livre Concorrência.

Se, por um lado, a publicação e distribuição de listas ou catálogos telefônicos constituía um ônus das concessionárias de serviço de telefonia – que podem cumpri-lo com ou sem a veiculação de publicidade – não se pode dizer que estas tinham exclusividade para fazê-lo.

O artigo 2º da L. 6.874/80 (“A edição ou divulgação das listas referidas no § 2o do art. 1o desta Lei, sob qualquer forma ou denominação, e a comercialização da publicidade nelas inserta são de competência exclusiva da empresa exploradora do respectivo serviço de telecomunicações, que deverá contratá-las com terceiros, sendo obrigatória, em tal caso, a realização de licitação“) era inconstitucional – tendo em vista a Carta de 1969 – na medida em que institui reserva de mercado para a comercialização das listas telefônicas em favor das empresas concessionárias.

RE desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Sr. Ministro Sepúlveda Pertence, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em negar provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto do Ministro Sepúlveda Pertence, Relator para o acórdão.

Brasília, 14 de agosto de 2007.

SEPÚLVEDA PERTENCE – RELATOR P/ ACÓRDÃO

 

23/03/99 – PRIMEIRA TURMA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 158.676-1 MINAS GERAIS

RELATOR: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

RECORRENTE: TELECOMUNICAÇÕES DO RIO DE JANEIRO S/A – TELERJ

ADVOGADO: MÁRCIA GOMES VIEIRAS BRANDÃO DE OLIVEIRA E OUTROS

RECORRIDA: ENAC EDITORA NACIONAL DE GUIAS LTDA

ADVOGADO: NARCISO MOURA MACHADO COELHO E OUTROS

 

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO OCTAVIO GALLOTTI: Trata-se de ação proposta em 4 de janeiro de 1985 por concessionária de serviços de telecomunicações, visando à apreensão de exemplares de listas telefônicas editadas e distribuídas pela ré sem autorização para fazê-lo, cumulativamente com pedido de indenização e, ainda, da abstenção de novas publicações, sob pena de multa diária.

Julgada procedente (fls. 415/7), veio a ser, todavia, reformada a sentença pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais, em 29 de outubro de 1991, com apoio na seguinte fundamentação, expendida pelo relator, Ilustre Juiz XIMENES CARNEIRO:

“02. b. A ré Editora. Nacional de Guias editou o que denominou guia comercial, contendo dados a respeito dos clientes, nos moldes dos catálogos telefônicos, mas acentuando que o seu valor está mais nas informações veiculadas que nos telefones relacionados, motivo a não incidir a proibição contida na Lei 6.874 de 3 de dezembro de 1980, que dá à empresa exploradora do serviço de telecomunicações a exclusividade na edição ou divulgação das guias e a comercialização da publicidade nelas inserta (art. 2o).

A ré argumenta que a autora ficou mais de três anos sem cumprir com a sua obrigação de editar os catálogos telefônicos, desobedecendo a determinação ministerial, pretendendo aproveitar, agora, um trabalho de pesquisa que antecedeu a própria Lei 6.874/80, pois o guia comercial é editado desde 1974.

A editora Nacional de Guias menciona o conflito da Lei 6.874/80 com a Constituição da República que admite a livre concorrência (art. 170, IV), pois nada mais fez que atuar em um mercado que não interfere no serviço público concedido.

Outrossim, a autora que procura impedir a edição de guias e lucrar com o serviço realizado pela ré, não se preocupou em cumprir com seus deveres perante as usuários dos serviços de telefonia, editando ou fazendo editar as oficiais, sacrificando o povo com um serviço deficiente, pois inclusive para se obter informações a respeito de assinante o interessado deve pagar, quando isso seria dispensável se existentes os catálogos atualizados anualmente.

A edição dos catálogos telefônicos não se inclui no serviço de telefonia, cuja exploração depende de concessão da União (art. 21, XI, Constituição Federal), pelo que a Lei não podia mesmo impedir que a ré atuasse nessa área, tendo em vista a livre concorrência.

A matéria hoje é realmente tranquila, porque já se dispõe o governo a liberalizar a economia, com a revogação de lei beneficiadoras de cartéis, ajustando-a aos parâmetros constitucionais.

A improcedência do pedido, por isso se impõe.

Do exposto, dá-se provimento a apelação julgando-se improcedente o pedido, com a condenação da autora ao pagamento das custas do processo e dos honorários advocatícios do patrono dos réus, arbitrados em 20% sobre o valor atualizado da causa.” (fls. 441/3)

Daí o recurso extraordinário interposto com base nas alíneas a e b do art. 102, III, da Constituição.

Sustenta, em suma, a TELERJ, que, tanto nos termos do inciso XV, a do art. 8o da Constituição de 1967 (Emenda n° 1-69), como, sem diferença significativa, na forma do item XI do art. 21 da Carta de 1988, de que teria feito letra morta o acórdão, está compreendida, na competência da União, a exploração do serviço de telecomunicações. Neste se inseriria, por sua vez, a prerrogativa da publicação dos catálogos de assinantes, sem lugar, destarte, para opor o principio da livre iniciativa às disposições da Lei n° 6.874-90, que atribuíram, às empresas exploradoras de serviços públicos de telecomunicações, a edição das listas telefônicas e já teve ocasião de ser aplicada pelo Supremo Tribunal ao apreciar o Recurso Extraordinário n° 97.496.

Admitido o recurso, oficiou, às fls. 548/61, o eminente Dr. ARISTIDES JUNQUEIRA ALVARENGA, então Procurador-Geral da República, que, após descrever a controvérsia, assim opina pelo provimento do apelo:

“8. A Emenda Constitucional de 1969 assim dispunha em seu artigo 8º, inciso XV:

“Art. 8o – Compete a União:

……………………………………………………………………..

XV – explorar diretamente ou mediante autorização ou concessão:

a) os serviços de telecomunicações;”

9. Já a vigente Carta Federal preceitua, em seu art. 21, inciso XV, que:

“Art. 21 – Compete à União:

…………………………………………………………………….

XI – explorar, diretamente ou mediante concessão a empresas sob controle acionário estatal, os serviços telefônicos, telegráficos, de transmissão de dados e demais serviços públicos de telecomunicações, assegurada a prestação de serviços de informações por entidades de direito privado através da rede pública de telecomunicações explorada pela União;”

10. O artigo enumera os serviços explorados diretamente pela União e a edição de catálogos telefônicos está, sem sombra de dúvidas, incluída entre os demais serviços públicos de telecomunicações, conforme será demonstrado.

11. .A Lei n° 6.874, de 1980, ora questionada, assim prescreve em seus artigos 1o e 2o:

“Art. 1º – A empresa exploradora de serviços públicos de telecomunicações é obrigada a divulgar, periodicamente, a relação de assinantes, nas condições definidas em regulamento.

§ 1º – A numeração das instalações telefônicas constitui atribuição da empresa exploradora dos serviços públicos de telecomunicações, sendo de sua exclusiva competência a designação dos números de telefones, bem como a sua substituição.

§ 2° – É gratuita e obrigatória a figuração do assinante:

a) na lista telefônica organizada, por ordem de nomes de assinantes, da respectiva localidade – Lista de Assinantes;

b) na lista organizada por ordem de atividades ou produtos dos assinantes da respectiva localidade – Lista Classificada;

c) na lista organizada por ordem de endereços dos assinantes de respectiva localidade, editada bienalmente, em função do número de habitantes – Lista de Endereços.

§ 3º – Mediante o atendimento de condições estabelecidas pelo Ministério das Comunicações, será facultado ao assinante não figurar em qualquer lista telefônicas.”

“Art. 2° – A edição ou divulgação das listas referidas no §  2º, do artigo 1º, desta Lei, sob qualquer forma ou denominação, e a comercialização da publicidade nela inserta são de competência exclusiva da empresa exploradora do respectivo serviço de telecomunicações, que devera contratá-las com terceiros, sendo obrigatória, em tal caso, a realização de licitação.

§ 1º – A edição ou a reprodução, total ou parcial, de qualquer das listais referidas no § 2o, do artigo 1º, desta Lei, sem a necessária contratação nos termos previstos neste artigo, sujeita quem a efetue à busca e apreensão dos exemplares e documentos a eles pertinentes, além da indenização correspondente ao valor da publicidade neles inserta.

§ 2º – Todas as listas telefônicas deverão obedecer, no mínimo, aos padrões gráficos de legibilidade estabelecidos pelo Ministério das Comunicações.

§3º – É facultada a edição de Lista de Assinantes de âmbito restrito, sem finalidade comercial e de distribuição gratuita, conforme disposto em regulamento.”

12. Já o artigo 170, inciso IV, da Carta Magna, estabelece a livre concorrência, mas, tal norma, não retira do Estado o poder de atuar com exclusividade em determinado setor. No caso das telecomunicações, prevalecia e prevalece o monopólio estatal.

13. A ementa do Recurso Extraordinário nº 97.496-2 – São Paulo, cujo acórdão foi prolatado em 7.4.1989, reconhece a eficácia da Lei n° 6.874, de 1980, promulgada após ter sido proferido o acórdão recorrido, como se vê a seguir:

EMENTA: – Listas telefônicas: edição por empresa privada.

Lei nº 6.874, de 03.12.80.

Tendo sido negado, na instância “a quo”, o direito de a recorrente, empresa privada, editar listas telefônicas, é de se considerar prejudicado o recurso extraordinário, se lei posterior ao acórdão recorrido, a de n° 6.874, de 03.12.80, deixou expresso que cabia às próprias empresas exploradoras de serviços públicos de telecomunicações a edição de tais publicações.”

14. Em seu relatório, no citado recurso, o Senhor Ministro-Relator, ALDIR PASSARINHO, transcreve voto do Senhor Ministro TORREÃO BRAZ que, por sua vez, transcreve parecer do ilustre jurista VICTOR NUNES LEAL sobre a matéria, e que cabe ser adotado, aqui, por sua pertinência:

“Resta saber, para o desate da controvérsia, se os números e códigos telefônicos constituem elementos integrantes do serviço concedido.

O eminente administrativista Victor Nunes Leal, em parecer junto aos autos, posto que negando a existência de “nexo de dependência entre a operação do serviço telefônico, finalidade objetivada pela concessão, e a exploração de propaganda comercial nas listas telefônicas” diz com todas as letras que a publicação da lista de assinantes integra o objeto da concessão, arrematando (folhas 37): “A obrigação de organizar, publicar e distribuir as listas de assinantes pode ser legitimamente imposta ao concessionário, como parte dos encargos que a tarifa deverá cobrir”. Acontece que, se essa publicação compõe o objeto da concessão, está igualmente abrangida pelo privilégio a esta conferido, não sendo possível dissociar a parte do todo para efeito de tratamento diverso. Ela é indissociável da concessão porque representa meio necessário a consecução do fim visado pelo poder concedente, tanto quanto a central, os fios de interligação e os cabos.

O repositório de informações sobre o número ou código de cada assinante sempre foi conceituado como bem patrimonial da concessionária, a qual cabe, em caráter exclusivo, a sua organização e publicação. Esse conceito está incorporado a tradição do nosso direito, conforme anotaram alguns eminentes juristas que emitiram parecer a respeito do tema, a exemplo, aliás, do que vem sendo observado em outros países.

Veja-se, na Itália, o magistério (de Pugliese, para quem o direito de publicação do elenco é ínsito ao direito geral do concessionário, porque tal elenco constitui um meio indispensável e incindível do serviço telefônico.

O ilustre especialista, que o citou ainda, aludiu ao modelo vigente na Inglaterra, Espanha e México e trouxe à colação decisão da Justiça norte-americana, reconhecendo ao exercente do serviço o direito de exclusividade na edição das páginas amarelas.

Não se pode,  conforme assinalou, com a acuidade de sempre, o Prof. Hely Lopes Meirelles, “inverter e converter a finalidade das listas de assinantes, de elemento do serviço telefônico em veículo de publicidade comercial, para concluir-se que a sua elaboração é atividade empresarial livre, da economia privada, refratária a qualquer regulamentação”. Semelhante concepção não vinga sequer nos Estados Unidos da América, pátria da liberdade de iniciativa.

Em suma os números e códigos telefônicos integram o serviço público de telefonia, monopólio constitucional da União, o qual, por isto mesmo, está sujeito às normas regulamentares, baixadas pelo Governo Federal, inserindo-se, entre estas, a que veda a produção ou reprodução total ou parcial, distribuição ou venda das listas de assinantes (DEC. n° 57.611/66, citado, art. 23, § 4o). A exclusividade abrange todo o objeto da concessão e decorre naturalmente do privilégio outorgado pelo legítimo titular do monopólio.

O ato impugnado teve fulcro na mencionada regulamentação, não havendo corno tachá-la de ilegal.”

15. Sendo a edição de catálogos telefônicos monopólio estatal, as disposições da Lei n° 6.874, de 1980, se harmonizam com o atual Texto Constitucional, e foram por ele recepcionadas.

16. O próprio Tribunal de Contas da União, conforme tem noticiado os jornais, vem exigindo das empresas exploradoras dos serviços de telecomunicações, a prévia licitação na edição de listas telefônicas, o que reforça a tese do monopólio estatal.

17. Pelo exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL opina no sentido de que se dê provimento ao recurso, considerando compatível, com a Carta Federal, a Lei n° 6.874, de 3 de dezembro de 1980.” (fls. 554/61)

É o relatório.

 

PRELIMINAR DE INEXISTÊNCIA DO RECURSO

O SENHOR MINISTRO OCTAVIO GALLOTTI – (Relator):  Em memorial apresentado pelo ilustre advogado Arnaldo Leite Soares, suscita a recorrida preliminar de inexistência do recurso extraordinário, sustentando, nesse intento:

a) a falta de reconhecimento da firma do substabelecimento da procuração, anexado com a inicial (fls. 9v°) à Dra. Márcia G. V. E. B. de Oliveira, que viria a ser a única subscritora da petição de recurso extraordinário;

b) revogação dessa mesma procuração por novo instrumento, outorgado a outros advogados e apresentado simultaneamente com a petição de extraordinário (fls. 469).

Verifico, quanto à primeira objeção, achar-se ela superada pela juntada,  às fls. 354v°, de nova procuração diretamente outorgada, e com firma reconhecida, à Dra. Márcia de Oliveira.

No tocante à arguição sub alíena b,  não a reputo autorizada pelos termos do instrumento superveniente de fls. 469, que, se havendo ocupado em dispor sobre a revogação de mandato anterior, não contemplou, nessa restrição, o conferido a advogada em questão.

Observo, ademais, que, tendo sido anexado com a petição esse instrumento revogador adventício, a ele estender-se-ia o mesmo vicio da petição que o fez anexar, não sendo possível contemplar o efeito da nova procuração, sem antes placitar o da petição que lhe daria existência nos autos.

Rejeito, assim, a preliminar.

 

VOTO MÉRITO

O SENHOR MINISTRO OCTAVIO GALLOTTI – (Relator): Acha-se claramente prequestionado o tema da petição de recurso extraordinário, como se depreende do ponto nuclear do acórdão recorrido que não é demais ressaltar, perante a Turma:

“À edição dos catálogos telefônicos não se inclui no serviço de telefonia, cuja exploração depende de concessão da União (art. 21, XI, da Constituição Federal), pelo que a Lei não podia mesmo impedir que a ré atuasse nessa área, tendo em vista a livre concorrência.” (fls. 442)

Ora, foi na vigência do art. 8o, XV, a, da Constituição de 1967 (Emenda n° 1-69), onde se atribuía à União explorar, diretamente ou mediante autorização, os serviços de telecomunicações, que a Lei n° 6.874, de 3 de dezembro de 1980, em seu art. 2o, expressamente reservou, às empresas exploradoras de serviço de telecomunicações, a edição, ou divulgação, de listas de assinantes, sob qualquer forma ou denominação, bem como a comercialização da publicidade nelas inserta.

Não vejo como não pudesse tê-lo feito o legislador ordinário, pois, tanto o princípio da liberdade de iniciativa, inscrito no inciso I do art. 160 da Carta pretérita, como a equivalente garantia da livre concorrência, estatuída pelo art. 170 da Constituição de 1988, hão de ceder lugar ao espaço que a própria Constituição reserva à atuação do delegado ou concessionário de determinado serviço, nele especificado.

Entre essas hipóteses de exceção, inclui-se a das telecomunicações, e, no regime de sua exploração, a disciplina da edição das listas ou catálogos.

Demonstrou-o, com a precisão característica da lucidez de seu espírito, o saudoso Ministro VICTOR NUNES, em parecer cuja transcrição parcial se contém no pronunciamento da douta Procuradoria Geral da República.

A edição dos catálogos, no seu duplo aspecto de despesa com a publicação e de receita publicitária, é, sem dúvida, fator essencial da equação financeira da concessão (ou delegação) segundo o contrato ou o estatuto, vigentes ao tempo dos fatos ora contemplados.

É, certamente, lamentável, como argui o acórdão recorrido, que a concessionária (então empresa estatal) se houvesse omitido em distribuir, nas épocas próprias, as listas a que está obrigada.

Mas repercute, essa omissão, na relação jurídica de direito administrativo entre a concessionária (ou delegada) e o Poder concedente ou delegante. Não basta para arvorar, por conta própria, qualquer particular, que assim o pretenda, nas obrigações ou privilégios constantes da concessão (ou delegação), usufruindo- os em seu proveito particular.

Conheço do recurso e dou-lhe provimento, para restabelecer a sentença de primeira instância.

 

PRIMEIRA TURMA

EXTRATO DE ATA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 158.676-1

PROCED.: MINAS GERAIS

RELATOR: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

RECTE.(S): TELEMAR NORTE LESTE S/A

ADV.(A/S): MARCELO LUIZ ÁVILA DE BESSA E OUTROS

RECDO.(A/S): ENAC EDITORA NACIONAL DE GUIAS LTDA

ADV.(A/S): NARCISO MOURA MACHADO COELHO E OUTROS

 

Decisão: Após o voto do Ministro Octavio Gallotti (Relator) e Ilmar Galvão, que conheciam e davam provimento ao recurso extraordinário, pediu vista dos autos o Ministro Sepúlveda Pertence. Falou pela recorrida o Dr. Arnaldo Versiani Leite Soares. 1ª Turma, 23.03.99.

Decisão: Renovado o pedido de vista do Ministro Sepúlveda Pertence, de acordo com o art. 1º, § 1º, in fine, da Resolução n. 278/2003. 1ª Turma, 27.04.2004.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à Sessão os Ministros Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Joaquim Barbosa.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Eitel Santiago de Brito Pereira.

Ricardo Dias Duarte

Coordenador

 

14/08/2007 – PRIMEIRA TURMA

RECURSO EXTRAORDINARIO 158.676-1 MINAS GERAIS

VOTO – VISTA

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE:

I

Trata-se, na origem, de ação para apreensão – cumulada com indenização e proibição de novas publicações – de exemplares de listas telefônicas editadas e distribuídas pela recorrida sem a autorização da recorrente.

A ação foi julgada procedente em 1º grau e o Tribunal de Alçada de Minas Gerais reformou a sentença, sob os seguintes fundamentos:

“A edição dos catálogos telefônicos não se inclui no serviço de telefonia, cuja exploração depende de concessão da União (art. 21, XI, Constituição Federal), pelo que a Lei não podia mesmo impedir que a ré atuasse nessa área, tendo em visa a livre concorrência.

A matéria hoje é realmente tranqüila, porque já se dispõe o governo a liberalizar a economia, com a revogação de lei beneficiadoras de cartéis, ajustando-a aos parâmetros constitucionais.

A improcedência do pedido, por isso, se impõe.

Do exposto, dá-se provimento a apelação julgando-se improcedente o pedido, com a condenação da autora ao pagamento das custas do processo e dos honorários do patrono dos réus, arbitrados em 20% sobre o valor atualizado da causa.” (fls. 441/3)

Daí o RE, a e b, que alega, em síntese, violação dos arts. 8o, XV, a, da Carta de 1969, e 21, XI (red. original), da Constituição de 1988.

Sustenta a recorrente que é de competência da União a exploração do serviço de telecomunicações e a publicação de catálogos dos assinantes, de acordo com a L. 6.874/80 – que confere às empresas exploradoras de serviços públicos de telecomunicações a edição de listas -, razão pela qual não violaria o princípio da livre iniciativa, conforme decidido no RE 97.496, 07.04.89, 2a T, Aldir Passarinho.

O recurso extraordinário foi admitido na origem. O parecer do Ministério Público foi pelo provimento do apelo, uma vez que os números e os códigos telefônicos integrariam o serviço público de telefonia, monopólio constitucional da União, e a L. 6.874/80 teria sido recebida pela Constituição.

Em seu voto, o em. Ministro Octávio Gallotti afastou as duas preliminares de descabimento do recurso extraordinário e a Turma o acompanhou por unanimidade neste ponto.

Quanto ao mérito, lê-se do voto do em. Relator:

“Ora, foi na vigência do art. 8°, XV, a, da Constituição de 1967 (Emenda n° 1-69), onde se atribuía à União explorar, diretamente ou mediante autorização, os serviços de telecomunicações que a Lei n° 6.874, de 3 de dezembro de 1980, em seu art. 2º expressamente reservou, às empresas exploradoras de serviço de telecomunicações, a edição, ou divulgação, de listas de assinantes, sob qualquer forma ou denominação, bem como a comercialização da publicidade nelas inserta.

Não vejo como não pudesse tê-lo feito o legislador ordinário, pois, tanto o princípio da liberdade de iniciativa, inscrito no inciso I do art. 160 da Carta pretérita, como a equivalente garantia da livre concorrência, estatuída pelo art. 170 da Constituição de 1988, hão de ceder lugar ao espaço que a própria Constituição reserva à atuação do delegado ou concessionário de determinado serviço, nele especificado.

Entre essas hipóteses de exceção, inclui-se a das telecomunicações, e, no regime de sua exploração, a disciplina da edição das listas ou catálogos.

(…)

É, certamente, lamentável como argüi o acórdão recorrido, que a concessionária (então empresa estatal) se houvesse omitido em distribuir, nas épocas próprias, as listas a que está obrigada.

Mas repercute, essa omissão, na relação jurídica de direito administrativo entre a concessionária (ou delegada) e o Poder concedente ou delegante. Não basta para arvorar, por conta própria, qualquer particular, que assim o pretenda, nas obrigações ou privilégios constantes da concessão (ou delegação), usufruindo-os em seu proveito particular.”

Após o voto do em. Ministro Octávio Gallotti, dando provimento ao recurso, votou no mesmo sentido o em. Ministro Ilmar Galvão.

 

II

Ao tempo em que vigia o Decreto 57.611, de 07.01.1966, que em seu art. 23 dispunha que “a organização, a publicação e a distribuição de catálogos ou listas de assinantes dos Serviços de Telefonia Públicos são de responsabilidade das concessionárias dos referidos serviços”, o saudoso Victor Nunes Leal produziu longo parecer1 sobre o tema, do qual extrato o que segue:

“O Código Brasileiro de Telecomunicações e o Regulamento dos Serviços de Telefonia assim definem o serviço de telefonia:

‘Telefonia é o processo de telecomunicação destinado à transmissão da palavra falada ou de sons.’ (L. 4.117/62, art. 4o, D. 57.611/66, art. 5o, inc. 45)

Os Serviços de Telefonia destinam- se à intercomunicação entre duas ou mais pessoas, usando a palavra falada ou sons.’ (D. 57.611/66, art. 2o)

Verificada (não obstante a impropriedade da linguagem) qual é a atividade nuclear do serviço de telefonia (objeto de concessão), podemos imediatamente identificar outras, conexas, indispensáveis ao funcionamento regular e eficiente do serviço.

Uma delas é a publicação das listas de assinantes. Para avaliarmos o grau de sua influência na regularidade do serviço telefônico, podemos imaginar como se procederá sem as listas. Todos os interessados consultariam o departamento de informações do concessionário, para fazerem suas ligações, o que neutralizaria as vantagens da discagem automática que corresponde ao padrão moderno do serviço.

A publicação da lista de assinantes influi, portanto, de modo direto e significativo, na operação do serviço telefônico, integrando e distribuir as listas de assinantes pode ser legitimamente imposta ao concessionário, como parte dos encargos que a tarifa deverá cobrir. E assim dispõe o Regulamento no seu art. 23:

‘A organização, a publicação e a distribuição de catálogos ou listas de assinantes dos Serviços de Telefonia Públicos são de responsabilidade das concessionárias e permissionárias dos referidos serviços.’

Nos Estados Unidos, têm decidido os tribunais que (86 C.J.S. 272, § 265).

‘a contract for telephone Service includes by implication, if not by express terms, an agreement that the subscriber’s name and telephone number will be placed in a telephone directory’.

A lista  de assinantes é, por outro lado, um documento oficial, porque emana de um serviço público. Essa característica afasta qualquer óbice legal à sua livre reprodução (C. Civ., art. 666, IV). E essa reprodução há de ser estimulada para se alcançar mais completamente o objetivo da publicação da lista, que é estar acessível em qualquer momento, não só aos assinantes, mas a todos quantos queiram fazer uso do serviço telefônico.

A possibilidade da reprodução com erros é uma contingência de muito compensada pela vantagem da maior divulgação da lista. Basta notar que ninguém cogitou ainda, em nome da prevenção de erros, de vedar ou cercear a divulgação particular das leis do país. E a própria lista oficial dos telefones está sujeita a essa eventualidade, contentando-se os tribunais norte-americanos em exigir do concessionário o simples cuidado ordinário (merely… ordinary care) no preparo de tais listas (86 C.J.S. 212, § 265). O Estado francês, que explora diretamente o serviço, vai mais longe, eximindo-se de qualquer responsabilidade pelos erros e omissões desse gênero (Dalloz, Nouveau Repértoire, 1964, III, § 304).

Ocorre que as listas telefônicas, com o desenvolvimento do serviço, atingem um público cada vez mais considerável, o que as torna vias de acesso a um amplo mercado, atual e potencial, de serviços e utilidades em geral. São essas listas, portanto, excelentes veículos de propaganda.

Não há, porém, o mais leve nexo de dependência entre a operação do serviço telefônico, finalidade objetivada pela concessão, e a exploração de propaganda comercial nas listas telefônicas. Expungida que seja qualquer propaganda dessas listas, nenhum embaraço resultará para a operação do serviço; elas continuarão a preencher suas finalidades, sem qualquer redução, na eficiência. Basta esta análise para que, atendendo ao critério de funcionalidade objetiva, não possamos incluir aquela propaganda no âmbito da concessão do serviço de telefonia, do mesmo modo que os tribunais norte-americanos não a consideram ‘an essential public service’ (86 C.J.S. 272, § 265).

Essa propaganda, simples especialização da propaganda impressa, é uma atividade caracteristicamente particular ou privada, que recai, pelo nosso ordenamento jurídico, na esfera da livre competição. A Constituição vigente só admite o monopólio ‘indispensável’, o que terá de ser instituído por lei federal. E só tem por indispensável o monopólio, quando exigir ‘motivo de segurança nacional’, ou quando o regime de competição e livre iniciativa for incapaz de organizar e desenvolver algum setor da atividade (art. 163). Condições tão estritas evidentemente não se apresentam no setor da propaganda impressa, especialmente na modalidade da propaganda através de listas telefônicas. Essa atividade econômica vem sendo desempenhada satisfatoriamente pelas empresas privadas, que assim correspondem à preferência que lhes concede a Constituição, não havendo sequer conveniência em que o Estado intervenha no setor em caráter supletivo (art. 170).

De qualquer modo, somente por lei federal, que instituísse monopólio (art. 163), ou que autorizasse a organização de empresa pública ou sociedade de economia mista (art. 170), poderia o Estado assenhorar-se dessa atividade ou suplementar, no setor, a ação das empresas privadas. Como nenhuma lei com esse alcance foi ainda promulgada, segue-se que a União Federal, como poder concedente do serviço de telefonia, isto é, como autoridade administrativa, não tem competência para incluir no objeto de tais concessões a exploração de propaganda em listas telefônicas.

(…)

No uso dessa atividade propagandística, portanto, o concessionário não pode invocar qualquer dos privilégios da concessão mas a tolerância do poder concedente, e no pressuposto de não sacrificar direitos de terceiros. Funcionando como empresa irregular ou através de outra empresa regularmente organizada para tal fim, sua posição, no ramo da propaganda, é de absoluta igualdade para tal fim, sua posição, no ramo da propaganda, é de absoluta igualdade com qualquer pretendente que se organize para a execução de tal serviço.

Rompida que fosse essa igualdade, a concessão do serviço de telefone passaria a funcionar como instrumento de concorrência desleal, que o poder concedente tem o dever de neutralizar, seja vedando a propaganda comercial por parte do concessionário, seja estabelecendo regras de leal competição com outros pretendentes.”

Victor Nunes manteve o mesmo entendimento em outras duas oportunidades em que foi consultado: a primeira tendo em vista a edição do Decreto 68.41711, de 24.03.71, e a segunda em razão do Decreto 73.380Lii, de 27.12.73. Em todos os casos era questionada a constitucionalidade dos referidos decretos frente ao texto da Carta de 1969, tal como ocorre no caso.

O que se discute, agora, é a constitucionalidade da Lei 6.874/80 tendo em vista a Carta de 1969, ou seja, não há questionamento sobre o recebimento daquela lei pela Constituição Federal de 1988, mesmo porque os atos objeto da ação movida pela recorrente foram praticados no ano de 1985.

Apesar de a Lei 6.874/80 ter sido revogada pela Lei 9.472/97, o interesse da recorrente permanece em razão do pedido de indenização por ela formulado por entender que houve usurpação de sua competência exclusiva.

Com a devida vênia dos em. Ministros Octavio Gallotti e Ilmar Galvão, estou em que o recurso extraordinário não deve ser provido.

Se por um lado a publicação e distribuição de listas ou catálogos telefônicos constituía um ônus das concessionárias de serviço de telefonia – que podem praticá-lo com ou sem a utilização de publicidade -, não se pode dizer que estas tinham exclusividade para fazê-lo.

O jurista Everardo Moreira Lima, em substanciosa monografia, sobre o tema, teceu considerações tendo em vista a Carta de 1969:

“Como já tivemos oportunidade de assinalar, em nenhuma outra das anteriores Constituições brasileiras, assumiu o legislador constituinte compromisso tão enfático com a iniciativa privada como na Constituição atual. Com efeito, enquanto o item I, do art. 160, aponta como princípio basilar da Ordem Econômica e Social a liberdade de iniciativa, o art. 170 reza que ’às empresas privadas compete, preferencialmente, com o estímulo e o apoio do Estado, organizar e explorar as atividades econômicas’, acrescentando, no § 1º, que ‘apenas em caráter suplementar da iniciativa privada o Estado organizará e explorará domínio econômico para incentivar a liberdade de iniciativa e regular as atividades empresariais, reservando-se o monopólio constitucional de algumas delas e facultando ao legislador federal o monopólio de outras, ‘quando indispensável por motivo de segurança nacional ou para organizar setor que não possa ser desenvolvido com eficácia no regime de competição e de liberdade de iniciativa, assegurados os direitos e garantias individuais’. Podemos então dizer que, no sistema constitucional brasileiro, as atividades econômicas são desempenhadas: a) preferencialmente pela iniciativa privada; b) pelo Estado, através de monopólio constitucional ou legal; c) concorrentemente, pela iniciativa privada e pelo Estado, e d) supletivamente, pelo Estado no caso de desinteresse da iniciativa privada.

As atividades econômicas exploradas pelo Estado em regime de monopólio constitucional são previstas no Art. 8°, XII e XV, e Art. 169, da  Constituição Federal, vale dizer, o serviço postal, os serviços de telecomunicações; os serviços e instalações de energia elétrica de qualquer origem ou natureza; a navegação aérea; as vias de transporte entre portos marítimos e fronteiras nacionais ou que transponham os limites de esta ou território, e a pesquisa e lavra de petróleo em território nacional.

São atividades econômicas exploradas pelo Estado sob o regime de monopólios legais, entre outras: a da refinação, transporte marítimo ou por condutos de óleo bruto e seus derivados no País (Lei n° 2.004, de 03.10.53); a da energia nuclear (Lei n° 4.118, de 27.08.62); a de operações finais de compra e venda de borracha (Lei n° 5.227, de 18.01.67).

Não há confundir exploração pelo Estado de atividades empresariais sob o regime de monopólio, constitucional ou legal, com os que o Estado realiza concorrentemente com a iniciativa privada ou supletivamente a ela. E, insista-se, o Estado só pode monopolizar atividade econômica privada mediante lei federal, quando indispensável por motivo de segurança nacional ou para organizar setor que não possa ser desenvolvido com eficácia em regime de competição e de liberdade de iniciativa. Atividades há, entretanto, insuscetíveis de monopólio, como é o caso da exploração da publicidade.

A comunicação é existencial e, todavia, existem atividades ligadas a ela, cujo exercício, embora regulado em lei, não pode ser atribuído ao Estado, ainda nos regimes totalitários (ex.: as publicitárias). (Luciano Benévolo de Andrade, Curso Moderno de Direito Administrativo, Edição Saraiva, 1975, p. 40)

Por conseguinte, a atividade publicitária que não    pode    ser monopolizada por lei, sem afronta a tradicionais princípios jurídicos, não poderia ser monopolizada por decreto.

(…) 

Não se pode dizer que a publicidade, só pelo fato   de ser feita com a utilização do catálogo, deva ser necessariamente considerada um ‘acessório’ do serviço de telefonia. Representa, ao contrário, uma atividade ‘a se’, de marcado cunho técnico, inserindo-se como um fator autônomo, no sistema cada vez mais complexo de comunicações’ resultante da tecnologia contemporânea.

É imprescindível atentar para a ‘natureza das coisas’, quando se tem de qualificar um bem como acessório, consoante justa ponderação de Francisco Campos, ao advertir que só se pode aplicar o princípio de que ‘o acessório segue o principal’, quando a coisa acessória se acha de tal maneira ligada à coisa principal, ou ligada de modo tão essencial, que não possa da mesma se destacar, sem que se altere ou modifique, de maneira grave ou essencial, a sua substância, ou a da principal.

A aplicação prática do princípio de que o acessório segue o principal é, como se vê, uma questão de fato, dependendo, como depende, da natureza da relação em que se encontram as coisas. (Direito Administrativo, Rio, 1943, p. 227 e 4 ss.)

‘Ora, basta pensar que há catálogos de telefones sem publicidade, para perceber-se que esta, longe de ser-lhes inerente e deles inseparável, é um plus acrescentado pelo gênio criador que soube oportunamente valer-se de um bem existente para torná-lo base de uma atividade econômica, materialmente complementar, mas juridicamente autônoma’ (Miguel Reale, Parecer, pp. 135-136, 2a edição deste livro).”

E mais adiante arremata:

“Antes que direito de aditar a lista dos assinantes da rede telefônica, há a obrigação de fazê-lo, uma vez que ela é, no nível da tecnologia atual, indispensável ao funcionamento do serviço. Repita-se: do serviço telefônico, de cuja exploração a União Federal não tem o monopólio, e pode concedê-lo (art. 8o, XV; a, C.F.). Mas esse negócio não se confunde com a da produção de catálogos comerciais para anunciar profissões, bens e serviços, com indicações de nomes, endereços e números de telefones, do qual a União Federal não tem monopólio, e, portanto, não poderia ser objeto da concessão, nem explícita nem implicitamente.”

Compartilho desse entendimento, entre ter o ônus de divulgar a lista oficial de assinantes e ter a exclusividade na exploração comercial dessa mesma lista há uma grande diferença.

Desse modo, por entender que o art. 2o da Lei 6.874/80 era inconstitucional – tendo em vista a Carta de 1969 – na medida em que institui reserva de mercado para a comercialização das listas telefônicas às empresas concessionárias, nego provimento ao recurso extraordinário: é o meu voto.

Ministro Sepúlveda Pertence – Relator

I Parecer exarado em 21.09.1970 e compilado por Everardo Moreira Lima na sua obra Publicidade em Catálogos Telefônicos: monopólio X livre concorrência. 4ª ed. rio de Janeiro: Expressão e Cultura: Esplanada, 1997. p. 141-155.

 II O Decreto 68.417/71 assegurava às concessionárias ou permissionárias dos serviços de telefonia exclusividade para a comercialização das listas ou catálogos com inserções e anúncios.

Lii Dispunha o art. 23 Decreto 57.611/66 com a redação conferida pelo Decreto 73.380/73: “Art. 23. São da exclusiva responsabilidade das concessionárias ou permissionárias dos Serviços de Telefonia Públicos a organização, publicação, distribuição ou venda de listas de assinantes dos referidos Serviços, as quais compreenderão:

I – relação em ordem alfabética de assinantes e respectivos endereços;

II – elenco classificado de assinantes, relacionados segundo sua atividade fundamental;

III – facultativamente, lista de endereços, e outras de interesse geral.

§ 1o. (Omissis).

§ 2°. A inserção do nome e endereço do assinante far-se-á sem qualquer ônus para este, podendo, entretanto, ser comercializadas,  por preços especiais, inserções suplementares e de anúncios nas listas, a que se refere este artigo.

§3o. As concessionárias ou permissionárias poderão contratar com empresas especializadas, com ou sem exclusividade, a organização, publicação e distribuição das listas, bem como a comercialização das inserções aludidas no parágrafo anterior, com a observância do seguinte:

a) as concessionárias ou permissionárias serão obrigadas a fornecer dados que possibilitem a confecção de listas somente à empresa com a qual tenham firmado contrato; e

b) a renda que as concessionárias ou permissionárias vierem a auferir, direta ou indiretamente, em virtude do disposto neste parágrafo, será incorporada à receita do serviço telefônico.

§ 4° . É vedada a produção ou reprodução total ou parcial, distribuição ou venda, das listas de que trata este artigo por pessoas jurídicas ou físicas, não expressamente autorizadas pelas concessionárias ou permissionárias dos Serviços de Telefonia Públicos.”

iv Everardo Moreira Lima. Publicidade em Catálogos Telefônicos: monopólio X livre concorrência. 4a ed. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura: Esplanada, 1997. p. 18-20 e 26-27.

 

14/08/2007 – PRIMEIRA TURMA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 158.676-1 MINAS GERAIS

EXPLICAÇÃO

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO – Senhor Presidente, no voto de Vossa Excelência, já na conclusão, há uma distinção, uma disceptação, como os administrativistas gostam de dizer, já que estamos tratando de concessionárias, que achei interessantíssima. Ou seja, as concessionárias têm o ônus da publicação, da edição. Podendo fazê-lo mediante publicidade, ou sem publicidade, mas não têm o monopólio da atividade comercial. Muito interessante.

A SENHORA MINISTRA CARMEN LÚCIA – Porque isso não é serviço público.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE (PRESIDENTE) – Isso, evidentemente, não é serviço público.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO – É próprio de Vossa Excelência: uma solução criativa e juridicamente fundamentada. Jamais me ocorreu essa tirada de espirito até. Parabéns.

Se os Colegas me permitem, antecipo o voto.

O SENHOR MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE (PRESIDENTE) – Vossa Excelência não tem voto.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO – Que pena! Gostaria de, neste caso, confirmar o meu voto.

 

14/08/2007 – PRIMEIRA TURMA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 158.676-1 MINAS GERAIS

VOTO

O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI – Senhor Presidente, faço minhas as palavras do eminente Ministro Carlos Britto, apropriando-me, com a licença de sua Excelência, em sua fundamentação, sublinhando a criatividade do voto, que encampo integralmente.

 

PRIMEIRA TURMA

EXTRATO DE ATA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 158.676-1

PROCED.: MINAS GERAIS

RELATOR ORIGINÁRIO: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

RELATOR PARA O ACÓRDÃO: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE

RECTE. (S): TELEMAR NORTE LESTE S/A

ADV.(A/S): MARCELO LUIZ ÁVILA DE BESSA E OUTROS

RECDO.(A/S): ENAC EDITORA NACIONAL DE GUIAS LTDA

ADV.(A/S): NARCISO MOURA MACHADO COELHO E OUTROS

 

Decisão: Após o voto do Ministro Octavio Gallotti (Relator) e Ilmar Galvão, que conheciam e davam provimento ao recurso extraordinário, pediu vista dos autos o Ministro Sepúlveda Pertence. Falou pela recorrida o Dr. Arnaldo Versiani Leite Soares. 1a Turma, 23.03.99.

Decisão: Renovado o pedido de vista do Ministro Sepúlveda Pertence, de acordo com o art. 1o, § 1o, in fine, da Resolução n. 278/2003. 1a Turma, 27.04.2004.

 Decisão: Adiado o julgamento por indicação do Ministro Sepúlveda Pertence. 1a Turma, 11.05.2004.

Decisão: Por maioria de votos, a Turma negou provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto do Ministro Sepúlveda Pertence, Relator para o acórdão; vencidos os Ministros Octavio Gallotti, Relator, e Ilmar Galvão. Não votou o Ministro Carlos Britto, por ser o sucessor do Ministro Ilmar Galvão, que já proferira seu voto. Ausente, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio. 1a Turma, 14.08.2007.

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à Sessão os Ministros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski e a Ministra Cármen Lúcia. Ausente, justificadamente, o Ministro Marco Aurélio. Compareceram os Ministros Cezar Peluso e Eros Grau, a fim de julgarem processos a eles vinculados, assumindo as cadeiras da Ministra Cármen Lucia e do Ministro Ricardo Lewandowski, respectivamente.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot.

Ricardo Dias Duarte

Coordenador

Como citar e referenciar este artigo:
STF,. STF – RE 158.676-1 – MG. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2014. Disponível em: https://investidura.com.br/jurisprudencias/stf/stf-re-158676-1-mg/ Acesso em: 18 abr. 2024
STF

STF – ADI – 2.649-6 – DF

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STF – ADC 9-6

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STF – ADI 1.221-5 RJ