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A cidadania de uma cidade é medida pelo tamanho de suas calçadas



Quem disse que as cidades não têm solução para o trânsito? Solução há mas, para isso, o poder público deve agir e o cidadão deve romper com a cultura individual. Precisamos inverter o raciocínio, deixando de pensar na mobilidade dos automóveis e investir na mobilidade das pessoas.

 

A lógica define que o homem deve construir uma cidade para as pessoas. Entretanto, vivemos numa sociedade que esqueceu essa premissa. Diminuir calçadas para aumentar as ruas é aumentar o problema de congestionamentos. Aumentar os espaços públicos de convivência, padronizar as calçadas em áreas de maior circulação e hierarquizar a sinalização do pedestre da mesma forma que sinalizam para o carro, é o início da solução.

 

A cidadania de uma cidade é medida pelo tamanho de suas calçadas. As cidades são criações das decisões de seu criador, neste caso, o homem. Entretanto, hoje, a criação voltou-se contra o seu próprio criador. A estrutura viária sempre foi pensada para o automóvel. Alargar ruas é aumentar o problema. É como resolver o problema da obesidade comprando um cinto mais largo.

 

A verdade é que o atual modelo está falido. A solução dos problemas do trânsito passa por projetos impopulares, polêmicos e questionadores. Quebra o conceito de que cada um usufrui o seu bem da forma que quiser porque paga por isso, assim como quebra preconceitos, oferecendo aos cidadãos de gravata e salto alto o transporte coletivo. Neste caso, é preciso empunhar a bandeira da integração dos diferentes modais de transporte, para que o cidadão possa fazer seu percurso a pé, de bicicleta ou de carro e após seguir de ônibus, trem ou outros meios de locomoção. O veículo não motorizado é o segundo da lista de prioridades.

 

A velha e conhecida bicicleta tem que ser acolhida no sistema urbano de trânsito, através de ciclovias ou ciclofaixas. O não motorizado contribui para diminuir a emissão de gases poluentes, sem falar na melhoria da condição física e na sua saúde das pessoas. Também precisa ser questionada a estratégia de diminuir impostos dos automóveis, principalmente o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A iniciativa resulta no aumento do consumo e na diminuição da arrecadação dos impostos pelo governo federal e, por consequência, dos tributos estaduais e municipais, além de aumentar os congestionamentos, a poluição, a demanda de infraestrutura, equipamentos de trânsito e investimentos em programas de conscientização e de prevenção de acidentes.

 

Ao mesmo tempo, há necessidade de avaliar a duração deste bem. Carro tem certidão de nascimento, mas não tem certidão de óbito. Carro precisa ter tempo de uso e, no final, ser descartado. É preciso ainda inverter a matriz de tributos de IPVA dos automóveis. Hoje, carros antigos pagam menos impostos, que sob o ponto de vista lógico não tem fundamento. Essa medida precisa estar par e par com a redução de impostos sobre a tarifa do transporte coletivo, que chega a 40% do valor e também estabelecendo critérios de gratuidade e de isenção da tarifa.

 

Entrando nas iniciativas impopulares também devemos enfrentar a restrição do uso do automóvel, que nada tem a ver com a ideia esdrúxula da rotatividade das placas para trafegar. Trata-se sim da cobrança de taxa de congestionamento em áreas de maior tráfego, a exemplo de Estocolmo: a aplicação dessa medida, no princípio reprovada por 73% da população, reduziu 30% o tráfego e, atualmente, recebe o apoio de quase 70% da população. Os valores advindos da taxa de congestionamento são inteiramente revertidos para os investimentos em estrutura viária, priorizando o transporte coletivo.

 

A restrição do uso do carro na via não é uma discussão de propriedade do bem, mas sim a sua utilização no espaço público. Outra solução importante, mas muito desagradável para o setor da construção civil está na restrição da construção de edifícios-garagem em áreas centrais. Fazer estacionamento está cada vez mais caro e cada vez mais raro. Quanto mais edifícios-garagem, maior será a indução de veículos que irão para o centro. É necessário definir critérios, condicionando a sua construção às áreas lindeiras das estações do Transporte Coletivo.

 

Nenhuma atitude isolada irá resolver o problema do trânsito nas cidades. Atitudes somadas trazem retorno imediato, jamais esquecendo que se nós planejarmos os carros para o tráfego, nós teremos um tráfego para os carros, mas se nós planejarmos as pessoas para os espaços, nós teremos um espaço para as pessoas.

 

A grande atração das cidades são as pessoas, lembrando de David Harvey quando afirma decida como a cidade é e a sua própria identidade será revelada.

 

*Deputado Estadual (PDT)

Fonte: AL/RS

Como citar e referenciar este artigo:
NOTÍCIAS,. A cidadania de uma cidade é medida pelo tamanho de suas calçadas. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2013. Disponível em: https://investidura.com.br/noticias/alrs/a-cidadania-de-uma-cidade-e-medida-pelo-tamanho-de-suas-calcadas/ Acesso em: 16 abr. 2024