Contestação

Modelo de Contestação – Governo Estadual – Indenização – Prisão Ilegal

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ….. VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE ….., ESTADO DO ….

AUTOS Nº …..

O ESTADO DE …………, pessoa jurídica de direito interno, representado pelo Procurador de Estado que abaixo subscreve, recebendo as suas intimações na Rua ……………., ….., …….., nesta Capital, vem, mui respeitosamente, nos autos desta ação de indenização por danos morais promovida por …….., ante Vossa Excelência apresentar

CONTESTAÇÃO

pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.

PRELIMINARMENTE

1. A Ausência de Capacidade Jurídica do “Governo do Estado de …………”

Os autores da presente ação pediram, na exordial, a citação do “Governo do Estado de …………”, conforme se pode visualizar à fl. 2 e 13.

Ocorre que o “Governo do Estado” é um órgão da administração direta sem personalidade jurídica, nem mesmo judiciária, vale dizer, sem capacidade para ser parte ou para estar em juízo.

Explica-se melhor: o art. 7º do Código de Processo Civil ensina que “toda pessoa que se acha no exercício dos seus direitos tem capacidade para estar em juízo”. Ou seja, para que se possa (tenha capacidade de) estar em juízo faz-se necessária que o ente tenha personalidade jurídica.

Obviamente, existem certos entes que, embora despersonalizados, possuem capacidade para ser parte. É o caso dos espólios, da massa falida, da herança jacente etc. Nesses casos, porém, a capacidade para estar em juízo é atribuída expressamente pelo próprio Código de Processo Civil. Ou seja, o próprio CPC cuida em excepcionar os casos em que entes despersonalizados podem estar em juízo.

Contudo, não há norma alguma atribuindo esta capacidade (para estar em juízo ou para ser parte) ao Governo do Estado. Tal ente, em hipótese alguma, pode ser parte passiva em processos judiciais comuns ou especiais (salvo, obviamente, para prestar informações em mandado de segurança). No caso, a ação deveria ter sido proposta contra o Estado de ………… e não contra o Governo do Estado.

Dessa forma, demonstrada a total ausência de personalidade jurídica e judiciária do Governo do Estado, requer-se que seja o Governo do Estado de ………… excluída da lide, extinguindo o processo, sem julgamento do mérito, ou, em caso contrário, sejam intimados os autores para emendarem a inicial, requerendo a citação da pessoa jurídica de direito público (Estado de …………), na pessoa de seu representante legal, abrindo-se novamente o prazo (em quádruplo) para apresentação da defesa do Estado.

2. A Inépcia da Inicial: Ausência de Requisitos Indispensáveis

Analisando os aspectos formais da petição inicial, verifica-se que ela não preenche os requisitos legais necessários, na forma estipulada no Código de Processo Civil.

Primeiramente, não há, no corpo da inicial, o endereço profissional dos patronos dos autores.

Prescreve o Código de Processo Civil que compete ao advogado declarar, na petição inicial, o endereço em que receberá intimações (art. 39, inc. I).

Como o advogado dos autores não informou, na petição inicial, o endereço em que receberá intimações, o processo deve ser extinto, sem julgamento do mérito, dada a ausência de pressuposto de constituição válida e regular da relação processual.

Igualmente, compulsando a exordial, verifica-se que falta pedido de intimação do representante do Ministério Público.

As normas do Código de Processo Civil, referente a este ponto, são bastante claras. Vale reproduzi-las.

Primeiramente, cuida o art. 82 em elencar as situações em que é obrigatória a participação do Ministério Público.

Eis os termos do dispositivo:

“art. 82. Compete ao Ministério Público intervir:

I – nas causas em que há interesses de incapazes;

II – nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposição de última vontade;

III – nas ações que envolvam litígios coletivos pela possa da terra rural e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte” – grifamos.

Como se vê, o ponto que nos interessa é exatamente a parte final do inciso III, que prescreve ser obrigatória a intervenção do Ministério público “nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte”.

Em seguida, o art. 84, do CPC, determina que “quando a lei considerar obrigatória a intervenção do Ministério Público, a parte promover-lhe-á a intimação sob pena de nulidade do processo”.

Finalmente, o art. 246 e seu parágrafo único são incisivos ao dispor que:

“art. 246. É nulo o processo, quando o Ministério Público não for intimado a acompanhar o feito em que deva intervir”.

“Parágrafo único. Se o processo tiver corrido, sem conhecimento do Ministério Público, o juiz o anulará a partir do momento em que o órgão deveria ter sido intimado”.

Como se vê, mais uma vez a parte Autora não fez presente um dos pressupostos essenciais para a válida formação do processo. Em se tratando de demanda onde o interesse público é cristalino e insofismável, denotado pela própria qualidade da parte Requerida, bem como por ser o Ministério Público responsável pelo controle externo da polícia, imprescindível que fosse vindicado pedido para a intimação do Ministério Público.

Ausente pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, impõe-se a EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO, consoante determinação do artigo 267, inciso IV do Código de Processo Civil, o que desde já se requer.

3. A Ausência de Documentos Indispensáveis à Propositura da Ação

A petição inicial é a peça inaugural do processo, pela qual o autor provoca a atividade jurisdicional. Juntamente com a exordial, o autor deverá juntar os documentos indispensáveis a propositura da ação, sob pena de preclusão consumativa, não podendo haver posterior complementação de documentos já existentes por parte do autor.

Conforme disposições expressas da Lei Processual Civil:

“Art. 282 – A petição inicial indicará:… omissis

VI – as provas com que o Autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; … omissis”

“Art. 283 – A petição inicial será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação”.

“Art. 396 – Compete à parte instruir a petição inicial (art. 283), ou a resposta (art. 297), com os documentos destinados a provar-lhe as alegações”.

Ora, os papéis trazidos aos autos a lume de prova não demonstram, de forma alguma, a existência do alegado direito à indenização.

Não logrou os Requerentes sequer desincumbirem-se do ônus da prova da existência do fato jurídico que, a seu ver, produziu em suas esferas jurídicas o direito a serem ressarcidos. Os fatos meramente alegados e não provados, não se prestam a embasar uma pretensão jurídica. Não são fatos, mas meras especulações. Não basta alegar, há que se provar.

Os únicos documentos acostados pelos Autores, que se revela inidôneo para fins de comprovação judicial do que quer que seja, foram certidões negativas das polícias alagoanas.

Nenhum dos fatos jurídicos cuja existência seria imprescindível para viabilizar, ao menos, a pretensão dos Autores – a suposta prisão ilegal, o aborto, a impossibilidade de ter novos filhos da esposa do requerente – foi comprovado. Bastavam a juntada de laudos médicos, notícias de jornais, qualquer documento que pudesse demonstrar a verdade das alegações autorais. Nada disso foi feito.

Não tendo instruído a exordial com os documentos imprescindíveis, os requerentes ignoraram completamente os ditames legais dos artigos 282, VI; 283; 396 e 801, V da Lei Processual, tendo sido atingido pela preclusão consumativa, vez que praticou incorretamente o ato exigido para alcançar o objetivo pretendido, não sendo legalmente permitida a repetição.

Com tal postura omissiva, o Requerente atingiu frontalmente a regra específica relativa ao ônus da prova, conforme prescreve o Estatuto de Ritos:

“Art. 333 – O ônus da prova incumbe:

I – ao Autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II – ao Réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do Autor”. ..omissis (Grifos nossos)

Sobre esse ponto, salutar a transcrição de lição doutrinária:

“Segundo a regra estatuída por Paulo, compilada por Justiniano, a prova incumbe a quem afirma e não a quem nega a existência de um fato (Dig. XXII, 3, 2). O autor precisa demonstrar em juízo a existência do ato ou fato por ele descrito na inicial como ensejador de seu direito.” (NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil em vigor. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 615).

A inexistência de prova documental imprescindível na petição inicial caracteriza a ausência de pressuposto de constituição válida e regular da relação processual, por torná-la inapta ao desenvolvimento válido e regular do processo.

Assim sendo, diante do exposto, vem requerer a Vossa Excelência o indeferimento da petição inicial e a consequente extinção do processo sem julgamento de mérito, em conformidade com os ditames legais dos artigos 267, IV; 282, VI; 283; 333; 365; 384; 396 e 801, V, todos do Código de Processo Civil.

PRELIMINAR DE MÉRITO

A Prescrição do Direito dos Autores

Ainda como matéria preliminar de mérito, deve ser alegada a prescrição fulminante do direito dos autores.

Sustentaram que, no dia 1 de setembro de 1995, foram detidos por policiais militares.

Em 31 de agosto deste ano, intentaram os requerentes a ação, visando justamente condenar o Estado-réu indenizá-los pelos supostos danos morais causados.

O despacho inicial do juiz processante, prolatado no rosto da exordial e determinando a citação do réu, deu-se em 14 de setembro de 1994.

O Estado de ………… foi devidamente citado em 27 de setembro de 1994, data em que houve a juntada do mandado de citação pelo serventuário da Justiça.

Em face dessas datas, e para tornar mais fácil a visualização dos argumentos que serão expendidos, vale elaborar um quadro cronológico:

DATA FATO

1/9/1995 Suposta prisão ilegal

14/9/2000 Despacho inicial do juiz

27/9/2000 Juntada do mandado de citação

Constitui ponto pacífico: as ações contra a Fazenda Pública prescrevem em cinco anos do ato ou fato do qual se originaram. É o que, taxativamente, positiva o art. 1º do Decreto nº 20.910/32.

O termo inicial do prazo prescrição é justamente a data da ocorrência da violação do direito positivo, a ensejar uma ação exercitável.

Como ensina AGNELO AMORIM FILHO, em texto clássico sobre a prescrição, “é que a lesão dá origem a uma ação, e a possibilidade de propositura desta, com o fim de reclamar uma prestação destinada a restaurar o direito, é que concorre para criar aquele estado de intranqüilidade social que o instituto da prescrição procura evitar” (Critério Científico para Distinguir a Prescrição da Decadência e para Identificar as Ações Imprescritíveis. Revista Forense 193/37).

No caso dos autos, qual foi o fato que ensejou a propositura da ação? Muito simples: a suposta prisão ilegal, que – na forma sustentada pelos autores – ocorreu em 1/9/1995.

Considerando-se, portanto, que o prazo prescricional começou a fluir no dia 1/9/1995, é incontestável que ocorreu a prescrição, vez que a interrupção do prazo prescricional ocorre com o despacho ordenatório da Citação.

De fato, a interrupção do prazo prescricional não ocorre com a simples propositura da ação, pois a mera interposição de ação judicial não tem o condão de interromper o prazo de prescrição.

Realmente, a lei processual é clara ao afirmar que a prescrição é interrompida somente com o despacho que ordena a citação, desde que a citação seja válida e se concretize. Esta é a melhor ilação que se extrai do art. 219 do CPC e dos seus parágrafos:

“art. 219. A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa e, ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição.

§ 1º A interrupção da prescrição retroagirá à data da propositura da ação.

§ 2º Incumbe à parte promover a citação do réu nos dez dias subseqüentes ao despacho que a ordenar, não ficando prejudicada pela demora imputável exclusivamente ao serviço judiciário.

§ 3º Não sendo citado o réu, o juiz prorrogará o prazo até o máximo de noventa dias.

§ 4º Não se efetuando a citação nos prazos mencionados nos parágrafos antecedentes, haver-se-á por não interrompida a prescrição.

§ 5º Não se tratando de direitos patrimoniais, o juiz poderá, de ofício, conhecer da prescrição e decretá-la de imediato.

§ 6º Passada em julgado a sentença, a que se refere o parágrafo anterior, o escrivão comunicará ao réu o resultado do julgamento”.

Dessa forma, é o despacho do juiz – e não a propositura da ação – que tem o efeito material de interromper o prazo prescritivo.

Percebe-se, com isso, que prescrita está a ação, vez que o despacho ordenatório da citação ocorreu apenas em 14 de setembro de 2000, ou seja, há mais de cinco anos da eventual detenção.

É importante observar que esta interpretação é a mais favorável ao próprio recorrido, tendo em vista que o Código Civil ainda é mais severo do que o Código de Processo Civil: enquanto este dispõe que o despacho do juiz interrompe a prescrição, aquele diz que somente a própria citação é que produz este efeito (art. 172, inc. I). Porém, na lição de SILVIO RODRIGUES, o preceito do Código Civil foi modificado pelo art. 166, §2º, do Código de Processo Civil de 1939, refundido pelo art. 219 do Código de 1973, “de maneira que o despacho que a ordena, e não a citação propriamente dita, é que tem o condão de interromper a prescrição. Todavia, sua eficácia fica dependendo de a citação efetuar-se no prazo concedido pela lei” (Direito Civil. vol. 1, 25ª ed. Saraiva, São Paulo, 1995, p. 335).

2.1.4.1. A Demora na Citação, por Culpa Exclusiva do Autor, Justifica o Acolhimento da Argüição de Prescrição (Inteligência da Súmula 106 do STJ).

Por último, em nome do princípio processual da eventualidade, é preciso ressaltar que a pequena demora que existiu entre a data da propositura da ação e a data do despacho ordenatório da citação ocorreu por culpa exclusiva do recorrido, e não da máquina judiciária, que atuou com a devida presteza.

Realmente, quando a petição inicial reuniu as condições de ser despachada, o prazo prescricional já havia, praticamente, se consumado.

In casu, o recorrido protocolou a ação no período da tarde do último dia de consumação do suposto prazo prescricional (fl. 2v.). Dessa forma, percebe-se que mesmo que o magistrado tivesse sido diligente, despachando dentro dos dois dias exigidos pela lei adjetiva (art. 189, inc. I, do CPC), a prescrição se consumaria, donde concluir que o retardamento do despacho do juiz processante e da própria citação ocorreu apenas por negligência, desídia e relapso dos autores, jamais por motivos inerentes aos mecanismos da Justiça.

Esclareça-se melhor: os requerentes tiveram cinco anos para propor a ação. Porém, negligentemente, deixaram para propor a ação apenas no último dia do prazo. E o pior: somente no período da tarde foi protocolada a petição inicial. Pior ainda: mesmo sabendo que o prazo já estava a poucas horas da prescrição, não diligenciaram junto ao juiz para que este despachasse logo, no mesmo dia em que foi protocolada a ação. Que culpa teve, então, a máquina judiciária? Absolutamente nenhuma! Pelo contrário, somente a parte autora foi responsável pela consumação do prazo prescritivo.

Seguindo essa linha de pensamento, a jurisprudência pátria é uníssona em acolher a prescrição em casos semelhante:

“Consuma-se a decadência se, por culpa do autor, resulta impossível a lavratura oportuna do despacho ordinatório da citação” (RTJ 121/32)

“A distribuição do pedido, por si só, não tem o condão de interromper ou de afastar a decadência (CPC, art. 220); apenas o despacho ordenando a citação é que produz tal efeito (CPC, art. 219, §1º; RT 471/84). É certo que ‘proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não justifica o acolhimento da argüição de prescrição ou decadência’ (STJ, súmula n. 106). Porém, para que tenha incidência a regra contida na súmula, cumpre à parte promover todos os atos de sua exclusiva competência para viabilizar aquele despacho” (TJSC, Apelação Cível 97.0006222-2, 14 de abril de 1998).

“Se o autor, apesar de protocolizar a petição dentro do biênio, não obteve, por inércia, o despacho ordenando a citação naquele prazo, operou-se a decadência do direito à rescisão” (STF, RE 114.920, Min. Carlos Madeira; RT 636/234).

“O art. 263 do CPC é expresso: não basta a propositura da ação (distribuição ou despacho da inicial) para interromper a prescrição ou impedir se consume a decadência; é mister despacho ordenando a citação ou, no mandado de segurança, determinando a requisição de informações (RT 471/84)” (ACMS 4279, Des. Rubem Córdova).

“Se a citação não for promovida dentro do prazo legal, consuma-se a decadência, inobstante ajuizada a rescisória no biênio, uma vez verificado que o retardamento daquele ato se deu por negligência do autor” (2º TACSP, JTACP-RT 93/381).

E mais:

“Somente se perquire a ocorrência, ou não, de obstáculo judicial à efetivação da citação, após a satisfação, pelo autor, dos dois requisitos contidos nos §§ 2º e 3º do art. 219 do CPC como tais, entendidos o ato de proporcionar ao oficial de justiça os meios necessários ao cumprimento do mandato, antecipando despesas e fiscalizando o cumprimento e requerer, não citado o réu, a prorrogação por mais noventa dias” (TAMG, Agr. 4195, rel. juiz Bady Curi).

Em conclusão final: a prescrição da ação proposta pelos autores, por todas essas razões, é irrefutável e esférica, isto é, pode ser vislumbrada de qualquer ângulo em que se ponha o operador do direto. Este sim, deve ser o entendimento. Os julgados acima transcritos levam a esta conclusão.

DO MÉRITO

DOS FATOS

Os autores, segundo alegam, teriam sido, na noite do dia ….o de ……. de ……, “presos”, na Delegacia de Furtos e Roubos do …………, para que informassem o paradeiro de……………., que tinha envolvimentos com o ………….

Em seguida, foram para a Delegacia da Rua …………, sob o comando, na época, do Delegado Dr. …………, sendo liberados logo após.

Sustentam ainda – sem fazer qualquer prova do alegado, nem demonstrar qualquer nexo de causalidade entre os fatos – que a esposa do requerente ……………, na época, aguardava o nascimento de seu primeiro filho, mas sofreu um aborto, passando mais de 4 anos para iniciar novo processo de gravidez.

Em razão desses fatos, pediram indenização por danos morais, na vultosa quantia de R$ …………. para cada, como compensação pela dor sofrida.

Esses foram os fatos narrados pelos autores. Ocorre, douto magistrado, que não foi exatamente isso que aconteceu, naqueles primeiros dias de ………

Na verdade, omitiram os autores fatos extremamente relevantes para a obtenção da justa solução ao caso concreto.

Olvidaram os requerentes em explicar que tudo teve início com o assalto ao Banco ……….., agência de ………., …………, ocorrido naquela época.

Neste assalto, houve o seqüestro do gerente e outros servidores da agência bancária, bem como a morte de Policial Militar.

Os assaltantes-seqüestradores, logo após o assalto, vieram para o Estado de …………, onde possuíam parentes (inclusive, os requerentes, que eram parentes diretos de um deles), cuja prisão preventiva já estava decretada.

A Secretaria de Segurança Pública de …………, responsável pela libertação dos reféns, descobriu que os criminosos estariam mantendo contatos com os seus familiares, inclusive com os autores.

Por esta razão, no intuito de facilitar a negociação para a libertação dos reféns, foi requisitada a presença dos autores, para ajudarem na intermediação, ou melhor, na negociação da soltura do seqüestrados, evitando-se, com isso, que uma tragédia ainda maior ocorresse.

Assinale-se que, em qualquer lugar do mundo, em hipóteses tais, onde há reféns ameaçados de morte, a presença dos familiares dos seqüestradores é de fundamental importância para a negociação entre a polícia e os infratores.

A par disso, informa-se que, dada a singeleza da operação, envolvendo criminosos de alta periculosidade, a atuação do “…………” era extremamente necessária e, por isso, foi requerida, sendo eles que se dirigiram à casa dos autores, determinando que comparecessem à delegacia para ajudar na negociação com os seqüestradores. Nenhum abuso houve nesse momento, conforme demonstrará o responsável por esta divisão de operações especiais, o Senhor ………….

No caso dos autos, os autores não foram presos (nem sequer em cela ficaram), não foram ameaçados, muito menos torturados ou constrangidos de qualquer forma. Eles próprios se predispuseram a ajudar a polícia, buscando salvar a própria vida de seu parente, que, inegavelmente, estava ameaçada.

Os próprios autores admitem que a esposa de …………, “obstinada, não se afastou das grades que trancafiavam o seu marido” (fl. 3). Ora, será que um preso teria tamanha liberdade em ter presente sua esposa, a toda hora, a seu lado? É claro que não…

Na realidade, prisão não houve. Os requerentes ficaram na Delegacia apenas o tempo necessário à libertação dos reféns e negociação com os seqüestradores. Não foram “três dias” como afirmam os autores; mas o momento em que eles se predispuseram a ajudar na negociação, por livre e espontânea vontade. Nem sequer foi aberto inquérito policial; a idoneidade e a inocência dos autores jamais foram questionadas. O depoimento das testemunhas arroladas hão de comprovar este fato, sobretudo do Delegado responsável pelo caso, Senhor …………, hoje já aposentado.

O mais relevante é que a operação foi sucedida com êxito. Os reféns foram libertados com vida, o que demonstra o importante trabalho da polícia neste caso, onde houve tanto clamor público.

Assim, conforme se demonstrará ao cabo desta petição, o pedido desta ação, caso não sejam comprovados todos os fatos narrados ao longo da instrução (que certamente não serão), é completamente insubsistente, além de, inegavelmente, ser excessivo o valor pleiteado. Vejamos.

DO DIREITO

1. Brevíssimas Considerações Acerca da Responsabilidade Extracontratual do Estado

Constitui ponto pacífico: a responsabilidade extracontratual do Estado por danos derivados de comportamentos administrativos de seus agentes é objetiva, ou seja, independe da culpa do agente. É o que se extrai de uma adequada ilação do dispositivo constitucional insculpido no § 6º, art. 37:

“§ 6º – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

Com efeito, evoluindo da total irresponsabilidade dos atos praticados pelos agentes públicos, em decorrência do princípio norteador dos regimes absolutistas segundo o qual o rei nunca erra (“the king can no wrong”), o conceito de responsabilidade pública da Administração, sempre crescendo em direção à proteção dos Administrados, atingiu um estágio de evolução – compatível com o espírito democrático e solidário de um Estado de Direito – pelo que a obrigação de indenizar surge tão só da equação: FATO + DANO + NEXO CAUSAL. É a Teoria do Risco Administrativo, na qual a jurisprudência pátria tem-se firmado:

“RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO – TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO – EXEGESE. De acordo com o art. 37, § 6º, da CF, as pessoas jurídicas de direito público respondem pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. Nosso legislador constitucional adota a teoria do risco administrativo, e por esta não se exige a prova da culpa do agente público. São suficientes para caracterizar a sua responsabilidade a prova do dano causado pelo agente público e o nexo causal entre a ação do agente e os danos” (STJ – Ac. unân. da 1ª T. publ. em 8-11-93 – Rec. Esp. 38.666-7-SP – Rel. Min. Garcia Vieira – Advs.: Maria Beatriz de Biagi Barros e Carlos Alberto de Freitas).

A doutrina autorizada de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, seguindo a lição do Prof. OSWALDO ARANHA BANDEIRA DE MELLO, defende que só se configura a responsabilidade fundada na teoria do risco-proveito, se se atentar contra a igualdade de todos diante dos encargos públicos, em lhe atribuindo danos anormais, acima dos comuns, inerentes à vida em sociedade (Curso de Direito Administrativo. 5a ed., Malheiros, São Paulo, 1994, p. 506). Em idêntico sentido, CARLOS ARI SUNDFELD:

“quando em pauta a responsabilidade estatal por comportamentos lícitos, mister que o dano sofrido seja anormal (isto é, excedente das inconveniências comuns da vida em sociedade) e especial (ou seja, atinja sujeitos determinados, não as pessoas em geral)” (Fundamentos de Direito Público. 4ª ed. Malheiros, São Paulo, 2000, p. 183).

Ora, no caso dos autos, as conseqüências suportadas pelos autores em decorrência da investigação criminal instaurada para a soltura dos reféns foram, a princípio, normais, inerentes à vida em sociedade, principalmente por se tratarem os autores parentes de um homem periculoso, membro do …………, com participação em assalto, com vítimas e seqüestro de pessoas trabalhadoras e que estava sendo perseguido pela Polícia, estando, por conseqüência, sujeito a controles mais rigorosos por parte da população.

Em nome do interesse público, consistente na libertação dos reféns, fica patente a legitimidade de todo o procedimento investigatório, não dando ensanchas a qualquer indenização por danos à moral dos autores.

Ressalte-se que, em momento algum, se pôs em dúvida a inocência dos autores. Tanto que nem sequer foi aberto inquérito policial.

Havia, in casu, a necessidade imperiosa da ajuda dos autores na soltura dos reféns. Somente eles – familiares do seqüestrador – teriam condições de manter um diálogo amistoso e racional, evitando-se o pior desfecho que um seqüestro pode ter: a morte do refém e dos seqüestradores.

2. A colisão de direitos fundamentais (Interesse Público vs. Interesse Privado)

As normas constitucionais vivem em permanente estado de tensão latente. Muitas vezes, elas parecem conflitantes, antagônicas até. Essa tensão existente entre as normas é conseqüência da própria carga valorativa inserta na Constituição, que, desde o seu nascedouro, incorpora, em uma sociedade pluralista, os interesses das diversas classes componentes do Poder Constituinte Originário. Esses interesses, como não poderia deixar de ser, em diversos momentos não se harmonizam entre si em virtude de representarem a vontade política de classes sociais antagônicas. Surge, então, dessa pluralidade de concepções – típica em um “Estado Democrático de Direito” que é a fórmula política adotada por nós – um estado permanente de conflito (colisão) entre as normas constitucionais. Como explica MÜLLER, a Constituição é de si mesma um repositório de princípios às vezes antagônicos e controversos, que exprimem o armistício na guerra institucional da sociedade de classes, mas não retiram à Constituição seu teor de heterogeneidade e contradições inerentes, visíveis até mesmo pelo aspecto técnico na desordem e no caráter dispersivo com que se amontoam, à consideração do hermeneuta, matéria jurídica, programas políticos, conteúdos sociais e ideológicos, fundamentos do regime, regras materialmente transitórias embora formalmente institucionalizadas de maneira permanente e que fazem, enfim, da Constituição um navio que recebe e transporta todas as cargas possíveis, de acordo com as necessidades, o método e os sentimentos da época (BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. p. 460).

Analisando o presente caso sob uma ótica constitucional, perceber-se-á que se está diante de uma colisão de direitos fundamentais: o direito dos autores (que, na verdade, não foi violado) e o direito à vida dos reféns e da própria sociedade em ver capturado os seqüestradores e assaltantes de uma instituição bancária. Surge, mais uma vez, o interesse público em confronto com o interesse privado. E qual a solução para este conflito, já que ambos os direitos possuem fundamento constitucional?

Quem nos fornece esta resposta é o jurista RONALD DWORKIN, através do que ele denominou dimensão de peso e importância dos princípios (dimension of weights). Na sua clássica obra Taking Rights Seriously, após explicar que as regras jurídicas são aplicáveis por completo ou não são, de modo absoluto, aplicada (dimensão do tudo ou nada), o prof. da Universidade de Oxford diz que os princípios “possuem uma dimensão que não é própria das regras jurídicas: a dimensão do peso ou importância. Assim, quando se entrecruzam vários princípios, quem há de resolver o conflito deve levar em conta o peso relativo de cada um deles (…). As regras não possuem tal dimensão. Não podemos afirmar que uma delas, no interior do sistema normativo, é mais importante do que outra, de modo que, no caso de conflito entre ambas, deve prevalecer uma em virtude de seu peso maior. Se duas regras entram em conflito, uma delas não é válida” (apud ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de Princípios Constitucionais. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1999, p. 65).

Portanto, somente diante do caso concreto será possível resolver o problema da aparente colisão de princípios, através de um ponderação (objetiva e subjetiva) de valores, pois, ao contrário do que ocorre com a antinomia de regras, não há, a priori, critérios formais (meta-normas) e standards preestabelecidos para resolvê-lo. O intérprete, no caso concreto, através de uma análise necessariamente tópica, terá que verificar, seguindo critérios objetivos e subjetivos, qual o valor que o ordenamento, em seu conjunto, deseja preservar naquela situação.

In casu, afigura-se que o ordenamento jurídico – e, sintomaticamente, a sociedade – deseja preservar mesmo é o interesse público, decorrente da captura e punição de perigosos criminosos, principalmente pelo aumento do nível da violência nos dias de hoje, bem como ao próprio bem jurídico maior, que é a vida dos reféns e desses próprios delinqüentes.

A sociedade não suporta mais tanta violência. É possível, a princípio, submeter os cidadãos a investigações, inquéritos e processos criminais, sempre que houver razões suficientes para tanto. O que não se pode é permitir, atonitamente, a morte de trabalhadores, ocasionada pela inércia da polícia. É a vida dos reféns que estavam em jogo; aliás, era também a vida dos próprios seqüestradores. Por isso, os requerentes possuíam todo o interesse em participar das negociações, visando salvar seu próprio parente.

O bem jurídico vida, neste caso, deve prevalecer sobre qualquer outro direito que esteja em jogo. Qualquer transtorno sofrido pelos autores é risível, em confronto com o interesse social em ver preservada a vida dos reféns.

Por todas essas razões, a presente ação – caso não fiquem sobejamente comprovados os fatos narrados – deve ser extinta, julgando-se improcedente o pedido autoral, restabelecendo o direito fundamental da sociedade de, pelo menos, tentar capturar os criminosos, sem que se corra o risco de se ter sempre e sempre que se indenizar o indivíduo toda vez que sua ajuda for imprescindível à solução do caso. Seria como colocar uma espada de Dâmocles sobre as cabeças dos agentes públicos responsáveis pelas investigações.

A título de corroboração de tudo o que foi exposto, vale colacionar decisão judicial em prol do que foi defendido, que ressalta bem o não cabimento de danos morais em casos como este:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. CONDENAÇÃO CRIMINAL DESCONSTITUÍDA PELA DÚVIDA. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. A utilização dos meios conferidos por lei às pessoas para realizar um interesse juridicamente tutelado não constitui abuso ou violação de direito de que resulte a obrigação de indenizar, salvo se houver má fé, erro palmar ou injustificável teimosia de quem os emprega” (Apelação cível 37.912, Terceira Câmara Civil, 26 de novembro de 1991, PUBLICADO NO DJESC nº 8.395 – Pág 07 – 10/12/91, Relator: Des. Eder Graf).

Em conclusão final: a ausência da responsabilidade civil do Estado, no presente caso, por todas as razões expostas pode ser vislumbrada facilmente. Este sim deve ser o entendimento. O julgado acima transcrito leva a esta conclusão.

3. A necessária redução da verba pleiteada

Por fim, é preciso ressaltar que o valor pleiteado pelos autores estão totalmente fora dos padrões racionais, sobretudo se se levar em conta a situação financeira do Estado de …………, neste triste período de sua história.

É preciso, pois, reduzir os valores pleiteados, caso se julgue procedente o pedido, a quantias que não levem o Estado ao empobrecimento, em contrapartida a um inegável enriquecimento sem causa por parte dos autores.

DOS PEDIDOS

Ante a tudo o que foi exposto, demonstrada a improcedência do pleito do autor, considerando, ainda, estarem prescritas as verbas pleiteadas, espera e pede o ESTADO DE ………… que Vossa Excelência, apreciando estas razões de defesa e por todos os argumentos expendidos:

1) receba a presente contestação;

2) determine a citação de todos os servidores públicos que agiram com dolo ou culpa neste caso para integrarem a lide como litisdenunciado (denunciação à lide) ou, do contrário, caso não se admita a denunciação à lide em casos tais, declare, expressamente, o direito de, no futuro, em eventual hipótese de ser julgado procedente o pedido da ação, o Estado propor ação regressiva contra todos os servidores públicos envolvidos no caso, cujos nomes serão descobertos ao cabo da instrução processual, tendo em vista que somente os autores poderão indicar quem agiu com dolo ou culpa;

3) determine a produção de todos os tipos de prova em direito admitidos, principalmente a juntada posterior de documentos, visando aquilatar a presença da verdade substancial e não meramente formal;

4) extinga o processo, sem julgamento do mérito, dada a ausência de capacidade jurídica do Governo do Estado de ………… para ser parte ou intime o autor para emendar a inicial, indicando não o Governo do Estado, mas o próprio Estado de ………… para integrar a lide;

5) ou, sucessivamente, declare a inépcia da petição inicial, tendo em vista a ausência de requisitos legais (falta do endereço do patrono dos autores, falta de requerimento de intimação do membro do Ministério Público e ausência de documentos indispensáveis a propositura da ação) ou, igualmente, intime o autor para emendar a inicial, indicando o endereço onde receberá intimações, bem como para requerer a intimação do representante do Ministério Público, que é o órgão responsável pelo controle externo da polícia;

6) ainda de forma sucessiva, extinga o processo, com julgamento do mérito, tendo em vista a consumação da prescrição da ação, vez que os fatos narrados ocorreram há mais de cinco anos (lembra-se que a interrupção da prescrição somente se dá com o despacho ordenatório da citação, conforme demonstrado);

7) ultrapassados os argumentos acima expendidos, julgue totalmente improcedente o pedido desta ação em todos os seus termos, em razão da não comprovação das alegações autorais e da ausência de responsabilidade civil do Estado no presente caso, uma vez que havia a imperiosa necessidade da participação dos autores, visando a libertação dos reféns, através da negociação com os seqüestradores;

8) em caso contrário, ou seja, caso fique comprovado que houve abuso, arbitre um valor indenizatório compatível com a situação financeira do réu e dos próprio autores, sob pena de se configurar verdadeiro enriquecimento ilícito, sobretudo por se ter em vista a relevância da atuação da polícia neste caso;

9) por fim, condene o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor atribuído à causa.

Nesses Termos,

Pede Deferimento.

[Local], [dia] de [mês] de [ano].

[Assinatura do Advogado]

[Número de Inscrição na OAB]

Como citar e referenciar este artigo:
MODELO,. Modelo de Contestação – Governo Estadual – Indenização – Prisão Ilegal. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2013. Disponível em: https://investidura.com.br/peticoes/contestacao/modelo-de-contestacao-governo-estadual-indenizacao-prisao-ilegal/ Acesso em: 20 abr. 2024