Teoria Política

A Teoria das Formas de Governo – Capítulo IV: Políbio

“Além dos textos de Platão e de Aristóteles, a Antigüidade clássica nos legou uma terceira obra fundamental para a teoria das formas de governo: o livro VI da História de Políbio.” (p.65)

“Grego de nascimento, foi deportado para a Roma depois da conquista da Grécia; entrou em contato ali com os meios mais elevados.” (p.65)

“Antes de examinar a constituição romana, Políbio tece algumas considerações sobre as constituições em geral – considerações que constituem uma das mais completas teorias das formas de governo que a história nos legou.” (p.65)

            Políbio é um historiador grego, diferente de Platão e Aristóteles, que são filósofos. Deportado para Roma, junto com mais 999 nobres, após a derrota da Grécia, entrou em contato com pessoas dos mais altos cargos. Descreve a constituição dos povos que narra pois alega que ela é a responsável pelo êxito, ou não, de uma nação. Aproveita para elogiar a constituição romana pois afirma que, em pouco tempo, foi capaz de expandir, e muito, seu império.

            Expõe, então, a teoria das três teses, fixando a “sistemática clássica das formas de governo”:

1 – existem fundamentalmente seis formas de governo.

2 – essas seis formas de governo se sucedem, constituindo um ciclo.

3 – na síntese das três boas formas tradicionais de governo nasce a sétima e melhor forma, o governo misto.

“A maior parte dos que nos querem dar lições sobre este ponto fala de três formas constitucionais, chamando a primeira de ‘reino’, a segunda de ‘aristocracia’ e a terceira de ‘democracia’” (p.66)

Políbio chama a terceira melhor forma de governo de democracia, diferentemente de Platão e Aristóteles, que a chamam de timocracia e politia, respectivamente. Afirma, também, que um Reino bom, é aquele que é aceito voluntariamente pelo povo, sem o uso da força. Que uma Aristocracia boa é aquela que apenas os melhores foram eleitos e que uma democracia decente é aquela que o ato de respeitar o próximo e os valores da sociedade está impregnado de forma cultural no povo.

“A observação mais substancial tem a ver com o critério adotado por Políbio para distinguir as constituições boas das más. É um critério que não corresponde ao aristotélico, mas reproduz o de Platão.” (p.67)

“Uma vez definidas as seis formas, Políbio as expõe em ordem cronológica, apresentando a teoria dos ciclos.”(p.67)

“(…) o ciclo polibiano se desenvolve através da alternância de constituições boas e más; contudo, a constituição boa que segue é inferior àquela que a precede; a má é pior do que a má que a precede. Em outras palavras, a linha decrescente do ciclo platônico é contínua, a do ciclo polibiano é fragmentada por uma alternância de momentos bons e maus, embora tenda para baixo.” (p.67)

            Políbio chama a forma corrompida da democracia de oclocracia (“governo das massas”), inserindo, assim, um novo termo para designar o governo popular na sua forma corrompida. O critério que Políbio usa para caracterizar uma constituição, como boa ou má, é relacionar o uso da força que foi necessário para impor essa forma de governo com o critério de legal e ilegalidade de Platão, diferente de Aristóteles, que seguia o raciocínio de interesse público e privado dos governantes.

            As seis formas de governo de Políbio são: reino, tirania, aristocracia, oligarquia, democracia e oclocracia. A teoria do ciclo polibiano das formas de governo possui uma tendência degenerativa, como podemos ver, também, em Platão, alternando-se entre formas boas e más de governo. O reino é sucedido pela tirania, a aristocracia, pela oligarquia e a democracia, pela oclocracia.

“(…) de estar implícita na própria natureza dos governos, que não podem deixar de sofrer o processo de transformação.” (p.68)

“Para demonstrar de modo evidente que o germe da corrupção está no interior de todas as constituições, Políbio usa a imagem da oxidação do ferro e da ação do caruncho na madeira.” (p.68)

“(…) o que acontece no fim do ciclo, quando a degradação das constituições chega à fase final (que é a oclocracia)” (p.68)

“A concepção que Políbio tem da história é cíclica; segundo ele, a história é uma repetição contínua de eventos que tornam sempre sobre si mesmos – o “eterno retorno do mesmo”.” (p.68)

            A concepção da história, de Políbio, é fatalista, pois parece ser algo predeterminada, natural e obrigatória. Políbio faz uma analogia da ação da ferrugem no ferro para afirmar que toda constituição possui um mal natural irrevogável. Ao chegar à fase final do ciclo polibiano, Políbio nos diz que a forma de governo retorna ao início, de certa forma, milagrosamente, ou seja, a oclocracia volta a ser um Reino. Entretanto, a teoria polibiana dos ciclos não se aplica a outras nações ou impérios, pois Políbio possuía uma visão limitada de mundo, vivendo apenas na região do mediterrâneo.

“A tese principal da teoria polibiana das constituições é sem dúvida a do governo misto.” (p.69)

“Isso significa que todas as constituições sofrem de um vício, o da falta de estabilidade.” (p.69)

“Está claro, de fato, que precisamos considerar ótima a constituição que reúne as características de todas as três formas.” (p.69)

“(…) para Políbio, a constituição de Esparta é excelente – porque é mista.”

            A teoria dos ciclos afirma que, por serem instáveis, mesmo as melhores formas simples de governo são más. Que ser simples é ruim, pois não é um governo misto, estável.

“Como dessa forma cada órgão pode ‘obstaculizar’ os outros ou ‘colaborar’ com eles, sua união é benéfica em todas as circunstâncias, de modo que não é possível haver um Estado melhor constituído.” (p.71)

            Políbio afirma que a melhor forma de governo é o misto, pois ele pode proporcionar o equilíbrio e a estabilidade que a composição das três melhores formas de governo, reino, aristocracia e democracia, fornece. Desse modo, o povo controlaria o rei, que está sendo fiscalizado pelo senado. Um controla o outro e tem, de certa forma, medo da fiscalização do outro, não havendo, assim, desvios de conduta por parte do governo.

“Políbio conclui perfeitamente a exposição que iniciara dizendo que a primeira causa do êxito ou do insucesso de um povo deve ser procurada na sua constituição.” (p.71)

“A teoria de Políbio é uma teoria dos mecanismos constitucionais que tornam possível uma forma de governo estável — por isso preferível a qualquer outra.” (p.71)

Políbio vai achar a razão da excelência do governo misto no principio do equilíbrio, que seria um mecanismo de controle reciproco dos poderes. Na idade moderna, isso se tornará a base das teorias constitucionalistas (balance of power). O historiador grego ainda afirma: “Nem deve este principio ser desprezado, nem se deve permitir tanto poder a ninguém, para que depois te seja impossível discutir com ele nos mesmos termos acerca de teus direitos manifestos.”.

Aristóteles antecipou, de certo modo, o conceito de governo misto ao estabelecer a politia como uma “admiração sentida por uma sociedade sem grandes desequilíbrios de riqueza.”. (p.71)

“Parece não haver dúvida de que desde o princípio Políbio tem perfeita consciência de que até mesmo o Estado romano, não obstante sua excelência, está sujeito à “lei natural” do nascimento, crescimento e

morte; que, portanto, o que constitui o título de mérito do governo misto é sua maior estabilidade – não sua perenidade.” (p.72)

Para Políbio, o governo misto não é sinônimo de eterna estabilidade, mas sim de um tipo de governo que leva mais tempo que as formas simples para sofrer mutações. Afirma, ainda, que até a constituição romana é alvo de degeneração, pois, seguindo uma “lei natural”, após o surgimento, desenvolvimento e auge de uma constituição, vem a sua decadência.

 

BOBBIO, Norberto. A teoria das formas de governo. 10 ed. Brasília: UnB, 2001. p. 65-76.

 

*Eduardo André Carvalho Schiefler é acadêmico de Direito na Universidade Federal de Santa Catarina

Como citar e referenciar este artigo:
SCHIEFLER, Eduardo André Carvalho. A Teoria das Formas de Governo – Capítulo IV: Políbio. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2014. Disponível em: https://investidura.com.br/resumos/teoriapolitica/a-teoria-das-formas-de-governo-capitulo-iv-polibio/ Acesso em: 18 abr. 2024