STF

Informativo STF Mensal – nº3

 

Brasília, outubro de 2010 – nº 3

Compilação dos Informativos nºs 603 a 606

O Informativo STF Mensal apresenta todos os resumos de julgamentos divulgados pelo Informativo STF concluídos no mês a que se refere e é organizado por ramos do Direito e por assuntos.

 

 

SUMÁRIO

 

Direito Administrativo

Agentes Públicos

Revisão Geral de Remuneração (28,86%): Servidores Civis e Militares

Atividade Policial: Aposentadoria e Recepção da LC 51/85

Acumulação de Cargos e Demissão – 1 e 2

Concurso Público

Concurso Público para Cargo de Procurador da República e Requisito Temporal

 

Direito Civil e Processual Civil

Recursos

Processamento de RE trancado na Origem – 3

 

Direito Constitucional

Competência Originária do STF

Conflito de Atribuições e Pronaf

Conselho Nacional de Justiça

Decisão Judicial e Suspensão de Efeitos pelo CNJ

Controle de Constitucionalidade

Remuneração de Servidor Público e Vício Formal

Tribunal de Contas: Lei Orgânica e Vício Formal

Tribunal de Contas: Composição e Modelo Federal

Recebimento de Denúncia: Suspensão Preventiva Automática e Devido Processo Legal

Vinculação de Receita de Custas e Emolumentos: Prejudicialidade

Extradição

Extradição e Prescrição – 1 e 2

 

Direito Eleitoral

Eleições

Lei da “Ficha Limpa”: Inelegibilidade e Renúncia – 1 a 4

Direito Penal

Crimes contra a Liberdade Pessoal

Rapto e “Abolitio Criminis”

Extinção de Punibilidade

HC: Prescrição e Redimensionamento da Pena

Corrupção de Menores para Prática de Mendicância e “Abolitio Criminis”

Penas

Superveniência de Condenação e Alteração da Data-Base

Comutação de Pena e Revogação de Livramento Condicional

Roubo: Emprego de Arma de Fogo e Causa de Aumento

Roubo: Emprego de Arma Branca e Causa de Aumento

Pena de Multa e Súmula 719 do STF

Unificação de Penas e Alteração de Data-Base

Homicídio e Confissão Espontânea

Princípios e Garantias Penais

Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância – 1 e 2

Crime de Descaminho e Princípio da Insignificância

Princípio da Insignificância e Descaminho – 2

Tráfico Internacional de Munição e Princípio da Insignificância

Princípio da Insignificância e Elementos Subjetivos Desfavoráveis

 

Direito Processual Penal

Ação Penal

Interrogatório: Lei 11.719/2008 e Lei 8.038/90

Crimes da Lei 8.666/93: Prestação de Serviços e Enquadramento

Ação Penal: Renúncia a Mandato de Parlamentar e Competência do STF – 1 a 6

Recebimento de Denúncia e Provas Ilícitas – 3 e 4

Competência

Portador do Vírus HIV e Tentativa de Homicídio – 2

Crime Militar praticado por Civil e Competência

Execução das Penas

HC e Transferência de Presídio

Habeas Corpus

Agravo em Execução e “Habeas Corpus”

Inquérito Policial

Inquérito Policial e Arquivamento Implícito

Nulidades

Tribunal do Júri e Nulidade

Princípios Processuais Penais

Tráfico de Drogas: Combinação de Leis e Princípio do “Ne Reformatio in Pejus”

Prisão e Liberdade Provisória

Prisão Cautelar e Excesso de Prazo

Prisão Penal

Recâmbio de Preso e Inércia Estatal

Provas

Crime de Furto: Qualificadora e Nulidade de Perícia

Testemunha Não Arrolada em Denúncia e Oitiva pelo Juiz

 

 

Direito Tributário

Impostos

Repercussão Geral e Alteração nas Premissas Fático-Jurídicas – 1 e 2

 

 

DIREITO ADMINISTRATIVO

 

Agentes Públicos

Revisão Geral de Remuneração (28,86%): Servidores Civis e Militares

O Tribunal resolveu questão de ordem suscitada pelo Min. Gilmar Mendes, em recurso extraordinário do qual relator, em que discutida a possibilidade de extensão do índice de reajuste de 28,86% aos militares contemplados com índices inferiores pelas Leis 8.622/93 e 8.627/93, para: a) reconhecer a repercussão geral da questão analisada neste recurso; b) também reconhecer a repercussão geral da extensão do reajuste de 28,86% aos servidores civis, ressaltando, quanto a essa matéria, entendimento consolidado pela edição do Enunciado 672 da Súmula do STF (“O reajuste de 28,86%, concedido aos servidores militares pelas Leis 8622/1993 e 8627/1993, estende-se aos servidores civis do poder executivo, observadas as eventuais compensações decorrentes dos reajustes diferenciados concedidos pelos mesmos diplomas legais”); c) reafirmar a jurisprudência da Corte segundo a qual há de se estender o reajuste de 28,86% aos servidores militares contemplados com índices inferiores pelas Leis 8.622/93 e 8.627/93, já que se trata de revisão geral dos servidores públicos, observadas, entretanto, as compensações de reajustes concedidos e a limitação temporal da Medida Provisória 2.131/2000, atual Medida Provisória 2.215-10/2001; d) prover parcialmente este recurso extraordinário, apenas para limitar as diferenças devidas à data em que entrara em vigor a referida medida provisória; e) autorizar o STF e os demais tribunais a adotar procedimentos relacionados à repercussão geral, principalmente a retratação de decisões ou a declaração de prejuízo de recursos extraordinários, sempre que as decisões contrariarem ou confirmarem, respectivamente, a jurisprudência ora reafirmada. Alguns precedentes citados: RE 408754 AgR/BA (DJU de 25.2.2005); RMS 22307/DF (DJU de 13.6.1997); RE 410778/RS (DJU de 26.8.2005); RE 580108 QO/SP (DJe de 5.2.2009).

RE 584313 QO/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 6.10.2010. (RE-584313)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 603, Plenário, Repercussão Geral)

 

Atividade Policial: Aposentadoria e Recepção da LC 51/85

O Plenário negou provimento a recurso extraordinário interposto, pelo Instituto de Previdência do Estado do Acre – ACREPREVIDÊNCIA, contra acórdão de tribunal de justiça local que concedera a servidor público policial o direito a aposentadoria especial conforme a Lei Complementar 51/85, que dispõe, nos termos do art. 103 da Constituição anterior, sobre a aposentadoria do funcionário policial. Na origem, delegado de polícia civil estadual impetrara mandado de segurança no qual pleiteara a aplicação da referida lei complementar, mesmo após a edição da EC 20/98 — que, dentre outras providências, modificou o § 4º do art. 40 da CF/88. A ordem fora denegada em primeira instância, o que ensejara apelação do impetrante à Corte estadual que, provida, culminara neste recurso extraordinário. Registrou-se que, depois do reconhecimento da repercussão geral da questão constitucional suscitada neste recurso, houvera o julgamento da ADI 3817/DF (DJe de 3.4.2009), no qual concluíra-se que a Constituição atual recepcionara a LC 51/85, especificamente o seu art. 1º, I [“Art. 1º – O funcionário policial será aposentado: … I – voluntariamente, com proveitos integrais, após 30 (trinta) anos de serviço, desde que conte, pelo menos 20 (vinte) anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial”]. Resolveu-se, inicialmente, reafirmar a recepção da LC 51/85. Em seguida, aduziu-se que o acórdão adversado baseara-se na recepção do diploma legal e examinara se ao recorrido era aplicável a lei, consideradas as condições de fato da prestação de serviço e, portanto, a submissão dele às condições de periculosidade pela permanência na carreira. Observou-se que rediscutir, diante dos fatos, se o recorrido preencheria as exigências legais para a aposentadoria especial não seria cabível em sede de recurso extraordinário. Quanto ao argumento do recorrente de que a aplicação da norma não seria automática, ressaltou-se que, na situação descrita nos autos, as instâncias de mérito, responsáveis pelo exame de provas, teriam comprovado que ele cumpriria rigorosamente as condições do aludido art. 1º. Por fim, o Min. Gilmar Mendes frisou que o exercício deve ocorrer em cargo de natureza estritamente policial para se atenderem aos requisitos do dispositivo legal.

RE 567110/AC, rel. Min. Cármen Lúcia, 13.10.2010. (RE-567110)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 604, Repercussão Geral, Plenário)

 

Acumulação de Cargos e Demissão – 1

A 2ª Turma desproveu recurso ordinário em mandado de segurança impetrado em favor de médico demitido por acumular 4 vínculos profissionais, sendo 2 com o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, 1 com a Prefeitura de Eldorado do Sul/RS e outro com a Prefeitura de São Leopoldo/RS. O recorrente alegava que o § 5º do art. 133 da Lei 8.112/90 lhe asseguraria o direito de optar por uma combinação lícita de cargos públicos até o momento da apresentação da defesa no procedimento administrativo (“§ 5º A opção pelo servidor até o último dia de prazo para defesa configurará sua boa-fé, hipótese em que se converterá automaticamente em pedido de exoneração do outro cargo”). Sustentava, ainda, que teria sido desconsiderada a opção oferecida junto com a defesa escrita; que o vínculo funcional com a Prefeitura de São Leopoldo apresentava caráter emergencial, não se prestando para impedir a acumulação de cargo; e por fim, que a entrega de pedido de exoneração dos cargos às prefeituras seria suficiente para se reconhecer a boa-fé.

RMS 26929/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 19.10.2010. (RMS-26929)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Acumulação de Cargos e Demissão – 2

Ressaltou-se que, em 9.6.2003, o recorrente reconhecera que sua situação funcional era irregular e se comprometera a apresentar a exoneração dos cargos ocupados nos Municípios de Eldorado do Sul e de São Leopoldo. Não obstante, em 3.11.2003, ele fora readmitido, por meio de contrato emergencial, como médico da Prefeitura de São Leopoldo. Observou-se que o § 5º do art. 133 da Lei 8.112/90 não socorreria o recorrente. Aduziu-se, tendo em conta, inclusive, que o recorrente residiria na capital, que caberia a ele demonstrar que o recebimento do termo de opção fora protocolado tempestivamente,ou seja, dentro do prazo de 5 dias do recebimento da citação — para apresentar defesa e fazer a opção pelo cargo público. Consignou-se, entretanto, que a cópia da defesa escrita acusara o seu recebimento pelo INSS somente em 24.5.2004, 12 dias depois da data que constaria do mandado de citação. Asseverou-se que, muito embora a Lei 8.112/91 preveja uma caracterização impositiva da boa-fé, dever-se-ia registrar que o recorrente tivera a oportunidade de corrigir a situação quase um ano antes do prazo para apresentação da defesa. Ademais, rejeitou-se a assertiva de que o caráter emergencial do contrato assumido com a Prefeitura de São Leopoldo afastaria a ilicitude da cumulação. Destacou-se, no ponto, que o dispositivo constitucional que trata de acumulação de cargos para a área de saúde não faz distinção entre contratos permanentes e não permanentes (“Art. 37XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI. … c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas”). Por fim, concluiu-se que a mera entrega do pedido de exoneração não seria suficiente para desfazer o vínculo funcional, porquanto o recorrente contrariara a expectativa oferecida à Administração ao não se desligar dos cargos, tendo, ao contrário, assumido novo contrato junto à Prefeitura de São Leopoldo.

RMS 26929/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 19.10.2010. (RMS-26929)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Concurso Público

Concurso Público para Cargo de Procurador da República e Requisito Temporal

Ante as peculiaridades do caso, o Tribunal, por maioria, deferiu mandado de segurança para assegurar ao impetrante o direito que lhe advenha da aprovação no 24º concurso público para provimento de cargos de Procurador da República. Na espécie, o Procurador-Geral da República denegara a inscrição definitiva do impetrante ao fundamento de não estar atendido o requisito de 3 anos de atividade jurídica previsto no art. 129, § 3º, da CF. Nada obstante, em razão de medidas liminares concedidas pelo STF, o impetrante prosseguira no certame e obtivera aprovação na fase oral. Inicialmente, salientou-se que a pretensão do impetrante não afrontaria o entendimento firmado pela Corte no julgamento da ADI 3460/DF (DJU de 15.6.2007), segundo o qual os 3 anos de atividade jurídica são contados da data da conclusão do curso de Direito e devem ser comprovados na data da inscrição no concurso. Observou-se que o impetrante colara grau como bacharel em Direito em 13.1.2005, e que 18.8.2008 fora o último dia das inscrições definitivas no certame. Em passo seguinte, registrou-se que a controvérsia residiria no período de 13.1.2005 a 31.3.2006, quando o impetrante exercia o cargo, não-privativo de bacharel em Direito, de assessor da direção-geral junto à assessoria jurídica da Direção-Geral do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. Reputou-se que as atividades desempenhadas pelo impetrante no referido período seriam de natureza jurídica. Ademais, enfatizou-se que o cargo de assessor, incompatível com o exercício da advocacia, embora não fosse privativo de bacharel em Direito no Estado do Rio Grande do Sul, o seria em outras unidades da federação. Por outro lado, aduziu-se que, ainda que não considerado o tempo de exercício no cargo de assessor da Direção-Geral do Ministério Público gaúcho, o impetrante preencheria o requisito temporal, haja vista que se inscrevera na Ordem dos Advogados do Brasil em 6.9.2005 e, consoante já afirmado, a inscrição definitiva no concurso se dera em 18.8.2008. Dessa forma, se ignorado o tempo de exercício no aludido cargo de assessor, o termo inicial da atividade jurídica do impetrante, como advogado, seria sua inscrição na OAB. Ressaltou-se que, nesta hipótese, faltar-lhe-iam apenas 19 dias para o atendimento dos requisitos, entretanto, esse período corresponderia a prazo razoável para a expedição da carteira de advogado após o seu requerimento. O Min. Cezar Peluso, Presidente, concedia a ordem ante a situação de fato consolidada. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski que, ao ressaltar o exercício do cargo de assessor pelo impetrante antes da conclusão de seu bacharelado, denegavam a segurança por julgar ausente direito líquido e certo. Precedentes citados: Rcl 4906/PA (DJe de 11.4.2008) e MS 26681/DF (DJe de 17.4.2009).

MS 27604/DF, rel. Min. Ayres Britto, 6.10.2010. (MS-27604)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 603, Plenário)

 

 

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL

 

Recursos

Processamento de RE trancado na Origem – 3

Em conclusão, a 1ª Turma, por maioria, proveu agravo regimental para que seja julgado recurso extraordinário. Tratava-se, na espécie, de agravo regimental contra decisão monocrática do Min. Ricardo Lewandowski, que negara seguimento a agravo de instrumento no qual pretendida a subida do apelo extremo, apresentado contra acórdão do STJ, o qual provera recurso ordinário em mandado de segurança para devolver os autos ao tribunal local. Na origem, a ora agravada impetrara writ contra ato de Presidente de Turma Recursal dos Juizados Especiais no qual alegada a incompetência dos Juizados para apreciação do feito, dado que o valor discutido ultrapassaria o teto legalmente estabelecido (Lei 9.099/95, art. 3º, I) — v. Informativo 572. Sem adentrar a matéria de fundo e ao salientar a sua relevância, considerou-se estar em jogo o sistema constitucional alusivo à atuação dos Juizados Especiais, à do tribunal de justiça quanto aos Juizados Especiais e à do STJ, que não a tem relativamente aos Juizados Especiais. Vencido o relator, que negava provimento ao agravo regimental.

AI 666523 AgR/BA, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ acórdão Min. Marco Aurélio, 26.10.2010. (AI-666523)

(Informativo 606, 1ª Turma)

 

DIREITO CONSTITUCIONAL

 

Competência Originária do STF

Conflito de Atribuições e Pronaf

O Plenário resolveu conflito negativo de atribuição entre o Ministério Público do Estado de São Paulo e o Ministério Público Federal, no sentido de reconhecer a atribuição do segundo para conduzir as investigações de supostas irregularidades na execução do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – Pronaf em município paulista e promover as medidas judiciais eventualmente cabíveis. Considerou-se a presença de verbas públicas federais, as quais decorreriam de convênios, para o Pronaf.

ACO 1281/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 13.10.2010. (ACO-1281)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 604, Plenário)

 

Conselho Nacional de Justiça

Decisão Judicial e Suspensão de Efeitos pelo CNJ

O Conselho Nacional de Justiça – CNJ, sob pena de atuação ultra vires, não pode interferir em atos de conteúdo jurisdicional, emanados de quaisquer magistrados ou de Tribunais da República. Com base nesse entendimento, o Plenário desproveu agravos regimentais em que se pretendia a desconstituição de decisões liminares, proferidas pelo Min. Celso de Mello, em mandados de segurança dos quais relator. As decisões impugnadas suspenderam a eficácia de deliberações administrativas emanadas do Corregedor Nacional de Justiça, cujo dispositivo declarara ineficazes julgamentos de tribunal de justiça concessivos de mandados de segurança impetrados perante a referida Corte. Preliminarmente, rejeitou-se a alegação de prejudicialidade de um dos writs, porquanto a desistência homologada nos autos referir-se-ia a outra impetração e não à presente, favorável a uma das ora agravadas. No mérito, reputou-se que, embora o CNJ esteja incluído na estrutura constitucional do Poder Judiciário, sua natureza seria meramente administrativa e sua competência teria sido definida, de modo rígido, pela EC 45/2004, que introduzira o art. 103 – B na CF. Salientou-se que esse artigo, em seu § 4º, II, estabelece que o referido órgão tem o poder de “apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário”. Aduziu-se que as deliberações administrativas, objetos dos casos em apreço, seriam impregnadas de conteúdo jurisdicional e que o Supremo já assentara posicionamento no sentido de não caber àquele órgão nenhuma competência cujo exercício fosse capaz de interferir no desempenho da função típica do Poder Judiciário (ADI 3367/DF, DJU de 25.4.2005). Competir-lhe-ia, porém, dentre outras atribuições, fiscalizar o exercício dos deveres funcionais por parte do magistrado, e não a atividade jurisdicional dele. Outros precedentes citados: MS 27148/DF (DJe de 25.5.2010) e MS 28537 MC/DF (DJe de 21.5.2010).

MS 28598 AgR-MC/DF, rel. Min. Celso de Mello, 14.10.2010. (MS-28598)

MS 28611 AgR-MC/MA, rel. Min. Celso de Mello, 14.10.2010.(MS-28611)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 604, Plenário)

 

Controle de Constitucionalidade

Remuneração de Servidor Público e Vício Formal

O Tribunal deferiu pedido de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade, proposta pelo Governador do Estado de Santa Catarina, para suspender, com efeitos ex nunc, o art. 3º da Lei 15.215/2010, daquela unidade federativa. O dispositivo impugnado, resultante de emenda parlamentar, fixa o subsídio mensal como forma de remuneração dos membros da carreira de procurador do Estado e cria gratificações em favor dos servidores públicos da Procuradoria-Geral do Estado, da Secretaria de Estado da Administração e do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina. Vislumbrou-se aparente usurpação da iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo para a propositura de leis que disponham sobre aumento de remuneração dos cargos, funções e empregos públicos existentes na estrutura da Administração direta ou autárquica (CF, art. 61, § 1º, II, a), bem como ofensa à vedação de emenda a projeto de lei de iniciativa da citada autoridade que acarrete aumento de despesa (CF, art. 63, I). Precedente citado: ADI 1070 MC/MS (DJU de 15.5.95).

ADI 4433 MC/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 6.10.2010. (ADI-4433)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 603, Plenário)

 

Tribunal de Contas: Lei Orgânica e Vício Formal

Por considerar usurpado, em princípio, o poder de iniciativa reservado constitucionalmente aos Tribunais de Contas para instaurar processo legislativo que visa alterar sua organização e seu funcionamento, o Tribunal deferiu, com efeitos ex tunc, pedido de medida cautelar em duas ações diretas de inconstitucionalidade propostas, respectivamente, pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil – ATRICON e pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, para suspender a eficácia da Lei 2.351/2010, do Estado de Tocantins. A norma impugnada, de origem parlamentar, alterou e revogou diversos dispositivos da Lei Orgânica do Tribunal de Contas daquele ente federativo. Preliminarmente, na linha de precedentes firmados pela Corte, assentou-se a legitimidade ativa ad causam da ATRICON, bem como se entendeu configurada a pertinência temática. Em seguida, sem adentrar o exame de cada artigo do diploma adversado, reputou-se configurado o aparente vício de iniciativa, porquanto não caberia ao Poder Legislativo estadual, mediante projeto de lei de iniciativa parlamentar, propor modificações em dispositivos da Lei Orgânica do Tribunal de Contas estadual. Enfatizou-se que apenas a própria Corte de Contas teria a prerrogativa de fazer instaurar processo legislativo concernente à alteração desse diploma normativo, sob pena de se neutralizar sua atuação independente. Consignou-se, por fim, que a lei em questão, além de acarretar conflitos institucionais entre o Tribunal de Contas e a Assembléia Legislativa, subtrairia daquele competências fiscalizatórias e interferiria em sua autonomia administrativa e financeira. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia a medida cautelar com eficácia ex nunc por considerar que a natureza do pronunciamento do Supremo seria acautelador e não reparador.

ADI 4418 MC/TO,rel. Min. Dias Toffoli, 6.10.2010. (ADI-4418)

ADI 4421 MC/TO, rel. Min. Dias Toffoli, 6.10.2010. (ADI-4421)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 603, Plenário)

 

Tribunal de Contas: Composição e Modelo Federal

O Tribunal deferiu pedido de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pelo Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB, para suspender, com eficácia ex tunc, a vigência do § 3º do art. 307 da Constituição do Estado do Pará, acrescido pela EC 40/2007. O preceito impugnado dispõe ser de livre escolha do Governador o provimento das vagas de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e do Tribunal de Contas dos Municípios, na falta de auditor ou de membros do Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas que preencham os requisitos para a nomeação. Considerou-se, à primeira vista, desrespeitada a Constituição, cuja sistemática, no que se refere ao Tribunal de Contas, se aplica às unidades da federação. Observou-se, ademais, que o mencionado Estado-membro já teria sido advertido pelo Supremo relativamente à discrepância do modelo de organização do Tribunal de Contas local com o modelo constitucional vigente. Registrou-se, consoante salientado pela Procuradoria-Geral da República, inexistir espaço para soluções normativas que se prestassem a um atraso ainda maior na implementação do modelo constitucional. Afirmou-se, ainda, que a Corte de Contas estadual teria comunicado oficialmente à Governadora do Estado a existência de vaga a ser preenchida por ocupante do cargo de Auditor e que o único integrante da classe não atenderia a todos os requisitos necessários à nomeação. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia a medida cautelar com eficácia ex nunc pelos fundamentos expostos no caso acima relatado.

ADI 4416 MC/PA, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 6.10.2010. (ADI-4416)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 603, Plenário)

 

Recebimento de Denúncia: Suspensão Preventiva Automática e Devido Processo Legal

O Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil – ADEPOL para declarar a inconstitucionalidade do art. 51 da Lei 15.301/2004, do Estado de Minas Gerais. Tal preceito determina a aplicação imediata da suspensão preventiva disposta no art. 20, VII, da Lei 5.406/69 (Estatuto da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais) ao servidor da polícia civil mineira assim que for recebida, pelo Poder Judiciário, denúncia contra ele oferecida decorrente da prática de crime hediondo, tortura, tráfico de entorpecentes e drogas afins e terrorismo; crime contra o sistema financeiro ou de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; extorsão ou corrupção passiva ou ativa. O dispositivo impugnado ainda prevê o recolhimento das armas de propriedade do Estado e o da própria identidade policial. Entendeu-se que a aplicação automática da suspensão preventiva estaria em confronto com os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. O Min. Celso de Mello ressaltou em seu voto, ademais, que a declaração de inconstitucionalidade da Lei 15.301/2004 não impedirá que a Administração Pública adote a suspensão preventiva, tendo em conta que o citado Estatuto da Polícia Civil mineira prevê que, no curso do processo administrativo disciplinar, poderão ser aplicadas, como medidas acessórias, a prisão administrativa e a suspensão preventiva, com eficácia temporal limitada a 90 dias. Observou que, nesse caso, entretanto, sempre se dará ao servidor, contra quem instaurado um procedimento administrativo disciplinar, a oportunidade de exercer as prerrogativas inerentes ao devido processo. Salientou, ainda, que o referido Estatuto alcança situações outras que não apenas aquelas concernentes aos episódios delituosos previstos na lei adversada.

ADI 3288/MG, rel. Min. Ayres Britto, 13.10.2010. (ADI-3288)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 604, Plenário)

 

Vinculação de Receita de Custas e Emolumentos: Prejudicialidade

O Plenário julgou prejudicadas duas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas, respectivamente, pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil – ANOREG e pelo Procurador Geral da República contra os artigos 49 e 50 da Lei 4.847/93, do Estado do Espírito Santo. Os dispositivos impugnados atribuem percentual da receita proveniente da arrecadação de custas e emolumentos remuneratórios de serviços judiciários e extrajudiciais a titulares de serventias, a órgãos de administração do Poder Judiciário e a entidades de classe e assistenciais de natureza privada. Concluiu-se pela superveniente perda de objeto das ações, diante do advento da Lei Complementar capixaba 219/2001 que, ao reestruturar o Fundo Especial do Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo – FUNDEPJ — para o qual seriam destinados taxas judiciárias, custas judiciais e emolumentos remuneratórios dos serviços judiciários e extrajudiciais oficializados —, cujo art. 11 revogou expressamente os preceitos questionados nas ações diretas.

ADI 1298/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 13.10.2010. (ADI-1298)

ADI 1378/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 13.10.2010.(ADI-1378)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 604, Plenário)

 

Extradição

Extradição e Prescrição – 1

O Plenário indeferiu pedido de extradição executória formulado pela República Italiana em que se postulava a entrega de nacional para cumprimento de execuções decorrentes de 4 acórdãos condenatórios proferidos por diversos tribunais de Roma. No caso, o extraditando fora condenado a uma pena total de 12 anos e 11 meses de reclusão pela prática dos crimes de desvio ou subtração de armas; armas clandestinas; transporte ilícito, para local público ou aberto, de armas, substâncias químicas, explosivos e engenhos; seqüestro de pessoas; assalto; receptação; atentado para o fim de terrorismo ou de eversão; favorecimento pessoal; quadrilha; associação subversiva e associação para fins de terrorismo ou de eversão da ordem democrática. Sua prisão preventiva para fins de extradição ocorrera em 3.7.2008, sendo revogada em 1º.10.2010, por força de liminar concedida pelo Min. Gilmar Mendes, relator. De início, verificou-se que o pleito extradicional preencheria as formalidades exigidas pelo art. 80 da Lei 6.815/80 e pelo art. 11 do tratado bilateral específico. Em passo seguinte, procedeu-se à análise do primeiro acórdão condenatório, no qual o Governo requerente afirmava que o extraditando seria membro de uma associação subversiva — denominada Nuclei Armati Rivoluzionari – R.A.R. — e que teria, entre os meses de dezembro de 1979 a março de 1982, atuado com finalidade terrorista e subvertido a ordem democrática. Consignou-se que o ponto mais complexo na apreciação desse aresto diria respeito à possível classificação dos fatos como crimes políticos puros, matéria prejudicial ao exame dos requisitos da dupla punibilidade e tipicidade. Constaria da nota verbal que o extraditando fora condenado por homicídio, tentativa de homicídio e lesões corporais — infligidas a 2 policiais e a 3 transeuntes — durante assalto a banco, bem como por roubo qualificado perpetrado contra outra instituição bancária e por extorsão mediante seqüestro. Considerou-se que, embora houvesse certa motivação política, os fatos narrados caracterizar-se-iam como crimes comuns, sendo, pois, passíveis de extradição.

Ext 1140/República Italiana, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.10.2010. (Ext-1140)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 605, Plenário)

 

Extradição e Prescrição – 2

Assim, passou-se à apreciação da dupla punibilidade, requisito este reputado presente, com exceção aos delitos de detenção e porte ilegítimo de armas. Aduziu-se não ser possível o deferimento relativamente a eles, já que, no tocante aos crimes previstos nos artigos 10 e 12 da Lei italiana 497/74 — que estabeleceu disposições para o controle de armas —, no direito pátrio, tais delitos eram punidos a título de contravenção penal, consoante a legislação então em vigor. Quanto aos crimes constantes dos artigos 21 e 23 da Lei italiana 110/75 — que dispôs sobre o controle de armas, munições e substâncias explosivas —, salientou-se que as condutas delituosas seriam absorvidas pelos crimes de roubo qualificado, extorsão mediante seqüestro, homicídio e tentativa de homicídio qualificados. A posse de armas clandestinas, por sua vez, constituiria ante-fato não punível, haja vista caracterizar-se como meio necessário para atingir o desideratum maior. Procedeu-se, em seguida, à análise da prescrição nos termos das leis brasileira e italiana, e observou-se a sua ocorrência, a impedir a extradição. Assinalou-se, a respeito da primeira condenação, que, considerado o seu trânsito em julgado em 5.6.89, a pena de 3 anos e 4 meses de reclusão imposta pelo crime de atentado teria prescrito em junho de 1997. Já as demais condenações de 10 meses de reclusão cominadas ao extraditando a título de continuação teriam prescrito em junho de 1991. No tocante ao segundo acórdão condenatório, enfatizou-se que as condutas atribuídas ao extraditando teriam sido cometidas quando ele era menor de 18 anos, o que tornaria inviável o pedido de extradição, ante a inimputabilidade do acusado à época dos fatos. Com referência aos dois últimos objetos do pleito extradicional, afirmou-se a ocorrência da prescrição segundo a legislação brasileira, tendo em conta que, impostas penas de 6 meses e 10 dias de reclusão por ofensa aos artigos 12 e 14 da referida Lei 497/74 e de 1 ano de reclusão por participação em associação eversiva, as sentenças teriam transitado em julgado, respectivamente, em 11.12.91 e 20.7.93. Por fim, confirmou-se a liminar concedida para revogar a prisão preventiva decretada em desfavor do extraditando.

Ext 1140/República Italiana, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.10.2010. (Ext-1140)

(Informativo 605, Plenário)

 

 

DIREITO ELEITORAL

 

Eleições

Lei da “Ficha Limpa”: Inelegibilidade e Renúncia – 1

O Plenário, ante o empate na votação, manteve acórdão do Tribunal Superior Eleitoral – TSE que, ao enfatizar a aplicabilidade imediata das alterações introduzidas pela LC 135/2010, concluíra pela inelegibilidade de candidato a cargo de Senador da República. O acórdão impugnado assentara a inelegibilidade do candidato para as eleições que se realizassem durante o período remanescente do mandato para o qual ele fora eleito e para os 8 anos subseqüentes ao término da legislatura, nos termos da alínea k do inciso I do art. 1º da LC 64/90, acrescentado pela aludida LC 135/2010 [“Art. 1º São inelegíveis: I – para qualquer cargo: … k) o Presidente da República, o Governador de Estado e do Distrito Federal, o Prefeito, os membros do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas, da Câmara Legislativa, das Câmaras Municipais, que renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de representação ou petição capaz de autorizar a abertura de processo por infringência a dispositivo da Constituição Federal, da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente do mandato para o qual foram eleitos e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término da legislatura.”]. Considerara o fato de o candidato ter renunciado a mandato de igual natureza, em 2001, após o oferecimento de representação capaz de autorizar a abertura de processo por infração a dispositivo da Constituição. Na espécie, passados 9 anos da data da renúncia e tendo sido o candidato eleito, nesse ínterim, Deputado Federal, por duas vezes, a ele fora negado o registro de sua candidatura às eleições de 3.10.2010. No presente recurso extraordinário, alegava-se ofensa: a) ao princípio da anualidade eleitoral (CF, art. 16); b) aos princípios da segurança jurídica e da irretroatividade das leis (CF, art. 5º, XXXVI); c) ao art. 14, § 9º, da CF, pois a cláusula de inelegibilidade em questão não se amoldaria aos pressupostos constitucionais autorizadores de novas hipóteses de inelegibilidade e d) ao princípio da presunção de inocência ou de não-culpabilidade (CF, art. 5º, LVII).

RE 631102/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.10.2010. (RE-631102)

Parte 1

Parte 2

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 606, Plenário)

 

Lei da “Ficha Limpa”: Inelegibilidade e Renúncia – 2

O Min. Joaquim Barbosa, relator, na linha do voto proferido no julgamento do RE 630147/DF — em que reconhecida a repercussão geral da matéria —, desproveu o recurso. Inicialmente, salientou que apreciaria o caso a partir da perspectiva de valorização da moralidade e da probidade no trato da coisa pública, sob uma ótica de proteção dos interesses públicos e não dos puramente individuais. Em passo seguinte, rejeitou a assertiva de ofensa ao art. 16 da CF. Afirmou que a norma adversada não se inseriria no campo temático de processo eleitoral e que a “Lei de Inelegibilidade” não se qualificaria como lei de processo eleitoral. Consignou que as condições de elegibilidade seriam examinadas na data do registro da candidatura, sendo que a lei em comento fora publicada antes do período fixado para a realização das convenções partidárias, de modo a inexistir surpresa ou quebra ao princípio da isonomia para os partidos políticos. Repeliu, de igual maneira, o argumento de ofensa ao art. 5º, XXXVI, da CF, ao fundamento de que a referida lei complementar não teria aplicação retroativa, mas concedera efeitos futuros a fatos desabonadores praticados no passado. Enfatizou que retroação ocorreria se os cargos exercidos posteriormente à renúncia do recorrente tivessem sido declarados nulos. No que concerne ao art. 14, § 9º, da CF, assinalou haver expectativa do corpo eleitoral de que os parlamentares não venham a renunciar, configurando a renúncia um ato desabonador do candidato, o qual demonstraria não se preocupar com seu eleitorado. Ademais, registrou que a norma em comento teria dado concretude à opção constitucional pela avaliação da vida pregressa do candidato. Por fim, relativamente ao art. 5º, LVII, da CF, asseverou que inelegibilidade não seria pena ou punição e não caracterizaria repercussão prática da culpa ou do dolo do agente político, mas uma reprovação prévia, anterior e prejudicial às eleições, por comportamento objetivamente descrito como contrário às normas de organização política. Acompanharam o relator os Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto e Ellen Gracie.

RE 631102/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.10.2010. (RE-631102)

Parte 1

Parte 2

(Informativo 606, Plenário)

 

Lei da “Ficha Limpa”: Inelegibilidade e Renúncia – 3

Em divergência, os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente, ao também reiterar posição firmada no julgamento do aludido RE 630147/DF, proveram o recurso. Reputaram que a lei complementar repercutira em inúmeros julgamentos no processo eleitoral. Acrescentaram que a alínea k da citada LC 135/2010 não seria fruto de iniciativa popular, mas resultado de emenda a projeto de lei. Registraram que, quando da renúncia do recorrente em 2001, dentre as conseqüências previstas para tal ato, não havia a inelegibilidade e que uma lei posterior não poderia buscar um fato pretérito para dele extrair conseqüências no presente. Realçaram que a concessão de eficácia retroativa à lei implicaria aplicação casuística e personalizada. Observaram que, na situação dos autos, após a renúncia, o recorrente obtivera da Justiça Eleitoral o deferimento dos registros e respectivas diplomações nas 2 eleições seguintes, sendo o candidato a Deputado Federal mais votado no Brasil. Indagaram como, à época, ele seria elegível e atenderia às formalidades legais e, nos dias atuais, considerado inelegível para exercer mandato, por essa mesma Justiça Eleitoral, tendo em conta aquela mesma renúncia que não o impedira de exercer os cargos de parlamentar federal. Assim, entendiam que a norma impugnada teria atribuído a um ato lícito um caráter de ilicitude para efeito de privação da elegibilidade passiva, haja vista que a inelegibilidade, dessa forma, configuraria sanção de direito eleitoral restritiva do exercício ao direito fundamental de participação política. Concluíram que a interpretação conferida pelo TSE afrontaria não só o postulado fundamental inscrito no art. 16 da CF, bem como aquele que busca prestigiar a incolumidade de situações já consolidadas no passado.

RE 631102/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.10.2010. (RE-631102)

Parte 1

Parte 2

(Informativo 606, Plenário)

 

Lei da “Ficha Limpa”: Inelegibilidade e Renúncia – 4

Em seguida, o Plenário rejeitou questão de ordem suscitada da tribuna pelo patrono do recorrente no sentido de suspender o julgamento até a nomeação de novo Ministro para compor o Tribunal. A defesa informava a peculiaridade das eleições no Estado-membro pelo qual concorrera o recorrente, porquanto lá haveria outro candidato ao Senado Federal com idêntica causa de inelegibilidade, cujo processo estaria aguardando apreciação pelo TSE. Considerou-se que o exame do processo deveria prosseguir para que o impasse fosse solucionado e efetivada a prestação jurisdicional. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Marco Aurélio que acolhiam o pleito de suspensão para evitar decisões díspares. O Min. Cezar Peluso fez ressalva de sua posição pessoal. Dessa forma, deliberou-se sobre a existência de critérios impessoais, objetivos e apriorísticos para a resolução do empate. Por maioria, acatou-se proposta formulada pelo Min. Celso de Mello para que fosse aplicado, por analogia, o inciso II do parágrafo único do art. 205 do Regimento Interno do Supremo e, com isso, mantida a decisão recorrida (“Art. 205. … Parágrafo único. O julgamento de mandado de segurança contra ato do Presidente do Supremo Tribunal Federal ou do Conselho Nacional da Magistratura será presidido pelo Vice-Presidente ou, no caso de ausência ou impedimento, pelo Ministro mais antigo dentre os presentes à sessão. Se lhe couber votar, nos termos do art. 146, I a III, e seu voto produzir empate, observar-se-á o seguinte: … II – havendo votado todos os Ministros, salvo os impedidos ou licenciados por período remanescente superior a três meses, prevalecerá o ato impugnado.”). Considerou-se a presunção de legitimidade dos atos estatais e o fato de que esse critério já teria sido adotado no julgamento da ADPF 46/DF (DJe de 26.2.2010). O Min. Celso de Mello salientou que a sugestão poderia ser adotada sem prejuízo da convicção de cada membro da Corte, haja vista que em discussão a superação do impasse. Foram rejeitados outros critérios, tais como o voto de qualidade do Presidente (RISTF, art. 13, IX), a convocação de Ministros do STJ e o art. 146, caput, do RISTF. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Marco Aurélio, que determinavam a aplicação do voto de qualidade do Presidente.

RE 631102/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.10.2010. (RE-631102)

Parte 1 –

Parte 2

(Informativo 606, Plenário)

 

 

DIREITO PENAL

 

Crimes contra a Liberdade Pessoal

Rapto e “Abolitio Criminis”

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do crime de rapto (CP, art. 219). A defesa sustentava a ocorrência de abolitio criminis, em razão da superveniência da Lei 11.106/2005, que revogou os artigos 219 a 222 do CP, e pleiteava a conseqüente extinção da pretensão executória. Aduziu-se que, muito embora o referido dispositivo tenha sido revogado com o advento da supracitada lei, a restrição da liberdade com finalidade libidinosa teria passado a figurar — a partir da entrada em vigor desta mesma norma — entre as possibilidades de qualificação dos crimes de seqüestro ou cárcere privado (CP, art. 148, § 1º, V). Reputou-se que a mera alteração da norma, portanto, não haveria de ser entendida como abolitio criminis, por ter havido continuidade normativa acerca do tipo penal.

HC101035/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 26.10.2010. (HC-101035)

(Informativo 606, 2ª Turma)

 

Extinção de Punibilidade

HC: Prescrição e Redimensionamento da Pena

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus em que se sustentava a extinção da pretensão executória de pena in concreto de 6 anos, pois já transcorridos mais de 12 anos entre a sentença condenatória e o redimensionamento da pena pelo STJ. Reputou-se que o redimensionamento da pena, em sede de habeas corpus, não influiria na contagem da prescrição, porquanto inexistente, dentre os marcos interruptivos desta (CP, art. 117), decisão proferida na via mandamental. Ao salientar que medida de igual natureza a presente somente fora distribuída ao STJ mais de 9 anos após o trânsito em julgado do acórdão da Corte estadual, concluiu-se que entender de outra forma possibilitaria que todos os condenados aguardassem o período que bem pretendessem para tentar obter, por meio de habeas corpus, redução da pena e a conseqüente prescrição retroativa.

HC 92717/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-92717)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Corrupção de Menores para Prática de Mendicância e “Abolitio Criminis”

A 1ª Turma concedeu, de ofício, habeas corpus para trancar ação penal instaurada contra o paciente, pela suposta prática do crime de corrupção de menor (Lei 8.069/90, art. 244-B) e da contravenção penal de mendicância (Decreto-lei 3.688/41, art. 60). A defesa sustentava a abolitio criminis da imputação feita ao paciente, razão pela qual estaria extinta a punibilidade. Não obstante reconhecendo que a tese não teria sido aventada perante o STJ e que sua análise implicaria supressão de instância, considerou-se a particularidade do caso. Aduziu-se que o fato pelo qual estaria o paciente sendo processado seria corrupção de menores para a prática de mendicância. Entretanto, a partir da análise do art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, reputou-se que, para a consumação do delito nele previsto, far-se-ia necessário que o agente corrompesse ou facilitasse a corrupção de menor, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la. Assim, tendo em conta a revogação do art. 60 da Lei das Contravenções Penais pela Lei 11.983/2009, concluiu-se que a conduta do acusado não seria típica, visto que a mendicância perdera o status de infração penal.

HC 103787/MG, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 26.10.2010. (HC-103787)

(Informativo 606, 1ª Turma)

 

Penas

Superveniência de Condenação e Alteração da Data-Base

A superveniência de nova condenação definitiva no curso da execução criminal altera a data-base para a concessão de benefícios futuros, sendo indiferente que o crime tenha ocorrido antes ou após o início do cumprimento da pena. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se sustentava a ilegalidade da alteração da data-base para a concessão de benefício, em virtude de nova condenação, decorrente de fato cometido antes do início da execução da pena. Entenderam-se aplicáveis, à espécie, os artigos 111, parágrafo único, e 118, II, da LEP (“Art. 111. Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição. Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á a pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação do regime. … Art. 118. A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado: … II – sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime…”). Ressaltou-se, ainda, que, caso sobrevenha condenação definitiva no curso da execução penal, deverão ser somadas a nova pena e o restante da que está sendo cumprida.

HC 102492/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 5.10.2010. (HC-102492)

(Informativo 603, 2ª Turma)

 

Comutação de Pena e Revogação de Livramento Condicional

A Turma concedeu habeas corpus para que o Juízo de Execuções Criminais proceda a novo exame de pedido de comutação de pena do paciente, devendo verificar a existência de preenchimento dos requisitos objetivos constantes do Decreto 5.620/2005, inclusive, alterando, se for o caso, o quantum de pena comutado posteriormente com base nos Decretos 5.993/2006 e 6.294/2007. Na espécie, a defesa requeria a nulidade de decisão do Juízo de Execuções que denegara ao paciente o direito à comutação de pena, prevista no Decreto 5.620/2005 — que concede indulto condicional, comutação e dá outras providências —, tendo em conta o que disposto no art. 88 do CP (“Revogado o livramento, não poderá ser novamente concedido, e, salvo quando a revogação resulta de condenação por outro crime anterior àquele benefício, não se desconta na pena o tempo em que esteve solto o condenado”). Afirmou-se que o mencionado artigo veda a concessão de novo livramento condicional quando o primeiro tiver sido revogado em razão de cometimento de crime posterior, bem como proíbe que o tempo em que o agente permanece solto seja descontado da pena. Contudo, entendeu-se que os requisitos do instituto da comutação da pena não se confundiriam com os referentes ao instituto do livramento condicional. Ressaltou-se que o art. 88 do CP prescreveria matéria atinente à impossibilidade de concessão de novo livramento condicional e não de concessão de comutação.

HC 98422/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 5.10.2010. (HC-98422)

(Informativo 603, 2ª Turma)

 

Roubo: Emprego de Arma de Fogo e Causa de Aumento

É desnecessária a apreensão e a perícia da arma de fogo para caracterizar a majorante prevista no art. 157, § 2º, I, do CP, se por outros meios for comprovado seu emprego na prática criminosa. A 2ª Turma, em homenagem aos princípios da segurança jurídica e da colegialidade, e para evitar decisões díspares entre as Turmas, deliberou acompanhar essa orientação, formalizada pelo Plenário no julgamento do HC 96099/RS (DJe de 5.6.2009) e, em conseqüência, indeferiu habeas corpus em que sustentada a necessidade de apreensão e perícia de arma de fogo para fins de verificação da sua potencialidade lesiva e conseqüente incidência da referida causa de aumento. Consignou-se que tal entendimento já vinha sendo adotado pela 1ª Turma e que a 2ª Turma teria, em casos análogos, sufragado tese em sentido diametralmente oposto após a prolação do citado paradigma. Os Ministros Gilmar Mendes, relator, e Celso de Mello ressalvaram sua convicção pessoal.

HC 103046/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-103046)

HC 104984/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-104984)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Roubo: Emprego de Arma Branca e Causa de Aumento

Ao aplicar a orientação anteriormente exposta, a 2ª Turma indeferiu habeas corpus em que a defesa pretendia fosse anulada condenação imposta ao paciente pela prática de roubo circunstanciado pelo emprego de arma branca (CP, art. 157, § 2º, I), sem que o referido instrumento tivesse sido apreendido e periciado.

HC 100854/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-100854)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Pena de Multa e Súmula 719 do STF

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus em se pleiteava a aplicação de multa, em substituição à pena privativa de liberdade imposta a condenado a 1 ano de reclusão, ao argumento de ser mais benéfica ao paciente do que a pena restritiva de direitos, consoante Enunciando 719 da Súmula do STF (“A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea.”). Entendeu-se que o referido Verbete não diria respeito a penas restritivas de direitos, mas ao regime de cumprimento de pena privativa de liberdade. Além disso, considerou-se que o juiz não estaria obrigado a substituir a pena privativa de liberdade por pena de multa (CP, art. 44, § 2º). Ressaltou-se que este órgão julgador, em precedente firmado no HC 83092/RJ (DJU de 29.8.2003), já se pronunciara no sentido da impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por multa nas hipóteses de condenação superior a 6 meses. Ademais, afirmara que: a) se a pena imposta ultrapassar 6 meses e for menor ou igual a 1 ano deverá ser aplicada uma restritiva de direitos; b) se superior a esse tempo, duas restritivas de direitos.

HC 98995/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-98995)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Unificação de Penas e Alteração de Data-Base

A unificação de penas decorrente de condenação transitada em julgado, durante o cumprimento de reprimenda atinente a outro crime, altera a data-base para a obtenção de benefícios executórios e progressão de regime, a qual passa a ser contada a partir da soma da nova condenação e tem por parâmetro o restante de pena a ser cumprido. De acordo com esse entendimento, a 1ª Turma indeferiu habeas corpus em que a defesa pretendia fosse estabelecido como marco inicial para essa finalidade a data da última infração disciplinar de natureza grave praticada pelo apenado, que havia empreendido fuga, ou a data de sua recaptura. Reputou-se que a execução da pena subseqüente, considerado o número de anos e as circunstâncias judiciais, poderia provocar a observância de regime mais gravoso do que o relativo à anterior, motivo pelo qual, inalterada a data-base, impossibilitar-se-ia eventualmente o cumprimento da nova reprimenda. Aduziu-se, também, que o somatório de penas decorrente da unificação teria por conseqüências lógicas tanto a limitação do tempo total que o sujeito deverá permanecer preso (CP, art. 75) quanto a implementação de regime próprio relativo à totalidade de anos em que deva o condenado ficar recluso.

HC 100499/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 26.10.2010. (HC-100499)

(Informativo 606, 1ª Turma)

 

Homicídio e Confissão Espontânea

A 1ª Turma deferiu habeas corpus a condenado pela prática de homicídio tentado para determinar o redimensionamento, por parte do juízo competente, da pena imposta. A defesa pretendia fosse considerada, na reprimenda, a atenuante da confissão espontânea, que fora afastada por conter a tese defensiva da legítima defesa e configurar, portanto, confissão qualificada. Reputou-se que a simples postura de reconhecimento da prática do delito atrairia a observância da regra contida no art. 65, III, d, do CP (“São circunstâncias que sempre atenuam a pena: … III – ter o agente: … d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime”), que não possuiria qualquer ressalva no tocante à maneira como o agente pronuncia a confissão. Precedentes citados: HC 69479/RJ (DJU de 18.12.92) e HC 82337/RJ (DJU de 4.4.2003).

HC 99436/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 26.10.2010. (HC-99436)

(Informativo 606, 1ª Turma)

 

Princípios e Garantias Penais

Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância – 1

A posse, por militar, de reduzida quantidade de substância entorpecente em lugar sujeito à administração castrense (CPM, art. 290) não autoriza a aplicação do princípio da insignificância. Com base nesse entendimento, o Plenário indeferiu habeas corpus em que a Defensoria Pública da União pleiteava a incidência desse postulado, já que o paciente fora flagrado na posse de 0,1 g de maconha. A impetração também alegava que essa conduta não causaria risco de lesão à saúde pública. Inicialmente, destacou-se que o problema em questão não envolveria a quantidade ou o tipo de entorpecente apreendido, mas sim a qualidade da relação jurídica entre esse usuário e a instituição militar da qual ele faria parte, no instante em que flagrado com a posse da droga em recinto sob administração castrense. Em seguida, consignou-se que essa tipologia de relação não seria compatível com a figura da insignificância penal. Explicitou-se que esta consubstanciaria vetor interpretativo cujo propósito seria o de excluir a abrangência do Direito Penal de condutas provocadoras de ínfima lesão ao bem jurídico tutelado. Reputou-se que o uso de drogas e o dever militar seriam inconciliáveis, dado que a disposição em si para manter o vício implicaria inafastável pecha de reprovabilidade cívico-profissional por afetar tanto a saúde do próprio usuário quanto pelo seu efeito no moral da corporação e no conceito social das Forças Armadas.

HC 103684/DF, rel. Min. Ayres Britto, 21.10.2010. (HC-103684)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 605, Plenário)

 

Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância – 2

Aduziu-se que a hierarquia e a disciplina militares não atuariam como meros predicados institucionais, constituindo-se, ao revés, em elementos conceituais e “vigas basilares” das Forças Armadas. Enfatizou-se, nesse ponto, que o maior rigor penal da lei castrense, na hipótese, se harmonizaria com a maneira pela qual a Constituição dispusera sobre as Forças Armadas. Ante o critério da especialidade, rejeitou-se a aplicação do art. 28 da Lei 11.343/2006. Mencionou-se que a referida lei revogara, expressamente, apenas as Leis 6.368/76 e 10.409/2002 e que o Código Penal Militar trataria da matéria de forma específica, embora em termos mais drásticos. De igual modo, afastou-se a assertiva, suscitada da tribuna, de ofensa ao princípio da proporcionalidade no sentido de que o art. 290 do CPM não distinguiria entre traficante e usuário. Asseverou-se que o aludido preceito cominaria somente a pena máxima aplicável ao delito, o que permitiria ao juiz sentenciante estabelecer a justa medida entre os atos praticados e o crime, a partir do exame das circunstâncias objetivas e subjetivas da situação concreta. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente, que deferiam o writ. O primeiro realçava o fato da quantidade ínfima ser insuscetível de colocar em risco o bem jurídico protegido pela norma, qual seja, a saúde. Os Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello, por sua vez, reconheciam a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância a crime militar e, rejeitada essa tese, aplicavam o princípio da proporcionalidade. O Min. Cezar Peluso salientava que a admissão desse princípio em matéria de Direito Penal Militar permitiria que o magistrado não ficasse impossibilitado de, ao examinar o caso e verificar a inexistência de afronta às objetividades jurídicas do tipo, assentar a atipicidade por falta de ofensividade ou de lesividade ao bem jurídico.

HC 103684/DF, rel. Min. Ayres Britto, 21.10.2010. (HC-103684)

(Informativo 605, Plenário)

 

Crime de Descaminho e Princípio da Insignificância

A Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do delito de descaminho (CP, art. 334), no qual se pretendia o trancamento de ação penal, por atipicidade da conduta, com base na aplicação do princípio da insignificância, pois o tributo devido seria inferior a R$ 10.000,00. Considerou-se que, embora o tributo elidido totalizasse R$ 8.965,29, haveria a informação de que o paciente responderia a outro processo — como incurso no mesmo tipo penal — cujo valor não pago à Fazenda Pública, considerados ambos os delitos, seria de R$ 12.864,35. Destacou-se estar-se diante de reiteração de conduta delitiva, pois o agente faria do descaminho seu meio de vida, daí a inaplicabilidade do referido postulado. O Min. Marco Aurélio, relator, enfatizou seu convencimento no sentido de que, sendo o montante superior a R$ 100,00, caberia concluir-se pela tipicidade.

HC 97257/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-97257)

(Informativo 603, 1ª Turma)

 

Princípio da Insignificância e Descaminho – 2

Em conclusão de julgamento, a 1ª Turma, ante o empate na votação, concedeu habeas corpus para reconhecer a aplicação do princípio da insignificância ao crime de descaminho (CP, art. 334, § 1º) e trancar a ação penal ao fundamento de que o referido postulado emergiria do valor sonegado diante da grandeza do Estado e do custo de sua máquina, não se compreendendo movimentá-la para cobrar o tributo devido. No caso, houvera a apreensão de bebidas cujo valor estimado totalizaria o montante de R$ 2.991,00 — v. Informativo 569. Votaram pelo indeferimento os Ministros Marco Aurélio, relator, e Cármen Lúcia.

HC 96412/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ acórdão Min. Dias Toffoli, 26.10.2010. (HC-96412)

(Informativo 606, 1ª Turma)

 

Tráfico Internacional de Munição e Princípio da Insignificância

A 1ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a aplicação do princípio da insignificância para trancar ação penal instaurada contra o paciente, pela suposta prática do crime de tráfico internacional de munição (Lei 10.826/2003, art. 18). A defesa sustentava que seria objeto da denúncia apenas a apreensão de 3 cápsulas de munição de origem estrangeira, daí a aplicabilidade do referido postulado. Aduziu-se que o denunciado faria do tráfico internacional de armas seu meio de vida e que teriam sido encontrados em seu poder diversos armamentos e munições que, em situação regular, não teriam sido objeto da peça acusatória. Nesse sentido, não se poderia cogitar da mínima ofensividade da conduta ou da ausência de periculosidade social da ação, porquanto a hipótese seria de crime de perigo abstrato, para o qual não importaria o resultado concreto. Vencido o Min. Marco Aurélio, que deferia a ordem por reputar configurado no caso o crime de bagatela, tendo em vista que a imputação diria respeito tão-somente às 3 cápsulas de origem estrangeira, mas não a todo o material apreendido.

HC 97777/MS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 26.10.2010. (HC-97777)

(Informativo 606, 1ª Turma)

 

Princípio da Insignificância e Elementos Subjetivos Desfavoráveis

A 2ª Turma, ante a falta de justa causa, concedeu habeas corpus para trancar ação penal instaurada em desfavor de acusado por furto de uma janela no valor de R$ 120,00. Considerou-se, relativamente ao princípio da insignificância, não ser possível a análise dos elementos subjetivos desfavoráveis, mesmo que se trate de reiteração de conduta. Afirmou-se, ainda, que o referido postulado, afetaria a própria tipicidade penal.

HC 104468/MS, rel. Min. Gilmar Mendes, 26.10.2010. (HC-104468)

(Informativo 606, 2ª Turma)

 

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL

 

Ação Penal

Interrogatório: Lei 11.719/2008 e Lei 8.038/90

O Tribunal resolveu questão de ordem suscitada em ação penal, movida pelo Ministério Público Federal contra diversas pessoas acusadas da suposta prática de crimes ligados ao esquema denominado “Mensalão”, para indeferir a renovação de interrogatórios. A defesa pleiteava que os réus fossem ouvidos novamente, haja vista as modificações promovidas pela Lei 11.719/2008, que alterou o momento em que efetuado o interrogatório, transferindo-o para o final da instrução. Aduziu-se que, no caso, quando sobreviera o novel regramento, os acusados já teriam sido interrogados, com observância de todos os direitos e as garantias, de acordo com a Lei 8.038/90, a qual institui normas procedimentais específicas para os processos de competência do STF e do STJ. Assentou-se, assim, a validade dos interrogatórios realizados segundo a legislação então vigente. Salientou-se que o tema relativo à incidência, ou não, da mencionada Lei 11.719/2008 aos feitos de competência originária do STF ficaria em aberto, devendo ser apreciado pela Corte naquelas hipóteses em que ainda não realizado o interrogatório. O relator, ao aplicar o princípio da especialidade, deixou consignado, desde logo, que a nova norma legislativa não alteraria o procedimento previsto na Lei 8.038/90, uma vez que a fase processual em que deve ocorrer o interrogatório continua expressamente prescrita no seu art. 7º (“Recebida a denúncia ou a queixa, o relator designará dia e hora para o interrogatório, mandando citar o acusado ou querelado e intimar o órgão do Ministério Público, bem como o querelante ou o assistente, se for o caso.”).

AP 470 Oitava-QO/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 7.10.2010. (AP-470)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 603, Plenário)

 

Crimes da Lei 8.666/93: Prestação de Serviços e Enquadramento

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado em favor de acusado pela suposta prática de delitos previstos na Lei 8.666/93, no qual se alegava a inépcia da denúncia e a atipicidade das condutas imputadas ao paciente. Pretendia a impetração, sob alegada ausência de justa causa, o trancamento da ação penal. No que se refere à apontada inépcia da denúncia, afirmou-se que ela consignara a qualidade de administrador e sócio da empresa contratada. Assentou-se, daí, que a responsabilidade, se procedente a imputação, seria subjetiva. No tocante à tipologia, ou seja, se o procedimento estaria, ou não, enquadrado na Lei das Licitações, aduziu-se que o art. 96 desse diploma legal não se referiria a serviços, mas a bens. Assim, conferiu-se interpretação sistemática a ponto de se entender que no vocábulo “bens” se teria a inclusão de serviços. Para tanto, considerou-se o disposto no art. 1º dessa mesma lei, a revelar que o diploma versaria licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Ressaltou-se que, na denúncia, aludira-se, também, ao art. 92 da Lei 8.666/93 que teria uma abrangência a apanhar a prestação de serviços. Registrou-se que a referência na peça acusatória não vincularia o juízo e que o pano de fundo — aditamento com majoração substancial do que contratado inicialmente com a Administração Pública — sinalizaria, em princípio, uma prática delituosa. O Min. Ricardo Lewandowski salientou que a denúncia descreveria adequadamente os fatos, pelo menos para propiciar a defesa ao paciente, e que o acusado se defenderia deles e não da imputação jurídica. Vencido o Min. Dias Toffoli que concedia a ordem para trancar a ação penal, ao fundamento de ocorrência de responsabilidade objetiva.

HC 102063/ES, rel. Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-102063)

(Informativo 603, 1ª Turma)

 

Ação Penal: Renúncia a Mandato de Parlamentar e Competência do STF – 1

O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação penal para condenar Deputado Federal pela prática dos delitos tipificados nos artigos 288 e 312, este na forma do art. 71, c/c o art. 69, todos do CP, à pena de 13 anos, 4 meses e 10 dias de reclusão e ao pagamento de 66 dias-multa, no valor de um salário mínimo vigente à época do fato, corrigido monetariamente. Na espécie, o Ministério Público do Estado de Rondônia instaurara procedimento investigatório a partir de representações em que questionada a licitude de contrato publicitário firmado entre a Assembléia Legislativa local e determinada empresa. No decorrer das apurações, o parquet constatara a existência de suposto esquema criminoso — engendrado para desviar dinheiro daquela Casa Legislativa — no qual o réu, na qualidade de diretor financeiro da Assembléia Legislativa, teria assinado vários cheques e os repassado, por mais de 2 anos, à mencionada empresa de publicidade a pretexto de pagamento pelos serviços, sequer prestados. Em razão disso, o Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público daquela unidade federativa oferecera denúncia contra o parlamentar e outros 7 co-réus por formação de quadrilha e peculato, em concurso material e de pessoas. Após o recebimento da inicial acusatória pela Corte de origem, o réu fora empossado Deputado Federal e o processo, desmembrado, remetido ao STF, que assim o mantivera e afirmara a validade dos atos judiciais praticados anteriormente à diplomação e à posse do parlamentar federal.

AP 396/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 28.10.2010. (AP-396)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 606, Plenário)

 

Ação Penal: Renúncia a Mandato de Parlamentar e Competência do STF – 2

Inicialmente, por maioria, resolveu-se questão de ordem suscitada pela Min. Cármen Lúcia, relatora, no sentido de se reconhecer a subsistência da competência do Supremo para a causa. Tendo em conta que o parlamentar apresentara, perante à Presidência da Câmara dos Deputados, manifestação formal de renúncia ao seu mandato, a defesa alegava que a prerrogativa de foro não mais se justificaria. Realçou-se que o pleito de renúncia fora formulado em 27.10.2010 e publicado no Diário da Câmara no dia seguinte, data para a qual pautado o julgamento da presente ação penal. Aduziu-se que os motivos e fins desse ato demonstrariam o intento do parlamentar de se subtrair ao julgamento por esta Corte, em inaceitável fraude processual, que frustraria as regras constitucionais e não apenas as de competência. Destacou-se, desse modo, que os fins dessa renúncia — às vésperas da apreciação do feito e após a tramitação do processo por mais de 14 anos — não se incluiriam entre aqueles aptos a impedir o prosseguimento do julgamento, configurando, ao revés, abuso de direito ao qual o sistema constitucional vigente não daria guarida. Vencido o Min. Marco Aurélio que, ao salientar a competência de direito estrito do Supremo, assentava que, com a renúncia operada, o réu teria deixado de ser membro do Congresso Nacional, o que cessaria, em conseqüência, a competência desta Corte. Os Ministros Dias Toffoli e Joaquim Barbosa sinalizavam, ainda, não ter efeito a renúncia operada após o fim da instrução, quando o processo já estiver concluso para o relator, faltando apenas a elaboração do voto.

AP 396/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 28.10.2010. (AP-396)

(Informativo 606, Plenário)

 

Ação Penal: Renúncia a Mandato de Parlamentar e Competência do STF – 3

Em seguida, rejeitaram-se todas as preliminares argüidas pelo réu. No tocante à alegação de que o inquérito teria sido instaurado e dirigido pelo Ministério Público em ofensa aos princípios do devido processo legal e da ampla defesa, enfatizou-se que os elementos de informação que serviram de suporte para a denúncia não teriam sido extraídos de investigação penal conduzida pelo parquet, mas de autos de inquérito civil. Relativamente à eventual quebra do princípio do promotor natural, observou-se que a peça acusatória fora apresentada pelo titular do órgão ministerial em âmbito estadual. Ressaltou-se, ainda, que os crimes em apreço seriam crimes contra a Administração Pública, o que afastaria a assertiva de que, por se tratar de crime político, haveria a impossibilidade de instauração de ação de improbidade. Repeliram-se, de igual modo, os argumentos de inépcia da denúncia e de ausência de subsunção dos fatos narrados ao tipo penal do art. 288 do CP ao fundamento de que a inicial teria delineado os limites de atuação do parlamentar. Por fim, quanto à necessidade de unidade do julgamento, mencionou-se que o desmembramento do processo fora mantido, em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal.

AP 396/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 28.10.2010. (AP-396)

(Informativo 606, Plenário)

 

Ação Penal: Renúncia a Mandato de Parlamentar e Competência do STF – 4

No mérito, reputou-se que a materialidade do crime de peculato estaria demonstrada pela vasta prova documental carreada, especialmente pelos cheques destinados ao pagamento da empresa. Acrescentou-se que a prova testemunhal produzida revelaria que a empresa de publicidade, embora tivesse recebido os pagamentos, não prestara serviços para o Poder Legislativo do Estado-membro e nem emitira notas fiscais. No ponto, assinalou-se que testemunha afirmara que documentos teriam sido incinerados por um dos co-réus. No que concerne à autoria, considerou-se que o acervo probatório, produzido sob o crivo do contraditório, apresentaria elementos de convicção suficientes para a formação de um juízo de certeza sobre o envolvimento do parlamentar na empreitada criminosa. Além dos cheques por ele assinados, as testemunhas ouvidas em juízo confirmaram que o parlamentar seria o diretor financeiro da Assembléia Legislativa à época. Também constariam depoimentos afirmando que a empresa que recebia os cheques não possuiria registro contábil, empregados, escritório, equipamentos ou telefone para contato. Consignou-se que não se trataria de responsabilização do acusado com base em prova indiciária, entretanto, ter-se-iam elementos de informação em simetria com o conjunto de provas produzidas durante a instrução processual. Assim, explicitou-se que os indícios obtidos na fase de investigação teriam sido confirmados pela instrução processual. Registrou-se não ser razoável supor-se que um diretor financeiro, ao efetuar o pagamento de serviços que custaram milhões de reais aos cofres públicos, desconhece a não realização dos serviços de publicidade. Por derradeiro, reconheceu-se a ocorrência de crime continuado (CP, art. 71), haja vista que os delitos de peculato teriam sido perpetrados no exercício do cargo de diretor financeiro da Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia, por meio da assinatura de cheques pertencentes a tal órgão e a emissão de cada um deles fora efetuada com regularidade de tempo.

AP 396/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 28.10.2010. (AP-396)

(Informativo 606, Plenário)

 

Ação Penal: Renúncia a Mandato de Parlamentar e Competência do STF – 5

Com relação ao crime de formação de quadrilha, destacou-se que o tipo exigiria que, pelo menos, 4 pessoas se associassem, em caráter estável e permanente, com a finalidade de cometer crimes. Assinalou-se que no esquema criminoso teria ficado comprovado o envolvimento do Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia, irmão do réu, de empresário do setor de comunicações naquele ente federativo, de servidores daquela Casa Legislativa e de sócios e patrono da empresa de publicidade. O caráter estável e permanente da associação também estaria demonstrado, já que efetuados, pelo menos, 22 pagamentos indevidos em um período de quase 1 ano. Ademais, avaliou-se que a continuidade delitiva seria bastante para a caracterização da elementar “finalidade de cometer crimes”. Quanto ao parlamentar, destacou-se que o delito de formação de quadrilha teria prova autônoma e independente, de forma a inexistir impedimento à sua condenação por tal crime, independentemente da apuração, nestes autos, da responsabilidade dos demais envolvidos. Informou-se, ademais, que os outros co-réus estariam sendo processados pelo mesmo crime na instância própria, com prolação de sentença penal condenatória. Afirmou-se que, na hipótese de absolvição desses co-réus em instância diversa e de condenação do parlamentar na presente ação penal, existiriam soluções processuais para evitar essa aporia, a exemplo da revisão criminal. Vencido o Min. Cezar Peluso, Presidente, que absolvia o réu da imputação do art. 288 do CP. Ao enfatizar a plurissubjetividade do tipo penal em apreço e o desmembramento do processo, considerava que, para haver condenação pelo Supremo, seria necessário que os demais co-réus tivessem sido definitivamente condenados pelo juízo competente, sob pena do reconhecimento de formação de quadrilha a um único membro.

AP 396/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 28.10.2010. (AP-396)

(Informativo 606, Plenário)

 

Ação Penal: Renúncia a Mandato de Parlamentar e Competência do STF – 6

No tocante à dosimetria da pena, prevaleceu o voto do Min. Dias Toffoli, revisor, relativamente ao delito de peculato, que estabeleceu a pena-base em 5 anos de reclusão e 30 dias-multa (culpabilidade, conduta social, personalidade, circunstâncias, motivos e conseqüências do delito desfavoráveis ao sentenciado) e, ante a ausência de circunstâncias atenuantes e agravantes, aplicou, à pena provisória, a majoração em 1/3, ante a causa especial de aumento prevista no § 2º do art. 327 do CP, a totalizar 6 anos e 8 meses de reclusão e 40 dias-multa. Nos termos preceituados no art. 71 do CP, aumentou a pena em 2/3, tornando-a definitiva em 11 anos, 1 mês e 10 dias de reclusão e 66 dias-multa. No que concerne à formação de quadrilha, fixou-se a pena em 2 anos e 3 meses de reclusão. Em conseqüência, determinou-se o regime fechado para o cumprimento inicial da pena. Na reparação do dano, seguiu-se a proposta da relatora no sentido da restituição, pelo sentenciado, aos cofres públicos do Estado de Rondônia do valor correspondente a R$ 1.647.500,00, atualizados na execução pelos índices de correção monetária, e da suspensão dos seus direitos políticos enquanto durarem os efeitos da condenação, além de outras cominações constantes de seu voto. Assentou-se o não cabimento da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e a possibilidade de o réu recorrer em liberdade, até que a pena se torne definitiva. Vencidos, quanto à dosimetria em relação ao peculato, os Ministros Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e Ellen Gracie, que aplicavam a pena de 13 anos e 9 meses de reclusão e 230 dias-multa, e Cezar Peluso, Presidente, que a fixava em 11 anos, 1 mês e 10 dias de reclusão e 66 dias-multa.

AP 396/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 28.10.2010. (AP-396)

(Informativo 606, Plenário)

 

Recebimento de Denúncia e Provas Ilícitas – 3

Em conclusão de julgamento, a 2ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia o trancamento de ação penal instaurada contra o paciente. Alegava-se que o STJ não poderia receber denúncia oferecida com esteio em provas que antes declarara ilícitas, obtidas por meio de interceptações telefônicas realizadas em outra investigação criminal, cuja ação penal correspondente fora trancada com fundamento na ilicitude da prova em julgamento, naquela Corte, do HC 57624/RJ — v. Informativo 589. Salientou-se, inicialmente, que as transcrições que os impetrantes diziam terem sido declaradas ilícitas no julgamento do citado writ objetivavam a apuração do crime de sonegação fiscal e que, como as escutas telefônicas haviam sido autorizadas antes da constituição definitiva do crédito tributário, condição de procedibilidade da ação penal, o STJ as anulara. Asseverou-se que a denúncia que resultara na ação penal instaurada contra o ora paciente não se valeria exclusivamente das escutas invalidadas, mas, principalmente, de documentos extraídos de inquérito, não se podendo afirmar que esses documentos seriam derivados da prova obtida ilicitamente. Ressaltou-se que o trancamento de ação penal em habeas corpus seria medida excepcionalíssima e que o cenário de incerteza que haveria no caso impediria que assim se procedesse.

HC 92467/ES, rel. orig. Min. Eros Grau, red. p/o acórdão Min. Gilmar Mendes, 26.10.2010. (HC-92467)

(Informativo 606, 2ª Turma)

 

Recebimento de Denúncia e Provas Ilícitas – 4

Extraiu-se do voto do relator no HC 57624/RJ que as interceptações telefônicas realizadas tinham a finalidade de servir à investigação da suposta prática do crime de sonegação fiscal. Assim, reputou-se haver dúvida a respeito da exclusividade, ou não, da escuta telefônica como prova dos fatos imputados na peça acusatória, referentes aos crimes de estelionato, formação de quadrilha, falsidade ideológica e uso de documento falso. Concluiu-se que a certeza da exclusividade da prova e da contaminação de outras a partir dela demandaria aprofundado reexame do acervo fático-probatório coligido nas investigações, o que seria inviável em habeas corpus. Vencido o Min. Celso de Mello que concedia a ordem, por considerar que se mostraria indivisível a questão da ilicitude da prova penal resultante de interceptação telefônica tal como qualificada no anterior julgamento do HC 57624/RJ pelo STJ.

HC 92467/ES, rel. orig. Min. Eros Grau, red. p/o acórdão Min. Gilmar Mendes, 26.10.2010. (HC-92467)

(Informativo 606, 2ª Turma)

 

Competência

Portador do Vírus HIV e Tentativa de Homicídio – 2

Em conclusão de julgamento, a Turma deferiu habeas corpus para imprimir a desclassificação do delito e determinar o envio do processo para distribuição a uma das varas criminais comuns estaduais. Tratava-se de writ em que se discutia se o portador do vírus HIV, tendo ciência da doença e deliberadamente a ocultando de seus parceiros, teria praticado tentativa de homicídio ao manter relações sexuais sem preservativo. A defesa pretendia a desclassificação do delito para o de perigo de contágio de moléstia grave (CP: “Art. 131 Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio: …”) — v. Informativo 584. Entendeu-se que não seria clara a intenção do agente, de modo que a desclassificação do delito far-se-ia necessária, sem, entretanto, vinculá-lo a um tipo penal específico. Tendo em conta que o Min. Marco Aurélio, relator, desclassificava a conduta para o crime de perigo de contágio de moléstia grave (CP, art. 131) e o Min. Ayres Britto, para o de lesão corporal qualificada pela enfermidade incurável (CP, art. 129, § 2º, II), chegou-se a um consenso, apenas para afastar a imputação de tentativa de homicídio. Salientou-se, nesse sentido, que o Juiz de Direito, competente para julgar o caso, não estaria sujeito sequer à classificação apontada pelo Ministério Público.

HC 98712/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-98712)

(Informativo 603, 1ª Turma)

 

Crime Militar praticado por Civil e Competência

A 2ª Turma deferiu habeas corpus para extinguir a ação penal instaurada contra civil pela suposta prática do crime de dano contra o patrimônio castrense (CPM, art. 259), consistente na colisão de veículo automotor, por ele conduzido, com uma viatura militar. Aduziu-se que a materialização do delito militar perpetrado por civil, em tempo de paz, seria de caráter excepcional e que a Corte teria firmado entendimento segundo o qual o art. 9º do CPM deve ser interpretado restritivamente, no sentido da necessidade de haver deliberada intenção de ofensa a bens jurídicos tipicamente associados à estruturação militar ou à função de natureza castrense. Asseverou-se, no caso, que o paciente não teria manifestado tal intento, o que afastaria a competência da justiça especial. Precedente citado: CC 7040/RS (DJU de 22.11.1996).

HC 105348/RS, rel. Min. Ayres Britto, 19.10.2010. (HC-105348)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Execução das Penas

HC e Transferência de Presídio

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus em que pretendida a transferência de interno do sistema prisional a presídio distinto do que se encontra e mais perto da residência de seus familiares. Alegava a impetração que estabelecimento em que ora cumprida a pena seria destinado ao recolhimento de presos de alta periculosidade, o que não seria o caso do paciente. Aduziu-se que a via estreita do writ não seria adequada para analisar os fundamentos pelos quais o paciente fora encaminhado à unidade prisional tida como de maior rigor. Reputou-se, ademais, que a defesa não teria formulado nenhum pedido de transferência em favor do apenado perante o juízo das execuções, ao qual caberia analisar o pleito, pois mais próximo da realidade factual. Entretanto, observou-se que o simples fato de o paciente estar condenado a delitos tipificados como de gravidade elevada não obstaria, por si só, a possibilidade de ser transferido para um presídio não distante de sua família, considerada a base da sociedade e dotada de especial proteção por parte do Estado (CF, art. 226).

HC 101540/SP, rel. Min. Ayres Britto, 19.10.2010. (HC-101540)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Habeas Corpus

Agravo em Execução e “Habeas Corpus”

A Turma, por maioria, deferiu habeas corpus para que o tribunal de justiça de origem aprecie medida de igual natureza lá impetrada — em que se discute a exclusão de anotação de falta grave cometida pelo paciente —, mas que não fora conhecida ao fundamento de que a decisão desafiaria agravo em execução. Consignou-se que, diante da passagem do tempo, não seria possível a interposição do referido recurso de agravo em execução, restando apenas a via do habeas corpus, sob pena de o paciente ficar sem jurisdição. Ademais, asseverou-se que o writ não sofre o empecilho da coisa julgada e, menos ainda, o da preclusão. Vencido o Min. Ricardo Lewandowski, relator, que, além de ressaltar que a matéria não fora apreciada pelas instâncias inferiores, considerava, no caso, o habeas corpus infrutífero, já que incabível, na sede eleita, a análise dos requisitos para a progressão de regime, obstada em virtude da falta disciplinar praticada.

HC 104190/SP, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-104190)

(Informativo 603, 1ª Turma)

 

Inquérito Policial

Inquérito Policial e Arquivamento Implícito

O sistema processual penal brasileiro não prevê a figura do arquivamento implícito de inquérito policial. Ao reafirmar esse entendimento, a 1ª Turma denegou habeas corpus em que se sustentava a sua ocorrência em razão de o Ministério Público estadual haver denunciado o paciente e co-réu, os quais não incluídos em denúncia oferecida anteriormente contra terceiros. Alegava a impetração que o paciente, por ter sido identificado antes do oferecimento da primeira peça acusatória, deveria dela constar. Inicialmente, consignou-se que o Ministério Público esclarecera que não incluíra o paciente na primeira denúncia porquanto, ao contrário do que afirmado pela defesa, não dispunha de sua identificação, o que impediria a propositura da ação penal naquele momento. Em seguida, aduziu-se não importar, de qualquer forma, se a identificação do paciente fora obtida antes ou depois da primeira peça, pois o pedido de arquivamento deveria ser explícito (CPP, art. 28). Nesse sentido, salientou-se que a ocorrência de arquivamento deveria se dar após o requerimento expresso do parquet, seguido do deferimento, igualmente explícito, da autoridade judicial (CPP, art. 18 e Enunciado 524 da Súmula do STF). Ressaltou-se que a ação penal pública incondicionada submeter-se-ia a princípios informadores inafastáveis, especialmente o da indisponibilidade, segundo o qual incumbiria, obrigatoriamente, ao Ministério Público o oferecimento de denúncia, quando presentes indícios de autoria e prova de materialidade do delito. Explicou-se que a indisponibilidade da denúncia dever-se-ia ao elevado valor social dos bens tutelados por meio do processo penal, ao se mostrar manifesto o interesse da coletividade no desencadeamento da persecução sempre que as condições para tanto ocorrerem. Ademais, registrou-se que, de acordo com a jurisprudência do Supremo, o princípio da indivisibilidade não se aplicaria à ação penal pública. Concluiu-se pela higidez da segunda denúncia. Alguns precedentes citados: RHC 95141/RJ (DJe de 23.10.2009); HC 92445/RJ (DJe de 3.4.2009).

HC 104356/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 19.10.2010. (HC-104356)

(Informativo 605, 1ª Turma)

 

Nulidades

Tribunal do Júri e Nulidade

A 1ª Turma indeferiu habeas corpus em que pretendido o restabelecimento de decisão absolutória proferida pelo Tribunal do Júri em favor de denunciado pela suposta prática do crime de homicídio qualificado. No caso, o parquet, ao alegar nulidade decorrente de violação, por parte da defesa, ao disposto na antiga redação do art. 475 do CPP (“Durante o julgamento não será permitida a produção ou leitura de documento que não tiver sido comunicado à parte contrária, com antecedência, pelo menos, de três dias, compreendida nessa proibição a leitura de jornais ou qualquer escrito, cujo conteúdo versar sobre matéria de fato constante do processo”) interpôs recurso perante o tribunal de justiça local, ao qual dado provimento, para determinar a realização de novo julgamento pelo júri popular. A defesa alegava que essa decisão teria violado o princípio constitucional da soberania dos veredictos. Reputou-se que, no julgamento absolutório, teria havido a leitura, por parte do patrono do acusado, de folhas de antecedentes criminais dos policiais que teriam atuado na fase inquisitória, sem que observada a referida regra

instrumental. Salientou-se, ademais, que a proibição contida nesse dispositivo seria bilateral, ou seja, atingiria tanto o Estado-acusador quanto a defesa.

HC 102442/MT, rel. Min. Cármen Lúcia, 26.10.2010. (HC-102442)

(Informativo 606, 1ª Turma)

 

Princípios Processuais Penais

Tráfico de Drogas: Combinação de Leis e Princípio do “Ne Reformatio in Pejus”

A 2ª Turma indeferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que determinara ao Juízo das Execuções que aplicasse à pena de condenado, como incurso no art. 12 da Lei 6.368/76, a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, no montante de 1/6 a 2/3, até o limite de 1 ano e 8 meses de reclusão. No caso, a defesa insurgia-se contra a fixação desse limite de redução, porquanto utilizada a pena mínima cominada em abstrato do art. 33 da Lei 11.343/2006 (5 anos de reclusão), mas não aquela em vigor à época dos fatos (3 anos de reclusão). Reputou-se não ser possível combinar dispositivos contidos em ambos os diplomas, sob pena de invasão da competência do Poder Legislativo e ofensa, por conseguinte, ao princípio constitucional da separação dos Poderes. Salientou-se que, muito embora o ato apontado como coator tivesse permitido a combinação de leis, contrariando entendimento fixado por esta Corte, ele não poderia ser desconstituído, em obediência ao princípio do ne reformatio in pejus. Precedentes citados: HC 96884/MS (DJe de 5.2.2010) e RHC 101278/RS, (DJe de 21.5.2010).

HC 97221/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.10.2010. (HC-97221)

(Informativo 605, 2ª Turma)

 

Prisão e Liberdade Provisória

Prisão Cautelar e Excesso de Prazo

A Turma, ante a excepcionalidade do caso, deferiu habeas corpus para conceder liberdade provisória aos pacientes, presos preventivamente, desde 2003, pela suposta prática do crime de homicídio qualificado. Reputou-se, inicialmente, não se tratar de superação do Enunciado 691 da Súmula do STF, pois o pedido de liminar no writ impetrado perante o STJ ainda não teria sido apreciado naquela Corte e o feito sequer possuiria relator. Aduziu-se a excessiva demora na constrição cautelar. Estabeleceram-se, por fim, algumas condições a que os pacientes deverão se submeter, dentre elas o compromisso de comparecimento a todos os atos do processo e a proibição de se ausentarem do distrito da culpa sem autorização judicial.

HC 102668/PA, rel. Min. Dias Toffoli, 5.10.2010. (HC-102668)

(Informativo 603, 1ª Turma)

 

Prisão Penal

Recâmbio de Preso e Inércia Estatal

A 1ª Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus, mas concedeu a ordem, de ofício, para o fim de revogar a prisão preventiva decretada em ação penal de comarca do interior de Pernambuco, com a determinação de expedição de alvará de soltura clausulado. Na espécie, o paciente fora denunciado por homicídio quadruplamente qualificado, supostamente cometido naquela unidade federativa, sendo preso em 20.1.2009, em São Paulo, sem que providenciado, até o mês de setembro deste ano, o seu recâmbio àquela comarca. A impetração pleiteava a revogação da custódia preventiva em virtude de ausência de fundamentação idônea e excesso de prazo. Asseverou-se que, embora houvesse motivação adequada para a segregação cautelar do paciente, a situação dos autos apresentaria peculiaridade. Aduziu-se que, de acordo com informações obtidas junto ao juízo processante, o feito ficara paralisado desde a prisão do paciente. Fora produzida apenas antecipação da prova acusatória, e facultada à defesa a realização de interrogatório por precatória na capital paulista. Em razão disso, apontou-se a aparente irregularidade do caso, pois não haveria a indicação de que teria ocorrido formal intimação para o oferecimento de defesa prévia e de apresentação de rol de testemunhas e, ainda, porque não incumbiria à defesa requerer a providência do interrogatório. Enfatizou-se que, apesar da gravidade do crime imputado ao paciente, sua liberdade individual não poderia ficar ao arbítrio do Estado-acusador, quanto ao andamento, ou não, do processo. Destacou-se a inércia estatal em recambiar de ofício o réu. Reputou-se que a demora no desfecho da ação penal não poderia ser debitada à defesa e que o juízo processante desconsiderara recomendação da Corte pernambucana no sentido de priorizar o recâmbio do réu àquela comarca.

Vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski, quanto à concessão de ofício, e Marco Aurélio, que conhecia do writ e concedia a ordem ante o excesso de prazo.

HC 104667/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 19.10.2010. (HC-104667)

(Informativo 605, 1ª Turma)

 

Provas

Crime de Furto: Qualificadora e Nulidade de Perícia

A Turma, por maioria, denegou habeas corpus em que alegada a nulidade de laudo pericial mediante o qual reconhecida a existência de qualificadora pertinente ao rompimento de obstáculo em crime de furto. A defesa alegava inexistência de relação entre a habilitação técnica dos peritos nomeados e a natureza do exame realizado, bem como ausência de indicação da metodologia por eles utilizada para a resposta dos quesitos, em dissonância com o que exigido pela legislação processual penal. Sustentava ser aplicável ao fato, ademais, o princípio da insignificância. Para evitar supressão de instância, conheceu-se da impetração, apenas na parte relativa à suposta nulidade. Nessa parte, entendeu-se idônea a perícia realizada, pois, comprovada a ausência de peritos oficiais, foram nomeados 2 peritos, ambos com curso superior, atendidos, portanto, os requisitos contidos nos artigos 159, § 1º, e 171, do CPP. Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, que deferia a ordem. Reputava ser necessário harmonizar-se o sistema processual como um todo, de modo a interpretar-se a legislação instrumental penal em conjunto com a instrumental civil, na qual se exige que os peritos comprovem sua especialidade na matéria sobre a qual deverão opinar, nos termos do art. 145, § 2º, do CPC (“Os peritos comprovarão sua especialidade na matéria sobre que deverão opinar, mediante certidão do órgão profissional em que estiverem inscritos”). Aduzia também configurar nulidade a não descrição da metodologia utilizada na elaboração do “auto de constatação de dano”, de forma a desclassificar o delito para furto simples.

HC 99035/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 5.10.2010. (HC-99035)

(Informativo 603, 1ª Turma)

 

Testemunha Não Arrolada em Denúncia e Oitiva pelo Juiz

A 1ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pleiteava a anulação de ação penal desde a audiência de oitiva de testemunhas, ao argumento de que testemunha, não arrolada na denúncia, teria sido ouvida, em primeiro lugar, pelo juízo processante. De início, ao salientar a condenação definitiva do paciente a 2 anos de reclusão por furto qualificado, substituída por pena restritiva de direitos e multa, observou-se não estar prejudicado o writ. No ponto, apurou-se, em contato com o juízo da execução, que a pena ainda não teria sido totalmente solvida, a possibilitar, caso não cumprida, eventual conversão em pena privativa de liberdade. Registrou-se que a primeira testemunha inquirida — patrulhador que abordara o paciente — realmente não fora arrolada na denúncia, comparecera à audiência e o juízo a ouvira como sua testemunha. Enfatizou-se que o CPP e a teoria jurídica processual penal não determinariam uma ordem necessária para a oitiva de testemunha do juízo. Avaliou-se que sua inquirição em momento anterior teria favorecido a defesa. Realçou-se a ausência de indicação de eventual prejuízo. Constatou-se, ainda, a preclusão da matéria, haja vista a presença, naquele momento, de defensora do réu, a qual, de acordo com o termo de deliberação da audiência, não teria impugnado imediatamente a inquirição da testemunha ou oferecido resistência ou oposição a esse fato, nem interposto recurso. O Min. Ricardo Lewandowski ressaltou que a busca da verdade real pelo juízo criminal permitiria uma atuação com certa amplitude, sendo possível ao juiz ouvir, como se fossem suas, tanto as testemunhas arroladas a destempo pelas partes quanto quaisquer outras. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ ao fundamento de que o devido processo legal, no que se refere ao direito de defesa, seria sagrado e que a nulidade seria absoluta. Entendia desnecessária, ao versar matéria sobre o exercício do direito de defesa, a demonstração do prejuízo, por reputá-lo presumido, não obstante reconhecer que o próprio título condenatório poderia consistir certidão judicial pública desse prejuízo. Considerava, ainda, a possibilidade de oitiva nos termos do art. 209 do CPP, mas não na forma realizada no caso presente, em que a acusação indicara extemporaneamente a testemunha, segundo a decisão do STJ, tendo o juiz afastado a inércia do Estado, ao ouvi-la sob a roupagem de testemunha do juízo.

HC 95319/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 19.10.2010. (HC-95319)

(Informativo 605, 1ª Turma)

 

 

DIREITO TRIBUTÁRIO

 

Impostos

Repercussão Geral e Alteração nas Premissas Fático-Jurídicas – 1

O Plenário resolveu questão de ordem no sentido de reconhecer a repercussão geral da matéria discutida em recursos extraordinários, relativa à possibilidade, ou não, de se aplicar a alíquota máxima do Imposto de Renda de Pessoa Física aos valores recebidos acumuladamente pelo beneficiário, por culpa exclusiva da autarquia previdenciária. Com base nisso, reformou decisão monocrática da Min. Ellen Gracie, que não admitira os recursos, dos quais relatora, ao fundamento de que a questão já teria sido considerada “sem repercussão geral” no âmbito do Plenário Virtual. No caso, após o STF haver deliberado que o tema versado nos autos não possuiria repercussão geral, o TRF da 4ª Região declarara a inconstitucionalidade, sem redução de texto, do art. 12 da Lei 7.713/88, o qual determina a incidência do Imposto de Renda no mês do recebimento de valores acumulados sobre o total dos rendimentos. A União, ao alegar a superveniente alteração nas premissas fático-jurídicas, sustentava, em sede de agravo regimental, que os recursos extraordinários interpostos com fulcro no art. 102, III, b, da CF teriam repercussão geral presumida.

RE 614232 AgR-QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-614232)

RE 614406 AgR-QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-614232)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 605, Plenário, Repercussão Geral)

 

Repercussão Geral e Alteração nas Premissas Fático-Jurídicas – 2

Aduziu-se que a superveniência de declaração de inconstitucionalidade de lei por tribunal de segunda instância consubstanciaria dado relevante a ser levado em conta, uma vez que retiraria do mundo jurídico determinada norma que, nas demais regiões do país, continuaria a ser aplicada. Ao enfatizar que se cuidaria de matéria tributária, mais particularmente de imposto federal, asseverou-se que os princípios da uniformidade geográfica (CF, art. 151, I) e da isonomia tributária (CF, art. 150, II) deveriam ser considerados. Observou-se, ademais, que a negativa de validade da lei ou de ato normativo federal em face da Constituição indicaria a presença de repercussão geral decorrente diretamente dos dispositivos constitucionais aludidos, o que justificaria a apreciação do mérito dos recursos extraordinários, devendo-se reputar satisfeito o requisito de admissibilidade previsto no art. 102, § 3º, da CF. Assim, tendo em conta a declaração de inconstitucionalidade superveniente e a relevância jurídica correspondente à presunção de constitucionalidade das leis, à unidade do ordenamento jurídico, à uniformidade da tributação federal e à isonomia, assentou-se que o tema apresentaria repercussão geral. Os Ministros Ellen Gracie, Ayres Britto, Gilmar Mendes e Marco Aurélio admitiam, na situação em apreço, a revisão da tese anterior, nos termos mencionados no art. 543-A, § 5º, do CPC (“§ 5º Negada a existência da repercussão geral, a decisão valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.”).

RE 614232 AgR-QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-614232)

RE 614406 AgR-QO/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 20.10.2010. (RE-614232)

(Informativo 605, Plenário, Repercussão Geral)

 

Supremo Tribunal Federal

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Como citar e referenciar este artigo:
STF,. Informativo STF Mensal – nº3. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/informativos-de-jurisprudencia/stf-informativos-de-jurisprudencia/informativo-stf-mensal-no3/ Acesso em: 18 abr. 2024
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