Pitacos de um Advogado Rabugento

Afinal, para que serve o Quinto Constitucional?

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Bruno de Oliveira Carreirão*

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Os advogados catarinenses se preparam para, pela primeira vez, elegerem pelo voto direto a lista sêxtupla dos advogados postulantes à vaga de desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina destinada ao quinto constitucional.

A nova forma de escolha foi aprovada pelo Conselho da OAB/SC[1] após a polêmica nomeação de Alex Santore em 2017[2], que integrou a lista sêxtupla eleita pela OAB/SC, a lista tríplice eleita pelo Tribunal de Justiça e foi escolhido pelo Governador, mas, posteriormente (embora sua candidatura já tivesse sido impugnada), revelou-se que ele não cumpria os requisitos para a candidatura, pois sequer tinha o tempo mínimo necessário de exercício da profissão – o que motivou a anulação de sua nomeação, que segue controvertida judicialmente até hoje[3].

Na época, as conversas de bastidores diziam que Santore era o candidato do então Presidente da Assembleia Legislativa e futuro candidato a Governador. Se isso é verdade? Não sei e não consigo entender qual seria o interesse da OAB/SC e do TJSC em fazer o jogo do Presidente da ALESC. Mesmo assim, ainda é incompreensível o porquê de um candidato tão pouco representativo da advocacia e que claramente não era o mais qualificado ter recebido votos suficientes para integrar a lista sêxtupla e depois a lista tríplice.

O fato é que Alex Santore não tinha atuação destacada na advocacia, tanto que mal conseguia comprovar que cumpria os requisitos mínimos, pois passou a maior parte de sua vida profissional no setor público, em cargos de confiança[4]. Ora, se os requisitos mínimos são o critério formal para que o advogado possa se candidatar, os parâmetros para que ele seja um dos mais votados certamente deveriam ser mais criteriosos.

Isso me leva ao tema central da coluna neste mês: para que serve o quinto constitucional? Não são poucos os que dizem que o quinto deveria ser extinto, porque parece só se prestar a promover a ascensão social e profissional de advogados de pouco sucesso na profissão, mas bem relacionados politicamente[5].

A ideia por trás do instituto do quinto constitucional, porém, é oxigenar a magistratura. O requisito de singelos 3 anos de prática jurídica para os concursos para a magistratura, que podem ser comprovados com atividades como conciliação e mediação, faz com que ingressem na carreira juízes muito jovens e com pouca vivência. Muitos desses magistrados prosseguem na carreira apenas encastelados em seus gabinetes, sem noção da realidade que os cerca e das consequências de suas decisões.

É por isso que para que o quinto constitucional cumpra sua função, o desembargador que ingressa por esta via precisa ser alguém com verdadeira experiência na advocacia, para que seja capaz de oferecer uma nova visão para o Tribunal e tirar os magistrados de carreira de sua zona de conforto. É esse desembargador que poderá demonstrar a seus pares o quão prejudicial é uma decisão com fundamentação genérica, uma omissão de julgamento de uma das teses apresentadas pela parte, uma fixação de honorários sucumbenciais abaixo do patamar legal, uma condenação por litigância de má-fé sem fundamento, etc.

No pleito que se aproxima, estabeleci três critérios fundamentais para orientar o meu voto:

1) Formação acadêmica sólida: Para ser um bom desembargador, o candidato deve, antes de mais nada, ser um grande jurista, capaz de compreender as teses jurídicas que julgará e fundamentar adequadamente suas decisões. Por isso, considero essencial analisar o currículo acadêmico dos candidatos e sua produção intelectual;

2) Representatividade da advocacia: É necessário que o candidato tenha a vivência da advocacia e conheça as suas dores, para que possa levar uma visão representativa para o Tribunal. Não basta apenas ser inscrito na OAB ou ter assinado meia dúzia de petições; é necessário realmente ter exercido de verdade a profissão, para que possa, como desembargador, não repetir os erros dos magistrados de carreira que frustram os advogados cotidianamente;

3) Reputação ilibada: Esse critério deveria ser autoexplicativo. A importância da função que será exercida é incompatível com quaisquer desvios éticos.

Os argumentos contrários à eleição direta para o quinto constitucionais não são desprezíveis. Há quem argumente que a eleição direta tornará a escolha ainda mais política e menos técnica, privilegiando os candidatos com mais tempo e recursos para fazer campanha. O tiro, de fato, pode sair pela culatra.

De todo modo, a experiência recente revela que uma mudança era necessária. Cabe agora a nós, advogados, tentar fazer a melhor escolha possível.



* Bruno de Oliveira Carreirão é advogado, mestre em Direito e acredita que deveria ser requisito para ingresso na magistratura o candidato já ter tido a experiência de ter embargos de declaração rejeitados por uma decisão genérica de duas linhas.



[1] “OAB/SC democrática: lista sêxtupla do Quinto Constitucional passa a ser escolhida pela advocacia catarinense em votação direta e eletrônica”:  https://www.oab-sc.org.br/noticias/oabsc-democratica-lista-sextupla-do-quinto-constitucional-passa-ser-escolhida-pela-advocacia-catarin/18020

[2] “Indicação de advogado ao TJ-SC gera crise entre tribunais e governador”:  https://www.conjur.com.br/2017-dez-04/indicacao-advogado-tj-sc-gera-crise-entre-cortes-governador

[3] “Advogado volta à disputa por uma vaga no TJ-SC”:  https://www.nsctotal.com.br/colunistas/anderson-silva/advogado-volta-a-disputa-por-uma-vaga-no-tj-sc

[4] Currículo do cidadão:  http://lattes.cnpq.br/0709164114970773

[5] A título de exemplo: “‘O quinto constitucional hoje é preenchido pelo advogado fracassado’”:  https://www.jota.info/justica/quinto-constitucional-anamages-13072018

Como citar e referenciar este artigo:
CARREIRÃO, Bruno de Oliveira. Afinal, para que serve o Quinto Constitucional?. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2020. Disponível em: https://investidura.com.br/colunas/pitacos-de-um-advogado-rabugento/afinal-para-que-serve-o-quinto-constitucional/ Acesso em: 18 abr. 2024