Novo CPC

Comentários ao novo CPC – art 4º

“Art. 4º As partes têm direito de obter em prazo razoável a solução integral da lide, incluída a atividade satisfativa”.

 

O processo é o instrumento pelo qual o Estado confere jurisdição na solução de conflitos e isso deve ocorrer de maneira justa. Dentro desse modelo, surgiu no direito pátrio o cha­mado “processo justo” que, em linhas gerais, refere-se ao ideal de que o processo seja formado em consonância com os preceitos de dignidade da pessoa humana.

 

Deve, portanto, respeitar o devido processo legal, nos seus seguimentos ampla defesa e contraditório, além das demais garantias fundamentais inerentes à pessoa humana, dentre os quais se encontram a igualdade, a publicidade dos atos judiciais e a duração do processo por um período de tempo razoável. Esses ele mentos devem ser rigorosamente resguardados quando da busca do jurisdicionado pela tutela jurisdicional dos direitos que deve ser prestados por meio de uma jurisdição adequada.

 

Pode ocorrer, contudo, a lentidão na entrega da prestação jurisdicional, o que pode ser identificada como uma mazela pelos jurisdicionados, que fazem a imediata correlação entre a morosidade e a ineficiência esta tal, gerando o conseqüente descrédito na justiça brasileira.

 

Em atenção ao mandamento da efetividade processual, foi introduzido no art. 5º de nossa Constituição através do inciso LXXVIII, pela Emenda Constitucional nº 45/2005, com o objetivo de combater a morosidade na entrega da prestação jurisdicional e garantir o acesso à justiça que, por sua vez, pressupõe não apenas a tutela adequada, mas também a tempesti­va.

 

Na opinião de Barbosa Moreira (Temas, 7a série) a idéia de que a justiça brasileira é morosa ou que aqui, a prestação da tutela jurisdicional é mais lenta do que em países mais desenvolvidos é um mito, que não se justifica.

 

A Constituição norte-americana ao promulgar a 6ª emenda evidencia também, a preocupação com o processamento em tempo hábil. O speedy trial é uma das liberdades funda­mentais trazidas pelo Bill of Rights, ainda que sua aplicação tenha incidência no processo penal.

 

Por outro lado, os processos cíveis na Itália têm tido duração bem acima do razoável. Na busca por uma maior efetividade na prestação jurisdicional, a Itália tem levado a cabo alte­rações no ordenamento processual. As modificações, contudo, não surtiram os efeitos pretendidos.

 

Aduza-se o fato de que, por integrar a Comunidade Européia desde 1957, a Itália submete-se à Convenção Européia, que prevê a razoável duração do processo (dirit to ad um processo equo) em seu artigo 6º, parágrafo primeiro. Não foram poucas as decisões da Corte Européia no sentido de condenar a Itália pela violação ao direito fundamental, que tanto pode ser pleiteado pelo autor quanto pelo réu.

 

 

Os constrangimentos provocados pelas sucessivas decisões da Corte fomenta ram a reforma constitucional que culminou por alterar o artigo 111 da Constituição italiana, prevendo o justo processo a ser regulado pela lei.

 

Explica Nicolò Trocker (Il Nuovo Articolo 111 della Constituizone e il “gius to processo” in matéria civili: profili generali, in Rivista trimestrale di Diritto e procedura Civile, 2001), ao comentar o referido artigo, que “justo é o processo que se desenvolve em respeito aos parâmetros fixa dos na Constituição e nos valores da sociedade”. A lei infraconstitucional, então, traria os parâmetros do justo processo, ficando ao encargo do legislador e não do juiz.

 

O advento da Legge Pinto (Legge Pinto adotou o nome de um dos senadores autores do projeto de lei. Trata-se da Lei nº 89/01) no ordenamento ita lia no inovou ao prever a reparação do dano causado pela excessiva duração do processo. Ao reformar o art. 375 do Código de Processo italiano, reconheceu o Estado que a entrega da prestação jurisdicional tardia, por si só, tem o condão de gerar um dano aos demandantes.

 

Além disso, previu a obrigação de o Estado indenizar as partes quando viola da a razoável duração do processo desde que aqueles não tenham concorrido para a excessiva duração. Registre-se por oportuno que o ordenamento italiano adotou os mesmos critérios da Corte Européia para a mensuração da violação da razoável duração do processo.

 

Compreendemos que a demora na prestação jurisdicional gere a sensação de ser nociva, de submeter os sujeitos do processo, muitas vezes, a desconforto, angústia e lesões de ordem material; por outro lado sabemos que a prestação jurisdicional precisa de um tempo mínimo a fim de garantir que os mecanismos de processamento dos feitos seja realizado de modo a garantir que elementos inerentes a um Estado Democrático de Direito sejam preservados.

 

No que tange aos meios que garantam a celeridade de sua tramitação (inciso LXXVIII, do art. 5º, in fine, da CF), tem tido papel relevante o CNJ, por meio da instituição das Metas, não obstante, no que se refere à Meta 2, não ter havido o integral cumprimento, nem mesmo pelo STF.

 

Razoável será o tempo necessário para a cognição da causa até a efetiva entrega (ou não) do bem pretendi do pela parte, ou seja, de todo o iter processual até a efetivação do provi­mento final.

 

A razoável duração do processo tem como características: a) a universalidade, b) a limitabilidade, c) cumulatividade e d) irrenunciabilidade.

 

A razoável duração do processo e a evolução do conceito de jurisdição devem ser harmonizadas no intento da efetividade ao concentrarem-se seja na busca de formas diferenciadas de tutela de direitos, seja por meios alternativos de solução de conflito, seja pela participação democrática do cidadão na persecução da solução do conflito submetido ao judiciário, como formas de viabilizar o Estado Democrático de Direito e os novos conflitos da sociedade moderna.

 

Ainda sobre o que seria o tempo razoável, observamos que são aplicáveis os princípios da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade e da razoabilidade.

 

Devemos ponderar, contudo, que apesar de a demora na solução do litígio apre sentar seus elementos nocivos, o princípio da celeridade processual deve ser observa do com cautela. Não se deve buscar uma celeridade a qual quer custo, sob pena de comprometimento do devido processo legal e, conseqüentemente, da prestação jurisdicional adequada, justa e eficaz (Boaventura de Souza Santos, Os Tribunais nas Sociedades Contemporâneas).

 

* Humberto Dalla Bernardina de Pinho, Promotor de Justiça no RJ. Professor Adjunto de Direito Processual Civil na UERJ e na UNESA. Acesse: http://humbertodalla.blogspot.com/

Como citar e referenciar este artigo:
DALLA, Humberto. Comentários ao novo CPC – art 4º. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/colunas/novo-cpc/comentarios-ao-novo-cpc-art-4o/ Acesso em: 29 mar. 2024