Diário de Estagiário

… quê?

 

Algumas pessoas escrevem realmente mal! Eu não saberia a quem culpar, mas acho que tem alguma coisa a ver com o professor, principalmente lá no primário ou no pré-primário… a tia. Sim, lá vou eu falar mal da tia… de novo!

 

A tia da minha turma se preocupava demais com que cada um escrevesse com letra bonita, não sei se para impressionar os pais ou o quê, mas esse era o objetivo principal dela: que todos tivessem letras cursivas, redondinhas e conectadas. Não me entendam mal, acho que ter uma letra no mínimo inteligível é superválido, mas essa está longe de ser a coisa mais importante na habilidade de alguém escrever.

 

Dessa forma, preocupando-se demais com a letra dos alunos, as tias deixam de ensiná-los a concatenar ideias, formar linhas de raciocínio, justapor frases e, o principal, transmitir a ideia.

 

Esta veio de uma ação declaratória de inexistência de débito c/c pedido de antecipação de tutela, na contestação. Aparentemente a empresa de telefonia que o requerente contratou, durante os três primeiros meses, cobrou pelo serviço mas não forneceu uma linha telefônica com estabilidade no sinal.

 

E vejam que novidade: empresas de telefonia prestarem um serviço ruim! Quem teria pensado nisso… Acho que até mesmo na galáxia muito, muito distante de Luck Skywalker as empresas de telefonia são ruins. Se duvidar o “Império” é o nome da SA e Darth Vader é o vice-presidente.

 

Mas, de qualquer jeito, fica a dica: ninguém precisa provar que o serviço dessas empresas é ruim. Os juízes já podem partir desse pressuposto porque é de conhecimento de todos que essa é a realidade. Atire a primeira pedra quem nunca se incomodou com Net, Telefônica, Oi ou Tim. Enquanto o consumidor brasileiro sofre com a falta de empresas competentes, o pessoal da Anatel deve estar tirando uma soneca.

 

Mas vamos logo ao trecho de hoje:

 

“A finalidade da ação declaratória e algançar uma certeza jurídica, e esta certeza jurídica, e um bem, ou seja, alcançar essa ceteza jurídica e, sem dvida, a função mais elevada do processo civil, e ordinariamete, a obtenção da certeza jurídica ocorre, antes da violação do direito, no entanto, também, e cabivel após a violação do mesmo.”

 

Nem vou comentar essas coisas que não podem ser consideradas erro de digitação. Erro de digitação é esbarrar em uma tecla e deixar o “catalisador” virar “caralisador” – como eu fiz em uma sentença e a juíza me passou um sabão. Não, isso aí é imperícia!

 

Adiante, alguém entendeu alguma coisa? Eu juro que não estou inventando. Tive de chamar o gabinete todo pra ver e tentar decifrar o que está escrito ali. Vamos TENTAR melhorar a situação:

 

“A finalidade da ação declaratória é alCançar uma certeza jurídica e essa, sem dúvida, é a função mais elevada do processo civil. Ordinariamente tal obtenção ocorre antes da violação do direito, no entanto, também é cabível após isso.”

 

Tirem toda a repetição, toda a gagueira e todo o vai e vem, além de todo e qualquer “o(a) mesmo(a)”, que é muito tosco, e pronto. Simples e direto. Quer algo ainda mais simples?

 

“A finalidade da ação declaratória é alcançar uma certeza jurídica – a função mais elevada do processo civil – ordinariamente ocorrendo antes da violação do direito, também sendo possível após.”

 

Pronto. E os travessões dão um toque mais interessante, chique, porém devem ser usados com parcimônia.

 

Bem, na realidade, que tal deixar assim?

 

“”.

 

Esse é o tipo de passagem totalmente desnecessária a uma argumentação. Não interessa se você acha que a certeza jurídica é a função mais elevada no processo civil ou em qualquer outro e, principalmente, nós já sabemos que pode ser obtida antes ou após a violação! Preocupe-se com o que é importante! Sabem o que aconteceu depois dessa peça? Metade dos fatos continuaram incontestados, porque o defensor da requerida estava tão preocupado em escrever bonito (acho que não deu muito certo) que se esqueceu de contrapor os fatos expostos.

 

A síndrome do obiter dictum não é legal e quem sabe não deveria se referir apenas ao “blá-blá-blá” nas decisões, mas a toda e qualquer manifestação.

 

É por essas e outras que os processos com peças gigantescas ficam jogados nos escaninhos e nunca são analisados. Ninguém merece ter de sanear um processo do juizado especial cível em que cada uma das petições tem mais de vinte páginas.

 

Sejam diretos, breves, concisos e, tentem escrever direito – dá mais credibilidade!

 

Como citar e referenciar este artigo:
BELLI, Marcel. … quê?. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/colunas/diario-de-estagiario/que/ Acesso em: 28 mar. 2024