Processo Civil

O Juizado Especial Ainda é Justiça de Segunda Classe

 

(Dedico este artigo ao Desembargador JOSÉ FERNANDES FILHO, do TJMG)

 

Como se sabe, o Juizado Especial se sustenta, basicamente, sobre dois pilares: 1) deve-se visar a conciliação como forma de resolver os processos; e 2) nos casos em que não se consegue a conciliação, a simplicidade e a maior informalidade do procedimento ajudam a se chegar a uma sentença de mérito mais rapidamente que nos processos tradicionais.

 

Com uma certa dose de razão, associou-se o Juizado Especial às classes pobres. É verdade que a maioria das causas tidas como de menor complexidade (pelo valor reduzido do pedido ou pela sua aparentemente maior simplicidade) são aquelas ajuizadas pelas pessoas de menor poder econômico… As causas ajuizadas pelos mais abastados são mais complexas, tanto pelo valor do pedido quanto pela própria complexidade das questões de fundo…

 

Essas duas afirmações são apenas meia-verdades, ou seja, representam a consagração de privilégios de uns e tratamento menos atencioso quanto a outros.

 

Os Tribunais não investem no Juizado Especial tanto quanto deveriam, porque não têm o retorno que a Justiça tradicional dá em termo de custas. Não há recurso financeiro suficiente para sustentar-se uma estrutura deficitária em termos de contraprestação representada pelo recebimento de custas.

 

O Juizado Especial somente dá retorno em custas quando os processos chegam à 2ª instância.

 

Diz-se que não se deve dar ao Juizado Especial a atenção que se dá à Justiça tradicional.

 

Todavia, deveria ser diferente, pois, em termos de Justiça, não se deve dividir os jurisdicionados em pobres e ricos, e as causas em simples e complexas ou de pequeno e de grande valor.

 

Trata-se de verdadeiro atentado à cidadania. Todos são cidadãos e não há meia-cidadania…

 

Em Minas Gerais, para felicidade geral, existe um magistrado de larga competência e exemplar espírito público que tem procurado transformar o singelo e depreciado Juizado Especial numa Justiça inteira, de verdade. Não fosse ele e esse modelo estaria fadado a naufragar no movediço oceano dos privilégios e interesses das classes abastadas.

 

Sempre me assusto com o tratamento inferiorizante que o Juizado Especial recebe dos operadores do Direito em geral, pois os pobres precisam mais da Justiça que os ricos.

 

É preciso sensibilizar-se inicialmente os legisladores para melhorarem o tratamento legislativo dado a esse importantíssimo segmento da Justiça.

 

Caso contrário estaremos dando aos nossos jurisdicionados muito menos que merecem, desconsiderando seu sagrado status de cidadãos.

 

 

* Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).

Como citar e referenciar este artigo:
MARQUES, Luiz Guilherme. O Juizado Especial Ainda é Justiça de Segunda Classe. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/o-juizado-especial-ainda-e-justica-de-segunda-classe/ Acesso em: 16 abr. 2024