Processo Civil

Breve análise acerca das medidas executivas atípicas presentes no Novo Código de Processo Civil

OLIVEIRA, Isabela Cristina Castro de [1]

RESUMO

Este trabalho pretende analisar as medidas executivas atípicas oriundas do magistrado frente às divergências doutrinárias e jurisprudenciais no ordenamento jurídico brasileiro e sua percepção quanto o Novo Código de Processo Civil assim como sua interpretação a luz da Constituição Federal e as medidas judiciais que promoveram tais complexidades no cenário atual e seus enfrentamentos sobre as matérias processuais vigentes.

Palavras-chave: Medidas Executivas, Processo Civil, Doutrina, Constituição Federal

ABSTRACT

This paper intends to analyze the atypical executive measures taken by the magistrate in face of doctrinal and jurisprudential divergences in the Brazilian legal system and its perception regarding the New Code of Civil Procedure as well as its interpretation in the light of the Federal Constitution and the judicial measures that promoted such complexities in the scenario current situation and their clashes over current procedural matters.

Key words: Executive Measures, Civil Procedure, Doctrine, Federal Constitution

1. INTRODUÇÃO

O Código de Processo Civil de 2015 aponta de forma mais concisa aquilo que por muito tempo provocou grandes questionamentos quanto às decisões de juízes ou tribunais acerca das medidas executivas atípicas no que tange as obrigações de pagar quantia, tema este que o ocasionou grandes divergências doutrinárias e jurisprudenciais da matéria, muito embora que tais medidas sejam legais unicamente se respeitados os direitos e garantias constitucionais de cunho fundamental, fato é que tais decisões ocorriam sem muita elucidação que o código de processo civil assim formulava sobre o alcance das obrigações do executado proferidas até então, o que inúmeras vezes geravam duvidas quanto a observância dos princípios constitucionais ou até mesmo os princípios processuais no caso de uma execução de título extrajudicial que ofendia tais direitos sobre a razão de que outras medidas poderiam ser utilizadas sem ferir os direitos fundamentais e de forma mais cabida, entretanto mesmo com a atuação da nova jurisdição ainda assim restam duvidas quanto os limites destas medidas executivas tomadas pelo judiciário no exercício de suas funções .

O complexo de decisões alimentadas por divergências quanto a sua observação das normas originarias ocasionaram até mesmo o interesse de verificar sua adequação quanto a sua constitucionalidade da norma constitucional, pois no caso das medidas executivas estariam para muitos pairando numa natureza contrária a sua original aplicação, ou seja, a sua forma de execução. Este trabalho pretende questionar as razões dessas medidas diante daquilo que o novo código de processo civil propõe utilizando assim o princípio da proporcionalidade dentre outros meios diversos ou assim como o princípio apresentado que em tese pretende analisar a adequação, necessidade, proporcionalidade strictu sensu, para assim ocasionar a possibilidade de inobservância de direitos fundamentais em razão de um executado, nesse sentido o artigo ainda pretende esclarecer quanto a razões dessas medidas, pois tais decisões partem em tese do não cumprimento do executado que por má-fé ignora a possibilidade real do cumprimento de tal obrigação.

Para tanto o novo código de processo civil sob a égide de um novo olhar pretende arcar com a alçada que previamente o Estado Democrático de Direito não logrou constituir, estabelecendo, portanto limites essenciais e necessários para obtenção do direito jurisdicional na sua capacidade de dirimir conflitos em observância do Devido Processo Legal.

2. DAS MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

A efetividade das decisões judiciais é um dos valores centrais do Novo Código de Processo Civil, pois a atividade satisfativa também passa a ser concebida no plano dogmático como corolário do direito fundamental ao acesso à justiça. Os sujeitos envolvidos em uma relação processual – autor, réu e juiz – estão conectados uns aos outros e por esta razão o Código de Processo Civil estabelece entre eles, direitos e deveres que devem ser seguidos e cumpridos.

Deste modo, o Novo Código de Processo Civil é instrumento de substancialização aos enunciados e princípios constitucionais, em uma dinâmica de intercomunicabilidade circular, sendo validado pela CF/88, fornecendo a Carta Magna, por sua vez, contornos a ela, como se observa da ampliação do conteúdo do efetivo contraditório (art. 9, 10, vedação a decisão surpresa), e da decisão fundamentada (art. 489, §1º).  

O objeto central da presente pesquisa é destacar a inovação introduzida pelo artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil, ou seja, analisar a forma de aplicabilidade da decisão baseada no artigo139, inciso IV dos magistrados e se esta encontra-se de acordo com o texto constitucional.

O art. 139, IV do CPC, objeto de pesquisa, é produto deste paradigma constitucionalista processual, pois ao atribuir ao juiz à responsabilidade de assegurar o cumprimento das suas próprias ordens – inclusive de ofício –, o novo CPC confirma que, a efetividade do processo, repita-se, é uns dos valores umbilicais do processo civil brasileiro.[2]

Aponta-se a opinião de Humberto Theodoro Júnior que:

Enquanto no processo de conhecimento o juiz examina a lide para ‘‘descobrir e formular a regra jurídica concreta que deve regular o caso’’, no processo de execução providencia ‘’ as operações práticas necessárias para efetivar o conteúdo daquela regra, para modificar os fatos da realidade, de modo a que se realize a coincidência entre as regras e os fatos’’. Em outras palavras o processo de conhecimento visa a declaração do direito resultante da situação jurídica material conflituosa, enquanto o processo de execução se destina à satisfação do crédito da parte.[3]

Para melhor entendimento, importante citar novamente o que prevê o inciso IV do mencionado artigo, veja-se:

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária; [4]

O Novo Código de Processo Civil, inovou, uma vez que abriu o microssistema da tutela executiva a implementação de meios não prescritos em lei, possibilitando a adoção das medidas que o magistrado compreenda como necessária para consecução da satisfação do direito material declarado na sentença, inclusive quando estabeleçam obrigação de pagar. Desta maneira, esclarece Daniel Assumpção Amorim Neves:

“A novidade que parece ter sido trazida pelo Novo CPC é que o art. 139, IV, inserido no capítulo que trata dos poderes, deveres e responsabilidade do juiz, positiva genericamente (atipicamente) o dever de efetivação. Estabelece que compete ao juiz, na qualidade de presidente do processo, determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária’’.[5]

Observa-se que o legislador se preocupou em criar novos mecanismos para contribuir com a celeridade nos processos de execução e o artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil irá auxiliar na efetividade da atividade executória, pois ampliou as medidas que poderão ser adotadas pelo juiz para que o devedor seja compelido a cumprir com sua obrigação. Assim, pode-se perceber que o artigo 139, inciso IV, flexibilizou os atos executivos, permitindo a adoção de novas medidas para satisfazer o crédito do exequente, contudo não restringiu seu alcance.

Cassio Scarpinella Bueno destaca essa inovação:

Trata-se de regra que convida à reflexão sobre o CPC de 2015 ter passado a admitir, de maneira expressa, verdadeira regra de flexibilização das técnicas executivas, permitindo ao magistrado, consoante as peculiaridades de cada caso concreto, modificar o modelo preestabelecido pelo Código, determinando a adoção, sempre de forma fundamentada, dos mecanismos que mostrem mais adequados para a satisfação do direito, levando e conta as peculiaridades do caso concreto.[6]

O art. 139, IV do CPC/15 é de grande importância para o alcance da efetivação da tutela jurisdicional. Todavia, não pode ser usado aplicado sem a observância de algumas balizas, sob pena de violar frontalmente a dignidade do devedor, e, por conseguinte abuso de direito pelo Poder Judiciário. Sendo assim, objetivando que tal cláusula de efetivação se coadune com os valores constitucionais, sugerimos a observância das seguintes balizas: a) dever de cooperação; b) ineficácia dos meios típicos; c) possibilidade de adimplemento pelo devedor; d) dever de proporcionalidade e razoabilidade e) eficiência; f) dever de fundamentação.

O dever de cooperação trata-se de norma fundamental descrita no art. 6º da lei 13.105/2015, CPC/15, importa observar que o comando do artigo é no sentido de que cooperação deve se dar durante todo o processo, seja para fins do alcance da decisão de mérito, seja para o alcance da sua devida efetividade. As medidas descritas no art. 139, IV do CPC/15 só devem ser implementadas após o esgotamento e a ineficácia dos meios típicos de execução.

Pode-se concluir que a adoção das medidas executivas atípicas, portanto, só deve ser admitida no caso concreto quando ficar demonstrado que não foi eficaz a adoção do procedimento típico, ou seja, o binômio penhora-expropriação não foi capaz de fazer o direito de crédito do exequente. Isto pois, o típico prefere o atípico, mas quando o típico se mostra ineficaz, incapaz de cumprir seu encargo legal deve se admitir adoção do atípico.[7]

Deste modo, as medidas atípicas não podem ser causa de majorar os prejuízos ao devedor quando este não possui condições de satisfazer o objeto da execução. Em outros termos, as medidas coercitivas, por exemplo, “só podem ser aplicadas no caso concreto se houver uma expectativa de cumprimento voluntário da obrigação. Caso o juiz se convença de que o devedor não paga porque não tem como pagar, em razão de ausência de patrimônio que possa ser utilizado em tal pagamento, a medida executiva coercitiva não deve ser aplicada”. [8]

A regra da proporcionalidade é decomponível em três sub-regras: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Pela “regra da adequação, deve-se buscar uma exata correspondência entre meios e fins, no sentido de que os meios empregados sejam logicamente compatíveis com os fins adotados e que sejam praticamente idôneos a proporcionar o atingimento desses fins. Observe-se, por oportuno, que a proporcionalidade, consiste, aqui, numa simples correspondência fática entre meios e fins’’.[9]

Acrescenta-se ainda que o magistrado ao adotar as medidas atípicas para o alcance da finalidade e implementação da sua decisão deve fazê-la de forma eficiente, ou seja, de modo a promover satisfatoriamente os meios necessários para que se alcancem os fins do processo. O art. 93, IX do CF/88 estabelece o dever de fundamentação das decisões proferidas pelo Poder Judiciário, que é regulamentado pelo art. 489, §1º do Código de Processo Civil. Portanto, não é possível de admissão uma medida de coerção ou sub-rogação sem que a decisão justifique a razão da medida escolhida, bem como especifique a forma de seu cumprimento, pois o poder público não pode ser utilizado de qualquer forma.[10]

Observa-se na seguinte Ementa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDAS EXECUTIVAS CONVENCIONAIS INFRUTÍFERAS. APLICAÇÃO DO ART. 139IVCPC. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. SUSPENSÃO DA CNH. POSSIBILIDADE. DECISÂO MANTIDA.

O art. 139IV, do CPC prevê as denominadas medidas executivas atípicas, a fim de que o magistrado possa determinar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias ao cumprimento da ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.. Tendo sido adotadas todas as medidas executivas típicas, e evidenciado que o devedor se furta a adimplir com suas obrigações, mostra-se cabível a aplicação de medidas executórias atípicas com o fito de alcançar a efetividade do provimento jurisdicional. A aplicação das medidas atípicas deve observar os fins sociais e o bem comum, resguardando a dignidade humana tanto dos devedores, quanto dos credores. A suspensão da CNH não ofende o direito constitucional ao trabalho, previsto no art. XIII, da CF, porquanto norma de eficácia contida e que deve ser sopesada com os demais direitos fundamentais de forma a garantir a dignidade tanto do devedor quanto do credor. Recurso desprovido. (TJ-DF 07071526220188070000 DF 0707152-62.2018.8.07.0000, Relator: JOSAPHÁ FRANCISCO DOS SANTOS, Data de Julgamento: 08/08/2018, 5° Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 17/08/2018. Pág.: Sem página cadastrada.)

Compreende-se que as medidas atípicas são aquelas medidas que embora não estejam tipificadas no Código de Processo Civil, tem por finalidade atingir o resultado útil do processo ao credor, no sentido obter o fim pretendido pelo exequente, alcançando o bem da vida que almeja. Como a legislação processual civil não especificou quais são as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias a serem impostas, faz-se necessário analisar cada uma delas particularmente, exemplificá-las, analisar a forma como estão sendo aplicadas pelos magistrados e se estão adequadas ao texto constitucional. Por fim, como última baliza, o contraditório deve ser observado, mesmo que de forma diferida, conforme art. 7º, 9º do CPC.[11] Deste modo, as medidas de execução direta ou indireta de natureza atípica, deferidas pelo art. 139, IV do CPC/15 devem passar pela avaliação do contraditório.

2.1 Medidas Sub-Rogatórias Atípicas

Em relação às medidas sub-rogatórias atípicas,o primeiro exemplo que vale citar é a realização por terceiro de uma determinada tarefa a que o réu se encontrava obrigado. A simples autorização para que se desenvolva a atividade sub-rogatória não é suficiente, pois o terceiro a nada está obrigado. Deverá realizar a obra na proporção em que seja pago e com esse pagamento arcará o réu.

Nos casos em que exista antecipação de tutela fundada em urgência, seria contrassenso pretender-se que a obtenção do numerário junto ao réu para cobrir tais despesas seguisse o procedimento de execução por quantia certa. A concessão antecipada de tutela pressupõe urgência, e a execução por quantia certa em seus moldes tradicionais é avessa à urgência. Vai se aplicar, então, e mais uma vez, o § 1º do art. 536, que, permitindo a adoção de quaisquer medidas necessárias à produção do resultado prático equivalente, autoriza, consequentemente, a obtenção do numerário que custeará tais medidas. Em casos mais graves será possível o bloqueio de valores depositados em bancos em nome do demandado; a apreensão de receitas por ele geradas, e assim por diante.

Em outros termos nas medidas por sub-rogação, a vontade do executado é irrelevante para realização das medidas executado, pois o Estado-Juiz, independentemente da vontade do devedor, toma as medidas necessárias à satisfação do credor. Se o devedor não quer pagar quantia o magistrado, por exemplo, determina o bloqueio e retira os valores que se encontram depositados em conta. Se o devedor se recusa a entregar um bem o juiz determina que ele seja buscado à força.[12]

A imissão na posse e a busca e apreensão, a que alude o art. 538, caput, são providências sub-rogatórias flexíveis que podem assumir conformação ampla. Como escreve Araújo Cintra, a imissão na posse de imóvel e a busca e apreensão da coisa móvel são “os meios executivos adequados, por excelência, para assegurar a satisfação específica da obrigação de entregar coisa”.[13]

Considere-se, como exemplo, a intervenção judicial, trata-se de medida atípica que também pode vi a ser adotada com base no art. 536, § 1º. Em determinados casos em que o bem imóvel está ocupado por uma estrutura organizacional do réu com amplitude e complexidade tais que não é possível sua simples entrega imediata: é preciso retirar equipamentos de difícil desmonte e remoção ou matérias primas que envolvem riscos, remanejar pessoal que trabalha nessas instalações, etc.

O critério de adequação demanda que a imposição do mecanismo atípico deve ser adequada, ao ponto de ser possível atingir o resultado almejado; da forma que venha ser menos onerosa ao executado (necessidade), bem como seja possível equilibrar a relação, buscando satisfazer o direito do credor sem sacrificar os direitos do devedor, em obediência ao critério da proporcionalidade.[14]

No caso de aplicação de medidas atípicas mais gravosas, o executado poderá valer-se do princípio da menor onerosidade, disposto no artigo 805, “caput” do Código de Processo Civil, como meio de defesa quando houver outro mecanismo para ser utilizado. Todavia, caso não indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, a medida atípica será mantida, conforme determinação do parágrafo único do mencionado artigo.[15]

Em algumas situações, o prazo para a entrega voluntária do bem (art.498, CPC) precisará ser amplo, não é discricionária a determinação do prazo para cumprimento. O lapso de tempo concedido ao réu não poderá ser curto em demasia, de modo que o impeça de cumprir a ordem tempestivamente, ainda que queira; nem longo a ponto de ser inócua a tutela que se concedeu ao autor. As circunstâncias concretas deverão de ser consideradas, no entanto, há o risco de que o réu se aproveite amplitude do prazo que lhe é concedido para apenas ganhar tempo, não cumprindo o mandado de entrega. Em um caso como esse, seria razoável que o juiz: estabelecesse e programasse um calendário de desocupação, com etapas consideradas intermediárias; incumbisse determinada pessoa para ficar responsável em fiscalizar a atuação do réu, atribuindo a tal auxiliar do juízo poderes suficientes para que pudesse verificar se o réu está efetivamente adotando as medidas necessárias para a desocupação do imóvel.

É expressa e textual nesse sentido a conclusão a que chegou o Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC), entendimento que foi encartado no Enunciado de nº 12:

A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer obrigação no cumprimento de sentença ou execução de título executivo extrajudicial. Essas medidas, contudo, serão aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório, ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art. 499, § 1.º, I e II.

É dizer, em outras palavras, que, apenas se assumirem função de coerção do réu ao adimplemento, tais medidas coercitivas poderão ser empregadas, porque como se infere da leitura atenta do art. 139, IV, do CPC/2015, a previsão de atipicidade dos meios somente e tão somente se presta a “assegurar o cumprimento de ordem judicial”. A liberdade concedida ao Juiz certamente lhe impõe, de outro lado, a necessidade de que não a utilize para contrariar a lei ou mesmo princípios do Direito, conforme se verificaria na hipótese de ser determinada prisão civil do devedor (não sendo o caso certamente de dívida alimentar).

Nesse sentido, tomando por referência o exemplo do devedor que viaja constantemente, mas que não paga suas dívidas, imagine-se como seria inútil à efetividade da tutela jurisdicional a apreensão do passaporte se aquele devedor que é visto rotineiramente na área de embarque internacional do aeroporto de seu estado viaja apenas porque presta serviço voluntário em comunidades carentes de países da América Latina, sendo que as passagens são compradas diretamente pela ONG a que o devedor é associado.

Nesse mesmo sentido, a lição de Daniel Amorim Assumpção Neves e Flávio Tartuce, para os quais o juiz deve atuar com razoabilidade no emprego das medidas atípicas:

[…] deve o juiz atuar com imparcialidade e razoabilidade. Não pode, por exemplo, determinar a suspensão da habilitação de devedor que tem a condução de automóveis sua fonte de subsistência (taxista, motorista do UBER, motorista de ônibus). Tampouco parece correto proibir a contratação de novos funcionários de empresa que deve verbas salariais quando a contratação for indispensável ao próprio funcionamento da empresa.[16]

É preciso que fique claro que a atipicidade de forma alguma pode representar ofensa a direitos e a garantias constitucionais, ao invés de protegê-los. A previsão de medidas atípicas só existe e só pode ser cogitada quando assume alguma utilidade real à obtenção da tutela efetiva, adequada e tempestiva. Além disso, é indispensável que a decisão que imponha a medida atípica venha motivada e fundamentada, com estrita observância ao disposto no art. 489, §1º, do CPC/2015, inclusive demonstrando quais circunstâncias do caso sugerem a adequação, efetividade e eficiência da medida imposta.

O art.497, que consagra, inclusive a eficácia mandamental da decisão ali prevista, tem por objeto, conforme expressa indicação, tanto a tutela de fazer e não fazer quanto a tutela para entrega de coisa. Portanto, a sentença ou decisão interlocutória de mérito que impõe dever de entrega de coisa tem eficácia mandamental. Veicula verdadeira ordem de entrega para o réu. Além disso, no regime do cumprimento dessa sentença (ou interlocutória de mérito), há expressa previsão de aplicação subsidiária das regras dos arts. 536 e 537 (art. 538, § 3º do CPC). Assim, estendem-se à tutela para entrega de coisa (fundada em “título judicial”), “no que couber”: a possibilidade de cominação de multa periódicas e o emprego de “medidas de necessárias à satisfação do exequente” coercitivas e sub-rogatórias atípicas.

2.2. Medida Coercitiva Atípica,

Como medida coercitiva atípica, para fins meramente didáticos, expõe-se que são coercitivas as medidas que o juiz adota no sentido de coagir o devedor, impondo-lhe, por exemplo, multas cominatórias ou restrições para que ele cumpra a obrigação.  

Os meios coercitivos são aqueles com os quais o órgão jurisdicional pressiona a vontade do devedor, através da ameaça de sanções agraváveis, de modo a induzi-lo a realizar, ele mesmo, a prestação devida.[17]

O Tribunal de Justiça de São Paulo fornece claro exemplo do perigo residente na aplicação do art. 139, IV do CPC/2015 sem a observância de critérios objetivos vinculados à função coercitiva da nova norma de encerramento. Perante o referido Tribunal foram decididos alguns casos em que exequentes, em execuções de pagar quantia certa, requereram a imposição aos executados das mesmas três medidas: suspensão da carteira nacional de habilitação (CNH), apreensão do passaporte e bloqueio de cartões de crédito. Trata-se do habeas corpus nº. 2183713-85.2016.8.26.0000, 30ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Marcos Ramos e dos agravos de instrumento nº. 2063499-31.2017.8.26.0000, 1ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rui Cascaldi e 2113286- 29.2017.8.26.0000, 5ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Erickson Gavazza Marques.

O fundamento invocado pelo exequente para requerer a imposição das medidas, em todos os três casos, é que a execução se arrastava há muitos anos sem que tenha sido possível a satisfação do crédito pela execução direta (ou seja, pela substituição da vontade do executado pela atuação do Estado). Em suma, realizadas buscas de bens, nada foi encontrado. Nada mais foi alegado pelos exequentes. Não há discussão, nos arestos oriundos do Tribunal resolvendo os referidos casos, acerca do motivo pelo qual as execuções estavam insatisfeitas: (a) se por ardil ou má-fé do devedor que se furta de cumprir sua obrigação mesmo possuindo condições financeiras para tanto ou (b) se por falta de condições financeiras do devedor para pagar o que deve. Neste último caso, configura-se a impossibilidade fática, real, concreta de cumprimento da obrigação de pagar, de forma que nenhuma medida será capaz de constranger o devedor a cumpri-la, pois está fora de seu alcance. A imposição de quaisquer das medidas restritivas de liberdade aos casos em questão, portanto, demonstra apenas cunho punitivo, e não coercitivo, pois não há coerção diante de impossibilidade real de cumprimento da obrigação.

E, mesmo assim, eis o resultado do julgamento nos casos destacados: (1) no julgamento do habeas corpus nº. 2183713-85.2016.8.26.0000 todas as medidas antes deferidas pelo juízo de piso foram afastadas; (2) no julgamento do agravo de instrumento nº. 2063499- 31.2017.8.26.0000 todas as medidas foram deferidas, ressalvando-se apenas a possibilidade de uso do cartão na modalidade “débito” pelo executado e (3) no julgamento do agravo de instrumento nº. 2113286-29.2017.8.26.0000 foi mantida a decisão de piso apenas no tocante ao bloqueio dos cartões de crédito do executado, revogando-a quanto à suspensão da CNH e apreensão do passaporte.

Como medida coercitiva atípica, a prisão civil é permitida apenas na estrita hipótese de não atendimento à ordem judicial de cumprimento de dever com natureza alimentar (art. 5º, LXVII, da CF; STF, Súm. Vinculante 25).[18] Porém, isso não significa que a prisão civil apenas possa ser aplicada ao descumprimento das ordens de pagamento de alimentos do direito de família. Afinal, o conceito constitucional de alimentos (que é o parâmetro de admissibilidade da prisão civil) não se restringe aos alimentos ditos “legítimos” (i.e., os alimentos do direito de família). Abrange toda e qualquer prestação que seja na sua origem essencialmente destinada à subsistência digna do titular do direito (tanto é assim que o Estado, que não tem família, também responde por dívidas alimentares – CF, art. 100).[19]

O conceito constitucional de alimentos abarca inclusive prestações remuneratórias do trabalho ou da prestação de serviços em caráter pessoal. Abrange igualmente indenizações destinadas à subsistência da vítima de condutas ilícitas ou de seus familiares. O conceito constitucional de alimentos abrange inclusive prestações remuneratórias do trabalho ou da prestação de serviços em caráter pessoal. Envolve igualmente indenizações destinadas à subsistência da vítima de condutas ilícitas ou de seus familiares. Mais ainda (e eis o que especialmente interesse neste tópico): prestações estatais positivas atinentes a direitos fundamentais também podem revestir-se de natureza alimentar – tais como, o direito a medicamentos, tratamento médico, vagas em instituições hospitalares ou de ensino etc. Nesse último campo, a prisão civil pode ser importante instrumento coercitivo a acompanhar ordens de cumprimento de deveres de fazer.[20]

2.3. Medidas Indutivas Atípicas

Em relação às medidas indutivas atípicas, não há na lei qualquer restrição ou seleção do uso das medidas indutivas para obrigações de pagar, sejam alimentos propriamente ditos, de natureza alimentar ou civis. A todos (sujeitos processuais) deve ser garantida uma prestação jurisdicional satisfativa/executiva (de qualquer natureza, processual e de direito material) concreta, plena, efetiva e em tempo razoável. Desta maneira, não se justifica a admissão de aplicação de medidas atípicas visando a realização do direito reconhecido num título executivo (judicial ou extrajudicial) exclusivamente em obrigação de alimentos ou de caráter alimentar e não as permitir nas obrigações civis em geral. E o precedente ora em comento, aplicou ditas medidas em execução de pagar obrigação de natureza civil, corretamente.

Vale ressaltar:

EXECUÇÃO. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. MEDIDAS INDUTIVAS E COERCITIVAS. BLOQUEIO DE CARTÃO DE CRÉDITO. CABIMENTO. O princípio constitucional da dignidade humana (art. 1º, III, CF) deve ser analisado tanto da ótica do devedor como do credor. Na aplicação do ordenamento jurídico, incumbe ao juiz resguardar a dignidade da pessoa humana, a razoabilidade e a eficiência (art. 8º, CPC/2015). Diante do esgotamento das tentativas de localização de bens dos devedores, incumbe ao juiz determinar todas as medidas indutivas e coercitivas que assegurem o cumprimento da ordem judicial, qual seja a de satisfazer o crédito postulado em juízo. Parte credora que tem direito às providências que induzam ou forcem o devedor a pagar a dívida, bem como que obstem a prática de manobras fraudulentas, com nítida intenção de furtar-se ao cumprimento de sua obrigação. No caso em tela, é preciso considerar que a execução tramita desde 2008, tendo o exequente exaurido todos os meios de localização de bens em nome dos devedores, todos sem sucesso. Execução que se encontra suspensa com relação à coexecutada Regina HELENA BERTOLLI Rodrigues CHAGAS FELISBERTO. Impossibilidade de bloqueio do cartão da coexecutada Regina Helena. Requerimento de bloqueio de cartão de crédito de titularidade dos devedores Fernando BERTOLLI Rodrigues CONSTANTINOS KATSONIS, FABRICIO Rodrigues CONSTANTINOS KATSONIS e REDE D COSTA SERVIÇOS AUTOMOTIVOS Ltda. Que se mostra cabível. Leitura do art. 139, II, III e IV, CPC/2015. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO NESTE TÓPICO. PEDIDO DE SUSPENSÃO DA CARTEIRA DE HABILITAÇÃO (CNH) E DE PASSAPORTE. DESCABIMENTO. Providência que se mostra prematura e que não está ligada diretamente ao direito de crédito. Medida que se mostra de duvidosa eficácia, desproporcional e inadequada. Com relação à CNH, nota-se que não se cuida de infração de trânsito, prevista na Lei nº 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro). RECURSO DESPROVIDO NESSE TÓPICO. (TJSP; AI 2085222-09.2017.8.26.0000; Ac. 10943542; São Paulo; Vigésima Terceira Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Sérgio Shimura; Julg. 01/11/2017; DJESP 07/11/2017; Pág. 2490)

A dignidade da pessoa (tanto do devedor, mas também do credor, CF, Art. 1.º, inc. III), o direito a duração razoável do processo, da efetividade/inafastividade processual e material20 da prestação jurisdicional (CF, Art. 5.º, incs. XXXV e LXXVIII, NCPC, Arts. 3.º, 4.º e 6.º) açambarcam todas as obrigações de pagar. A autorização para o uso dos meios atípicos, igualmente, não se restringe à determinado tipo de prestação ou obrigação de pagar/pecuniária (NCPC, inc. IV, do Art. 139). Assim, conclui-se primeiramente que os meios indutivos, atípicos, podem e devem ser aplicados em qualquer tipo de obrigação de pagar quantia/pecuniária, própria ou subsidiária de obrigação específica não realizada, seja originária de alimentos (rito prisional, desconto em folha ou de expropriação), de natureza alimentar (honorários advocatícios, por exemplo) ou civis.

A suspensão do direito de dirigir conferido através de Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs), ou de navegar ou pilotar, o ARRAIS e o BREVÊ, até mesmo apreensão de passaportes e até cancelamento de cartões de créditos, são outros meios indutivos nas execuções/cumprimento de sentença de pagar quantia, amparado no disposto no inc. IV, do Art. 139, do NCPC. No caso ementado a medida aplicada foi, justamente, o bloqueio do cartão de crédito.

A Desembargadora Maria Pizzotti (SÃO PAULO, 2017),[21] explica que o objetivo do dispositivo não é impor penas ou restringir direitos, não sendo intenção do Judiciário suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar, mas de impor uma restrição gravosa caso ele não cumpra com a determinação, que escolha cumprir sua obrigação e dar fim ao problema.

Primeiramente, verifica-se que as novas medidas indutivas devem ser adotas de forma excepcional, após esgotadas os meios típicos previstos para cada execução/cumprimento de pagar (sejam alimentos, obrigações de natureza alimentar ou civis) e, ainda, desde que havendo ao menos indícios de que o devedor usa de artifício para escamotear-se da execução, seja quando levando padrão de vida incompatível com o seu status de inadimplente, sem bens passíveis de satisfazer a dívida, seja ostentando viagens, carros, bens, e, ainda que não se encontrem, efetivamente, bens em seu nome.

Nessa perspectiva, o professor FERNANDO FONSECA GAJARDONI, em seu artigo publicado no JOTA, aborda sobre o momento de se autorizar as medidas coercitivas/indutivas, veja-se:

“Por isso – a prevalecer a interpretação potencializada do art. 139, IV, do CPC/2015 –, o emprego de tais medidas coercitivas/indutivas, especialmente nas obrigações de pagar, encontrará limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfação do débito), na proporcionalidade (inclusive à luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art. 805 do CPC/2015), na necessidade de fundamentação substancial e, especialmente, nos direitos e garantias assegurados na Constituição Federal (v.g., não parece possível que se determine o pagamento sob pena de prisão ou de vedação ao exercício da profissão, do direito de ir e vir, etc.).De todo modo uma coisa é certa: a parte não conta com ninguém mais, a não ser o Estado/Juiz, para fazer a decisão judicial valer. Que a doutrina e os Tribunais se conscientizem que a efetivação é tão, ou até mais importante, do que a própria declaração do direito. ”[22]

Destaque-se que as medidas coercitivas/indutivas incidem na esfera fático-jurídica do devedor para incutir ou fazê-lo adimplir a obrigação pecuniária e, para isto, esta incursão na esfera fático-jurídica não necessita guardar relação com a natureza da dívida objeto da execução. E, usualmente, não manterá, justamente porque se trata de meio atípico. E, como dito, o inc. IV, do Art. 139, do NCPC, também não faz esta limitação. Nem a efetividade da prestação jurisdicional limita. Portanto, as medidas atípicas indutivas adotadas, por interferirem na esfera fático-jurídica do executado inadimplente injustificável, não precisam guardar relação com a natureza da obrigação, porém, devem guardar somente a proporcionalidade. As medidas atípicas, como exposto e como constou da própria ementa ora sob comentário, possuem um caráter excepcional e encontram limite no plano da proporcionalidade, como critério balizador da decisão e das medidas a serem impostas pelo magistrado, devendo-se observar os três passos apontados pela doutrina: a necessidade (exigibilidade), a adequação (idoneidade) e a proporcionalidade em sentido estrito, as quais unidas possuem o objetivo de alcançar a funcionalidade pretendida pelos operadores de direito.

2.4. Medidas Mandamentais Atípicas

Em relação às medidas mandamentais atípicas,o novo Código de Processo Civil acrescentou, ainda, a possibilidade de o magistrado adotar medidas mandamentais para efetivação das decisões judiciais. Tais medidas, por certo, são mais úteis nas obrigações de fazer ou não fazer de natureza infungível. Elas, por sua vez, preferencialmente somente devem ser adotadas em casos extremos. Isso porque, se o juiz pode alcançar a satisfação da obrigação através da adoção de medidas sub-rogatórias, coercitivas ou indutivas, deve evitar a expedição de ordem mandamental, já que, o descumprimento da mesma, acarretará na prática de crime de desobediência. E, por certo, deve-se evitar ou prevenir a conduta delituosa, inclusive não adotando medida que possa induzir a sua prática.

Contudo, não se pode descartar que, em determinadas situações, em juízo de ponderação e na busca da satisfação da obrigação de forma mais célere e até como ação pedagógica, preventiva e inibitória, é preferível que o próprio obrigado cumpra com a prestação. Daí porque a expedição de uma medida mandamental, sujeitando o obrigado à prática do crime de desobediência, caso descumprida a ordem, quando seja a mais conveniente para alcançar a efetividade da decisão judicial.

Essa medida, por exemplo, pode-se mostrar mais eficaz em face de obrigações a serem executadas por agentes públicos. Isso porque, do ponto de vista da eficácia, ela pode se revelar menos traumática ou perturbadora para a Administração, por exemplo, do que a adoção de medidas sub-rogatórias ou coercitivas. Um exemplo é a decisão que ordena a nomeação e posse de agente público, é preferível que o próprio ente público o faça do que o juiz tenha que adotar medidas sub-rogatórias, interferindo na burocracia da Administração Pública. O mesmo se diga em relação à elaboração de políticas públicas, os atos de abstenção por parte da Administração e a realização de obras públicas. Pelo teor do disposto no inc. IV do art. 139 do CPC/2015 nada impede, ainda, da ordem ser dirigida ao cumprimento das obrigações pecuniárias. Assim, por exemplo, a ordem mandamental pode ser expedida para a inclusão em folha de pagamento das prestações de trato sucessivo. Aqui, ainda que a ordem não seja propriamente de pagar, ela serve como instrumento de satisfação da prestação pecuniária.

Também mandamental pode ser a ordem para que o devedor indique onde estão seus bens penhoráveis, para exibição de coisa ou documentos etc. Agora deve ficar certo, para evitar dúvidas e para exercer pressão, que o obrigado deve ser intimado pessoalmente da ordem mandamental, constando da comunicação a advertência que o descumprimento da obrigação imposta pode resultar na prática de crime de desobediência. Aliás, será essa advertência, constante da intimação, que dará certeza de que se trata de uma ordem mandamental, pois, a rigor, ela não se diferencia de qualquer outra decisão que impõe uma obrigação. Ou seja, tanto há desobediência à decisão judicial quando se intima para pagar, sob pena de incidir uma multa, e não se cumpre a obrigação, como quando se expede a ordem mandamental com entregar determinada coisa e é desrespeitado o provimento judicial. Tanto é ordem a que manda pagar e a que manda fazer uma obra. E não se pode querer, superficialmente, distinguir essas determinações a partir da modalidade da obrigação imposta, colocando de um lado as de fazer, não fazer e dar coisa certa diversa de dinheiro e do outro lado a obrigação de dar dinheiro. Aliás, a própria diferenciação entre dar-pagar e dar coisa diversa é uma criação da lei processual apenas com intuito de estabelecer procedimentos diversos para satisfação dessas obrigações que, por natureza, em ambos casos, é de dar, seja dar o papel moeda, seja dar outra coisa qualquer. Para diferenciar essas determinações judiciais, portanto, cabe constar a advertência da consequência ao descumprimento da ordem judicial de modo que se esteja diante de uma ordem mandamental.

3. CONSIDERAÇOES FINAIS

Como analisado, o Novo Código de Processo Civil inovou com o microssistema da tutela executiva de implementação de meios não prescritos em lei, para prover maior efetividade das decisões judiciais. Tal inovação tem como objetivo prover a celeridade processual e a efetividade da atividade executória.

O art. 139, IV do CPC/15 possibilitou ao magistrado definir qual medida executiva atípica é necessária para garantir a efetiva satisfação do direito material proferido na sentença. Como já visto, tal medida deve ser guiada pelos princípios constitucionais que protegem a dignidade do devedor, tais como o dever de cooperação, a ineficácia dos meios típicos, possibilidade de adimplemento pelo devedor, proporcionalidade e razoabilidade, eficiência e dever de fundamentação.

Constatou-se que as medidas executivas atípicas, embora não tipificas do Código de Processo Civil, atingem o resultado útil do processo ao credor. Para alcançar o bem da vida desejado, o magistrado pode e deve se utilizar das medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias.

Não há nenhuma restrição legislativa ao uso das medidas indutivas para as obrigações de pagar, nessa modalidade é garantida a prestação jurisdicional satisfativa concreta, plena, efetiva e célere. Elas recaem na esfera fático- jurídica do devedor para induzi-lo a cumprir a obrigação pecuniária, não necessitando guardar relação com a natureza da dívida objeto da execução. As medidas coercitivas atípicas coagem a vontade do devedor, de forma a induzi-lo a executar a prestação devida, se utilizando de sanções agraváveis como as exemplificadas na pesquisa. As medidas mandamentais permitem o magistrado efetiva decisões mais céleres e uteis nas obrigações de fazer ou não fazer de natureza infungível, contudo, devem ser utilizadas excepcionalmente, uma vez que é uma forma mais rigorosa e sua desobediência implica crime. As medidas sub-rogatórias ignoram a vontade do executado para a realização da execução, uma vez que o juiz decide o modo necessário para a satisfação do credor. Deve-se observar o critério de adequação para a escolha do mecanismo atípico, ensejando a maneira menos onerosa ao executado e que satisfaça o direito do credor, obedecendo o princípio da proporcionalidade.

REFERÊNCIAS

ROSADO, Marcelo da Rocha. A multa coercitiva como instrumento para tutela de obrigações pecuniárias no CPC de 2015. In: Coleção Repercussões do novo CPC: Direito Civil. (Coord.) Fredie Didier Jr. Vol. 14. Salvador: Juspodivm. 2017. 484.

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Disponível em< https://jota.info/artigos/a-revolucao-silenciosa-daexecucao-por-quantia-24082015> Acesso em 05 maio 2021. Dita referência também fora mencionada no acórdão da ementa ora em análise.



[1] Graduanda do Curso de Direito da UEMA – Universidade Estadual do Maranhão – São Luís / MA

[2] ROSADO, Marcelo da Rocha. A multa coercitiva como instrumento para tutela de obrigações pecuniárias no CPC de 2015. In: Coleção Repercussões do novo CPC: Direito Civil. (Coord.) Fredie Didier Jr. Vol. 14. Salvador: Juspodivm. 2017. 484.

[3] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 57. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, v1; v 2; v 3.

[4] Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>

Acesso em: 02 abril. 2021.

[5] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Medidas executivas atípicas na execução de obrigação de pagar quantia certa – art. 139, IV, do novo CPC. In: Revista de Processo – REPRO. Ano 42. Vol. 265. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2017. P. 112.

[6] BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de direito processual civil: volume único. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2016.

[7] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Medidas executivas atípicas na execução de obrigação de pagar quantia certa – art. 139, IV, do novo CPC. In: Revista de Processo – REPRO. Ano 42. Vol. 265. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2017. P. 127.

[8] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Medidas executivas atípicas na execução de obrigação de pagar quantia certa – art. 139, IV, do novo CPC. In: Revista de Processo – REPRO. Ano 42. Vol. 265. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2017. P. 127.

[9] GUERRA, Marcelo Lima. Direitos fundamentais e a proteção do credor na execução civil. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003. P. 92

[10] MINAMI, M.Y. Breves apontamentos sobre a generalização das medidas de efetivação no CPC/2015 – do processo para além da decisão. In: Coleção novo CPC Doutrina Selecionada. Execução. (coord.) Fredie Didier Jr. Vol. 05. Salvador: Juspodivm. 2015. P. 226.

[11] DIDIER JR. Fredie. BRAGA, Paula Sarno. CUNHA, Leonardo Carneiro da. OLIVEIRA. Rafael Alexandria de. Curso de direito processual: execução. Vol. 05. 7ed. Salvador: Juspodivm. 2017. P. 117.

[12] MINAMI, M.Y. Breves apontamentos sobre a generalização das medidas de efetivação no CPC/2015 – do processo para além da decisão. In: Coleção novo CPC Doutrina Selecionada. Execução. (coord.) Fredie Didier Jr. Vol. 05. Salvador: Juspodivm. 2015. P. 220

[13] Comentários ao CPC, 2ª ed., v. IV, RJ, Forense, 2003, nº 252-C, p. 296.

[14] DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil 1: Introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 18. ed., Salvador: JusPodivm, 2016.

[15] MEDINA, José Miguel Garcia. Curso de direito processual civil moderno. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.

[16] NEVES, Daniel Amorim Assumpção; TARTUCE, Flávio. Manual de Direito do Consumidor. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.

[17] GUERRA, Marcelo Lima. Direitos fundamentais e a proteção do credor na execução civil. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003. P. 37.

[18] Sobre o tema, remeto ao que expus em Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer, cit., nº 12.1, e em “Prisão civil e penal e ‘execução indireta’ (a garantia do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal)”, em RePro, v. 92, 1998, nº 7, e “Ainda sobre a prisão como ‘execução indireta’: a criminalização da desobediência a ordens judiciais”, em Processo de execução (coord. T. Arruda Alvim e S. Shimura), v. 2, São Paulo, RT, 2001, nº 1.

[19] Sobre o tema, v. Eduardo Talamini, “Prisão civil e penal e ‘execução indireta’ (a garantia do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal)”, cit., nº 6, e “Ainda sobre a prisão como ‘execução indireta’: a criminalização da desobediência a ordens judiciais”, cit., nº 1.

[20] Especificamente sobre esse aspecto, v. Eduardo Talamini, “Concretização jurisdicional de direitos fundamentais a prestações positivas do estado”, cit., nº 6.

[21] 23 São Paulo. Habeas Corpus 2183713 85.2016.8.26.0000. Impetrantes Paulo Antônio Papini, Ariston Pereira de Sá Filho; Paciente Milton Antônio Salerno; Impetrado MM Juiz de Direito da 1 Vara Cível do Foro Regional de Ipiranga. Desembargadora Maria Lúcia Pizzotti. Diário de Justiça do Estado de São Paulo. DJSP 03/10/2017. Disponível em: < https://www. jusbrasil.com.br/diarios/documentos/505587588/andamento-do-processon-2183713-8520168260000-habeas-corpus-03-10-2017-do-tjsp?ref=topic_ feed> Acesso em 05 de maio 2021.

[22] Disponível em< https://jota.info/artigos/a-revolucao-silenciosa-daexecucao-por-quantia-24082015> Acesso em 27 out 2018. Dita referência também fora mencionada no acórdão da ementa ora em análise.

Como citar e referenciar este artigo:
OLIVEIRA, Isabela Cristina Castro de. Breve análise acerca das medidas executivas atípicas presentes no Novo Código de Processo Civil. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2021. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/breve-analise-acerca-das-medidas-executivas-atipicas-presentes-no-novo-codigo-de-processo-civil/ Acesso em: 18 abr. 2024