Processo Civil

Negócio processual: possibilidade de aplicação no direito processual do trabalho

Jamille Ribeiro Pires Hasegawa[i]

 SUMÁRIO: Introdução. 2. Princípio do autorregramento da vontade das partes. 3. Negócios Processuais. 4. Requisitos de validade dos negócios jurídicos processuais. 4.1. Capacidade. 4.2. Objeto lícito. 4.3. Formalidade. 5. Negócio Processual e o Princípio da Proteção no Processo do Trabalho. 6. A negociação processual e o processo do trabalho. 7. Considerações Finais. Referências bibliográficas.

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo analisar as alterações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015, especificamente no que pertine a possibilidade de criação de cláusula geral atípica, negociada pelas partes, com a estipulação de convenções processuais. Analisaremos, ainda, a possibilidade de aplicação do negócio processual no Direito do Trabalho, ante a natureza do crédito alimentar e a hipossuficiência do trabalhador no processo trabalhista.

 PALAVRAS-CHAVE: Negócio processual. Direito do Trabalho. hipossuficiência.

 ABSTRACT:The purpose of this article is to analyze the changes introduced by the Civil Procedure Code of 2015, specifically regarding the possibility of creating an atypical general clause, negotiated by the parties, with the stipulation of procedural conventions. We will also analyze the possibility of application of the procedural business in Labor Law, given the nature of the food credit and the employee’s hyposufficiency in the labor process.

 KEYWORDS:Business process. Labor Law. Hypersufficiency.

 INTRODUÇÃO

Dentre as inúmeras alterações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015, uma delas, em particular – ante a realidade litigiosa do país – é potencialmente geradora de relevantes repercussões, na medida em que se possibilita a criação de cláusula geral atípica com a estipulação de convenções processuais, pelas partes, em comum acordo, atribuindo-lhes, mediante certas condições, maior liberdade na condução do .

O ponto de destaque do novo CPC/15 está no autorregramento da vontade, cuja previsão normativa se depreende nos artigos 190 e 191 do estatuto, que visa aproximar o processo essencialmente público, dos negócios jurídicos celebrados no âmbito privado, nos quais a autonomia da vontade é lei entre as partes.

Em síntese, essa cláusula geral representa uma alternativa ao modelo procedimental previsto em lei, possibilitando a oxigenação e flexibilização do sistema.

Esse tema vem sendo debatido por diversos doutrinadores no sentido de que, ao contrário do que acontece nas pactuações privadas, onde forma e efeito são negociados pelas partes, no âmbito processual, os atos processuais resultam, quase sempre, da lei e não da vontade das partes.

A relevância do tema está na potencialidade do instituto proporcionar a tão almejada efetividade à tutela jurisdicional, uma vez que possibilita a flexibilização do procedimento rígido previsto em lei, adequando-se às peculiaridades do litígio.

Abordaremos a possibilidade de compatibilidade deste “novo” instituto, que se apresenta como realidade no ramo processual civil, no âmbito do Direito do Trabalho, ante a singularidade do bem jurídico que o processo do trabalho visa salvaguardar, de natureza essencialmente alimentar, além da histórica “desigualdade” das partes que compõem a demanda.

2.DO AUTORREGRAMENTO DA VONTADE

A liberdade se revela como o bem mais precioso à existência humana. O homem é naturalmente livre, incumbindo ao Estado à tarefa de reconhecê-la, assegurá-la e protegê-la.

A liberdade é direito fundamental que compõe o patrimônio imaterial do ser humano, logo não se resume apenas no direito de ir e vir, mas em garantir, sem pretensão de esgotar o tema, a liberdade de crença, de pensamento, de locomoção, de associação, de opção sexual e, no plano das relações jurídicas, de negociação, de renúncia, de aquisição e de disposição.

Ensina José de Oliveira Ascensão[1] que o poder de autorregramento da vontade pode ser identificado em quatro zonas de liberdade: 1) liberdade de negociação, limitando-se as negociações preliminares que precedem à lide; 2) liberdade de criação, afeita à possibilidade de se criar novas formas de convenções processuais que melhor atendam aos interesses das partes; 3) liberdade de estipulação, atribuindo aos interessados à faculdade de definirem o conteúdo do negócio jurídico; e por fim, 4) liberdade de vinculação, que se traduz na manifestação de vontade em celebrar ou não negócio jurídico.

A grande discussão é se o autorregramento da vontade é compatível com o direito processual, cujos atos e efeitos decorrem da lei e não da manifestação de vontade das partes.

O processo não é ato de disposição das partes, embora sejam elas as destinatárias diretas da atividade jurisdicional, mas instrumento de natureza pública indispensável para a realização da justiça e pacificação social.

Fernando Fonseca Gajardoni[2] defende que o direito processual civil, embora de caráter publicístico, é regido pela liberdade. O princípio da liberdade atua diretamente no rito procedimental, produzindo um subprincípio: o princípio do autorregramento da vontade no processo.

Fredie Didier Júnior ensina que:

“(…) um processo que limita injustificadamente o exercício da liberdade não pode ser considerado um processo devido. Um processo jurisdicional hostil ao exercício da liberdade não é um processo devido, nos termos da Constituição brasileira”[3].

Segundo essa corrente, não importa a flexibilização do procedimento, uma vez que o órgão jurisdicional continua detentor do poder de condução do processo, cabendo-lhe negar eficácia a toda e qualquer convenção que tenha a intenção de macular a higidez do procedimento ou criar situações desfavoráveis ou favoráveis a uma das partes.

Nessa perspectiva, apresenta-se o princípio do autorregramento da vontade como meio de tornar o processo jurisdicional um espaço para o exercício da liberdade, onde as partes possuam maior interação dialógica, o que vai ao encontro da nova metodologia do processo civil.

O autorregramento busca alcançar um novo modelo de processo, agregando-lhe a idéia de cooperação e colocando o juiz em dupla posição: “paritário no diálogo e assimétrico no momento da decisão”[4].

3.NEGÓCIO PROCESSUAL

Entende-se por negócio jurídico processual o fato jurídico voluntário, em cujo suporte fático se confere ao sujeito o poder de escolher a categoria jurídica ou estabelecer, dentro dos limites fixados no próprio ordenamento jurídico, certas situações jurídicas processuais[5].

Para Leonardo Carneiro da Cunha[6], o negócio jurídico resulta da manifestação da autonomia da vontade ou da autorregulação de interesses, implicando em liberdade de celebração e de estipulação.

Entretanto, Cândido Rangel Dinamarco[7], pondera a inexistência de negócios jurídicos. A justificativa apresentada pelo autor reside na constatação de que os efeitos emanados dos atos jurídicos processuais decorrem da lei, e não da manifestação volitiva das partes. Para Dinamarco, negócio jurídico seria ao de autorregulação de interesses, ancorado no princípio da autonomia da vontade; segundo referido autor, todo negócio jurídico pressupõe que seus efeitos sejam exatamente aqueles que as partes aprazarem, o que não ocorre no processo, já que a lei define as conseqüências dos atos praticados no processo, sem conferir qualquer margem de intervenção às partes.

José Carlos Barbosa Moreira[8] admite à existência das convenções processuais (negócio jurídico processual), pontuando, a título de exemplos, a cláusula de eleição de foro, a convenção de suspensão do processo, a cláusula que versa sobre a distribuição do ônus da prova, o adiamento da audiência por convenção das partes; adverte, entretanto, que a liberdade de negociação se circunscreve aos limites das normas processuais dispositivas.

De todo modo, a discussão sobre a admissão ou não dos negócios jurídicos processuais no ordenamento jurídico pátrio tende a tornar-se obsoleto, haja vista a regulamentação do instituto nos arts. 190 e 191 do CPC/15.

Outra grande questão é que, ao lado das convenções processuais típicas, o CPC/15 introduziu, sem precedentes, a cláusula geral de negociação do processo. A instituição dessa cláusula geral dá margem para que se criem as mais variadas espécies de negócios processuais atípicos.

Segundo Fredie Didier Júnior:

“(…) tem por objeto as situações jurídicas processuais – ônus, faculdades, deveres, e poderes (“poderes”, neste caso, significa qualquer situação jurídica ativa, o que inclui os direitos subjetivos, direitos potestativos e poderes propriamente ditos). O negócio jurídico atípico também tem por objeto o ato processual – redefinição de sua forma ou da ordem de encadeamento dos atos, por exemplo”[9].

Não se trata de negócio sobre o direito litigioso, objeto afeito à autocomposição. No caso, negocia-se sobre o processo, alterando suas regras, e não sobre o objeto da lide processual.

4.REQUISITOS DE VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO PROCESSUAL

4.1.CAPACIDADE

O art. 190 do CPC/15 exige que as partes sejam plenamente capazes para celebrarem as convenções processuais, todavia, deixou de esclarecer a que capacidade se refere.

Fredie Didier Júnior, ensina que:

“(…) No caso, exige-se a capacidade processual negocial, que pressupõe a capacidade processual, mas não se limita a ela, pois a vulnerabilidade é caso de incapacidade processual negocial, como será visto adiante, que, a princípio, não atinge a capacidade processual geral – um consumidor é processualmente capaz, embora possa ser um incapaz processual negocial[10].

O parágrafo único do artigo 190 do CPC/15 trouxe uma hipótese específica de incapacidade processual negocial: a incapacidade pela manifesta situação de vulnerabilidade. Pode-se dizer que há vulnerabilidade quando existe desequilíbrio entre os sujeitos da relação jurídica, fazendo com que a negociação não se aperfeiçoe em igualdade de condições.

Há casos em que a ordem jurídica presume vulnerável o agente plenamente capaz, pela natureza especial do direito tutelado. Exemplo disso é a posição jurídica do trabalhador, reconhecidamente hipossuficiente.

Didier, todavia, adverte que, nem por isso há plena inadmissão dos negócios processuais nos planos consumeristas e trabalhistas. Segundo o autor, caberá ao órgão jurisdicional, verificar, cada caso concreto, se a negociação foi realizada em condições de igualdade.

4.2.OBJETO LÍCITO

A negociação atípica somente pode envolver causas que admitam a solução por autocomposição. A indisponibilidade do direito, por si só, não afasta a autocomposição. Tanto o é que, muito embora de caráter indisponível, o crédito trabalhista esta sujeito à solução negociada do conflito, conforme dispõe o art. 764 da CLT.

Não se autoriza a negociação processual que tenha por objeto afastar a regra processual que sirva à proteção de direito indisponível. Didier explica que:

“Trata-se de negócios jurídicos celebrados em ambiente propício, mas com objeto ilícito, porque relativo ao afastamento de alguma regra processual cogente para a proteção de alguma finalidade pública”[11].

Nesse particular, importante lembrar a lição de Tereza Arruda Alvim Wambier:

“Por força do art. 190 do NCPC, portanto, não reputamos ser possível a pactuação de negócio jurídico processual que tinha por objeto deveres processuais imperativamente impostos às partes, sob pena de ser-lhe ilícito o objeto. Não vigora, ipso facto, o “vale tudo” processual. O negócio jurídico não tem, e nem deve ter, esta extensão. (…) Não se pode, é essa convicção, dispor em negócio jurídico processual que uma decisão poderá ser não fundamentada, ou que não vigora o dever de cumprir as decisões judiciais. Admiti-lo seria algo comparável à admissão do objeto ilícito na celebração do negócio jurídico processual”[12].

Frise-se, os titulares de direitos indisponíveis não estão proibidos de praticar quaisquer atos de disposição processual, sendo-lhes vedado, tão somente, praticar aqueles que, direta ou indiretamente, possam prejudicar a tutela desses direitos.

O Enunciado nº 20 do Fórum Permanente de Processualistas Civis dispõe:

“Não são admissíveis os seguintes negócios bilaterais, dentre outros: acordo para modificação da competência absoluta, acordo para supressão da primeira instância, acordo para afastar motivos de impedimento do juiz, para a criação de novas espécies recursais, acordo para a ampliação das hipóteses de cabimento de recurso”.

O Enunciado nº 21 do mesmo diploma legal, dispõe que:

“São admissíveis os seguintes negócios, dentre outros: acordo para realização de sustentação oral, acordo para ampliação de tempo de sustentação oral, julgamento antecipado do mérito convencional, convenção sobre prova, redução de prazos processuais”.

4.3.FORMALIDADE

A forma da convenção processual atípica é livre. Assim, o negócio processual poderá ser oral ou escrito, expresso ou tácito.

Há, todavia, casos em que a lei exige a forma escrita, como nas hipóteses de foro de eleição e na convenção de arbitragem.

5.NEGÓCIO PROCESSUAL E O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO NO PROCESSO DO TRABALHO

A relação jurídica trabalhista, embora com intervenção do Estado (regulação verticalizada) não conseguiu suplantar a desigualdade entre as partes contratantes. Ainda persiste forte contingenciamento do empregador na condução do contrato de trabalho, sem qualquer medida de resistência capaz de fazer frente a essa força.

Nessa ordem de idéias, inobstante superada a noção de sujeição pessoal, em se tratando de relação jurídica trabalhista, impossível separar o sujeito e o objeto (trabalhador e força de trabalho), ou seja, sendo o trabalho dimensão inerente à vida e à dignidade humana, não é possível transacioná-lo como mercadoria.

Em razão desses argumentos desponta o princípio da proteção como ferramenta essencial para contraponto à mercantilização do trabalho.

Se o princípio da proteção atua no âmbito material, mais ainda deve atuar no âmbito processual, haja vista este último se tratar de instrumento a serviço da construção de uma sociedade justa, livre e solidária, pelo trabalho dignamente considerado.

Gabriela Neves Delgado e Renata Queiróz Dutra ensinam que:

“A simples mudança de ótica, no sentido de admitir a negociação das partes como regra, refutando-a nos casos em que verificados abusos, em detrimento da opção vigente, que presume o vício das negociações estabelecidas por empregado e empregador; e submete uma eventual e excepcional validade a prova, produz uma drástica mudança de perspectiva no sistema e passa a onerar material e processualmente o trabalhador, caminhando contrariamente ao princípio da proteção”[13].

Desta forma, maior parte da doutrina entende que o princípio da proteção é aplicável ao direito processual do trabalho. Isso porque, a hipossuficiência do trabalhador não desaparece na relação jurídica processual. Entretanto, há exceções. Veremos mais adiante.

6.O NEGOCIO PROCESSUAL E O PROCESSO DO TRABALHO

A negociação processual para ter validade pressupõe o atendimento aos critérios de validade: capacidade, licitude do objeto e forma prescrita ou não defesa em lei, conforme dispõe o art. 104 do Código Civil.

No que tange a capacidade, o art. 190 do CPC/15, em seu parágrafo único trouxe uma modalidade específica de incapacidade processual negocial, na medida em que se recusa a validade do negócio jurídico celebrado por agentes que, embora plenamente capazes, apresentem situações de vulnerabilidade.

Na relação processual trabalhista, ao contrário do que se dá ordinariamente no processo civil, essa situação de vulnerabilidade, evidenciada no plano material, quase sempre não desaparece, permanecendo a condição de desigualdade.

No que pertine ao objeto do negócio processual, o bem jurídico tutelado pela relação processual trabalhista, em regra, de fato, é indisponível. Não que isso signifique, em tese, recusa à autocomposição, principalmente porque a estrutura processualística do Direito do Trabalho é marcada pela conciliação (art. 764, CLT).

Nesse sentido, dispõe o Enunciado nº 135 do Fórum Nacional dos Processualistas Civis:

“a indisponibilidade do direito material não impede, por si só, a celebração de negócio jurídico processual”.

A grande questão ponderada em sede de doutrina, é a redução dos poderes atribuídos ao juiz para a declaração de nulidade do negócio. Há casos que se nega ao juiz, inclusive, o poder de homologar a convenção processual, porque sua validade independe da interferência do órgão jurisdicional.

Afirma Didier:

“A regra é a dispensa da necessidade de homologação judicial do negócio processual. Negócios processuais em que tenham por objeto as situações jurídicas processuais dispensa, invariavelmente, a homologação judicial. Negócios processuais que tenham por objeto mudanças no procedimento podem sujeitar-se a homologação, embora nem sempre isso ocorra”[14].

Ora, como admitir a passividade do juiz frente a convenções processuais que versem sobre direitos indisponíveis, cuja relação entre as partes é historicamente desigual, em reverência ao princípio da autonomia da vontade e em detrimento ao princípio da proteção?

Entendeu o TST, precocemente, pela inaplicabilidade do artigo 190 no CPC/15 no processo do trabalho, conforme dispõe o art. 2º, inciso II da Resolução 39/2016:

“Art. 2º – Sem prejuízo de outros, não se aplicam ao Processo do Trabalho, em razão da inexistência de omissão ou por incompatibilidade, os seguintes preceitos do Código de Processo Civil:

(…)

II – art. 190 e parágrafo único (negociação processual)

(…)”. 

Entretanto, destaca-se que a própria Constituição Federal autoriza a flexibilização das normas regulamentadoras trabalhistas mediante a celebração de negociação peças entidades sindicais representativas das categorias profissionais, nas hipóteses do art. 7º, VI, XIII, XIV, onde se presume a igualdade entre sujeitos convenentes.

A aplicação das convenções processuais em sede coletiva não suscita maiores problemas. Todavia, surge grande polêmica quando da sua aplicação em sede individual. Nesse contexto, cabe trazer o quanto dispõe o Enunciado nº 06 aprovado pelo Fórum Nacional do Processo do Trabalho:

“A previsão contida no art. 190, do NCPC, não se aplica aos processos que envolvam dissídios individuais de relação do trabalho, tendo em vista que a CLT, tem rito próprio (ordinário, sumaríssimo ou alçada), conforme arts. 849, 852-C e art. 2º §§ 3º e 4º, da Lei nº 5.584/70. A aplicação dos arts. 769, 849, 852-C da CLT e art. 190 do NCPC”.

Quanto ao negócio processual firmado no bojo da ação trabalhista, há entendimento de que seja possível a sua utilização, uma vez que as convenções processuais estariam sujeitas ao crivo e monitoramento do magistrado trabalhista, com o auxílio dos advogados das partes, sob o fundamento de que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva” (art. 6º do CPC).

Assim, ao contrário do que ocorre no âmbito do processo civil, onde a regra é a desnecessidade de homologação judicial do negócio jurídico, no processo do trabalho a regra deve ser inversa: obrigatoriedade de homologação judicial da negociação processual como requisito de validade.

Quanto ao jus postulandi, soa razoável presumir a vulnerabilidade inibidora da validade do negócio. Nesse sentido dispõe o Enunciado nº 18 do Fórum Permanente de Processualistas Civis:

“há indício de vulnerabilidade quando a parte celebra acordo de procedimento sem assistência técnico-judiciária”.

A título de exemplo de negociação processual em ação trabalhista, no processo nº 0001129-93.2015.5.08.0122[15], as partes, acompanhadas de seus respectivos advogados, convencionaram, em razões-finais, a renúncia recíproca do direito de recorrer da decisão que seria prolatada em sessão logo em seguida.

O reclamante pleiteava a declaração/certificação de acidente de trabalho, teve o seu pedido julgado procedente e o feito transitou em julgado de imediato com o seu arquivamento.

Sob essa perspectiva não há óbice para se negar, de imediato, a aplicação do art. 190 do CPC ao processo do trabalho.

7.CONSIDERAÇÕES FINAIS

Há de se presumir válido negócio processual firmado com a chancela sindical obreira e cujo objeto atente ao princípio protetivo, independentemente de homologação judicial, ainda que a negociação envolvendo o âmbito coletivo se dê em plano pré-processual.

No plano individual, a regra é pela invalidade do negócio jurídico processual, em razão da patente vulnerabilidade do trabalhador. Entretanto, quando a convenção processual se dá no curso de ação trabalhista, impõe-se a homologação judicial como requisito de validade, além da criteriosa apreciação do Magistrado, em cada caso concreto, sempre atentando para o princípio protetivo.

Destaca-se que a apreciação do Magistrado deve ser objetiva, observando se a convenção é lícita, proporcional e razoável, afim de que se concretizem os princípios da cooperação, da adequação e do respeito ao autorregramento da vontade no processo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 17ª ed. Salvador: JusPodivm, 2015.

____.Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no processo civil. In: Negócios Processuais. Coordenadores: Antônio do Passo Cabral, Pedro Henrique Nogueira. Salvador: JusPodivm, 2015.

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DINAMARCO. Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. V. 1. São Paulo: Atlas, 2014.

GAJARDONI, Fernando Fonseca. Flexibilização procedimental. São Paulo: Atlas, 2008.

MITIDIERO. Daniel. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Convenções das partes sobre matéria processual. In: Temas de direito processual – terceira série. São Paulo: Saraiva, 1984.

SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho – de acordo com o Novo CPC. 9ª ed. São Paulo: LTr, 2015.

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao Novo Código de Processo Civil. Artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015.



[1] ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil – Teoria Geral. Vol. II. Coimbra: 1999, p. 77-80.

[2] GAJARDONI, Fernando Fonseca. Flexibilização procedimental. São Paulo: Atlas, 2008, p. 215.

[3] DIDIER JÚNIOR, Fredie. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no processo civil, p. 21.

[4] MITIDIERO. Daniel. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 279.

[5] DIDIER JÚNIOR, Fredie; NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa. Teoria dos fatos jurídicos processuais. 2ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 59-60.

[6] CUNHA, Leonardo Carneiro. Negócios jurídicos processuais no Processo Civil Brasileiro. In: Negócios processuais. Coordenadores: Antônio do Passo Cabral, Pedro Henrique Nogueira. – Salvador: Ed: JusPodivm, 2015, p. 42.

[7] DINAMARCO. Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. V. 1. São Paulo: Atlas, 2014, p. 276.

[8] MOREIRA, José Carlos Barbosa. Convenções das partes sobre matéria processual. In: Temas de direito processual – terceira série. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 87-98.

[9] DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. p. 380.

[10] DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. p. 385. Grifos no original.

[11] DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. p. 389.

[12] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao Novo Código de Processo Civil. Artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015, p. 356-357.

[13] DELGADO, Gabriela Neves; DUTRA, Renata Queiróz. A aplicação das convenções processuais do Novo CPC ao Processo do Trabalho na perspectiva dos direitos fundamentais. In: O Novo Código de Processo Civil e seus reflexos no Processo do Trabalho. Organizador: Elisson Miessa. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 198.

[14] DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. p. 379.

[15] Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA-AP). 2ª Vara do Trabalho de Santarém (PA). Processo nº 0001129-93.2015.5.08.0122. Sentença publicada em 26 de abril de 2016. Magistrado prolator: Juiz Titular Ney Maranhão.



[i] Advogada, especialista em Direito e Relações do Trabalho pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. Mestranda em Direito do Trabalho pela PUC/SP.

SUMÁRIO: Introdução. 2. Princípio do autorregramento da vontade das partes. 3. Negócios Processuais. 4. Requisitos de validade dos negócios jurídicos processuais. 4.1. Capacidade. 4.2. Objeto lícito. 4.3. Formalidade. 5. Negócio Processual e o Princípio da Proteção no Processo do Trabalho. 6. A negociação processual e o processo do trabalho. 7. Considerações Finais. Referências bibliográficas.

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo analisar as alterações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015, especificamente no que pertine a possibilidade de criação de cláusula geral atípica, negociada pelas partes, com a estipulação de convenções processuais. Analisaremos, ainda, a possibilidade de aplicação do negócio processual no Direito do Trabalho, ante a natureza do crédito alimentar e a hipossuficiência do trabalhador no processo trabalhista.

PALAVRAS-CHAVE: Negócio processual. Direito do Trabalho. hipossuficiência.

ABSTRACT:  The purpose of this article is to analyze the changes introduced by the Civil Procedure Code of 2015, specifically regarding the possibility of creating an atypical general clause, negotiated by the parties, with the stipulation of procedural conventions. We will also analyze the possibility of application of the procedural business in Labor Law, given the nature of the food credit and the employee’s hyposufficiency in the labor process. 

KEYWORDS:  Business process. Labor Law.  Hypersufficiency. 

INTRODUÇÃO 

 

Como citar e referenciar este artigo:
HASEGAWA, Jamille Ribeiro Pires. Negócio processual: possibilidade de aplicação no direito processual do trabalho. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2019. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/negocio-processual-possibilidade-de-aplicacao-no-direito-processual-do-trabalho/ Acesso em: 28 mar. 2024