Processo Civil

Competência de Foro na Insolvência Civil, formulada por credor

Competência de Foro na Insolvência Civil, formulada por credor

 

 

Filipe Rezende Semião *

 

 

01.               O processo da insolvência é, na verdade, um sistema de liquidação do patrimônio de determinado devedor, que não dispõe de meios para satisfazer integralmente a todos os seus credores.

 

 

02.               Como tal é, sem dúvida uma execução forçada. Difere, contudo, da execução singular, por destinar-se esta a satisfazer apenas o interesse individual de cada credor, enquanto na insolvência se procura considerar os direitos de todos os credores, tratando-se em pé de igualdade, salvo tão-somente os privilégios legais.

 

 

03.               Pode-se, então, definir insolvência civil, como o procedimento destinado a expropriar todos os bens penhoráveis do devedor não-comerciante, cujo passivo seja superior ao ativo, a fim de pagar a todos os seus credores, na proporção de seus créditos e de acordo com as ordem das preferências estabelecidas pela lei.

 

 

04.               Feita esta breve consideração sobre o conceito de insolvência, aborda-se-á mais adiante sobre a competência de foro para tramitar a insolvência civil.

 

05.                               Ab initio, importante esclarecer que o crédito do credor que advém de um processo de conhecimento não guarda qualquer relação com a matéria processual relativa à competência para pedir a insolvência.

 

 

06.                               Destarte, o pedido de insolvência civil formulada por credor, regra geral, vem estribado na dicção do art. 748 e do 750, I, do CPC que traz em si presunção juris tantum de insolvência quando o devedor não possuir outros bens livres e desembaraçados para nomear a penhora.

 

 

07.                               Assim, não há que se falar de competência do juízo prevento, por se tratar de título executivo originário de processo de conhecimento e execução de sentença.

 

 

08.                               O processo da insolvência civil tem natureza própria com o fito de num primeiro instante, buscar uma sentença declaratória de insolvência, pelo fato do réu não dispor de bens suficientes para o pagamento da sua dívida ou garantia do juízo em execução (CPC, art.761).

 

 

09.                               Ainda importante salientar que, o processo de insolvência civil da pessoa FÍSICA, não guarda qualquer relação com o processo de falência da pessoa JURÍDICA. Na insolvência civil, serão admitidos os credores da pessoa física, enquanto no juízo falencial se comungam os da pessoa jurídica.

 

 

10.               Assim sendo, a competência interna para processamento do pedido de insolvência formulado por credor, é fixada pela regra geral de que o réu deve ser demandado em seu domicílio, conforme preceitua o art. 94 do CPC, in verbis:

 

Art. 94. A ação fundada em direito pessoal e a ação fundada em direito real sobre bens móveis serão propostas, em regra, no foro do domicílio do réu.

 

 

11.               Importante ressaltar que não influi o foro contratual nem o local de cumprimento da obrigação, visto que o procedimento de declaração de insolvência não se confunde com a  ação de cobrança, por ter objeto e finalidade distinta.

 

 

12.               Ainda necessário afirmar que ainda que haja interesse de pessoa sujeita a jurisdição especial, como a Federal ou a Trabalhista, o processo de insolvência é da competência da Justiça comum, idêntico ao art. 99, parágrafo único, n.º I:

 

Art. 99. O foro da Capital do Estado ou do Território é competente:

I – para as causas em que a União for autora, ré ou interveniente;

II – para as causas em que o Território for autor, réu ou interveniente.

Parágrafo único. Correndo o processo perante outro juiz, serão os autos remetidos ao juiz competente da Capital do Estado ou Território, tanto que neles intervenha uma das entidades mencionadas neste artigo.

Excetuam-se:

I – o processo de insolvência;

II – os casos previstos em lei.

 

 

13.               Sendo assim, em regra, o foro da insolvência será o domicílio real do devedor, ou seja, o local onde tenha sua moradia habitual, com sua família, e centralize seus negócios, embora possa praticar eventualmente outros negócios em localidades diversas.

                            Para esclarecer o significado do termo “domicilio”, temos o art. 70 do Código Civil, in verbis:

 

Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo.

 

 

14.               Em caso de pluralidade de domicílios, o que ocorre quando a pessoa natural tem diversas residências, onde alternativamente vive, a competência será de qualquer um deles, sendo que “tendo mais de um domicílio, o réu será demandado no foro de qualquer deles (art. 94, § 1º, CPC)”.

 

 

15.               Insta pontuar que só há mudança de domicilio quando a pessoa transfere sua residência com o ânimo de deslocar, em caráter definitivo, o centro de suas atividades.

 

 

16.               Há que se falar ainda que os efeitos da insolvência não se restringem apenas aos participantes da relação processual de cognição, inicialmente travada em juízo entre credor e devedor, mas atingem, ao contrário, toda a universalidade subjetiva dos credores do insolvente.

 

 

17.               Assim sendo, a fixação da competência, atende aos interesses tanto do devedor, como dos credores; e se na prática, alguma dúvida surgir quanto a um eventual conflito, parece lógico que a solução mais plausível seja a de prevalência dos interesses dos credores.

 

 

18.               Em conclusão, a competência para processar a insolvência é territorial, fixada à luz do critério comum do domicilio do devedor, mas sem a disponibilidade que ordinariamente caracteriza essa espécie de foro. Presidida por uma preocupação de ordem pública, é ela uma competência improrrogável, muito embora territorial.

 

 

19.                               Preleciona o Prof. HUMBERTO THEODORO JÚNIOR com a autoridade que se lhe reconhece:

 

“Com relação ao pedido de insolvência formulado por credor, a competência é fixada pela regra geral de que o réu deve se demandado em seu domicílio (art.94). Também aqui não influi o foro contratual nem o local de cumprimento da obrigação, visto que o procedimento de declaração de insolvência não se confunde com a ação de cobrança, por ter objeto e finalidade diversos. Como lembra Prieto-Castro, a doutrina jurisprudencial estabelece como foro o do domicílio do insolvente presuntivo…É fácil de compreender que assim o seja, dada a circunstância de que os efeitos da insolvência não se restringem aos participantes da relação de conhecimento inicialmente travada em juízo entre credor e devedor, mas atingem, ao contrário, toda a universidade subjetiva dos credores do insolvente”

(Curso de Direito Processual Civil, Forense, vol.II,

 33ª.ed., p.295)

 

 

20.                               Único o posicionamento do nosso eg. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS acerca da competência nos pedidos de insolvência civil:

 

Número do processo: 2.0000.00.305636-6/000(1)

Relator: SILAS VIEIRA 

Data do acordão: 29/08/2000

Data da publicação: 23/09/2000

Ementa:

EMENTA: EXECUÇÃO CONTRA DEVEDOR INSOLVENTE. COMPETÊNCIA. LEGITIMIDADE. – O foro competente para o processamento da insolvência civil é o do domicílio do réu, por aplicação analógica do artigo 760 do CPC, não se admitindo ações dessa natureza no Juizado Especial, ex vi do artigo 3º da Lei 9.099/95. – A insolvência civil destina-se apenas aos não comerciantes, pessoas físicas ou jurídicas, razão por que a microempresa que naturalmente desenvolve atos de comércio está sujeita à lei falimentar e não às disposições previstas no CPC referentes à execução contra devedor insolvente.

Súmula: Negaram provimento. 

 

 

 

Número do processo: 2.0000.00.291828-3/000(1)

Relator: JUREMA MIRANDA 

Data do acordão: 10/05/2000

Data da publicação: 20/05/2000

Ementa:

APELAÇÃO CÍVEL Nº 291.828-3 – 10.05.2000 GUAXUPÉ EMENTA: INSOLVÊNCIA CIVIL – COMPETÊNCIA RELATIVA – DOMICÍLIO DO DEVEDOR – EXECUÇÃO PROMOVIDA ANTERIORMENTE EM OUTRA COMARCA – AUSÊNCIA DE PREVENÇÃO – TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – CÓPIA REPROGRÁFICA COM O ORIGINAL SOB A GUARDA DO JUÍZO – ADMISSIBILIDADE – PAGAMENTO PARCIAL DA OBRIGAÇÃO CARTULAR – ILIQUIDEZ AFASTADA – ERRO MATERIAL – MERA CORREÇÃO – POSSIBILIDADE. Ao juízo universal da declaração de insolvência é que acorrem as demais execuções, inexistindo qualquer prevenção do juízo em que foi ajuizada execução singular contra o devedor solvente com base no mesmo título que embasa o pedido de insolvência, pelo mesmo credor. É apta a instruir o pedido de insolvência civil cópia autenticada de título original, devidamente desentranhado do processo executivo promovido anteriormente em outra comarca e acostado aos autos suplementares do processo onde se requer a decretação da insolvência civil do devedor. O título executivo não é ilíquido se quitado parcialmente, com o credor procedendo dedução aritmética relativa à parte paga, pelo que válido é o pedido de insolvência baseado em valor diverso do que consta na nota promissória, não configurando o abatimento motivo descaracterizador do mencionado título.

Súmula: Deram provimento Falou pelo apelante a Dra. Adriana M.Theodoro de Mello. 

21.                               Não discrepa o colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

 

EMENTA

 

Exceção de incompetência. Competência. Artigos 94 e 760 do Código de Processo Civil. Execução decorrente de título judicial frustrada.

Precedente da Corte.

1. O fato de ter havido execução frustrada não acarreta a competência da Comarca onde foi a mesma processada para processar e julgar pedido de insolvência ajuizado pelo mesmo credor, sendo este autônomo, misto de atividades próprias dos processos de conhecimento

e de execução, devendo prevalecer a competência dos artigos 94 e 760 do Código de Processo Civil.

2.  Recurso especial conhecido e provido.

(Resp 292.383/MS, DJ 08.10.2001)

 

 

No bojo do voto condutor, da lavra do Min. RELATOR CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, a matéria sub iudice é aclarada:

 

“O pedido de insolvência não é continuação de processo de execução. É processo autônomo, independente, que não tem por que acompanhar a competência para execução. Tanto assim é que o próprio Código estabelece a declaração de insolvência instruída com título executivo judicial ou extrajudicial, que ensejará embargos ou, se o devedor ilidir o pedido, o depósito do crédito para discutir a respectiva legitimidade ou valor”. 

 

 

Belo Horizonte, 07 de fevereiro de 2006.

 

 

* Acadêmico de direito

 

Compare preços de Dicionários Jurídicos, Manuais de Direito e Livros de Direito.

Como citar e referenciar este artigo:
SEMIÃO, Filipe Rezende. Competência de Foro na Insolvência Civil, formulada por credor. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/competencia-de-foro-na-insolvencia-civil-formulada-por-credor/ Acesso em: 29 mar. 2024