Processo Penal

Transação Penal e o Devido Processo Legal – Lei 9.099/1995 – Juizado Especial Criminal

KELLY CONTE COSTA

Aluna do Curso de Direito da Faculdade Anhanguera em Taboão da Serra.

SÉRGIO MURILO SABINO

Advogado, Professor de Direito na Faculdade Anhanguera em Taboão da Serra, Pós-Graduado em Penal, Processual Penal e Ambiental, respectivamente pelo Centro Universitário FIEO de Osasco/SP (UNIFIEO) e pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo/SP (UNISAL).

RESUMO

 O Juizado Especial Criminal, criado pela Lei nº 9.099/95, objetivando atender a redação do artigo 98, I, da Constituição Federal de 1988, trata de um procedimento mais simples e célere, ao contrário do rito utilizado na Justiça Comum. Trata o procedimento de causas de menor complexidade (as quais não necessitam de uma dilação probatória profunda), além de englobarem os crimes de menor potencial ofensivo e contravenções penais. O foco principal é dar maior celeridade no andamento processual, bem como finalizar a lide em tempo hábil a não causar grandes transtornos ao Estado e ao autor do crime ou da contravenção. Para tanto foram criados diversos institutos na lei 9.099/95, como suspensão condicional do processo, composição civil dos danos, e o foco deste trabalho – A TRANSAÇÃO PENAL. Ainda será mitigado neste trabalho, a questão de possível inconstitucionalidade sob a ótica dos princípios do contraditório e da ampla defesa bem como, o que nos traz a jurisprudência e as correntes doutrinárias a respeito desta problemática. Ademais, será abordado o papel do Ministério Público na homologação da transação e os requisitos nos quais serão aceitos ounão.

Palavras-chave: Transação penal; inconstitucionalidade; princípios; juizado especial

SUMMARY

The Special Criminal Court, created by Law No. 9.099 / 95, aimed at complying with the wording of article 98, I, of the Federal Constitution of 1988, deals with a simpler and faster procedure, unlike the rite used in the Common Court. It deals with the procedure of causes of less complexity (which do not need a deep probationary delay), as well as encompassing crimes of lesser offensive potential and criminal offenses. The main focus is to speed up the procedural process, as well as finalize the deal in a timely manner not to cause great inconvenience to the State and to the perpetrator of the crime or of the contravention. For that purpose, several institutes were created in Law 9.099 / 95, as a conditional suspension of the process, civil composition of damages, and the focus of this work – PENAL TRANSACTION. The question of possible unconstitutionality from the point of view of the principles of the adversary and of the ample defense, as well as the jurisprudence and the doctrinal currents regarding this problematic, will still be mitigated in this work. In addition, the role of the Public Prosecution Service in the approval of the transaction and the requirements in which it will be accepted or not will be addressed.

Keywords: Criminal transaction; Unconstitutionality; principles; Special court

SUMÁRIO

1. Introdução 2. A Criação Do Juizado Especial Criminal 3. Princípios dos Juizados Especiais Criminais 4. Da Transação Penal 5. Natureza Jurídica da Transação Penal 6. Da Aceitação ou Não Aceitação da Transação Penal 7. No que Consiste a Proposta de Transação Penal 8. Consideração Finais 9 Bibliografia

1.    Introdução

O presente artigo cientifico terá a finalidade de abordar o tema relativo à Transação Penal disposta na Lei 9.099/95 e o Devido Processo Legal na legislação vigente. O objetivo é demonstrar como foi criada esta Lei, e passar uma breve visão de sua aplicação até os dias atuais, bem como qual sua finalidade em nosso ordenamento jurídico.

De acordo com a Lei in comentum, no que tange o procedimento sumaríssimo, este tem o condão de dar uma resposta do Estado célere nas punições dos crimes de menor potencial ofensivo, trazendo a possibilidade de extinção da punibilidade do autor do fato por mecanismos que não os tradicionais.

O JECRIM foi criado em 1995, mesmo tendo previsão constitucional desde 1.988 (CF/88, artigo 98, I) e sofreu poucas alterações desde o momento de sua criação.

A principal característica desta lei é regular, no âmbito da persecução penal do Estado, os crimes de menor potencial ofensivo, dando celeridade processual ao judiciário, bem como beneficiando o autor do fato que faça jus a conduta determinada a este procedimento.

Serão elencados, sua origem (inclusive constitucional), os procedimentos, tudo a fim de se ver sanado tal desconforto social, mediante condutas típicas cujas penas máximas não excedam 2 (dois) anos.

Se abordará, no presente artigo, se a lei 9.099/95, que traz o benefício da Transação Penal, é inconstitucional. O Artigo tentará responder a tal indagação, isso porque, após o autor do fato preencher os requisitos necessários exigidos na lei, fazendo jus a tal benefício, se imporá uma “pena”, mesmo antes do contraditório e da ampla defesa, o que, em tese, lhe furta direitos fundamentais.

A transação penal oferecida ao autor do fato representa, geralmente, o pagamento de cestas básicas ou valores ínfimos em dinheiro a serem doados a entidades de caridade. Isso, às vezes, causa insatisfação ao ofendido. Mas este poderá buscar pelas vias legais seus direitos à reparação civil, se for o caso. O que a lei 9.099/95 trouxe foi meios de soluções rápidas e eficazes às pequenas lides penais.

Veremos, o que acontecerá se o autor do fato típico, ilícito e culpável, discordar da transação penal. Esta não se aplicará, dando-se continuidade ao processo, com a consequente denúncia (podendo ser aplicado outros benefícios legais).

2.     A Criação do Juizado Especial Criminal

Os legisladores constituintes de 1988, preocupados com os índices de criminalidade decorrentes de infrações de menor potencial ofensivo e a forma de suas punições, a fim de não misturar os autores dos fatos, com aqueles que realmente cometiam crimes relevantes, isto é, que causavam repudio a sociedade, criaram, assim, o Juizado Especial Criminal. Este foi instituído em 26 de setembro de 1995, pela Lei nº 9.099.

Já era de entendimento comum que para certas contravenções penais, com mínima repercussão social, não fossem instaurados processos criminais com longos procedimentos, que apenas retardavam a solução da causa. Não se entendiam mais por que subsistem certos crimes no Código Penal (que a nenhum bem jurídico protege), enquanto outros delitos novos, como os pertinentes à ecologia e à informática, estavam (e ainda estão), a reclamar previsão legal. Pelo que se reclamava a necessidade de inúmeras alterações, as quais não podiam (e não podem), esperar mais tempo.1

A descrença da sociedade com a justiça criminal, acumulada com o aumento da criminalidade, a busca por celeridade processual e a necessidade de adoção ao Direito Penal Mínimo2, visando a solução de conflitos, bem como com a realidade social em que em inúmeros casos se desconhece a autoria delitiva, ou mesmo os fatos delitivos que acabavam por prescreverem, fez com que a intervenção penal, que não objetiva, apenas, criação de leis, mas, também, a sua efetiva eficácia, no que compete ao quesito prevenir o fato típico, antijurídico e culpável, levasse os legisladores a se debruçarem para elaborar um mecanismo (que já detinha previsão constitucional), que desafogasse as “prateleiras” dos fóruns criminais, lembrando que as normas do direito penal não são, precipuamente, instituídas para prevenir o crime, mas como meio de se punir o infrator, para que este (e todos quantos souberem de sua punição), não mais cometam tais atos.

O legislador observou, ainda, que os ordenamentos processuais, introduzidos na Itália, na década de 70, advindo do direito norte-americano e em nosso ordenamento na esfera Civil (com a instituição do Juizado de Pequenas Causas), encontrada na lei nº 7.244 de 7 de novembro de 1984, que se baseava nos seguintes princípios: economia processual, oralidade, informalidade e celeridade, bem como seus resultados, trazia grandes vantagens para a sociedade.

1 Revista JUSTITIA 141/50.

2 QUEIROZ, Paulo. Sobre a Função do Juiz Criminal na Vigência de um Direito Penal Simbólico. IBCcrim, nº 74, 1999).Corrente doutrinária na qual defende a privação de liberdade, deve ser imposta nos casos em que haja risco social efetivo.

Observou-se, também, que transação do direito holandês, possível até mesmo entre a polícia e o autor do fato, que possibilitava o não o desenvolvimento do processo, a transação italiana, o arquivamento condicional do direito polonês (e também do Alemão), a cargo do Ministério Público, a suspensão provisória do processo, art.281/282 do Código de Processo Português de 1987, e o procedimento sumaríssimo introduzido, com euforia, no artigo 392 do mesmo estatuto, eram medidas que, de certa forma, constituíam alternativas aos processos longos brasileiros, e faziam sucesso nos Países apontados.3

Neste sentido, comentou Alexandre de Moraes, coordenador da Obra: Os 20 anos de Constituição da República Federativa do Brasil, pág.171, que o constituinte se baseou no princípio da obrigatoriedade ao instituir a Lei dos Juizados na Constituição Federal de 1988, no artigo 98, inciso I, no qual seriam utilizados os procedimentos orais e sumaríssimos que permitiriam a transação penal e até os recursos por turmas de juízes no primeiro grau de instância.

A grande celeuma de sua criação fora em 1998, quando o Congresso, de fato, não sabia informar quais seriam as infrações de menor potencial ofensivo  (elencadas, originalmente no artigo 61 da lei 9.099/95, como crimes cuja pena máxima não ultrapassasse 1 (um) ano), e quais os requisitos para a transação penal, além de como seria o procedimento sumaríssimo. Afinal, cabia somente a este instituir sua maneira de funcionamento, com fulcro no artigo 22, inciso I daCF.

Adiante, com a criação da Emenda Constitucional nº 22 de março de 1999 foi acrescentado o parágrafo único ao artigo 98 da CF, dispondo sobre a criação dos Juizados especiais na esfera da Justiça Federal, surgiram ainda mais dúvidas, pois, qual a pena a ser adotada? Na Lei Federal se dizia 2 (dois) anos. No âmbito Estadual, 1 (um) ano. Acabou-se por adotar (e depois alterar-se), a própria lei 9.099/95, passando os crimes de menor potencial ofensivo considerados àqueles cuja pena máxima culminada não ultrapassassem 2 (dois) anos.

Com a inovação deste subsistema consensual, o legislador propôs a desburocratização da Justiça, a fim de desafogar o judiciário, o sistema carcerário e até acabou por introduzir, efetivamente, um sistema baseado em costumes (uma vez que já e cediço que, na maioria das vezes, se impõe o pagamento de cestas básicas aos infratores).

3 FILHO, Fernando da Costa Tourinho. Comentários à Lei dos Juizados Especiais Criminais/ 8ª Edição. Pág.13.

Ao dedicar resposta Estatal a sociedade para aqueles que, mesmo cometendo os delitos de menor insignificância, estariam sendo reprimidos, resolveu duas situações graves (a de falta de resposta do Estado aos crime e contravenções de menor potencial ofensivo e ao problema do custo excessivo aos cofres públicos e aoscidadãos para a persecução penal destes).

Nesse diapasão, o procedimento comum à todos os processos do sistema penal e a instauração de inquérito policial investigativo foi dispensado neste rito, pois, o que se buscava era maior celeridade e economia processual, pelo que a autoridade policial passou a lavrar o Termo Circunstanciado conforme redação do artigo 69 da Lei 9.099/95:

A partir de então, a autoridade policial que tomasse conhecimento da ocorrência da prática de um crime cuja pena máxima culminada fosse de até 1 (um) ano, lavraria termo circunstanciado e encaminharia, imediatamente, ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.

Termo que não dispensou completamente a importância de seu conteúdo, haja vista que a autoridade policial deveria, no momento da lavratura, reunir os elementos suficientes a possibilitar ao titular da ação penal a aplicabilidade da lei, bem como apontar a justa causa penal. Assegurava-se, ainda, que com este procedimento a ação penal não necessitaria de uma denúncia, cabendo, antes de tudo, o oferecimento da transação penal proposta pelo Ministério Público e, cumprida a obrigação, ensejaria a extinção dalide.

Importante esclarecer que o termo circunstanciado deveria conter declarações de ambas as partes:  vítima e autor do fato, sendo possível arrolamento de testemunhas com suas qualificações, endereços e até mesmo requisição de exame pericial.

O órgão do Ministério Público (CONAMP), preocupado com a vinda de inquéritos mal elaborados em suas promotorias, acabou por apresentar requisitos mínimos à instauração dos termos circunstanciados:

Do termo circunstanciado deveria constar:

 a)    Qualificação e endereços completos das partes (residencial e do trabalho, inclusive comtelefone)

 b)   Data, hora e local dosfatos;

 c)   As versões do autor do fato e davítima;

 d)   Rol de testemunhas, com qualificação e endereços completos (residencial e do trabalho, inclusive telefone), bem como a súmula do que tiverem elas presenciado;

 e)      Especificação dos exames periciais que foram requisitados; croqui, se possível;

 f)   Descrição dos objetos apreendidos ounão;

 g)   Assinaturas das partesenvolvidas;

 h)   No caso de previsão legal, a representação do ofendido (quandopossível);

 i)   Outros dados relevantes para esclarecimento dosfatos;

 j)       A folha de antecedentes do acusado deveria acompanhar o termo circunstanciado, quandopossível.4

Contudo, o legislador ao instaurar a lei, criou inúmeras oportunidades de composição da lide, dentre as quais pode-se destacar que, inicialmente, conforme o artigo 68 da referida lei, as partes são obrigadas a comparecer em audiência preliminar com seus advogados após serem intimados, caso isso não ocorra, o MP pode requisitar a instauração de inquérito policial ou até mesmo denunciar o ocorrido.

É relevante ressaltar que a autoridade policial competente responsável para a elaboração do TC, conforme a lei, é a polícia civil, exercendo a função de polícia judiciária, embora, na maioria das vezes, quem chega ao local do fato, tomando ciência do ocorrido, é a Polícia Militar, funcionando como o poder de repressão e ostensividade.

Ademais, não haveria prisão em flagrante, nem imposição de fiança, desde que o autor do fato se comprometesse a comparecer no Juizado Especial Criminal no dia e horamarcados.

A presença do advogado no comparecimento ao Juizado seria obrigatória, com base no artigo 68 da Lei 9.099/95.

Diante de todas as oportunidades, se ainda persistisse o autor do fato ausente, O Ministério Público poderia, dependendo do caso: arquivar o TC, requisitar instauração de inquérito policial ou, por fim, se assim entendesse, oferecer a denúncia. Daí o autor do fato, comparecendo em audiência preliminar, na qual estariam presentes o MP, a vítima (esta, sem obrigatoriedade), e os seus respectivos defensores (advogados), o magistrado presta os esclarecimentos, dentre estes, a possibilidade da composição civil e possível aceitação imediata da pena. Todavia não seria uma pena privativa de liberdade (artigos 70 e 72 da Lein°9.099/95).

4 Revista MPMG JURÍDICO. Edição especial do Juizado Especial Criminal. pág. 92/93.

Surgiram, assim, as medidas despenalizadoras: a transação penal (artigo 62) e a suspensão condicional do processo (artigo 89); prevista, ainda, a reparação causada pelo dano decorrente da infração penal (artigo 62 e 74). Para tanto, estabeleceu-se o procedimento oral e sumaríssimo (artigo 77 eseguintes).

Porém, mesmo nesta lei, permaneceu obrigatório os princípios da identidade física do juiz, concentração, mediação, bem como o princípio da razoabilidade e ainda, até, a produção e exames de provas periciais (artigo 81, §1°).

A instauração desta lei visava, de forma definitiva, dar um aspecto mais importante a vítima, buscando a possível reparação dos danos sofridos, não obstante, na ação penal privada ou pública condicionada a referente composição tem como objetivo principal extinguir a punibilidade do agente (artigo 74, parágrafo único).

A composição dos danos civis seria reduzida a escrito e, homologada pelo  juiz, mediante sentença irrecorrível, e teria eficácia de título a ser executado no juízo civilcompetente.

Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarretaria a renuncia ao direito de queixa ou representação da vítima.5

Nessa hipótese, claramente não caberia Apelação para combater a decisão, sendo, esta, irrecorrível. Todavia, nada impediria que pudessem ser opostos embargos declaratórios, havendo obscuridade, ambiguidade, omissão ou até mesmo dúvida na decisão homologatória, de acordo com o artigo 83 deste diploma legal (lei 9.099/95). Também, o magistrado, de ofício, poderia corrigir os erros em seu aspecto material (artigo 83,§3°).

Ao que concerne à conciliação homologada, o juiz sentenciaria a extinção da punibilidade pela renúncia, de acordo com o artigo 107, inciso V, do Código Penal Brasileiro, em casos de ação penal privada. Para a ação penal pública condicionada a representação, o acordo celebrado, automaticamente implicaria em uma “renúncia tácita” e de igual forma julgaria extinta a punibilidade do autor dofato.

 3.    Princípios dos Juizados Especiais Criminais

O princípio, de modo geral, é a forma original a qual instaura-se a criação de algo, as proposições que fundamentam, de forma universal, as regras, condutas a serem seguidas.

5 FILHO, Fernando da Costa Tourinho; Comentários à lei dos juizados especiais criminais. 8ª Edição. Editora Saraiva. Pág.117

Neste trabalho, vejamos os princípios norteadores dos Juizados Especiais Criminais.

 a)    Princípio da Oralidade

Este princípio disposto na lei 9.099/95, substitui o critério da escrita, formalizando a oralidade, onde os atos do processo são expressosverbalmente,frenteaosjuízesetribunais,tornando-seeficazes pela “palavra oral”6.

Contudo, apesar de estar embasado na palavra falada, deverá o referido procedimento ser documentado, não se excluindo totalmente a escrita nos autos, devendo ser reduzido a termo, conforme preleciona o parágrafo 3º do artigo 65 da lei 9.099/95.

Neste caso, há de ser relevante o princípio da identidade física do juiz, (não se excluindo a possibilidade de mais de um juiz na instrução do caso). Porém, relevante será a visão daquele juiz o qual esteve presente no momento da prova oral.

Na justiça consensual dos Juizados Especiais Criminais pode-se exemplificar todos os procedimentos resumidos em sua oralidade, tais como: o termo circunstanciado (artigo 69, caput), onde são registrados somente os atos essenciais; os atos em audiência de instrução e julgamento que poderão ser colhidos em sistema audiovisual (artigo 65 § 3º); a acusação e a defesa são orais (artigos 77, caput, e § 3º e artigo 81,caput).

Deste modo, o corolário do princípio da oralidade é a própria lei que instituiu que antes de ocorrer a acusação, todos os atos do processo deveriam ser resumidos na audiência preliminar, havendo, após a sua instauração, uma única audiência de instrução e julgamento. A concentração destes atos no procedimento sumaríssimo faz com que o magistrado possa participar de todos os atos do processo, onde, após suas análises, deverá, logo em seguida,sentenciar.

 b)    Princípio da Informalidade eSimplicidade

Este princípio traz, em sua essência, a ausência com a preocupação relacionada à forma dos atos processuais, porém, não significa que haverá ausência total de formas, pois estaria, assim, em desconformidade com os entendimentos exigidos na Constituição Federal de 1988. Como bem diz os nobres mestres Marques e Figueira Jr.:

6 MARQUES,J.F.Elementos de direito processual penal.p.67.

“Haverá quando o ato estiver em conformidade com o modelo descrito em lei. Não havendo correspondência entre o ato realizado e o tipo legal, ele se diz atípico ou imperfeito”.7

Ainda, segundo Mirabete, os atos processuais devem ser realizados conforme a lei em obediência ao princípio do devido processo legal, de modo a se combater, aomáximo,oexcessodeformalismo.Todavianãodevemserafastadasasregras gerais do processo, e no silencio da lei dos juizados, aplicar, subsidiariamente, os mecanismos do Código de Processo Penal.8 Um exemplo prático é o que condiz o artigo 65, parágrafo 1º da lei em consonância com o artigo 563 do CPP, ao se referir sobre nenhum ato do processo ser considerado nulo diante desta nulidade não gerar prejuízos.

O critério da simplicidade está ligado a um procedimento simples e relativo às infrações menores, de pouca complexidade. Não obstante, afastado o procedimento de instauração de inquérito policial, ou ainda, em caso de prisão em flagrante, não aparecerá nos autos, sendo possível conceder-se a liberdade com ou sem fiança, para que o autor do fato responda em liberdade.

As intimações serão feitas por correspondências com aviso de recebimento. No caso de lesão corporal, será suficiente para comprovar, o laudo pericial ou mesmo boletim médico. Ademais, os atos processuais poderão ser realizados durante a noite ou até mesmo em qualquer dia da semana, observando- se a respectiva lei estadual. No caso de citação nos Juizados Criminais não haverá em hipótese alguma a citação por edital, pois quebraria a referida essência do princípio da simplicidade, deverá ser imediatamente remetido a justiça comum, também assim, se constatar um caso de maior complexidade.

O princípio da informalidade está claramente presente na tentativa de conciliação das partes; na própria audiência preliminar, presentes o autor do fato, a vítima, o promotor de justiça; bem como na proposta de transação penal, e na possibilidade de apreciação da defesa (artigos 76 caput, 77 parágrafos 3º e 4º da lei nº 9.099/95). Admitindo assim, que o maior interessado para o fim da lide seja o Estado, o poder que consegue controlar a sociedade, havendo possibilidade da convivência entre as partes normalizar, menos gastará com sua repressão e movimentação da máquina judiciária.

7 LOPES, M.A.R. e FIGUEIRA JR, J.D. Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. 3 ed. São Paulo. Ed. RT, 2000.P.522.

8 MIRABETE, J.F. Juizados Especiais Criminais. São Paulo. Atlas, 1998.p.25.

c)    Princípio da EconomiaProcessual

Este princípio está relacionado ao máximo de resultados na atuação do direito, contendo mínima movimentação de atividades processuais. Isto é, quanto menos encargos nos autos, melhor será seu desfecho. Exemplo: a dispensa de inquérito policial e a concentração de atos em uma mesma oportunidade, trazem menos possibilidade de recursos (apelação ou embargos), os quais travariam sua resolução.

 d)    Princípio daCeleridade

A celeridade está ligada aos demais princípios, e concerne na rápida resolução da lide “Busca reduzir o tempo entre a prática da infração penal e a decisão judicial, para dar uma resposta mais rápida à sociedade. ”9

 4.     Da Transação Penal

Como já dito, a transação penal foi introduzida na criação do artigo 98, inciso I da CF/88 e instituída na Lei nº 9.099/95, em seu no artigo 76:

Art. 76 da Lei nº 9.099/95 – Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada naproposta.

Entretanto, foram instituídas algumas restrições, quais sejam: não seria concedido ao reincidente pela prática de crime à pena privativa de liberdade, por sentençadefinitiva; não seria concedida ao agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos; não seria concedida se os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção damedida.

A definição de transação segundo Ada Pellegrini Grinover é que há neste sistema, “concessões mútuas entre as partes e os partícipes”10. Neste sentido assemelha-se ao sistema de autocomposição, no qual uma das partes abre mão de seus interesses para que assim a lide se desfaça. É certo que na lei, o termo “transação” não fora adotado, e sim o termo “proposta”.

A transação permitiria então que o suposto autor do fato tenha a oportunidade de negociar com o membro do Ministério Público sua sanção, sem ao menos ser punido por pena privativa de liberdade decorrente de um processo criminal, seguido nos ditames do rito tradicional.

9 GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Juizado Especial Criminal – doutrina e jurisprudência atualizadas. 3 ed. rev.e atual. São Paulo: Saraiva, 2007,  p.6.

10 KYLE, Linda Dee. Transação Penal Revisão Crítica à luz do acesso à justiça.1ª ed.Curitiba. JURUÁ EDITORA 2011. p.115

Todavia, há de se esclarecer que não há uma liberdade às partes para transacionar. O MP escolhe a “pena”, o autor do fato, conjuntamente com seu advogado aceita ou não, e só então o magistrado ou conciliador, amparado pelo princípio da legalidade ou obrigatoriedade, ohomologa.

Nesse ínterim, há uma grande discussão sobre a constitucionalidade da lei 9.099/95, quanto à transação penal, tendo em vista que esse novo sistema acaba por impor a alguém uma “pena” sem as garantias do devido processo legal como assegura a CF/88 em seu artigo 5º, incisos LIV eLV11.

A corrente doutrinária majoritária, representadas por Ada Pellegrini Grinover, Rogério Lauria Tucci e Miguel Reale Junior, sustentam que uma lei infraconstitucional não pode divergir do Preceito Constitucional nulla poena sine judicio.12

Nesse sentido, o renomado autor, ainda alega que o indivíduo não pode ser privado de sua liberdade ou mesmo de seus bens sem o devido processo legal. A pena imposta (não importa se consensual e sem presunção de culpa) deve proceder com a instauração do processo, contrariando também os princípios processuais constitucionais. De acordo com Afrânio Silva Jardim a proposta de transação penal é à peça inicial de uma ação penal de natureza condenatória, apresentada pelo Ministério Público no que competem as infrações de menor potencial ofensivo, tendo em vista que a decisão judicial homologara a proposta que evidentemente terá indisfarçável caráter punitivo.

No entanto os doutrinadores elencados a seguir são contrários ao pensamento da transação penal ser um fato inconstitucional ao ordenamento jurídico:

“A leitura e a interpretação desatentas levariam o aplicador ou intérprete a concluir pela inconstitucionalidade da transação penal, uma vez que desta forma poder-se-ia pensar que não há ação e, por consequência, não haveria processo, tampoucojurisdição.

Esta dificuldade é afastada quando se busca uma interpretação conforme a Constituição, ou seja, a moderna doutrina constitucional prima exatamente pela manutenção da norma no ordenamento, só retirando-a quando não for possível qualquer interpretação que se conforme com a Constituição.”13

[…] Quando o Ministério Público vai a juízo “propor a transação, ou seja, quando vai a juízo apresentar sua proposta de aplicação imediata de uma pena  não  privativa  de  liberdade  ao  dito  “autor”  da  infração  de    menor potencial ofensivo, o que está fazendo, decerto, não é algo diverso do ajuizamento de uma demanda, entendida esta, na conceituação sempre esclarecedora do professor José Carlos Barbosa Moreira, como o ato pelo qual alguém pede ao Estado a prestação de atividade jurisdicional” 14

11 Edição do Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil. p.10. Artigo 5º, inciso LIV –“Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Inciso LV

12 KUENHE, Maurício, FICHER, Félix, GUARAGNI, Fábio André, JUNG, André Luiz Medeiros, Lei dos Juizados Especiais Criminais, Curitiba, Juruá Editora. 1996, p.37/38.

13 NICOLITT, André Luiz. Juizados especiais criminais- temas controvertidos. 2. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.p.17.

14 KARAN, Maria Lúcia. Juizados especiais criminais: a concretização antecipada do poder de punir. São Paulo: Revista dos Tribunais,2004.p.86

[…] É infecundo discutir a transação penal no plano de sua constitucionalidade, uma vez que o discurso jurídico-positivo lhe dá suporte, por meio da justificação de confluência da transação penal ao disposto no artigo 98, I, norma constitucional de eficácia limitada, que necessitou de legislação complementar posterior.15

Contudo, para pôr fim a esta discussão podemos observar que o artigo 76 da Lei nº 9.099/95, impõem uma série de circunstâncias para acolhimento ou não deste instituto ao autor do fato. Por exemplo: se a ação for penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, pode o Parquet propor a aplicação de pena restritiva de direitos ou multa. Porém, como já visto, não se admitirá, em hipótese alguma, em casos em que o autor da infração já tenha sido condenado pela prática de crime à pena privativa de liberdade em sentença definitiva, ou tenha sido beneficiado anteriormente, no prazo de 5 anos pela pena restritiva de direitos ou multa, bem como se for reincidente.

De igual forma, decidiu recentemente o STJ (Superior Tribunal de Justiça) em 10 de fevereiro de 2017, no Recurso Especial nº 1.327897, o relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, em sua argumentação que a transação penal não incide em culpa, e nesta ocasião denegou o pedido da vítima para utilizá-la como prova em ação indenizatória de danos morais, haja vista que nesta ocasião não foram comprovadas as supostas agressões.

A seguir o referido Acórdão:

RESP 1327897

Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 1.327.897 – MA (2012/0118056-8) RELATOR: MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA RECORRENTE:  ITAQUÊ  MENDES  CÂMARA  E  OUTRO  ADVOGADOS:

PEDRO LEONEL PINTO DE CARVALHO – MA000417 JEZANIAS DO RÊGO MONTEIRO E OUTRO(S) – MA004161 RECORRIDO : MARCOS TÚLIO PINHEIRO REGADAS ADVOGADO : JOAO CARLOS DUBOC JÚNIOR E OUTRO(S) – MA006748 EMENTA RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSAÇÃO PENAL. REALIZAÇÃO. RECONHECIMENTO DE CULPA. IMPOSSIBILIDADE. ART.

535 DO CPC/1973. SÚMULA Nº 284/STF. FUNDAMENTOS. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. SÚMULA Nº 283/STF. DEMONSTRAÇÃO DE NEXO DE CAUSALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. SÚMULA Nº7/STJ.

Cinge-se a controvérsia a saber se a transação penal disposta na Lei nº 9.900/1995 importa reconhecimento de culpabilidade do réu a ensejar a pleiteada indenização por danosmorais. O instituto pré-processual da transação penal não tem natureza jurídica de condenação criminal, não gera efeitos para fins de reincidência e maus antecedentes e, por se tratar de submissão voluntária à sanção penal, não significa reconhecimento da culpabilidade penal nem da responsabilidade civil.Precedentes.

O recurso especial que indica violação do artigo 535 do Código de Processo Civil de 1973, mas não especifica a omissão, contradição ou obscuridade a que teria incorrido o aresto impugnado e qual sua importância no desate da controvérsia, é deficiente em sua fundamentação, atraindo o óbice da Súmula nº284/STF.

15 MIRANDA, Alessandra de La Veja. Transação Penal, controle social e globalização. Porto Alegre:Sergio Antonio Fabris,2004. P.233.

Não havendo impugnação dos fundamentos da decisão atacada, incide na espécie a Súmula nº283/STF.

O Tribunal estadual concluiu pela ausência de comprovação do nexo causal e de culpa do recorrido, não sendo possível a esta Corte rever tal entendimento, sob pena de esbarrar no óbice da Súmula nº7/STJ. Recurso Especial nãoprovido.

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Terceira Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze (Presidente), Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 06 de dezembro de 2016 (Data do Julgamento) Ministro Relator: RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA16

 5.    Natureza Jurídica

O instituto da transação penal segundo Sérgio Turra Sobrane, possui natureza jurídica dupla: de Direito Processual Penal, a qual compõe uma lide que se forma implicitamente e o instituto do Direito Material, devendo haver um ajuste entre as partes e a homologação do acordo pelo magistrado, extingue-se a punibilidade do fato típico e antijurídico.

Contudo, ainda existe uma discussão, e a doutrina se divide com relação  à transação penal ser possível diante do princípio da obrigatoriedade ou ser  instituído mediante o princípio da oportunidade, bem como se este instituto refere-se a uma faculdade do MP ou um direito subjetivo do autor dofato.17

Para parte da doutrina, a proposta para a transação por parte do Ministério Público, não é uma obrigação. O Parquet, em obediência ao princípio da obrigatoriedade, pode recusar-se a propor, oferecendo imediatamente a denúncia.

Contudo o autor André Luiz Nicolitt afirma que tal ato deve ser rejeitado pelo magistrado, não havendo justa causa. A discussão fora tão acalora que no estado de São Paulo, fora instituída a Lei Complementar nº 851 de 9 de dezembro de 1998, informando que, caso a proposta de transação penal não fosse aceita pelo membro do MP, deveria ser observado o artigo 28 do Código de Processo Penal, isto é, deveria remeter os autos ao Procurador Geral de Justiça a fim de analisar o caso emconcreto.

16 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão no Recurso Especial nº1327897 Maranhão. Relator CUEVA, Ricardo Villas Boas. Disponível em  http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/

17 SOBRANTE, Sérgio Turra. Transação penal. São Paulo: Saraiva. 2001.p.98

Para Sérgio Turra Sobrane, a transação penal é uma faculdade do Ministério Público, pelo fato deste ser dono da ação penal, cabendo ao Órgão propor ou não o acordo em razão do princípio da oportunidade18. Entretanto, para Fernando da Costa Tourinho Filho, tal não é uma faculdade do MP, e não vigora o princípio da oportunidade, pois as condições subjetivas e objetivas para a transação penal deveram surtir efeito conforme o texto da lei e não na mera vontade do promotor de justiça formulará19.

Todavia o objetivo a ser alcançado no Instituto dos Juizados Especiais Criminais, na transação penal é a solução daquele conflito sem a instauração de um processo na justiça comum, as partes devem decidir a melhor maneira de sanar os conflitos, sendo assim a transação como direito público subjetivo é um benefício ao autor do fato, certamente se preencher os requisitos apresentados anteriormente. Ao comparar a definição da natureza jurídica no direito processual seria o Habeas Corpus no CPP equivalente a transação penal neste instituto.

 6.     Da Aceitação ou Não Aceitação da Transação Penal

Inicialmente é importe frisar o momento da aplicação da transação penal, o qual está inserida na redação do artigo 72 deste diploma legal resumindo então seus requisitos:

 a)  O crime deve ser de ação pública. Se for de ação pública condicionada ou ação pública incondicionada, o ofendido deve assinar o termo de representação que consta no termo circunstanciado, assim o MP poderá propor atransação.

 b) Há audiência preliminar para a tentativa de composição civil dosdanos

 c) No caso do ofendido efetivar a representação ou o MP denunciar, o autor do fato deverá ser informado da aplicação imediata da pena qual seja, não privativa deliberdade.

 d) O fato típico deve se enquadrar ao tipo descrito na lei, caso contrário, poderá ser requisitado o arquivamento pelo MP, decidindo assim o magistrado se acolhe ounão.

A transação penal, diferentemente da suspensão condicional do processo, ocorre antes do oferecimento da denúncia, antecedendo a formação da relação processual.

18 SOBRANTE, Sérgio Turra. Transação penal. São Paulo: Saraiva. 2001.p.99

19 TOURINHO FILHO, Antônio da Costa. Comentários à lei dos Juizados especiais criminais.3. ed. Revista atualizada de acordo com a Lei 10.259/01. São Paulo : Saraiva, 2003.p.99.

Entretanto na Constituição Federal de 1988, o legislador não especifica qual seria o momento da transação penal, apenas dizendo que “havendo representação ou tratando-se de crime de ação pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento…”Contudo hádoutrinadoresque entendeque a proposta oferecida pelo MP constitui uma denúncia, pelo fato de se negociar com o autor do fato sua pena diversa da restritiva de liberdade.

A natureza jurídica da aceitação da proposta, para Cezar Roberto Bitencourt, implica ao autor do fato a admissibilidade de culpa em razão do principio “nulla poena sine culpa”, já para Ada Pellegrini Grinover a natureza jurídica da aceitação implica na submissão voluntária à sanção penal” 20, isto é, não há reconhecimento de culpa, uma vez que a sanção imposta não gera a reincidência e nem as outras consequências derivadas de uma sentençacondenatória.

Ademais o artigo 76 em seu parágrafo 3º, garante que a aceitação da proposta deve ter a anuência do autor do fato e de seu advogado. Essa premissa revela que a vontade do réu é indispensável para a validade do ato21, bem como a presença de seu defensor a fim de garantir sua defesa técnica. Porém há casos em que o defensor discorda da proposta e o autor do fato concorda, para tanto fora instituído na Comissão Nacional de Interpretação da Lei 9.099/95 a conclusão nº15 a qual informa “Quando entre o interessado e seu defensor ocorrer divergência quanto à aceitação da proposta de transação penal ou suspensão condicional do processo, prevalecerá à vontade doprimeiro”.

Da não aceitação da transação penal: Nesses casos o autor do fato recusa-se a aceitar a proposta do MP, e passará a exercer seu direito a instauração do procedimento sumaríssimo, conforme artigo 77 da Lei dos Juizados, dessa forma o procedimento poderá se tornar complexo a ponto de ser remetido para Justiça Comum.

Segundo Luiz Cláudio Silva, mesmo que o autor do fato seja considerado culpado mediante as provas estabelecidas nesse sentido, o MP poderá oferecer a denúncia e logo em seguida, mediante os requisitos do artigo 89 da lei 9.099/95 (que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime), poderá oferecer a suspensão condicional do processo pelo período  mínimo de 2 anos e máximo de 4 anos, bem como em caso de não haver a revogação da suspensão será declarada a extinção da punibilidade22.

20 GRINOVER, Ada Pellegrini. Juizados Especiais Criminais, cit.p.141.

21 PINHO , Humberto Dalla Bernardina de. A introdução do instituto da transação penal no direito brasileiro e as questões daí decorrentes. Rio de Janeiro: Lumen Juris,1998.p.74

22 SILVA, Luiz Claúdio. Juizado especial criminal: prática e teoria do processo. Rio de Janeiro: Forense, 1997.p.128.

Todavia a implantação deste instituto só deve ser considerada identificando  as pessoas envolvidas nas ocorrências a elas imputadas, pois, não obstante, percebe-se que, não raramente, parte dos ofendidos recorrem ao dispositivo dos juizados motivados pela vingança e, muitas vezes, não comparecem na audiência ou desistem de seguir adiante, somente pelo desejo do outro ter se submetido ao rigor  e atos do judiciário ou da presença de uma autoridade policial, causando medo ou sentimento de humilhação. Sendo assim, a vingança se consuma como uma lição de moral, caso em que, observado pelo MP ou delegado, já se poderá oferecer a promoção de arquivamento aomagistrado.

 7.     No que Consiste a Proposta de Transação Penal

A proposta que o Ministério Público fará ao autor do fato está elencada nos ditames do artigo 43 do Código Penal23. Geralmente, fica revertida ao pagamento de cestas básicas para entidades carentes, ou prestação de serviços à comunidade. Nesse ínterim, para fazer jus a essa proposta, o autor do fato não pode ter sido beneficiado nos últimos 5 anos por esta aplicação de pena ou multa, conforme traduz o artigo 76, parágrafo 2º, inciso II da lei dos Juizados. Considera-se ainda que, em alguns casos, o suposto autor do fato nem é culpado e acaba por aceitar a proposta como forma de se livrar dessa contenda e de seu constrangimento.

Isto pode posteriormente ser afetável quando o autor do fato realmente for culpado no exemplo a seguir: ter sido o agente causador em um acidente de trânsito e não ter transcorrido o prazo de 5 anos da outra transação aceita. Desta forma, suportará uma denúncia e responderá no tramite da justiça comum, por vezes, em razão de uma fatalidade.

Por isso, é imprescindível o papel do conciliador e mesmo do membro do Ministério Público, para informar as possibilidades de restrições da lei, o que levará a uma consciência na hora da aceitação da proposta pelo autor do fato.

 8.    Considerações Finais

Por todo exposto, é possível afirmar que a Lei do Juizado Especial Criminal, veio fazer parte do ordenamento jurídico em busca de uma justiça criminal consensual, a fim de desafogar o judiciário, sobretudo, buscando conciliações nos julgamento das infrações de menor potencial ofensivo, cuja pena máxima cuminada não exceda a dois anos.

23 Artigo 43. As penas restritivas de direitos são: I- prestação pecuniária; II- perda de bens e valores; III-vetado; IV- prestação de serviços a comunidade ou a entidades públicas; V- interdição temporária de direitos; VI- limitação de fim de semana.

O instituto da transação penal inserido nesta lei, objetivou a reparação dos danos sofridos pela vítima, cumulada com a aplicação de pena não privativa de liberdade ao suposto infrator.

Ainda que a modalidade da transação penal busque penalizar o autor do fato, a grande discussão sobre uma possível inconstitucionalidade fervilhou entre renomados doutrinadores, haja vista, alguns considerem que o princípio maior do devido processo legal (contraditório e ampla defesa), estaria sendo desrespeitado, pois a pena a um réu só pode ser aplicada após incorrer todas as fases procedimentais do processo, em que só será penalizado se a culpa for provada.

Contudo pode-se considerar que a questão está vencida, em razão do entendimento do STJ citado do trabalho, de que a “transação penal não incide em culpa”. Ocorre que, por um lado o Ministério Público abre mão do procedimento da persecução penal, e do outro, o autor do fato tem a chance de evitar que um simples fato, de menor relevância, transforme-se em um processo e siga os procedimentos legais, o qual, sim, poderá trazer consequências graves, para ele e para a sociedade. Ao escolher o cumprimento da proposta formulada pelo promotor de justiça, poderá, assim que cumprir, ver extinta a sua possível punibilidade, pondo fim àlide.

Aliás, observamos que a transação penal não tem caráter punitivo, e sim uma medida penal em que poderá ou não aceitar o autor do fato. O certo é que, aceitando, se verá livre de um processo. Também, verificamos que sua aceitação não importa em admissão de culpa ou mesmo de responsabilidade civil, conforme comprovado no artigo 76, §4º da lei sob análise, não importando em reincidência. A única consequência “amarga” é que a aceitação impedirá que durante o prazo de 5 anos o mesmo não cometa delitos semelhantes, pois se assim proceder, não poderá fazer mais jus a tal medida.

Neste trabalho, de modo geral, insistimos na derradeira eficácia deste instituto, que busca o princípio da celeridade processual e a transparente efetivação na resolução dos conflitos. O autor do fato tem a oportunidade de reeducar-se sem privação de sua liberdade. Neste sentido, o sistema inserido pelo legislativo na aludida lei, adaptou uma forma de não ferir o direito da vítima e tão pouco do suposto autor, tudo para evitar o processo e o caos constantementeinserido.

Por todo o conteúdo pesquisado e exposto neste trabalho, compreendemos que a criação da transação penal é constitucional.

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Como citar e referenciar este artigo:
COSTA, Kelly Conte; SABINO, Sérgio Murilo. Transação Penal e o Devido Processo Legal – Lei 9.099/1995 – Juizado Especial Criminal. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2017. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-penal/transacao-penal-e-o-devido-processo-legal-lei-90991995-juizado-especial-criminal/ Acesso em: 29 mar. 2024