Processo Penal

Considerações acerca da Execução Penal no Brasil

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL[1]

Maria Vitória de Araújo Soares [2]

Thaís de Sousa Damasceno Costa [3]

 

Resumo: O presente trabalho desenvolve uma análise crítica acerca do processo de execução penal adotado no Brasil, notadamente as modalidades de pena. O enfoque crítico sobre a questão volta-se ao impacto ocasionado pelo superencarceramento hoje vivenciado, para que se possam avaliar as possibilidades de superação desse paradigma. Para tanto, faz-se necessária a análise da natureza jurídica da pena, suas modalidades e institutos que visam à ressocialização do apenado.

Palavras chave: Ressocialização – Pena – Regime Prisional – Ineficiência – Punibilidade.

Sumário: 1. Introdução. 2. Do Processo de Execução Penal.3. Conclusão.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho discorrerá sobre o processo de execução penal. Essa fase ocorre após a condenação do réu, momento no qual o Estado passará, efetivamente, a aplicar o jus puniendi.

Será analisando as seguintes penas: I) privativas de liberdade, são aquelas em que o condenado tem sua liberdade de locomoção cerceada, subdividindo-se em duas espécies: reclusão (podendo ser cumprida em regime fechado, semiaberto e aberto) e detenção (a priori, o regime inicial deve ser o regime semiaberto, mas em alguns casos, existe a necessidade do regime inicial ser fechado).

Além disso, serão apresentadas outras peculiaridades sobre a pena privativa de liberdade, bem como o posicionamento do STF sobre a execução provisória da pena.

II) As penas restritivas de direito, que tem o caráter alternativo, com o fulcro de substituir a pena privativa de liberdade. Conforme o Código Penal, no art. 43, as penas restritivas de direito são: prestação pecuniária; perda de bens e valores; limitação de fim de semana; prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana.

Por fim, trataremos sobre a medida de segurança, apontando os casos em que ela será aplicada, além da explanação procedimental desse instituto. Para isso, traremos posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais sobre o assunto.

2. DO PROCESSO DE EXECUÇÃO PENAL

2.1 PANORAMA GERAL

A execução penal é uma fase subsequente ao processo penal condenatório, com a finalidade de dar cumprimento à pena ou medida de segurança aplicada por sentença. Após o encerramento do processo de conhecimento, os autos são arquivados e, por cópia e com a emissão da guia de execução, são formados outros autos, onde será desenvolvido o procedimento executivo de forma individual, em respeito à individualização da pena.

A Constituição Federal assegura o princípio da individualização da pena, devendo este ser observado em sede de execução penal. É por esse motivo que a Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal) disciplina e determina, por inteligência do seu art. 5º, que “os condenados serão classificados segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal”, sendo certo que a classificação deve ser feita por “Comissão Técnica de Classificação que elaborará o programa individualizador da pena privativa de liberdade adequada ao condenado ou preso provisório” (art. 6º da LEP).

Além do princípio da individualização da pena, cabe destacar que devem ser observados também outros princípios na fase de execução penal, tais como o princípio da legalidade, de extrema importância no contexto atual em que se vive o Estado Democrático de Direito, bem como o princípio-garantia do contraditório e da ampla defesa.

Para que ocorra a fase da execução penal são necessários: a existência de título executivo consistente em sentença criminal condenatória, sentença absolutória imprópria ou sentença que homologa transação penal, conforme a Lei 9.099/95.

2.1.1 Natureza jurídica

Muito se discute na doutrina acerca da natureza jurídica da execução penal. Nesse sentido, cabe apontar o pensamento da renomada autora Ada Pellegrini Grinover, que aponta três correntes: a corrente que defende que a execução penal seria atividade meramente administrativa; a outra que advoga que a execução das penas é atividade jurisdicional e, por fim, uma terceira opinião no sentido de que a fase executiva do processo penal é puramente processual.

Segundo a autora, isso se dá em função de três aspectos peculiares da execução, quais sejam: a relação entre sanção e jus puniendi; a presença de um título executivo, tratando-se, então, de matéria processual penal; e expiação da pena, que poderia ser incluída no direito administrativo.

A respeitável jurista ressalta ainda que a execução penal é uma atividade complexa e nela compreendem-se tanto a atividades jurisdicional quanto a administrativa, devendo estas serem desenvolvidas harmonicamente.

Entretanto, Grinover enfatiza que esses dois aspectos devem, ao mesmo tempo, ser separados, na medida em que a aplicação da pena é afeta ao direito penitenciário, podendo-se enquadrar em um ramo do direito administrativo, ainda que muitas dessas normas sejam encontradas nos diplomas penal e processual penal, e a tutela à efetivação da sanção penal, por seu turno, é atividade jurisdicional.

Quanto à natureza jurídica da execução, assim entende o ilustre doutrinador Nestor Távora, em conformidade com parte da doutrina: “Diante da natureza jurídica híbrida da execução penal pensamos que o processo executivo criminal tem natureza preponderantemente jurisdicional e, secundariamente, administrativa, mercê do desenvolvimento de atividade não-decisória em seu âmbito”[4].

Nesse sentido, é forçoso concluir que a execução penal, entendida como o processo de cumprimento da pena, é atividade complexa que associa aspectos jurisdicionais e, também, administrativos. Todavia, a atividade do juiz de execução, como consequência necessária de um Estado Democrático e de Direito, todavia, é sempre jurisdicional.

2.2 DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

As penas privativas de liberdade têm sua previsão entre os artigos 33 e 43 do Código Penal e são aquelas conhecidas como a limitação do poder de locomoção do condenado.

Ainda segundo o art. 33 do Código Penal, as penas privativas de liberdade possuem duas espécies, quais sejam: reclusão, cuja destinação é para os crimes dolosos, podendo ser inicialmente cumprida nos três regimes (fechado, semiaberto e aberto); e detenção, que pode ser cumprida inicialmente nos regimes semiaberto, salvo necessidade de transferência para o regime fechado. Por fim, há a “prisão simples” prevista na Lei de Contravenções Penais.

Cabe ressaltar que, para o cumprimento de pena privativa de liberdade, é imprescindível a emissão de guia de execução penal, sendo que, por inteligência do art. 107 da Lei de Execução Penal, ninguém será recolhido, para cumprimento de pena privativa de liberdade, sem a guia expedida pela autoridade judiciária.

O advento da Lei de Execução Penal teve como objetivo efetivar as disposições criminais e possibilitar ao apenado condições para a sua reintegração social, ressaltando-se aqui, o caráter ressocializador que, em tese, deveria pautar a execução da pena, por ter esta a função precípua de reintegrar o apenado na sociedade e evitar a sua reincidência.

Nesse sentido, faz-se necessária uma análise sobre toda a fase de execução penal, com o auxílio da Lei de Execuções Penais e dando ênfase ao processamento da pena privativa de liberdade, para que se possa perceber se há efetivamente o cumprimento da função de ressocialização e reintegração do apenado à sociedade.

2.2.1 Do início do procedimento

A sentença condenatória apenas adquire força executiva quando ocorre a expedição da guia de recolhimento. Esta guia é expedida somente após o trânsito em julgado da sentença, momento no qual o apenado passa à fase de cumprimento da pena, tendo em vista que, antes do trânsito em julgado da sentença, ainda há a possibilidade de o sentenciado recorrer da pena que lhe foi imposta.

A competência do juízo de execução começa a partir do momento em que há a efetiva prisão do condenado, devendo esta ser expressamente determinada na sentença. Cabe ressaltar que cabe ao juízo da condenação o papel de estabelecer o regime inicial de cumprimento da pena e sua omissão no que diz respeito a esse assunto constitui nulidade.

A guia de recolhimento, regulamentada pela Resolução nº 113 do Conselho Nacional de Justiça, pode, também, ser ordenada para o acusado preso preventivamente e condenado por sentença que ainda não transitou em julgado, o que é, inclusive, benéfico a ele, pois é na guia de recolhimento que constam os dados necessários para a segregação do agente, o que possibilita a concessão de benefícios que só seriam auferíveis se transitada em julgado a sentença, a exemplo da progressão de regime e livramento condicional.

2.2.2 Da execução provisória da pena

Nada impede, também, a execução provisória da pena, com a condição de que o réu já esteja preso cautelarmente. Todavia, por mais que, como já mencionado, seja possível a emissão de guia de recolhimento para fins de concessão de benefícios próprios de condenado com trânsito em julgado, o STF havia decidido pela inconstitucionalidade da execução provisória da pena, por entender que só possível a prisão antes do trânsito em julgado se presentes os requisitos da prisão preventiva.

Nesse sentido, cabe mencionar o informativo nº 0390 do STJ:

Informativo nº 0390. Quinta Turma. PRISÃO. TRÂNSITO EM JULGADO. A Turma, ao julgar o habeas corpus, entendeu não aplicar o enunciado da Súm. 267-STJ, diante do teor de recente julgado do STF no sentido de que a execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da condenação ofende o princípio da não culpabilidade (art. 5º, LVII, da CF/88), excetuada a hipótese de privação da liberdade acompanhada da demonstração de sua natureza cautelar: dos pressupostos e requisitos do art. 312 do CPP. Precedente citado do STF: HC 84.078-MG, DJ 18/2/2009. HC 122.191-RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 14/9/2009. (grifo nosso)

Havia consolidação no posicionamento do STF de que o trânsito em julgado de decisão penal condenatória seria o único meio hábil a dar início à pena, não sendo admissível sua execução de maneira provisória, isto é, sua execução quando ainda havia pendência no julgamento de recursos, mesmo que de natureza constitucional, endereçados ao STJ e ao STF que, em regra, não são dotados de efeito suspensivo.

Todavia, houve mudanças na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, com o julgamento do HC 126.292, que passou a permitir que, depois de decisões de segundo grau que confirmem condenações criminais, a pena de prisão já seja executada, nada obstante o Egrégio Tribunal tenha dito que não se trata de execução provisória, nem de prisão cautelar, mas de execução definitiva, início de cumprimento de pena.

CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado.[5] (grifo nosso).

O STF utilizou-se de argumentos processuais (em regra, RE e REsp não são dotados de efeito suspensivo e não há análise de fatos e provas nestas instâncias, mas tão somente de matéria de direito) e de caráter prático (pelo direito comparado, foi suscitado que outros países se utilizam desta mesma fórmula e que o processo é deveras moroso, sendo a grande maioria dos recursos interpostos de natureza protelatória).

O princípio maculado com este novo entendimento é o da presunção de inocência, constitucionalmente previsto no inciso LVII do artigo 5º. O Relator no HC em questão, Min. Teori Zavascki, ressaltou que até a confirmação da sentença penal no 2º Grau de jurisdição, deve-se presumir a inocência do réu, mas que após este momento se exaure o princípio da não-culpabilidade.

É importante ressaltar que a presunção de inocência – garantia fundamental, cláusula pétrea e corolário do Estado Democrático de Direito – não poderia admitir qualquer tipo de flexibilização, pois a execução indevida de uma condenação penal produz danos irreparáveis na vida das pessoas que forem injustamente encarceradas, sem que qualquer tipo de reparação seja suficiente.

Ademais, em matéria de direitos humanos, é vigente o princípio da proibição do retrocesso, que não permite que uma conquista seja maculada por decisões posteriores. Decorre, também, da segurança jurídica, é a confiança do cidadão no ordenamento.

Outro fato interessante que se destaca neste julgamento é que foram utilizados diversos argumentos metajurídicos, como a opinião pública, a noção de impunidade, expectativas sociais e a crescente ocorrência da prescrição. Nesta senda, o Supremo Tribunal Federal, o guardião da Constituição da República, viola um direito humano e uma garantia fundamental pela justificativa de ser “uma forma de harmonizar o princípio da presunção de inocência com a efetividade da justiça” (Min. Teori Zavascki), em prejuízo ao cidadão e aos direitos de primeira dimensão.

2.2.3 Da superveniência de doença mental

A LEP prevê, também, a possibilidade da superveniência de doença mental. Nesse caso, o apenado acometido por doença mental deve ser internado em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, havendo a interrupção do cumprimento da pena privativa de liberdade, justificada por circunstância maior de saúde.

Essa interrupção pode ser apenas temporária e, nesse caso, o apenado pode retornar ao cumprimento da pena posteriormente. Todavia, se definitiva, deve haver a conversão da pena privativa de liberdade em medida de segurança (art. 183, LEP).

2.2.4 Da necessidade de menção expressa do regime inicial

Em seu art. 110, prevê a LEP que: “o juiz, na sentença, estabelecerá o regime no qual o condenado iniciará o cumprimento da pena privativa de liberdade, observado o disposto no artigo 33 e seus parágrafos do Código Penal”

A previsão do art. 110 da LEP, qual seja a necessidade de menção expressa pelo juízo da condenação do regime inicial do apenado, constitui, inclusive, direito do réu, pelo que o juiz não pode se eximir da obrigação de assim determinar. Entendem os Tribunais Superiores a omissão do juiz quanto à determinação do regime inicial de cumprimento de pena constitui nulidade da sentença proferida.

O juiz não é obrigado, ainda que o réu seja primário e que sua pena não seja superior a quatro anos a fixar, de pronto, o regime penal aberto. Contudo, deve decidir fundamentadamente para tanto. Nesse sentido, tem-se a súmula 719 do STF, de seguinte teor: “A imposição do regime de cumprimento mais severo do que apena aplicada permitir exige motivação idônea”. Isto é, embora a opção pelo regime aberto constitua faculdade do juiz, não pode impor ao apenado regime de cumprimento mais severo arbitrariamente.

Importante destacar ainda que essa “motivação idônea” a que se refere a súmula 719 do STF não guarda qualquer relação com a gravidade abstrata do delito, tendo em vista que esta não é capaz de motivar o estabelecimento de regime prisional mais grave do que o cabível pela sanção imposta (súmula 440 do STF).

O regime inicial de cumprimento da pena não é fixado a partir da consideração dos crimes isoladamente; leva-se em conta a pena já unificada, em caso de concurso de crimes.

2.2.5 Da progressão de regime

A sanção privativa de liberdade será executada de maneira progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, desde que sejam satisfeitos os requisitos subjetivos e objetivos para tanto. É de competência do juízo de execução a análise acerca do preenchimento desses requisitos para a concessão do benefício de progressão. Devem ser ouvidos, também, o Ministério Público e o Defensor.

A Lei de Execução Penal exige que o apenado tenha cumprido 1/6 (um sexto) de sua pena para que possa progredir de regime. Ressalta-se que a gravidade do crime e anterior periculosidade do agente não obstam essa progressão, mas o lapso temporal exigido é maior para os crimes hediondos e equiparados: 2/5 (dois quintos) para o condenado primário e 3/5 (três quintos) para o reincidente.

O lapso temporal maior exigido para os crimes dessa natureza somente aplica-se para os crimes hediondos cometidos após a vigência da Lei n. 11.464/07. Antes disso, aplica-se o lapso temporal de 1/6, lei mais benéfica.

Quando o apenado obtém, por exemplo, o benefício de progressão para o regime semiaberto, o período que deve ser calculado para que progrida novamente de regime (para o regime aberto) é o remanescente da pena.

Além do requisito objetivo, qual seja o lapso temporal que o apenado deve cumprir, é analisado, também, para a concessão do benefício, o bom comportamento carcerário (requisito subjetivo), sendo este comprovado por atestado emitido pelo diretor do estabelecimento penal. A decisão que concede a progressão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor, repisa-se.

O apenado, ao progredir de regime, não pode, a título de exemplo, progredir do regime fechado diretamente ao regime aberto. Esse fenômeno é denominado progressão per saltum é vedado, pois é obrigatória a passagem pelo regime intermediário, qual seja o semiaberto, para que possa alcançar a progressão para o regime aberto.

Discute-se ainda qual seria a data-base para a recontagem do prazo para os benefícios da execução, tal como a progressão de regime, em caso de cometimento de infração disciplinar grave ou em caso de fuga, por exemplo. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende que essa data-base para a recontagem do prazo para progressão de regime seria a do cometimento da última infração disciplinar grave ou da recaptura, em caso de fuga.

O cometimento de infração disciplinar grave indica que o apenado não apresenta bom comportamento carcerário, pelo que se deve reiniciar a contagem do prazo.

O ingresso do apenado no regime aberto tem como pressuposto a autodisciplina e senso de responsabilidade do apenado, além do fato de que deve estar trabalhando ou comprovar a possibilidade de trabalhar imediatamente – apresentando proposta de emprego – e apresentar, pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos exames a que foi submetido, indícios de que irá ajustar-se ao novo regime com responsabilidade.

Para tal feito, deve frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada e deve recolher-se durante o período noturno e nos dias de folga. Essas condições são estabelecidas no art. 115 da LEP. O trabalho aqui exercido não pode gerar direito à remição de pena, pois é condição para a concessão da progressão para o regime aberto.

2.2.6 Da remição da pena

A remição é um direito do condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto e que, pelo trabalho ou pelo estudo, pode “abater” uma parte do tempo da pena que deve cumprir.  Pode ser considerado assim como um instituto que auxilia na ressocialização do apenado, tendo em vista que o labor e o estudo são essenciais na sua reintegração à sociedade, com o fito de evitar-se que o condenado venha a reincidir em atos criminosos.

A contagem do tempo funciona da seguinte forma, segundo o art. 126 da LEP: a cada 3 dias de trabalho, 1 dia da pena é remido e, igualmente, a cada 12 horas de frequência escolar.

2.2.7 Da falta de vaga no estabelecimento prisional

O apenado não pode cumprir sentença em regime que seja mais gravoso do que o determinado em sentença, ainda que provisoriamente. Em caso de falta de vaga no estabelecimento adequado para cumprir pena em regime semiaberto, não pode o condenado ser prejudicado e deve, assim, aguardar em regime mais benéfico a abertura de uma vaga para que possa cumprir sua pena no regime a que tem direito. Assim entende o STF:

HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REGIME DE CUMPRIMENTO. SEMI-ABERTO. AUSÊNCIA DE VAGAS. DEFICIÊNCIA DO ESTADO. REGIME MAIS BENÉFICO. ORDEM CONCEDIDA. I – Consignado no título executivo o regime semiaberto para o cumprimento da pena, cabe ao Estado o aparelhamento do Sistema Penitenciário para atender à determinação. II – À falta de local adequado para o semiaberto, os condenados devem aguardar em regime mais benéfico até a abertura de vaga. III – Ordem concedida.[6]

Todavia, embora seja esse o entendimento do STF, não é o que se percebe em boa parte dos estados brasileiros. Em pesquisa feita pelo site “Migalhas”[7], publicada em junho de 2016, constatou-se que apenas em 11 capitais, os apenados ficam reclusos exclusivamente em colônias agrícolas, industriais ou similares (institutos penais ou albergues), conforme prevê o Código Penal e a Lei de execução penal. São elas: Rio Branco/AC, Salvador/BA, Goiânia/GO, Campo Grande/MS, Recife/PE, Teresina/PI, Curitiba/PR, Rio de Janeiro/RJ, Natal/RN, Porto velho/RO, Porto Alegre/RS e Palmas/TO:

  

UF

Capital

Dorme e passa o dia em colônia agrícola, industrial ou similar

Trabalha durante o dia e dorme em colônia agrícola, industrial ou similar

Dorme e passa o dia em peniten-ciária

Dorme em peniten-ciária e sai para trabalhar durante o dia

Fica em prisão domiciliar

Fica livre, mas com tornozeleira

eletrônica

Fica livre mediante compro-vação de emprego

AC

Rio Branco

X

X

AL

Maceió

X

AM

Manaus

X

X

AP

Macapá

X

X

X

X

BA

Salvador

X

X

CE

Fortaleza

X

X

DF

Brasília

X

X

ES

Vitória

GO

Goiânia

X

X

MA

São Luís

X

X

X

X

MG

Belo Horizonte

X

X

MS

Campo Grande

X

X

MT

Cuiabá

X

PA

Belém

X

X

X

X

X

PB

João Pessoa

X

X

PE

Recife

X

X

PI

Teresina

X

X

PR

Curitiba

X

X

RJ

Rio de Janeiro

X

X

RN

Natal

X

X

RO

Porto Velho

X

X

X

RR

Boa Vista

X

X

RS

Porto Alegre

X

X

SE

Aracaju

X

X

X

SC

Florianó-polis

X

X

SP

São Paulo

X

X

TO

Palmas

X

X

  

Em outros estados, a ausência de estabelecimentos prisionais para o cumprimento do regime semiaberto ou a falta de vagas nesses lugares faz com que os detentos cumpram suas penas em penitenciárias comuns, casas do albergado, em prisão domiciliar ou até mesmo livres, com uso de tornozeleira eletrônica ou mediante comprovação de trabalho.

Percebe-se, assim, a falência do sistema e a inaplicabilidade dessas normas, não só em relação a isso, mas a tantos outros direitos dos apenados que são mitigados pela ineficiência do aparelhamento do sistema penitenciário brasileiro, ressaltando-se o problema da superlotação de presídios.

2.2.8 Da prisão albergue domiciliar

O art. 117 da LEP prevê a possibilidade do cumprimento do regime aberto em residência particular para: o condenado maior de 70 anos; acometido de doença grave; condenado com filho menor ou deficiente físico ou mental; condenada gestante.

2.2.9 Da regressão de regime

O apenado, além de ter o benefício da progressão de regime, por outro lado, pode também ser transferido de um regime menos rigoroso para outro mais rigoroso, em decorrência de prática de fato definida como crime doloso, falta grave ou de sofrer condenação por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena unificação, torne o regime atual inadequado. Da mesma forma que é vedada a progressão per saltum, é vedada a regressão per saltum.

Em caso de falta grave pode o juiz aplicar a regressão cautelar, em decisão fundamentada. Essa decisão visa determinar medidas emergenciais, com o fito de assegurar a efetividade do processo executivo e inibir quaisquer atos que atentem contra à finalidade da execução.

2.2.10 Das autorizações de saída temporária

Prevê a LEP entre seus artigos 120 a 125 as autorizações de saída, quais sejam: a permissão de saída de cunho humanitário e a saída temporária. A primeira consiste em autorização que pode ser concedida ao preso que cumpre pena em regime fechado, semiaberto ou ainda, em regime provisório, em caso de falecimento ou doença grave do cônjuge, companheiro, ascendente, descendente, irmão ou ainda por necessidade de tratamento médico.

A saída temporária é um benefício que apenas os apenados que cumprem pena em regime semiaberto tem direito, podendo ser autorizados pelo juiz a deixar o estabelecimento pelo prazo máximo de sete dias, quando, então, devem retornar, sob pena de terem sua data-base modificada para fins de concessão de progressão de regime (quando o apenado foge, sua data-base para fins de progressão passa a ser o dia da sua recaptura).

Esse benefício é concedido para que o condenado tenha direito a visitar sua família em datas comemorativas, tais como dia dos pais e natal e, também, como preveem os arts. II e III do art. 122 da LEP para frequentar cursos profissionalizantes ou participar de atividades que concorram para o retorno ao convívio social (função ressocializadora da pena trazida pela LEP).

Para que o apenado possa ter direito a esse benefício deve preencher os requisitos previstos no art. 123 da LEP, quais sejam: comportamento adequado (requisito objetivo); cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena, se o condenado for primário, e 1/4 (um quarto), se reincidente (ou seja, deve estar no regime semiaberto); e, por fim, deve haver a compatibilidade do benefício com os objetivos da pena.

2.2.11 Do livramento condicional

O livramento condicional é benefício que pode ser conferido ao condenado que cumpre a pena privativa de liberdade igual ou superior a dois anos e consiste no deferimento de sua liberdade sob determinadas condições que devem ser cumpridas sob pena de revogação do instituto.

A operacionalização desse benefício pressupõe a existência de um sistema penal progressivo, representando, assim, sua etapa final. O mérito desse sistema de progressão do cumprimento da pena é bem retratado por Francisco Bueno Arus, citado pelo autor Cézar Roberto Bitencourt[8] na seguinte passagem:

A essência desse regime consiste em distribuir o tempo de duração da condenação em períodos, ampliando-se em cada um os privilégios que o recluso pode desfrutar de acordo com sua boa conduta e o aproveitamento demonstrado do tratamento reformador. Outro aspecto importante é o fato de possibilitar ao recluso reincorporar-se à sociedade antes do término da condenação. A meta do sistema tem dupla vertente: de um lado pretende constituir um estímulo à boa conduta e à adesão do recluso ao regime aplicado e, de outro, pretende que este regime, em razão da boa disposição anímica do interno, consiga paulatinamente sua reforma moral e a preparação para a futura vida em sociedade. (grifo nosso).

A disciplina atinente aos requisitos necessários à concessão de livramento condicional é disposta no art. 83 do Código Penal e devem ser ouvidos, ainda, o Ministério Público e o Conselho Penitenciário. São previstos requisitos objetivos e subjetivos, quais sejam:

·        Cumprimento de mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;

·        Cumprimento de mais da metade da pena se o condenado for reincidente em crime doloso;

·        Comprovação de comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto;

·        Efetiva reparação do dano causado pela infração, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo;

·        Cumprimento de mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

Importante trazer à tona o entendimento consolidado na súmula 715 do STF, de seguinte teor: “a pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução”. Também entende a jurisprudência majoritária nesse sentido de que a pena que deve ser tida como parâmetro para a concessão do benefício é a efetivamente aplicada.

Quando do deferimento do pedido, algumas condições são impostas ao apenado, tais como obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável, se for apto para trabalho; deve comunicar ao juiz periodicamente sua ocupação e não mudar do território da comarca do juízo da execução, sem prévia autorização deste.

O benefício, todavia, poderá ser revogado de maneira obrigatória ou facultativa. Será obrigatória a revogação em caso de o liberado, ser condenado a pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível, por crime cometido durante a vigência do benefício, ou por crime anterior ou ainda se depois de somadas as penas em decisão que as unifique, a unificação exceda o limite mínimo de cumprimento de pena para o deferimento do livramento condicional.

A possibilidade de revogação facultativa perfaz-se quando o liberado deixa de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade.

Nesses casos, cabe ao juiz a decisão de manter ou não e mantido o livramento condicional, na hipótese da revogação facultativa, o juiz deverá advertir o liberado ou agravar as condições em audiência designada para essa finalidade.

De acordo com o art. 146-B da LEP, o juiz poderá definir fiscalização do apenado por meio de monitoração eletrônica quando determinar a prisão domiciliar ou autorização de saída temporária no regime semiaberto.

2.2.12 Do fim do cumprimento da pena – extinção de punibilidade

Por fim, tem-se, ao final do cumprimento da pena, tem-se a extinção de punibilidade. Encerra-se, assim, o processo de execução penal com a decisão do juiz de execução que declara extinta a punibilidade em virtude do integral cumprimento da pena.

Desta forma, determina o art. 109 da Lei de Execução Penal: “cumprida ou extinta a pena, o condenado será posto em liberdade, mediante alvará do Juiz, se por outro motivo não estiver preso”.

Acrescente-se o fato de que não constarão da folha corrida, atestados ou certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares da Justiça, qualquer notícia ou referência à condenação, salvo para instruir processo pela prática de nova infração penal ou outros casos expressos em lei após extinta a pena.

2.3 DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS

A pena restritiva de direito ou penas alternativas, tem o caráter de substituir (art. 44, CP) a pena privativa de liberdade, fixada em sentença, quando o juiz vislumbrar por preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos do agente para isso.

Com esse tipo de pena visa-se diminuir o encarceramento nos presídios; favorecer a ressocialização do autor do fato, evitando a estigmatização decorrente do cárcere; e reduzir a reincidência, uma vez que a pena privativa de liberdade é a que detém o maior índice de reincidência, sem, contudo, eliminar a aplicação de punição feita pelo Estado aos ilícitos penais.

O Código Penal, no art. 44 e seus incisos, lista cerca de dez sanções restritivas, além da pena pecuniária, quais sejam: prestação de serviços à comunidade; limitação de fim de semana; interdições de direitos (proibição do exercício de cargo, função pública ou mandato eletivo; proibição do exercício de profissão ou atividade; suspensão da habilitação para dirigir veículo), proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos; prestação pecuniária em favor da vítima; prestação pecuniária inominada e perda de bens e valores.

Sem mais delongas sobre as penas, passemos a analisar a fase de execução penal. Conforme o art. 147, da LEP, após o trânsito em julgado da pena que aplicou a pena restritiva de direitos, o Juiz da execução, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, promoverá a execução, podendo, para tanto, requisitar, quando necessário, a colaboração de entidades públicas ou solicitá-la a particulares.

Ou seja, após proferir a sentença, o juiz da condenação, deve emitir guia ou carta de recolhimento e enviá-la ao juiz da execução. Cabe aqui a ressalva de que, o STF, possui precedentes de execução provisória da PRD quando interpostos recursos de caráter meramente protelatórios, sem qualquer conteúdo jurídico que viabilize seu provimento[9].

Abaixo se analisa o procedimento da execução das penas restritivas de direito.

2.3.1 Da prestação de serviço à comunidade

Quando houver condenação nessa modalidade de pena, o juiz da execução designará a entidade ou programa comunitário ou estatal, devidamente credenciado ou convencionado, junto ao qual o condenado deverá trabalhar gratuitamente (LEP, art. 30), por uma hora por dia. O trabalho a que será subordinado não pode ter caráter vexatório ou humilhante, bem como não poderá atrapalhar a sua rotina de trabalho normal. O início do cumprimento, conta-se a partir da data do primeiro comparecimento (art. 149 da LEP), o que configura causa interruptiva da prescrição executória (art. 117, V/CP).

A comprovação do cumprimento ou não da medida é realizada por meio de relatórios que devem ser enviados mensalmente ao juiz da execução, descrevendo as atividades desenvolvidas, bem como faltas ou indisciplinas do condenado.

Em caso de descumprimento da prestação de serviços à comunidade, sem motivo justificável, a pena restritiva de direitos converte-se em pena privativa de liberdade.

A duração da pena equivale, em regra, a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída (art. 55/CP), tratando-se de condenado a pena superior a um ano de prisão, ser-lhe a facultado o cumprimento da pena substitutiva em menor tempo, desde que não seja inferior à metade do tempo da pena de prisão substituída (art. 46, § 4º, do CP).

2.3.2 Da limitação de final de semana

Esse tipo de restritiva de direito impõe ao condenado a permanência de no mínimo cinco horas diárias, durante o sábado ou domingo em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado, período em que poderão ser ministrados ao indivíduo cursos ou palestras educativas. Inicia-se, do mesmo modo que a medida acima comentada, na data do primeiro comparecimento ao estabelecimento indicado pelo juiz da execução (art. 48/CP).

Além disso, o estabelecimento deve efetuar o envio de relatório detalhando as atividades desenvolvidas pelo condenado durante o período do cumprimento da pena. O descumprimento da medida imposta abre possibilidade à reconversão em pena privativa de liberdade.

2.3.4 Da interdição temporária de direitos

Uma vez aplicada esse tipo de pena, o juiz da condenação expede a guia de execução à Vara de Execuções Criminais e este último comunica à autoridade competente da pena aplicada (art. 154, caput, da LEP). Além disso, intima o condenado para que fique ciente da limitação que lhe foi imposta. Caso o condenado não seja encontrado, ocorre a conversão da pena, conforme o julgado:

RECURSO DE AGRAVO. EXECUÇÃO PENAL. PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. NÃO LOCALIZAÇÃO DO EXECUTADO. CONVERSÃO EM PRIVATIVA DE LIBERDADE. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. A pena restritiva de direitos será convertida em privativa de liberdade caso o condenado não seja encontrado, frustrando as tentativas de intimação no endereço por ele indicado, conforme preceituam os artigos 181, § 1º, “a”, da Lei de Execuções Penais e 44, § 4º, do Código Penal. 2. Não tendo sido o executado encontrado no endereço informado nos autos, descumpriu os ditames do art. 132, § 1º, alínea “c”, da LEP, que expressamente dispõe ser vedado ao apenado “mudar do território da comarca do Juízo da Execução, sem prévia autorização deste” e a determinação de comunicar à VEPEMA eventual mudança de endereço residencial, demonstrando verdadeiro desprezo à execução penal. 3. Não cabe ao Poder Judiciário ou ao Ministério Público o ônus de realizar diligências a fim de localizar o réu, devendo este manter seu endereço atualizado nos autos quando sujeito a pena restritiva de direitos. 4. Recurso conhecido e provido.[10]

Portanto, após a intimação, o descumprimento da interdição, autoriza o juiz a converter a pena restritiva de direito em pena privativa de liberdade.

2.3.5 Da prestação pecuniária em favor da vítima

Transitada em julgado a sentença, será expedida guia de execução à Vara de Execução Criminal, na qual o juiz notificará o condenado, para que efetue o pagamento ao beneficiário indicado, podendo ser estipulado, por analogia, o prazo de dez dias (art. 164/LEP). Após o pagamento, extingue-se a pena. Não ocorrendo o pagamento, é possível a conversão em pena privativa de liberdade.

2.3.6 Da prestação pecuniária inominada

Aqui, caso a vítima ou beneficiário da prestação pecuniária abdique do valor fixado em sentença, o montante da condenação poderá ser revertido em prestação de outra natureza (art. 45, § 2º, CP). Seguindo os mesmos trâmites da execução da prestação pecuniária acima comentada.

2.3.7 Da perda de bens e valores

Referente a esse tipo de PRD, a LEP foi omissa quanto ao procedimento da execução. Norberto Avena[11] traz três correntes sobre o assunto.

A primeira afirma que o condenado deve entregar espontaneamente o bem, sob pena de conversão em privativa de liberdade; a segunda diz que deve ser aplicada, por analogia, a regra do art. 51 do CP, que dispõe ser a pena de multa dívida de valor, sujeita à execução na forma da Lei de Execução Fiscal; e a última alega que se utiliza o procedimento regulado no art. 164 da LEP, cabendo ao MP requerer a citação do condenado para, no prazo de dez dias, entregar os bens referidos na sentença.

Decorrido tal prazo sem que ocorra a entrega desses bens, proceder-se à respectiva penhora (art. 164, § 2º/LEP) seguindo-se a partir daí o procedimento relativo à execução ditado pelo Código de Processo Civil.

2.4 DA MEDIDA DE SEGURANÇA

Na definição de Fernando Capez, medida de segurança é sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja finalidade exclusiva preventiva, no sentido de evitar que o autor de uma infração penal que tenha demonstrado periculosidade volte a delinquir[12].

A sentença que impõe medida de segurança é denominada absolutória imprópria e é consequência dos seguintes requisitos: a prática de um fato típico e ilícito; do reconhecimento da periculosidade do agente e da não ocorrência de causa extintiva de punibilidade.

Assim, constado se tratar de um agente semi-imputável (aqui se fala em possibilidade de substituição da pena pela qual foi condenado o réu, conforme o art. 98 do CP) ou inimputável à época do cometimento do ilícito penal, deve-se aplicar a medida de segurança. As funções precípuas desse tipo de “pena” são o caráter preventivo, assistencial e curativo.

Porquanto, a medida de segurança divide-se em detentiva (internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, CP, art. 97 – tratando-se de uma privação de liberdade do condenado) e restritiva (sujeição a tratamento ambulatorial, CP, art. 97).

Conclui-se que, se o crime cometido for punido com reclusão, a medida de segurança será de internação; caso a punição prevista para o crime seja pena de detenção, cabe ao juiz analisando a periculosidade do agente optar entre a internação e o tratamento ambulatorial. Entretanto, cabe ao julgador analisar sobre a ótica dos princípios da adequação, razoabilidade e proporção no momento da aplicação da internação ou do tratamento ambulatorial, para atender da melhor forma a função curativa da Medida de Segurança.

2.4.1 Do processo de execução

Passemos então a analisar a execução da medida de segurança. Após o trânsito em julgado da sentença que aplicar medida de segurança, será ordenada a expedição da guia para a execução (art. 171, LEP). O juiz da Vara de Execuções Criminais expedirá a guia de internamento ou tratamento ambulatorial (que conterá a qualificação do agente e o número do registro geral; o inteiro teor da denúncia e da sentença com a certidão do trânsito; a data em que terminará o prazo mínimo da internação) ao Ministério Público e a remeterá à autoridade administrativa responsável pela execução da medida de segurança.

O cumprimento da medida de segurança deve ser realizado em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou do tratamento ambulatorial (art. 172/LEP). Quanto ao prazo da medida de segurança, é estabelecido pelo juiz, o prazo mínimo entre um a três anos (art. 97, § 1º/CP), não se estabelecendo prazo máximo. Entretanto, já é pacifico na doutrina e na jurisprudência que a medida de segurança não deve ultrapassar a pena máxima estabelecida pelo Código Penal de trinta anos, corroborando com essa afirmação, o seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. MEDIDA DE SEGURANÇA. PRAZO MÁXIMO DE INTERNAÇÃO. TRINTA ANOS. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL. ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. 1. Em atenção aos princípios da isonomia, proporcionalidade e razoabilidade, aplica-se, por analogia, o art. 75 do Diploma Repressor às medidas de segurança, estabelecendo-se como limite para sua duração o máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado, não se podendo conferir tratamento mais severo e desigual ao inimputável, uma vez que ao imputável, a legislação estabelece expressamente o respectivo limite de atuação do Estado. 2. Agravo regimental improvido.[13]

Conforme o art. 176, em qualquer tempo, ainda no decorrer do prazo mínimo de duração da medida de segurança, poderá o Juiz da execução, diante de requerimento fundamentado do Ministério Público ou do interessado, seu procurador ou defensor, ordenar o exame para que se verifique a cessação da periculosidade, procedendo-se nos termos do artigo 175.

Caso a perícia de periculosidade seja desfavorável ao agente, dar-se-á continuidade ao tratamento, sendo a investigação da cessação da periculosidade feita anualmente pela autoridade administrativa, ou a qualquer tempo, se o entender o juízo da execução, observando os arts. 175 e 176 da LEP.

Se constatado a cessação total ou parcial da periculosidade do indivíduo, o juiz determinará a desinternação ou liberação, que ocorrerá somente após o trânsito em julgado da decisão que concluir pela cessação da periculosidade (art. 179/LEP) e dará por encerrada a medida de segurança. Entretanto, se no decorrer de um ano após a liberação judiciária o agente praticar fato indicativo de sua periculosidade (art. 97, § 3º/CP), é reestabelecida a medida de segurança.

3. CONCLUSÃO

Diante do exposto, percebe-se certa ineficiência do Estado em atender amplamente todos os seguimentos da sociedade, fato diretamente relacionado com a aplicação do direito penal máximo, isto é, com um maior rigor repressivo e o encarceramento exacerbado.

Desta forma, ter como perspectiva de solução das mazelas sociais somente a penalização e que vise resguardar unicamente a segurança pública é um equivoco que reiteradamente no Brasil se faz presente.

Pelos dados apresentados no decorrer do trabalho, conclui-se que a política proibicionista só amplia ainda mais a complexidade da situação, uma vez que a figura do apenado é constantemente trabalhada pela mídia para que ele seja visto como marginalizado social – o que aumenta a desigualdade social já profundamente difundida no país e dificulta grandemente a reinserção daquele na sociedade, inclusive como um ser humano, um cidadão também dotado de direitos e deveres.

Ao melhorar as condições de cumprimento de pena no Brasil, a Lei de Execuções estaria hábil a proporcionar maior eficácia, fazendo com que o índice de reinserção social se elevasse. Certamente, é preciso que haja uma maior conscientização por parte da sociedade, notadamente o setor privado, para que os presidiários possam ter melhores condições para promover a sua ressocialização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 10ª ed. rev. aampl. Atual. São Paulo: Editora Juspodivm, 2015.



[1] Artigo científico apresentado à disciplina de Criminologia da Universidade Estatual do Maranhão – UEMA.

[2] Aluna do 9º período do Curso de Direito da UEMA, mariavitoriadearaujos@gmail.com.

[3] Aluna do 9º período do Curso de Direito da UEMA, thaiis.costa@hotmail.com.

[4] TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 10ª ed. rev. ampl. Atual. São Paulo: Editora Juspodivm, 2015. P. 1572.

[5] HC 126.292, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, STF, julgamento: 17/02/2016.

[6] HC94.526, Rel. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski. 1ª Turma, DJR de 29-8-08.

[7] Regime semiaberto praticamente não existe no Brasil. Disponível em:  < http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI194415,101048-Regime+semiaberto+praticamente+nao+existe+no+Brasil > Acesso em: 18 jun. 2016.

[8] BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: Parte Geral. Vol. 1, 3ª ed. rev. e atual. São Paulo. Saraiva, 2000, p.98.

[9] AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Execução Penal. 2ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015. P. 344.

[10] TJ-DF – RAG: 20160020012878, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, Data de Julgamento: 25/02/2016, 3ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no DJE: 29/02/2016. Pág.: 337.

[11] AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Execução Penal Esquematizado. 2ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015.

[12] CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. Vol. 2. Parte especial dos crimes contra a pessoa e dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015. P. 467.

[13] STJ – AgRg no HC: 160734 SP 2010/0015753-5, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 01/10/2013, T5 – QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/10/2013.

Como citar e referenciar este artigo:
SOARES, Maria Vitória de Araújo; COSTA, Thaís de Sousa Damasceno. Considerações acerca da Execução Penal no Brasil. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2017. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-penal/consideracoes-acerca-da-execucao-penal-no-brasil/ Acesso em: 28 mar. 2024