Política

Bem-vindo ao circo Brasil

Pipoca e refrigerante: o circo está armado.

A promulgação da Constituição Federal de 1988 trouxe muitos sonhos destruídos durante os Anos de Chumbo. A CF/88 também trouxe, sem estar em seu espírito iluminista, ideologias perversas. De forma didática e sem rodeios, a CF/88 é um corpo, as ideologias os carrapatos. Os carrapatos são as ideologias desde o Império. A trajetória sociopolítica brasileira continua a mesma, um verdadeiro Déjà vu.

Hoje, as verborragias se propalaram no Plenário da Câmara. A democracia fora exaltada, a corrupção do PT combatida, o golpe repudiado. Enfim, um show para a nova geração [adolescente] que começa a se aventurar – política no Brasil é aventura – nas pirotecnias dos parlamentares. Acredito, claro, que muitos adolescentes não são tão leigos em política como nas décadas anteriores a de 1964. Esse ano, com certeza mobilizou cidadãos que estavam cansados das verborragias dos representantes do povo, das classes dominantes, do Mais Valia. Saíram às ruas para protestar contra o Golpe Militar. Após isso, grupos marginalizados até então começaram a exigir o princípio da igualdade entre todos os brasileiros, independentemente de crença, gênero, sexualidade, morfologia, etnia, classe social.

As lutas sociais se fizeram dentro e fora da internet, sendo esta um ambiente de “liberdade de expressão”. Ódio, perseguições, ameaças, injúrias, calunas, difamações, reuniões para matar inimigos torcedores. Enfim, um palco de horrores. Na internet também se desenvolveu outro campo de batalha, a política. Boatos, intrigas, perseguições, endeusamentos de partidos e de políticos. Uma nova arma estava forjada. Uso de robot para disseminar intrigas fora usado. Flash, embeb, toda parafernália tecnológica proporcionada pela internet já principiava o aperfeiçoamento do Pão e Circo tupiniquim.

O PT é um exemplo vivo de como é a política em nosso país. Antes de o PT entrar e sentar na cadeira da Presidência da República, tudo parecia Matrix. A superfície do lago parecia um local de tranquilidade suprema. Já dentro d’água, alguns predadores. No fundo abissal, criaturas horrendas. Esse cenário maravilhoso fora perpetrado por muito tempo pelos partidos de direita – liberais e nacionalistas, conservadores e a extrema direita [fascismo e nazismo] . Enquanto isso, concidadãos brasileiros eram escravizados sem correntes. Os proletariados tinham que suportar a falácia da dignidade humana, os empresários lucravam demasiadamente. Os políticos deitavam em berços esplêndidos e se empanturravam como imperadores romanos. No Coliseu da miséria brasileira, corpos deitados nas sarjetas, mães agonizantes por terem seus filhos aliciados pelo tráfico de drogas, familiares em pranto pelo deslizamento de terra da encosta, balas perdidas furiosas a quererem matar alguém, serviços públicos dignos de guerras ou desastres ambientais. O inferno era melhor, já que o agonizante sabia, literalmente, que vivia num inferno.

A esquerda – progressistas, social-democratas e extrema esquerda [autoritários] – retirou a vitaliciedade da Presidência da República das mãos da direita. O lodo do lago fora remexido. As criaturas abissais emergiram. A podridão veia à tona. O que já era suspeitado por milhões de brasileiros se confirmou: a política brasileira é repugnante e vil. Desde 1500, ano de descobrimento do Brasil — mas os índios já não tinham descoberto? —, pouco mudou em relação a igualdade material e formal. Tudo bem que naquele tempo o planeta não respirava os direitos humanos, os quais são de conhecimento de muitos brasileiros, porém os direitos humanos vigentes no Brasil são belíssimas letras numa folha A4. À realidade, a tristeza de ver um dos mais belos países do planeta, tanto em riquezas naturais quanto em miscigenação, ainda insistir na antropofagia.

O canibalismo, disfarçado, acontece sem a menor cerimônia. Alguns exemplo:

O CDC

   A Anatel está rasgando o CDC e o Marco Civil da Internet. Na sua omissão perite que as operadoras de telecomunicações criem cláusulas exterminando com os planos ilimitados de transferência de dados da banda larga fixa, ou seja, passaram a limitar as conexões como já fazem na telefonia móvel. Agora, se algum sobrevivente desta selva de pedra lesar o consumidor, não faltarão defensores dos direitos do consumidor. Os pequenos empreendedores lojistas são constantemente processados com todos os rigores da lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.

O interesse público no Direito Administrativo

Construções não autorizadas pela Prefeitura são demolidas. Nem tanto. A mansão em Paraty — foi noticiada pela Bloomberg, em 2012 —, construída em área ambiental, está sendo associada a família Marinho, dona da TV Globo.[1] Seja como for, ainda não há nada comprovado, mesmo não sendo da Rede Globo, como se pode construir em área ambiental? Outra, logicamente haverá investigação e a legitima defesa. Pois bem, aos moradores da Vila Autódromo, [2]no RJ, a Prefeitura — lê-se gestor público Eduardo Paes — prometera que não iria demolir as construções [residências]. Reeleito, porém, o “bota abaixo” fora decretado. Promessas de campanha ficaram no vazio. Favelas são construções irregulares, mas estas construções são consequências de políticas que favorecem a leite brasileira, jamais aos párias. O interesse público não passa de pilhéria.

As jurisprudências que protegem os péssimos gestores públicos

O Estado brasileiro é conduzido por gestores públicos — o detentor de poder, o povo, não está nem aí; ainda há a concepção de que elegeu e eles [políticos] que se virem —, os quais atendem a seus interesses particulares e aos interesses de poucos brasileiros. Por exemplo, os presídios e a responsabilidade civil do Estado. Se um preso é morto dentro de estabelecimento prisional público, o Estado é responsável. Todavia, há exceções ou exclusão da responsabilidade civil do Estado, como danos causados por culpa da vítima, danos causados por terceiros e danos causados por caso fortuito ou força maior. Se o preso morrer em decorrência d e rebelião, mas sua morte se deve ao infarto do miocárdio, porque já tinha problemas cardíacos, o Estado pode se eximir de culpa. Ora, os presídios são verdadeiros centros de excelências de ratos, de baratas, de esgoto a céu aberto, de rebeliões devido ao número reduzido de agentes penitenciários. Além disso, as condições físicas prisionais são construções preste a ruírem. Mesmo assim, pela incompetência dos gestores públicos, ou porque têm concepções ideológicas de racismo e sadismo, nada fazem para melhorar as condições prisionais. Resta, então, aos juízes protegerem o Estado, com as leis disponíveis, para não indenizar as famílias e os próprios detentos.

E a bala perdida? Pela incompetência dos gestores públicos, ou descaso mesmo, ou ainda, conluios com empresários — de forma a privatizar os presídios —, as jurisprudências protegem o Estado. Se cada cidadão baleado pela tal da bala perdida fosse indenizado, o Estado faliria. E os buracos nas vias públicas e os acidentes de trânsito?  Pela incompetência dos gestores públicos, ou descaso mesmo, ou ainda, conluios com empresários — de forma a privatizar as vias públicas, de norte a sul, de leste a oeste, com vários pedágios num mesmo trecho —, as jurisprudências protegem o Estado. Além do domínio pleno do automotor, o condutor deve ter olhos de águia. Deve também ter olhos de raio-X para enxergar entre os prédios para ver se tem algum buraco após a curva.

E o que dizer da cobrança mínima da tarifa de energia elétrica? Ora, o consumidor, pelo CDC, só deve pagar o que consumir, mas não se aplica na cobrança mínima de energia elétrica. Ao lojista, que quiser cobrar o couvert é proibido, a não ser que avise, antecipadamente, que o cliente pagará o couvert se consumi-lo. Pior, validade para os créditos adquiridos pelo consumidor para poder efetuar ligações telefônicas. Agora imagine isto: o lojista de um restaurante impede que o consumidor fique mais de trinta minutos sentado sem consumidor nada. Logicamente estará agindo abusivamente. 

Nestes singelos exemplos, que não se esgotam em si, representam a realidade de nosso país. O princípio da isonomia é uma da maiores piadas Made in Brazil. Só não exporta porque é muito ridícula, mesmo para os talibãs. Para estes, é melhor matar de uma vez do que enfeitar e perder tempo. E os representantes do povo tornam as piadas a cada dia melhor. No Plenário da Câmara as verborragias causam náuseas ás cidadãos com mais de 80 anos de idade, os que são universalistas, pois já ouviram as mesmas ladainhas. Os discursos repetitivos de nada contribuem para os objetivos da Republica. Entre e sai representante, e as desigualdades sociais continuam altíssimas. Os serviços públicos jamais proporcionaram dignidade aos usuários, os salário minimo jamais atendeu as necessidades básicas dos proletariados, o que dirá de seus familiares. O acesso às universidades continuam difícil, a má qualidade do ensino faz com que milhões de cidadãos tenham que ter reforços técnicos, nos vestibulares, ou provarem capacidade, pelo Enem. Ora, se o ensino fosse de qualidade, bastaria apresentar tão somente o histórico. Aliás, vestibular e Enem não garantem aprovação nas universidade. Há centena de milhares de alunos que desistem dos cursos por vários motivos: não tem vocação; acham o curso difícil; entraram porque a mídia disse que seria “a profissão do futuro”. Quando há ensino de qualidade e economia forte e estabilizada, os jovens ficam mais tranquilos em escolher alguma profissão, não porque poderá proporcional ascensão socioeconômica, porém escolha pessoal de atuar em área específica.

Nesse diapasão, infelizmente, os jovens escolhem profissões não pelo gostar em si, mas pela possibilidade de manterem, assim pensam, os mesmo padrões socioeconômicos de seus pais, ou ascenderem de padrão socioeconômico cujos pais não conseguiram. Não é à toa que quando há crises econômicas, muitos jovens trancam seus cursos, além da falta de dinheiro, para pensarem em qual curso, considerado melhor, escolheram. A ciranda das salas de aulas é muito comum entre os jovens. Há uma ideia incutida no inconsciente coletivo de que a universidade é a salvação para todos os problemas. Universidade não garante emprego vitalicio, muito menos ascensão socieconômica. Porém friso que a busca frenética da ascensão socioeconômica é condição quase religiosa, ou meritocrática, de países com imensas desigualdades sociais. Se a economia é forte e estabilizada, se as distribuições de riquezas são igualitárias, se há igualdade material e formal, não há a tenacidade neurótica de pensar em ascender socioeconomicamente. Será uma opção, escolha pessoal sem qualquer apelo emotivo narcista, o provar que tem capacidade perante si e as demais pessoas. Ou seja, não há supervalorização do ego, este muito exacerbado em países de extremas desigualdades sociais.

Destarte, não é invencionice dizer que as eleições no Brasil servem como possibilidade de ascensão socioeconômica, de possuir poder e respeito, mesmo presente na crise atual. Já assisti propagandas políticas transmitindo a ideia de que o partido é o que mais tem deputados e senadores. Essa ideia transmite tão somente a possibilidade de estar em cargo público sem concurso público e, mais atraente, porque muitos brasileiros sabem disto, de ganhar muito dinheiro, muito se comparado com o salário minimo. Assim se constrói a mentalidade de Lei de Gerson aos cargos políticos e não tê-lo, provisoriamente, para defender o Estado Democrático de Direito.

Termino este texto para dizer que o circo do Pão e Circo do Impeachment, se houver ou não, será a maior atração circense do mundo: tem palhaçada [mandam o povo pintar os rostos para defender a democracia]; tem acrobacias fabulosas [trocas de partidos]; tem mágicas [esconder dinheiro nas cuecas e nos paraísos fiscais].

Junte todos os partidos e todos os representantes do povo, quantos estão empenhados, realmente, para materializar o Estado Democrático de Direito?

Referências:

[1] — Mansão que Globo não noticia é alvo da Lava Jato no esquema Mossack Fonseca. Disponível em: http://www.redebrasilatual.com.br/blogs/helena/2016/02/mansao-de-donos-da-globo-e-alvo-da-lava-jato-no-esquema-mossack-fonseca-3618.html

[2] — FanPage Vila Autódromo. Disponível em: https://pt-br.facebook.com/vivaavilaautodromo

Como citar e referenciar este artigo:
PEREIRA, Sérgio Henrique da Silva. Bem-vindo ao circo Brasil. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2016. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/bem-vindo-ao-circo-brasil/ Acesso em: 18 abr. 2024