Política

FHC contraria José Serra

 

 

Quero comentar aqui o artigo de hoje de FHC (“Cara ou coroa?”), publicado em vários jornais pelo Brasil. FHC é um homem inteligente e muito bem informado? Sim, é. É um homem de partido, comprometido com o seu candidato? Vamos ver abaixo. É um homem idoso e poderoso, que tem compromisso com a Nação e as novas gerações? Creio que não. O seu viés ideológico o impede de ser um estadista.

 

Creio que FHC sabe mais que ninguém qual é a diferença entre o seu partido, o PSDB, e as forças agrupadas sob a liderança do PT: seu partido é a pura expressão da social-democracia, que propõe a manutenção da instituição da propriedade privada dos meios de produção, mas com regulação do mercado e distribuição de renda pelo instrumento da forte tributação. Em artigos anteriores mostrei que esse modelo entrou em crise terminal em toda parte, especialmente na Europa ocidental, mas também nos EUA e no Japão. Se o distributivismo no âmbito da social-democracia se esgotou, o que suas lideranças estão propondo mundo afora é a sensatez: a simples redução do Estado ou, ao menos, o equilíbrio orçamentário que minimize ou impeça a eclosão de crises fiscais. A Europa já se conformou em ter baixas taxas de crescimento econômico nos próximos anos em troca de estabilidade de preços e de suas relações econômicas internacionais.

 

O PT, pelo contrário, desde a origem recusou-se dar um sentido claro ao que entende pelo conceito “socialismo”, justamente porque sua proposta é diferente, é usar o espaço democrático garantido pela ordem da social-democracia para alcançar seu objetivo de implantação de um governo de vanguarda revolucionária. No seu arco de aliança é preciso destacar a parceria estratégica com o PCdoB, partido tipicamente marxista-leninista, e outros grupos menores que querem a revolução já. E o PT, no poder com Lula, tem seguido fielmente a receita revolucionária de Antonio Gramsci, de fazer a fusão paulatina do partido com os órgãos de Estado. Não podemos nos esquecer também que a política externa de Lula tem sido a de cortejar radicais, de confrontar os EUA, e apoiar os narco-terroristas das FARC, Hugo Chávez, a insana teocracia do Irã, alinhamento automático com a China comunista e apoio a todos os malucos revolucionários da América Latina. O episódio de Honduras foi o mais patético e o mais explícito desse anseio imperialista revolucionário, que só não foi além por causa da dureza da intervenção norte-americana, em boa hora.

 

No citado artigo citado, agora no auge da campanha em que José Serra tenta se diferenciar do afã carbonário de sua adversária, o “sábio” FHC escreveu: “O voto decidirá entre dois modelos de sociedade. Um mais centralizador e burocrático, outro mais competitivo e meritocrático. No geral, ambos os oponentes levarão adiante o capitalismo. Estamos longe dos dias em que o PT e sua candidata sonhavam com o que Lula nunca sonhou: o controle social dos meios de produção e uma sociedade socialista. Mas estamos mais perto do que parece de concretizar o que vem sendo esboçado neste segundo mandato petista: mais controle do Estado pelo partido, mais burocratização e corporativismo na economia, mais apostas em controles não democráticos, além de maior aproximação com governos autoritários, revestidos de retórica popular”.

 

Tal afirmação, além de ser uma óbvia inverdade, é um desserviço à candidatura de José Serra, na medida em que equipara ambas e retira de Dilma Rousseff qualquer ameaça revolucionária. Ambos os candidatos levarão adiante o capitalismo? Isso, além de mentiroso, é contrapropaganda contra o seu próprio partido e o que tem dito o seu candidato. A diferença entre os dois candidatos não se dá em minudências acessórias, mas nos fundamentos filosóficos mais profundos. O PT é marxista-leninista e se propõe fazer na América Latina o que foi perdido no Leste europeu, conforme as atas do Foro de São Paulo.

 

No final do artigo faz pura retórica ao afirmar que as candidaturas não são iguais, depois de torná-las equivalentes no plano mais profundo. O essencial que diferencia ambos os candidatos não é, como ele escreveu: “Há argumentos para defender qualquer dos dois. Mas que não são a mesma coisa, não são. E não porque num governo haverá fartura e noutro, escassez, para pobres ou ricos. E sim porque num haverá mais transparência e liberdade que no outro. Menos controle policialesco, menos ingerência de forças partidário-sindicais. E menos corrupção, que mais do que um propósito é uma consequência.” A diferença essencial, que FHC se recusou a apontar, é que o PT quer fundar um império à moda do que foi o soviético na América Latina, tendo o Brasil como centro.

 

Creio que FHC perdeu uma excelente oportunidade de não apenas defender o seu candidato, José Serra, mas também o Brasil, denunciando as verdadeiras (más) intenções dos grupos políticos abrigados em torno de Dilma Rousseff. O ex-presidente anestesiou o eleitorado que eventualmente venha a ler o artigo sem ter os meios para perceber as mentiras nele contidas. FHC deveria ter dito a verdade: o PT é um perigo que deve ser combatido de todas as formas e denunciado em todos os fóruns.

 

* José Nivaldo Cordeiro, Executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor da ANL – Associação Nacional de Livrarias.

Como citar e referenciar este artigo:
CORDEIRO, José Nivaldo. FHC contraria José Serra. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/fhc-contraria-jose-serra/ Acesso em: 20 abr. 2024