Política

A Caminho do Desastre

 

26 de março de 2010

 

Os jornais de hoje trazem duas notícias, aparentemente desconectadas: mais uma espetacular elevação do déficit da Previdência Social e a inauguração de um shopping center de luxo em Brasília. A cada elevação de salários dos funcionários públicos o efeito cascata sobre a Previdência agiganta o défict. Os ociosos enriquecem, enquanto os que trabalham empobrecem. Outra notícia é que o reajuste proposto pelo governo para os aposentados que ganham mais de um salário mínimo será majorado pelo Congresso Nacional.

 

O céu é o limite para o populismo. A ata da última reunião do Copom revela o que toda gente sabe: a inflação está se aproximando do descontrole. Talvez estejamos vivendo a agonia final do que restou do Plano Real e o seu compromisso com a disciplina fiscal, que nisso consiste todo o Plano. Não é possível ter estabilidade de preços com o Estado gastando com rédea solta.

 

O drama previdenciário está posto e o novo governo a tomar posse no Ano Novo não escapará de lhe dar combate frontal, diga o que disserem os candidatos. Isso implica em cessar reajustes nominais, arrumar maneira de reduzir benefícios e aumentar a contribuição de todos, inclusive dos retirados.

 

O drama está em que os aposentados constituem a maior força político-eleitoral no Brasil. Nenhuma “categoria” terá mais força que eles. Todo o funcionalismo público, por exemplo, está empenhado na manutenção do sistema como ele está constituído. Aqui vemos o sentido da expressão “privatizar o Estado”na sua plena acepção. Em que consiste isso? Em um gigantesco sistema de rapina sobre aqueles que trabalham, via impostos, para repassar os recursos a um contingente crescente de desocupados, que vivem nababescamente. Abrir shopping de luxo em Brasília, cidade que praticamente vive de impostos federativos, é sintoma dessa disfunção abissal, que escraviza quem trabalha para bancar a boa vida dos desocupados.

 

A situação é disfuncional não apenas do ponto de vista moral. É também do ponto de vista político e econômico. Politicamente o déficit previdenciário poderá colocar em xeque a legitimidade do processo democrático, na medida em que as instituições representativas não conseguirem tomar decisões contra o status quo dos aposentados. Do ponto de vista econômico temos o duplo desastre do retorno da inflação e do colapso do balanço de pagamentos. No fundo, estamos vendo o Brasil ser transformado em uma sociedade de rentistas. Mesmo a máxima carga tributária é insuficiente para garantir as “conquistas” dos aposentados. O desastre é certo.

 

A classe política evita discutir o assunto. Toda a gente relevante foi “incluída” no sistema, a começar pelos políticos. Todo mundo tem a sua boquinha na Previdência Social. O benefício privado aqui é imediato e incompatível com a saúde sistêmica da economia e do sistema político. O benefício público da estabilidade de preços é simplesmente ignorado da forma mais egoísta.

 

Esse é o grande nó da economia brasileira. Estamos vendo onde vai dar a hipertrofia do setor público puxada pelo crescimento do funcionalismo e das aposentadorias no caso da Grécia, que está falida. Imaginar uma situação igual para o Brasil nos próximos anos é realista, especialmente depois do reinado de Lula, que elevou as “conquistas” do funcionalismo e dos aposentados para limites impossíveis.

 

Inevitável concluir que, de novo, podemos viver a espiral cambio/salários, ou seja, uma explosão da inflação. Quem viver verá.

 

 

* José Nivaldo Cordeiro, Executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor da ANL – Associação Nacional de Livrarias.

Como citar e referenciar este artigo:
CORDEIRO, José Nivaldo. A Caminho do Desastre. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/a-caminho-do-desastre/ Acesso em: 28 mar. 2024