Política

O poder pelo poder

O poder pelo poder

 

 

Ives Gandra da Silva Martins*

 

 

Carl Schmitt, em seu Conceito do Político, formula teoria das oposições, defendendo a tese de que a Ciência Política é conformada pela oposição entre o amigo e o inimigo. O poder justifica-se por si mesmo e, sem citar, confirma os versos de Rotrou, de que todos os crimes são belos, se o trono é o preço.

 

Nenhum partido personifica melhor a teoria schmittiana do que o PT. Na oposição, defendia a ética política, atacava o fisiologismo, censurava o empreguismo dos amigos dos detentores do poder, exaltava a austeridade fiscal, enaltecia a competência administrativa e apregoava a justiça comutativa e social como seus grandes objetivos políticos, sem deixar de respeitar a lei. No governo, não só esqueceu o que dizia, como suplantou todos os governos anteriores em qualquer desses aspectos.

 

Ética é palavra incômoda, como se percebeu na luta para evitar a CPI do caso Waldomiro; para excluir os nomes dos amigos do rei e incluir os inimigos, na patética CPI do Banestado; para arquivar o processo contra irresponsabilidade da fala presidencial, de que teria escondido crimes ocorridos no governo anterior; ou mesmo na luta para que não se esclareça com profundidade o caso Celso Daniel.

 

No fisiologismo, dá o PT “shows” da arte maquiavélica de governar, pois aceita qualquer tipo de acordo com qualquer tipo de partido, independentemente da ideologia, para manter o trono. Os historiadores futuros terão farto material comparativo para julgar a era petista. As reformulações, conformações e reestruturações ministeriais são a inequívoca prova de que o fisiologismo é o objetivo maior do partido para manter, enquanto o Brasil for uma democracia, o PT no poder.

 

O empreguismo é dramático. Enquanto FHC conseguiu – segundo Suely Caldas, em seu artigo A farra do boi começou (13/3, B2) – reduzir em 180 mil o número de funcionários, o governo Lula contratou 45.580, quase todos em função de sua preferência ideológica, e não por merecimento e competência.

 

A austeridade fiscal não tem no presidente o melhor exemplo. O caríssimo avião comprado por US$ 57 milhões, para ficar no chão – poucas vezes é utilizado – com dispendiosa manutenção; os cartões de crédito que, por segurança nacional, não tem os gastos revelados, mas são fartamente utilizados pelos amigos do poder e pagos pelos contribuintes; a contaminação de outros poderes com o vírus de gastos desnecessários e desproporcionais; e muitas outras formas de desperdiçar o dinheiro público são as notas dominantes do governo.

 

A competência administrativa não é o forte. A grande maioria dos que foram agregados ao poder não tem qualificação profissional adequada. O fato terminou atingindo, inclusive, a própria universidade, com promessa de notável perda de qualidade na pesquisa científica, pela inclusão de favorecidos menos qualificados e a exclusão dos mais qualificados, que são discriminados pelos projetos do MEC. Ao violentar o artigo 3º da Constituição, que não permite nenhum tipo de discriminação, o MEC criou, como disse o ESTADO, a “exclusão dos incluídos” ou, melhor dizendo, a “exclusão dos competentes” pela “inclusão dos incompetentes”. Em outras palavras, no Brasil a ciência não se faz pelo mérito, mas por ideológico assistencialismo. É uma espécie de “meritocracia às avessas”.

 

Em matéria econômica, graças à explosão mundial, o Brasil cresce, mas cresce dramaticamente menos que seus concorrentes emergentes mais próximos. Enquanto crescemos 5,2%, em 2004, a Índia cresceu 8,2%; a Rússia, 8,6%; e a China, 9,6%. Somos, de longe, o pior dos grandes paises emergentes, por força de três causas principais: burocracia inchada e ineficiente, juros excessivos e carga tributária indecente.

 

Por fim, como dizia Miguel Reale em artigo no Estado (Culturalismo revolucionário, 12/3, A2), a teoria gramsciana começa a ficar nítida e descoberta para o país, na prática política, ao financiar movimentos de terroristas no campo, que degradam a lei, desmoralizam as autoridades constituídas e invadem terras públicas e privadas com prévio aviso.

 

Almejam tais cidadãos uma ditadura marxista semelhante à do genocida Fidel Castro, que, sem julgamento, no início de seu governo assassinou milhares de pessoas nos trágicos “paredons”.

 

Não sem razão – tendo em vista a ideologia que sempre acalentaram -, as autoridades governamentais prestam ao ditador cubano reverência permanente, visitando-o no país insular, lutando para que seus médicos, menos preparados, ingressem no Brasil com “status” de médicos muito mais qualificados – e, o que é pior, permitindo que os nossos agentes de inteligência aprendam como investigar a vida dos cidadãos com Cuba, país cuja escola de investigação foi formada no melhor estilo da KGB.

 

Estou convencido de que o PT, no poder, deseja o poder pelo poder. E que, nada obstante, individualmente, cada um de seus líderes continue sendo pessoa agradável, deseja implantar uma ditadura sindicalista, idealizada pelos amigos e correligionários, com limitação de todos os direitos possíveis de seus opositores. É que, afinal, para o PT, Schmitt tinha razão, a política é a arte que opõe o amigo ao inimigo – e o PT sabe quem são os amigos e a quem atribui o estigma de inimigos.

 

* Advogado tributarista, professor emérito das Universidades Mackenzie e UniFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, é presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, do Centro de Extensão Universitária e da Academia Paulista de Letras.

 

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. O poder pelo poder. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/o-poder-pelo-poder/ Acesso em: 19 abr. 2024