Judiciário

Eles, os Juízes, Vistos por um Advogado, de Calamandrei

 

Na minha monografia A Psicologia do Juiz, aponto algumas observações de PIERO CALAMANDREI sobre os juízes:

 

Crítico rigoroso dos juízes em várias situações, mas, em outras, extremamente compreensivo, faz observações importantes para nossa reflexão:

 

A irascibilidade é um defeito grave. Assim indaga ele:

 

O que é pior para o bom andamento da justiça: um advogado verboso ou um magistrado irascível? (p. 43)

 

A capacidade de sorrir é primordial para gerar confiança naqueles que nos procuram, muitas vezes como sua última esperança:

 

Para nos entendermos como pessoas sensatas, é preciso estarmos dispostos a sorrir também: com um sorriso poupamo-nos tantos discursos inúteis! (p. 45)

 

A soberba é um defeito que somente alguns têm ou é geral? A afirmação é uma acusação séria:

 

Grave defeito num juiz é a soberba: mas talvez seja uma doença profissional. (p. 61)

 

A intuição é um dom maravilhoso, que encurta o caminho para a decisão e aponta o rumo certo, convencendo as duas partes litigantes:

 

Juiz ótimo é aquele em que prevalece, sobre a cauta cerebralidade, a pronta intuição humana. O senso de justiça pelo qual, sabidos os fatos, logo se sente quem está com a razão. (p. 181)

 

Se avançarmos demais na reflexão seremos um PAUL MAGNAUD ou ficaremos sem condição de julgar? Tout comprendre, c’est tout pardonner (?) CALAMANDREI nos coloca num beco sem saída?

 

Debaixo da ponte da justiça passam todas as dores, todas as misérias, todas as aberrações, todas as opiniões políticas, todos os interesses sociais. E seria bom que o juiz fosse capaz de reviver em si, para compreendê-los, cada um desses sentimentos: experimentar a prostração de quem rouba para matar a fome ou o tormento de quem mata por ciúme; ser sucessivamente (e, algumas vezes, ao mesmo tempo) inquilino e locador, meeiro e proprietário de terras, operário em greve e industrial. Justiça é compreensão, isto é, abarcar e conciliar os interesses opostos: a sociedade de hoje e as esperanças de amanhã, as razões de quem a defende e as de quem a acusa. Mas se o juiz compreendesse tudo, talvez não pudesse mais julgar: tout comprendre, c’est tout pardonner. Talvez, para que possa alcançar os limitados objetivos que nossa sociedade lhe atribui, a justiça necessite, para funcionar, de horizontes não demasiado vastos e de um certo espírito conservador, que pode parecer mesquinharia. Os horizontes do juiz são marcados pelas leis; se o juiz compreendesse o que há além, talvez não pudesse mais aplicá-las com tranqüilidade de consciência. É bom que não perceba que a função que nossa sociedade atribui à justiça é, com freqüência, a de conservar as injustiças consagradas nos códigos. (pp. 280-281)

 

Da minha parte, tenho procurado refletir sobre as acusações desse grande jurista e tentado vencer minhas deficiências…

 

 

* Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).

Como citar e referenciar este artigo:
MARQUES, Luiz Guilherme. Eles, os Juízes, Vistos por um Advogado, de Calamandrei. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/judiciario/eles-os-juizes-vistos-por-um-advogado-de-calamandrei/ Acesso em: 28 mar. 2024