Judiciário

Mediação Judicial

Mediação Judicial

 

 

Bárbara Diniz*

 

 

RESUMO

 

Análise do primeiro caso de mediação forense no Distrito Federal realizado pelo SEMFOR – Serviço de Mediação Forense do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT, realizada por meio da apresentação do caso e da análise das estratégias e dos argumentos e da efetividade das decisões envolvidas. Verifica-se que a mediação, como forma pacífica de resolução de conflitos, é uma realidade passível de alcançar soluções criativas e encerrar lides. Contudo, não pode ter como objetivo central apenas um acordo, sendo importante o debate sobre qual modelo aplicar junto aos tribunais e como deve se dar a preparação dos profissionais, em especial advogados, em relação a esse novo processo,

 

Palavras-chave: Mediação. Mediação Judicial.TJDFT. SEMFOR. CRNC.

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho busca analisar o primeiro caso de mediação realizado pelo SEMFOR – Serviço de Mediação Forense do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT.

 

A título de esclarecimento, o SEMFOR nasceu a partir da Resolução nº. 02, de 22 de março de 2002, que instituiu, no âmbito de TJDFT, o Programa de Estímulo à Mediação. Na ocasião, foi escolhida a cidade-satélite de Taguatinga – DF para abrigar o projeto-piloto, que funcionava dentro do fórum local.

 

Dessa forma, a escolha do caso foco deste trabalho pareceu fácil. Sua análise, porém, mostrou-se mais complexa do que inicialmente previsto. Isso porque, apesar de o processo em análise (processo de dissolução de sociedade) ter sido rapidamente concluído graças à atuação do SEMFOR, o caso possui uma origem bem mais complexa (um processo litigioso de separação judicial), além de ter ramificações na circunscrição especial de Brasília (processo de anulação de escritura pública e de reparação de danos), onde não havia atuação do SEMFOR. Em outras palavras, um único processo (e sua cautelar) nasceu de outro e deu origem a, pelo menos, mais dois, totalizando um mínimo de cinco processos intimamente interligados, que chegaram até a interposição de agravo de instrumento em razão de denegação de prosseguimento de recursos especial e extraordinário.

 

Considerando que o objeto do presente trabalho é o caso de mediação forense, a análise a seguir procura direcionar sua atuação para esse processo específico. Contudo, não há como desconsiderar os demais processos, principalmente porque a argumentação e as estratégias utilizadas são similares, conforme se verificará, justificando a mediação como meio de resolução do conflito. Ocorre, que, até o momento, apesar de institucionalizada a mediação no âmbito do fórum de Brasília, não houve atuação perante qualquer caso.

 

 

2.       APRESENTAÇÃO DO CASO[1]

Em nove de maio de 1992, João José da Rocha, empresário, casou-se em regime de comunhão parcial de bens com Maria Da Silva, também empresária. Poucos meses depois, em setembro do mesmo ano, João  iniciou sociedade com Bruno Rocha Cândido, a VCA Comércio de Vidros e Acessórios Ltda, sendo Joãosócio majoritário e administrador.

 

Quatro anos depois, em 1996, Joãoadquiriu um imóvel onde passou a funcionar uma outra empresa, a CJR, tendo como objeto social a compra e venda de ferro velho, da qual eram sócios sua esposa, Maria e seu cunhado Vitor Da Silva. Em razão do regime de casamento, o imóvel onde funcionava a empresa constituía patrimônio comum do casal.

 

No ano seguinte, em maio de 1997, a VCA efetuou contrato de arrendamento mercantil (leasing) para “uso próprio” com o Banco de Brasília – BRB[2]. Para a contratação, João e Bruno foram fiadores, sendo alienado fiduciariamente o imóvel onde funcionava a CJR. Conforme cláusula padrão, a propriedade retornaria aos antigos proprietários (João e Maria) logo após o pagamento integral do financiamento.

 

Pouco depois, Vitor Da Silva teria pagado dívidas da CJR. Em razão disso, Maria e Joãolhe teriam repassado, como compensação, o imóvel oferecido em garantia no contrato de arrendamento mercantil da VCA. Por isso, em oito de junho de 2000 foi feita a opção de compra para Vitor Da Silva perante o BRB. No documento, Joãoapareceu como único representante da VCA, ainda que, um ano antes, em dezessete de agosto de 1999, a consolidação das alterações do contrato social tivesse estabelecido que Bruno e Joãoseriam co-administradores, com igual participação.

 

A transferência, porém, deu-se por meio de instrumento particular, sem registro e sem autorização conjugal de Maria. Ainda assim, em 30 de junho, o BRB, ao invés de devolver o imóvel a seus antigos donos (Maria e João), transferiu-o a Vitor por meio de escritura pública de compra e venda, lavrada em cartório de Notas de Taguatinga – DF.

 

No ano seguinte, em dezessete de outubro de 2001, Bruno saiu da sociedade e Vitor Da Silva, cunhado de João, passou a integrá-la como sócio minoritário. No documento de alteração do contrato social, Joãotornara-se sócio majoritário, cabendo-lhe gerência, administração e uso da denominação social, além de direito de prolabore.

 

Em 2002, Joãoe Maria iniciaram processo litigioso de separação judicial, que transcorreu na 3ª Vara de Família de Taguatinga – DF. Entre os bens mencionados para partilha não constou o imóvel transferido a Vitor. Em razão disso, em oito de julho de 2002, Joãoingressou com ação de anulação de escritura pública em face de Vitor e do BRB, solicitando, ainda, suprimento de outorga uxória e adjudicação compulsória do imóvel, com pedido de antecipado de tutela para impedir o registro, que ainda se encontrava pendente. Como a ação apresentava litisconsórcio passivo com um banco estatal, o juiz declinou da competência para a vara de fazenda pública e encerrou o processo sem julgamento do mérito.

 

Pouco depois, em cinco de novembro de 2002, Vitor deu entrada em ação cautelar de arrolamento de bens e ação de dissolução de sociedade, em razão do fim da affectio societatis pelo ingresso com a ação de anulação de escritura pública. O pedido na ação principal solicitava a declaração de dissolução de sociedade e alienação judicial dos bens a serem arrolados na cautelar. Com isso, foi designada audiência de justificação para dez de dezembro do mesmo ano, quando foi apresentado o SEMFOR – Serviço de Mediação Forense e todos concordaram com a tentativa de mediação, até então inédita perante esse tribunal.

 

A primeira sessão ocorrera no dia seguinte, em onze de dezembro, culminando em acordo quanto à ação de cautelar de arrolamento de bens. Em razão do sucesso, as próprias partes solicitaram nova sessão e, em vinte e sete de fevereiro de 2003, Vitor deixou de integrar a sociedade da VCA, Bruno retornou, novamente como co-administrador. Em seis de março foi apresentado pedido de homologação do acordo nos demais processos e o encerramento da lide se deu com a homologação em vinte e oito de abril de 2003.

 

Apesar disso, em quatorze de julho de 2002, foi distribuído o processo de anulação de escritura pública em face do BRB e de Vitor Da Silva, a fim de que o imóvel retornasse ao domínio de Maria e Vitor e, com isso, pudesse haver a partilha junto ao processo de separação litigiosa do casal. Esse processo foi concluído em primeiro de junho de 2007 com a improcedência do pedido, tendo, porém, alcançado a fase de interposição de Agravo de Instrumento em Recurso Especial e Extraordinário.

 

Nesse meio tempo, ainda em onze de março de 2004, Joãosaiu da VCA, permanecendo Bruno como administrador, então com 90% da cotas sociais. No ano seguinte, em oito de agosto de 2005, a VCA Comércio de Vidros e Acessórios (tendo como seu representante Bruno Rocha Cândido) ingressou com ação de reparação de danos em face do BRB, de Vitor, de Maria Da Silva e de João, processo esse ainda em curso.

 

 

3.       ARGUMENTAÇÃO E ESTRATÉGIA

 

Os aspectos que parecem influenciar as estratégias e a argumentação das partes na resolução do conflito ou na tentativa de convencimento do juiz nos processos de anulação de escritura pública, arrolamento de bens e dissolução de sociedade foram:

 

a.         Existência de um conflito de fundo: a separação litigiosa do casal proprietário do imóvel referente ao contrato de leasing;

b.         O conteúdo afetivo e emocional da relação entre as partes.

 

Assim, Joãoteria ingressado com a primeira ação, em oito de julho de 2002, em face do BRB e de Vitor pelo fato de o imóvel não figurar entre os bens a serem partilhados no processo de separação litigiosa, sendo seu objetivo impedir o registro da escritura de compra e venda do imóvel. Para tanto, seus argumentos foram fundados em três eixos:

 

a.  O documento seria particular, sem registro no cartório de imóveis, ferindo dispositivos do então Código Civil:

Art. 82 – A validade do ato jurídico requer agente capaz (art. 145, I), objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei (arts. 129, 130 e 145).

Art. 130 – Não vale o ato, que deixar de revestir a forma especial, determinada em lei (art. 82), salvo quando esta comine sanção diferente contra a preterição da forma exigida.

Art. 134 – É, outrossim, da substância do ato a escritura pública: (…  )

II – nos contratos constitutivos ou translativos de direitos reais sobre imóveis de valor superior a cinqüenta mil cruzeiros, excetuado o penhor agrícola

Art. 145 – É nulo o ato jurídico: (…)

III – quando não revestir a forma prescrita em lei (arts. 82 e 130);

b. Não houve autorização conjugal, conforme determinação do artigo 235, I do então Código Civil, pois Joãoteria assinado como representante da VCA;

c. O outorgante seria a própria sociedade VCA, que não era proprietária do imóvel, não possuindo poderes para a transferência.

 

Apesar de os proprietários originários do imóvel serem Joãoe Maria, não houve litisconsórcio. A argumentação dos advogados de Joãofoi de que Maria teria se recusado em razão de “conluio” com o irmão a fim de que Joãofosse prejudicado na partilha dos bens. Daí o pedido de suprimento de sua autorização pelo art. 237 do então Código Civil.

 

A argumentação de “conluio” será outras vezes mencionada, evidenciando o aspecto emocional da lide e o conflito de fundo, a ponto de permitir a confissão de negócios simulados (art. 102, I, do Código Civil) como estratégia processual: Vitor não teria condições financeiras para adquirir o imóvel, pois não possuiria rendimentos próprios, sendo a procuração apenas um meio utilizado para alcançarem um fim, realizado na base da “confiança” e com expressa determinação de ser futuramente desfeito. Como esse processo possuía litisconsórcio passivo com o BRB – Banco de Brasília foi encerrado sem julgamento do mérito em prol de uma das varas de fazenda pública do Distrito Federal.

 

Quanto a Vitor, sua estratégia foi similar em relação a mencionar aspectos emocionais. Assim, em cinco de novembro de 2002, foi dado entrada em ação cautelar para arrolamento de bens, baseada na argumentação de fim do affectio societatis e no risco de extravios. A ação de dissolução de sociedade reproduziu os argumentos anteriores e acrescentou que Vitor teria tentado vender suas cotas a Joãopor R$ 50.000,00, sendo ignorado. Percebe-se aqui um primeiro movimento negocial: a parte mostra-se disposta a negociar, apresentando lance.

 

Em resposta, Joãocontestou e ingressou com nova ação, impugnando o valor da causa, permanecendo, porém, na contestação, a estratégia de confessar negócios simulados:

… embora o suplicante seja um sócio minoritário (…), tal aconteceu simplesmente por ser (…) cunhado do requerido e tendo este necessidade do nome de uma pessoa para constituição da sociedade comercial, colocou-o graciosamente como sócio cotista, por ser na época pessoa da sua inteira confiança.

Em nenhum momento o autor integralizou referido capital social, mesmo porque (…) não dispunha de recursos financeiros para tal, por nunca ter exercido nenhuma atividade profissional ou possuir economia suficiente para tal finalidade.

(…) procura o autor um locupletamento sem causa, embora a sua postulação possua suporte legal no contrato social, [pois] tem pleno conhecimento de que jamais integralizou ou disponibilizou qualquer centavo para constituição da sociedade comercial ou mesmo contribuiu de qualquer maneira para o crescimento econômico e financeiro da mesma (sic) (Processo nº 2002.07.1.017659-0, p.31).

Quanto ao movimento negocial iniciado por Vitor, Joãoexpressou interesse na compra das cotas, a fim de que não houvesse dissolução da sociedade, nos termos do art. 355 do Código Comercial, mas questionou o valor pedido tendo por base valores de estoque, saldos bancários e débitos que indicariam que a empresaria operaria “no vermelho”. A menção ao Código Comercial se deu porque, à época, ainda estava em vacatio legis o Código Civil de 2002 que revogou essa parte do Código Comercial.

 

Vitor apresentou réplica em treze de fevereiro de 2003 declarando a intempestividade da peça, reafirmando a integralização do capital social e questionando a empresa atuar “no vermelho”:

A empresa (…) é a mais rentável do ramo (…), tanto é assim, que (…) a venda mensal (…) ultrapassa a cifra de R$ 90.000,00 (…).

O réu alega (…) a empresa tem um estoque no valor de apenas R$ 150.000,00 (…), mas (…) não acosta nenhum documento nos autos, o que já comprova que é inverídica a sua alegação, pois na verdade, a empresa tem um estoque de mais de R$ 500.000,00 (…), razão por que as 5.000 cotas do autor valem R$ 50.000,00 (…).

E se a empresa VCA vende mensalmente a quantia de mais de R$ 90.000,00 (…) é ilógico que ela tenha um estoque de apenas R$ 150.000,00 (…). (Processo nº 2002.07.1.017659-0, p.75).

Vitor também mencionou possibilidade de “caixa dois”, por ausência de depósitos em cheque; existência de cofres com dinheiro que poderia estar sendo depositado na conta pessoa física de João; e a abertura de outras sociedades pelo réu, com possível esvaziamento do estoque, sugerindo necessidade de vistoria pelo Ministério Público (mas sem apresentar os nomes das empresas). Por fim, impugnou os documentos apresentados, justificou o valor pedido por suas cotas (R$ 50.000,00) por considerar ser esse o valor real, sem apresentar provas de tal, e indicou a possibilidade de comprar as cotas do réu, desde que os documentos sobre a real situação empresarial fossem apresentados.

 

Considerando esses pontos, pode-se dizer que a estratégia tomada pelos advogados das partes foi de ingressar com sucessivas ações ao invés de provocar incidentes processuais no processo originário, de separação litigiosa. No entanto, a argumentação utilizada (deficiente em aspectos técnicos, com baixa produção probatória, abordando aspectos emocionais do conflito, inclusive com justificação para simulações) reforça a importância de um conflito de fundo, pois não é baseada em dados técnicos, mas em tergiversações, declarações que não podem ser comprovadas, com ênfase na situação de “relação de confiança”, o que sugere que o processo judicial foi utilizado como um subterfúgio para tentar obrigar uma negociação ou acordo dentro da posição de cada parte, não representando a busca real de resolução.

 

De fato, verifica-se que as partes trocaram lances negociais via petições, buscando o “melhor preço”, um tentando comprar pelo menor e o outro tentando vender pelo maior. No entanto, vigorou uma negociação distributiva[3], com destaque para a tergiversação, com apresentação de dados que não têm relação com o objeto principal e de valores sem comprovação de origem, apenas para valorizar as posições e permitir a continuação do processo.

 

 

4.       DECISÃO E EFETIVIDADE

 

A primeira decisão foi a designação de audiência de justificação na cautelar de arrolamento de bens, em dez de dezembro de 2002. Na audiência, o juiz considerou que a relação societária possuía um componente pessoal muito forte, comportando uma tentativa de mediação, e, por isso, esclareceu sobre o SEMFOR e sobre seu ineditismo e as partes concordaram com o procedimento.

 

A primeira sessão de mediação ocorreu no dia seguinte, em onze de dezembro de 2002, tendo as partes logo alcançado acordo quanto ao processo de arrolamento de bens:

O réu concorda em dar em garantia a eventual execução futura na ação principal, 50% do imóvel situado na QND 36, lt. 29, Taguatinga Norte, relativos à meação do autor e sua fração ideal nessa propriedade.

Com relação às questões tratadas nos autos da ação de dissolução de sociedade, concordam as partes a se submeter ao processo de mediação para, eventualmente, compor a controvérsia (Processo nº 2002.07.1.010465-0, p. 95)

 

Com isso, a sentença de homologação e de extinção da ação cautelar considerou que o SEMFOR “bem geriu o objetivo para o qual foi criado, estruturando o conflito de interesses em observância aos desejos das partes” (Processo nº 2002.07.1.010465-0, p. 98), gerando uma composição capaz de dar satisfatividade quanto ao objeto da ação.

 

A sentença ainda considerou que questões cíveis e comerciais são perfeitamente adequadas à mediação forense, dependendo “da especificidade da relação jurídica existente nos autos” (idem; grifo nosso), sendo responsabilidade do juiz avaliar se o litígio pode ser mediado. Qual seria a especificidade capaz de levar uma lide à mediação não foi esclarecida, mas pode sugerir o “aspecto pessoal forte” existente na relação societária, conforme a ata da audiência de justificação. Essa idéia pode ser reforçada ao se considerar que na sentença do processo de anulação de escritura pública em face de Joãoe do BRB (que tramitou em Brasília) a carga emocional também foi percebida. Contudo, ao ser analisado dentro de um processo judicial e numa sentença, o aspecto preponderante passa a ser a simulação:

O ponto nodal da demanda refere-se ao fato de que (…) VITOR DA SILVA (…) também é sócio da empresa, é irmão da ex-esposa do autor. Verifica-se nos autos que o autor já estava de má-fé, porque ao invés de retornar o imóvel que estava em nome do casal, para este, após a quitação da dívida não o fez; não se sabe a título de quê o autor transferiu o imóvel para o seu cunhado VITOR DA SILVA (…)[4].

Agora, após a separação judicial (…), o autor vem (…) alegar que o ato jurídico é nulo pela simulação. Ocorre que quem elaborou a própria simulação foi o próprio autor. Assim, está pretendendo se valer do próprio dolo para anular o negócio jurídico por ele simulado[5] (grifo nosso. Processo nº 2003.01.1.056668-7, p. 187).

Quanto ao desejo das partes de tentar nova mediação, na dissolução de sociedade, foi atendido com a determinação de que todos os atos necessários fossem feitos com urgência para “facultar às partes oportunidade (…) de realizar nova sessão de mediação”.

 

Não há informações sobre outras sessões, porém, em seis de março de 2003 as partes apresentaram termo de transação na ação de dissolução de sociedade, com pedido de extinção do feito.

O Réu da presente demanda [João], pagará os direitos decorrentes da presente ação, representados pelos valores das cotas da Empresa objeto da demanda, a quantia de R$ 20.000,0 (vinte mil reais)  em moeda corrente do país, dando de forma recíproca plena e rasa quitação ao objeto da presente ação, para não mais reclamar em juízo e/ou fora dele.

O Réu, em face do acordo, assume perante o fisco Estadual e Federal todos os débitos ali existentes, bem como todas as dívidas (…), débitos trabalhistas existentes e futuros, desonerando o Autor de quaisquer responsabilidades de valores da empresa desde a sua constituição até a presente data.

O Réu compromete-se no prazo de 05 (cinco) dias a contar do (SIC) presente data, a proceder a alteração contratual junto à Justa de Comércio bem como junto às Receitas Estadual e Federal, retirando o nome do Autor da condição de sócio da empresa objeto da presente demanda (…).

Nos demais processos, que não permitiam o uso da mediação, o litígio continuou, estando ainda um pendente de resolução final: o processo referente a pedido da VCA (representada por Bruno) de reparação de danos em face de João, Vitor, Maria e BRB.

 

 

5.       ANÁLISE E DISCUSSÃO

 

Os chamados meios alternativos de solução de disputas (ADR – Alternative Dispute Resolution) são formas de solucionar conflitos fora do âmbito estatal. Apesar da referência à alternatividade, eles já existiam antes da adjudicação, razão pela qual se pode considerar que são métodos originários, sendo o meio estatal subsidiário à solução de disputas[6].

 

De fato, antes do Estado, conflitos eram resolvidos pela imposição da vontade do mais forte ou pela concessão de uma parte (autotutela ou autodefesa). Como as próprias partes resolviam seus conflitos, diz-se que havia autocomposição (AZEVEDO, 2003, p. 153). Com o tempo, as decisões passaram a ser tomadas por um grupo especial (sacerdotes, chefes, anciãos), cuja decisão possuía força obrigatória (EGGER, 1997). Com isso surgiu a chamada heterocomposição, ou seja, a resolução da disputa por valores impostos por um terceiro.

 

Com o fortalecimento do Estado e surgimento de direitos e garantias da pessoa, surge a idéia de que apenas pela adjudicação, no qual certos pressupostos, direitos e garantias estivessem presentes, é que os conflitos poderiam ser resolvidos. No entanto, o aumento de garantias e direitos e a ineficácia social em conter diversos tipos de conflitos, antes sujeitos ao controle da própria comunidade, fizeram com que o processo judicial passasse ser o meio de resolução de todo e qualquer tipo de conflito e, conseqüentemente, ele se mostrou incapaz de oferecer uma resposta adequada e em tempo hábil a todos eles (COSTA, 2004, p. 199).

 

Com isso, passou-se a acreditar que o problema seria o próprio processo, que polarizaria as partes e estabeleceria uma posição de competição destrutiva. Em conseqüência, passou-se a acreditar que o novo paradigma seria a busca por colaboração e compromisso e o abandono das tendências de rivalidade e competição, que seriam inerentes ao processo judicial (LOVE, 2004, p. 107). Isso fez com que ganhassem importância os chamados métodos alternativos (negociação, mediação, conciliação, arbitragem), então conhecidos pela sigla ADR (Alternative Dispute Resolution), reconhecida mundialmente desde a década de 70.

 

Ou seja, a partir da década de 70 do século XX, formas auto e heterecompositivas são redescobertas e ganham força como métodos válidos para a resolução de conflitos. No Brasil, porém, apesar de a conciliação estar presente desde as Ordenações do Reino (TAVARES, 2002, p. 31-32), somente a partir da década de 90 é que negociação, mediação e arbitragem passaram a ser considerados como formas de resolução de conflito. Quanto a isso, Grinover (1992, p. 26) declarou que “se o que importa é pacificar, torna-se irrelevante que a pacificação venha por obra do Estado ou por outros meios, desde que eficientes”. 

 

Apesar de terem surgido como forma de se evitar um judiciário lento e moroso, a idéia de alternatividade está perdendo terreno, pois ela pode levar a crer que esses métodos seriam apenas subsidiários ao processo judicial, pois, de acordo com Costa (2004, p. 162), a “noção de que é preciso valorizar métodos alternativos significa um reconhecimento que o modo jurisdicional é o mecanismo padrão de resolução” (grifo no original).

 

Ocorre que essa constatação não espelha a realidade, pois os métodos não judiciais, como simples instrumentos na resolução de conflitos também podem ser úteis para certas tarefas, mas inúteis ou até perversos para outras (COSTA, 2004, p. 167), constituindo-se, conjuntamente à adjudicação, em possibilidades de administração e resolução de conflitos de acordo com suas peculiaridades. Assim, atualmente, há uma tendência a se abandonar a expressão meios alternativos em prol de meios privados ou extrajudiciais, para o que antes eram os ADR, ou sistema de resolução de conflitos, para englobar toda a gama de possibilidades e métodos disponíveis, inclusive o processo judicial.

 

Seja como for, as pessoas podem lidar de diversas formas com o conflito. Podem, por exemplo, evitá-lo, não se posicionando e mantendo-se neutras; isolando-se e não conversando ou afastando-se e encerrando o relacionamento. Podem, ainda, ceder ou se sacrificar para manter o relacionamento, satisfazendo os interesses de uma outra pessoa à custa de suas próprias necessidades (MOORE, 1998, p. 22), numa autocomposição clássica.

 

              Podem, no entanto, usar a negociação, processo pelo qual as próprias partes (ou seus representantes) procuram alcançar uma troca de valores capaz de satisfazer os interesses de todos os envolvidos (ALBRECHT, 1995, p. 38). Nesse caso, a negociação é tida como o meio mais informal e célere do sistema, pois nela não existem regras, tradições, fórmulas, métodos racionais ou o poder de uma autoridade, cabendo às partes total controle sobre o procedimento e o resultado final. A negociação, porém, possui duas abordagens:

 

a.        Distributiva: as partes buscam maximizar seus ganhos à custa do outro, desejando ganhar ou não deixar que o outro ganhe. Ou seja, quanto mais um ganha, mais o outro perde. Para isso, as partes tomam posições e as abandonam, sucessivamente, até chegarem a um acordo, mas a tomada de decisões é difícil e demorada, pois, para aumentar as chances de acordo, sai-se de posições extremas, sendo concessões feitas apenas o suficiente para continuar o processo (FISHER, 1994, p. 21-24). Como as partes se vêem como adversários, é comum o uso de técnicas desleais para obter maiores concessões e, por outro lado, protegerem-se.

b.        Cooperativa: busca-se ampliar a extensão das alternativas, de forma que todas as necessidades sejam satisfeitas da melhor forma possível, insistindo-se em resultados baseados em padrões justos para produção de um acordo satisfatório. A cooperação tem muitas vantagens: baixo custo operacional; possibilidade de soluções criativas e desnecessidade de se pautar as ofertas em parâmetros apenas legais (FISHER, 1994, p. 25-32). Além disso, o relacionamento entre as partes tende a melhorar, pois todos os interesses são considerados de forma a não restar litigiosidade remanescente[7].

 

              Às vezes, as partes envolvidas em conflito podem necessitar da ajuda de um terceiro, razão pela qual podem fazer uso da mediação e da conciliação, métodos pelos quais alguém imparcial e de fora do conflito colabora para que se chegue a um resultado satisfatório.

 

            Pessoas em conflitos podem decidir também por métodos que diminuam seu controle sobre o resultado final e aumentem o poder de terceiros (MOORE, 1998, p. 24). Nesse caso, podem escolher a arbitragem ou a adjudicação, métodos baseados em decisões de competição, ou seja, em que quanto mais um ganha mais o outro perde. Apesar de ambos serem heterocomposição, a arbitragem é um processo privado no qual um terceiro, imparcial, escolhido pelas partes, toma uma decisão de caráter obrigatório, isto é, com a mesma força de uma sentença judicial. Na adjudicação, uma autoridade institucionalizada (juiz), com poder de coerção e atuando como representante do Estado, emite uma decisão de caráter obrigatório (sentença) dentro de um processo em geral público.

 

Graficamente, o sistema atual em vigor no Brasil pode ser assim demonstrado[8]:

 

Sistema de Resolução de Conflitos

 

Autocomposição

Mais Informal

^

I

v

Mais Formal

Negociação

Mediação e conciliação

 

Heterocomposição

Arbitragem

Processo Judicial

 

 

 

 

 

 

 

 

TAVARES (2002, p. 41-47) apresenta outros métodos (ombudsman, mini-trial, summary jury trial e rent a judge) passíveis de aplicação no Brasil, por ausência de vedação, porém mais comuns no sistema norte-americano, não sendo, por isso, aqui apresentados.

            Diante de todas essas possibilidades passa a ser importante ao profissional jurídico identificar cada um desses métodos, suas características, especialidades e os tipos de conflitos a ele direcionados. Considerando o objeto de estudo do presente trabalho, passa-se agora ao estudo da mediação, cujo conceito pode variar entre os diversos autores:

(…) interferência em uma negociação ou em um conflito de uma terceira parte aceitável, [com] poder de decisão limitado ou não autoritário e que ajuda as partes a chegarem voluntariamente a um acordo, mutuamente aceitável com relação às questões em disputa (MOORE, 1998, p. 28).

 É um processo pacífico de resolução de conflitos em que um terceiro independente e imparcial coordena reuniões, conjuntas ou separadas, com as partes envolvidas no conflito (SALES, 2007, p. 34, apud Adolfo Braga Neto).

(…) autocomposição assistida (…) pelo qual [um terceiro] facilita a comunicação (…), almejando a solução e a prevenção de conflitos (SALES, 2003, p. 40).

(…) intervenção de um terceiro imparcial e neutro, sem qualquer poder de decisão, para ajudar os envolvidos em um conflito a alcançar voluntariamente uma solução mutuamente aceitável (CALMON, 2007, p. 119).

Como se verifica, todos concordam que mediação é um processo no qual um terceiro imparcial ajuda as partes a resolver a disputa ou a planejar uma transação. Entretanto, na realidade, suas metas e métodos variam tanto que essa generalização nos leva a ter uma idéia enganosa sobre o tema. Na realidade, os objetivos e a forma de agir de mediadores podem variar de acordo com a escola ou modelo de mediação existente:

 

a.       Tradicional linear[9]: também conhecido como modelo clássico, de Harvard ou focado na resolução de problemas ou ainda mediação para acordos, busca a eliminação de impasses e vê a mediação como uma extensão da negociação e seu objetivo como a busca de um acordo. O mediador, nesse caso, dentro de um processo linear, claro, e em etapas pré-estabelecidas, apenas ajuda as partes a chegar a um acordo satisfatório para todos, em um amplo espectro de atuação. Dentro dessa vertente, mediação é o termo genérico de toda intervenção de terceiro em um conflito, sendo o termo “conciliação” um objetivo natural do mediador.

b.      Transformativo[10]: criado a partir da teoria proposta por Robert A. Barush Bush e Joseph F. Folger, não vê o acordo como objetivo do processo, mas apenas uma das diversas possibilidades da mediação, pois busca o diálogo (comunicação) entre as partes. Assim, o foco deixa de o acordo e passa a ser as pessoas ou no tipo de conflito. O objetivo do mediador é colaborar para que haja o reconhecimento de necessidades, possibilidades e capacidade de escolha e de decisão, das próprias partes e do outro, promovendo-se a transformação na relação e viabilizando, como conseqüência natural, o acordo. Dentro desse modelo, há uma grande diferença entre o que seria conciliação e mediação, pois aquela seria o modelo centrado no acordo, e essa o modelo centrado nas pessoas ou no conflito.

c.       Circular-narrativo: criado por Sara Cobb (apud SUARES, 2002, p. 59), procura unir os dois modelos anteriores, focando-se tanto no conflito quanto no acordo. Parte da idéia de que as pessoas e o conflito, bem como sua história, não podem ser vistos isoladamente, mas como inter-relacionados a um conjunto de relações dentro de um todo maior (ALMEIDA, sd). Dentro dessa vertente, o pensamento sistêmico, a teoria das narrativas[11] e o enfoque em redes sociais são as bases para a atuação do mediador. Costa (2004, p. 177) considera o modelo focado também no conflito, constituindo-se em variante do modelo anterior e não um modelo distinto.

 

Atualmente, no Brasil, todos esses modelos co-existem conflitando-se uns aos outros, havendo grande discussão sobre o real conceito de mediação e, por tabela, o conceito de conciliação, sendo que a mediação, como método de resolução de conflitos, pode inclusive ser questionada em face do art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal, que determina que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

 

            Quanto a esse ponto, porém, pode-se considerar o mesmo argumento utilizado a favor da lei de arbitragem (Lei nº 9.367, de 23 de setembro de 1996)[12]: a prestação jurisdicional constitui direito dos jurisdicionados, mas não impõe o dever de levar ao conhecimento do Poder Judiciário qualquer contenda que se desenvolva entre as pessoas. O princípio, na verdade, estabelece que o legislador não pode elaborar leis que excluam a apreciação, pela via jurisdicional, de lesão ou ameaça de direito, mas permite às partes lidar livremente com suas demandas, dentro do princípio de que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (art. 5º, II, CF/88).

 

Aliás, ainda que não haja legislação específica sobre a mediação, salvo sobre a conciliação (Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, que cria os Juizados Especiais Cíveis), há dispositivos legais relacionados à mediação de conflitos no âmbito da Justiça do Trabalho:

MEDIDA PROVISÓRIA No 1.982-76, DE 26 DE OUTUBRO DE 2000.

Dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa e dá outras providências.

Art. 4o Caso a negociação visando à participação nos lucros ou resultados da empresa resulte em impasse, as partes poderão utilizar-se dos seguintes mecanismos de solução do litígio:

I – mediação;

 

MEDIDA PROVISÓRIA No 1.950-70, DE 16 DE NOVEMBRO DE 2000.

Dispõe sobre medidas complementares ao Plano Real e dá outras providências.

Art. 11. Frustrada a negociação entre as partes, promovida diretamente ou através de mediador, poderá ser ajuizada a ação de dissídio coletivo.

§ 1o O mediador será designado de comum acordo pelas partes ou, a pedido destas, pelo Ministério do Trabalho e Emprego, na forma da regulamentação de que trata o § 5o deste artigo (grifo nosso).

 

Em outras palavras, a mediação constitui-se método pleno de aplicabilidade, tanto que o caso em questão foi tratado a partir de sua institucionalização, dentro de um Tribunal. De fato, o Serviço de Mediação Forense do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (SEMFOR – TJDFT) nasceu a partir da Resolução nº. 02, de 22 de março de 2002 (vide anexo), que instituiu o Programa de Estímulo à Mediação.

 

A título de esclarecimento, o projeto-piloto (no qual ocorreu o caso ora em análise) se desenvolveu inicialmente em apenas quatro varas: 1ª e 2ª Varas de Família, Órfãos e Sucessões e 1ª e 3ª Varas Cíveis, todas da circunscrição judiciária de Taguatinga, cidade-satélite do Distrito Federal[13], com os seguintes objetivos[14]:

 

– Aumentar o poder de decisão das partes sobre as possíveis soluções para suas próprias lides;

– Incentivar e inserir a utilização da técnica da mediação nos procedimentos judiciais, ampliando a possibilidade de resolução de controvérsias com a conseqüente pacificação das partes;

– Promover uma significativa diminuição do tempo de espera da tramitação do processo;

– Diminuir o volume de processos em tramitação nas Varas Cíveis e de Família.

Para tanto, os procedimentos para aplicação da mediação eram[15]: um juiz de direito encaminhava o caso e, a partir de então, o próprio SEMFOR entrava em contato com as partes e advogados para explicar o processo e marcar data e horário para realização da sessão. Em seguida, o processo era devolvido à vara de origem, o caso distribuído entre os mediadores e era realizada comunicação às partes e advogados da data e hora definitivas, momento em que também eram dados outros esclarecimentos. A sessão ocorria em sala especialmente preparada[16], seguindo o modelo tradicional linear, sendo que, ao seu término, era enviado memorando à vara de origem do processo com uma das seguintes informações:

 

a.       Houve acordo, sendo então encaminhado por escrito e assinado pelas partes, para análise e possível homologação do juiz.

b.       Não houve acordo, sendo encaminhada uma certidão negativa sem explicações sobre as razões ou motivos pra o impasse.

 

Apesar dos aspectos positivos da mediação, ela não deve ser vista como o método de resolução de conflitos por excelência. Em verdade, assim como os demais métodos, ela é aplicável à realidade de certos conflitos, mas ineficaz a outros. Quanto a isso, Fiss (2004, p. 144), teórico norte americano, argumenta que o grande problema de defensores de métodos extrajudiciais é que todos os conflitos são tratados como se fossem iguais e, portanto, passíveis de serem submetidos a qualquer método alternativo. Costa (2004, p. 199), aliás, considera que esse foi o grande motivo para a crise do processo judicial: os conflitos, indistintamente sua natureza, passaram a ser resolvidos apenas por ele e o que seria característica inerente à própria estrutura do método, hoje é visto como limitação do sistema.

 

Assim, para a análise do caso concreto é preciso levar em conta a natureza do conflito. Considerando que a mediação busca eliminar o caráter adversarial habitualmente observado no litígio judicial, pode-se dizer, em linhas gerais[17], que ela deve ser utilizada quando os demais métodos não puderem proporcionar a melhor opção para satisfazer às necessidades e interesses emocionais, econômicos e psicológicos dos clientes. Ou seja, quando as partes possuírem forte vínculo emocional-afetivo; estiverem envolvidas em conflitos que exijam sigilo e manutenção de relacionamentos; precisarem de flexibilidade para a comunicação de preocupações e para a manifestação de prioridades e desejos (COOLEY, 2001, p. 29-30) e, por fim, houver interesses não tutelados pelo Estado, tais como, desejos de reconhecimento e de valorização ou desejo de pedido de desculpas.

 

Em relação ao caso concreto, verifica-se a presença de todos esses critérios de aplicabilidade da mediação: o conflito subjacente, a existência de necessidades e interesses que não podem ser satisfeitos pelo processo judicial e a existência de um vínculo emocional, entre outros, o que sugere serem essas as razões para o sucesso da mediação pelo SEMFOR.

 

Ocorre que essa possibilidade só surgiu a partir de duas premissas: a) a percepção do juiz quanto ao caráter afetivo; b) a institucionalização da mediação. Tanto é assim que no processo de anulação de escritura pública, entre as mesmas partes, apesar da percepção do juiz de que haveria um vínculo emocional, não houve qualquer indicativo de diálogo ou negociação pela ausência de possibilidade de mediação. Com isso, a sentença se baseou nos documentos dos autos, sem considerar qualquer questão de fundo do conflito.

 

De fato, no processo judicial, as chamadas “questões de fundo” não são tratadas simplesmente por não serem juridicamente tuteladas, mesmo que, sendo ignoradas, gerem repercussões nos aspectos materiais e econômicos do conflito (BARBADO, 2003, p. 378). Isso ocorre porque, se é o Estado que resolve o litígio, o critério norteador da solução será o próprio interesse estatal, que nem sempre corresponde ao das partes. Além disso, o processo é determinado por normas pré-existentes, sendo os resultados possíveis limitados. Ou seja, não há resolução, mas apenas a solidificação da decisão judicial (ALMEIDA, 2003, p. 189).

 

No caso em questão, essa situação pode ser vista de pronto: o interesse estatal pode ser considerado como o de proteger a confiança jurídica nos atos efetivados pelos jurisdicionados, ou, conforme Owen Fiss (2004, p. 144), declarar os valores nos quais se fundamentou o Estado. Daí a única possibilidade de solução ser justamente a análise da simulação praticada pelas partes e a conseqüente sanção – o indeferimento do pedido.

 

No entanto, o resultado de não se abordar os conflitos de fundo também aqui pode ser visto: a perpetuação da litigiosidade remanescente e a continuação da lide, por novas ações ou pela interposição de sucessivos recursos e incidentes. Nesse ponto, é interessante lembrar que o primeiro caso de mediação forense do SEMFOR não foi, em si, um caso originário. Ou seja, ele nasceu de um conflito anterior, inclusive, à época, já institucionalizado: a separação litigiosa de Maria e João. Contudo, que não foi submetida à mediação, pois o projeto piloto não abarcou a vara onde ele tramitara.

 

Nesse ponto, verificam-se duas questões sobre a efetividade da mediação para o caso:

 

a. A não união das diversas lides, pois o processo foi encaminhado sem que houvesse menção aos conflitos inter-relacionados e processualmente distantes (o conflito mediado era de uma vara cível e o conflito de fundo de uma vara de família, que não integrava o projeto piloto).

b. A não compreensão sobre os mecanismos de resolução de conflitos e sobre a atuação em um fórum de múltiplas portas[18] dos advogados envolvidos.

 

Em relação a isso, pode-se dizer que, ainda que a mediação tenha pontualmente conseguido encerrar um processo judicial por meio de um acordo e tenha gerado satisfação das partes (demonstrada pela solicitação de novas sessões), se formos analisar a totalidade do caso, inclusive quanto aos processos inter-relacionados, o procedimento de mediação forense não conseguiu manter os laços afetivos, nem exaurir a litigiosidade existente.

 

As razões para tal são intrínsecas à realidade do caso concreto e talvez não se justifiquem se considerado o estado da arte atual[19]. Contudo, o fato de a análise do conflito haver sido segmentada e pontual, de o projeto piloto não ser integrado a todas as varas nem estar presente em outra circunscrição, senão em Taguatinga – DF, e de os advogados atuantes não terem consciência das peculiaridades do procedimento, são fatores que permitem considerar a mediação, dentro de uma análise ampla do conflito, ineficaz ou infrutífera, apesar de haver sido, pontualmente, efetiva para término da lide.

 

Quanto aos advogados, não se pode deixar de mencionar que seriam eles os profissionais com melhores condições de detectar a necessidade de mediação em razão das peculiaridades do conflito em questão. No entanto, também não se pode desconsiderar que, até então, não havia uma possibilidade real de atuação frente à mediação, não havendo, até o momento, uma formação direcionada à atuação para a resolução e administração de conflitos.

 

Como conseqüência, vê-se o que ocorre rotineiramente na profissão: demanda contínua ao Poder Judiciário, argumentações e estratégias pouco técnicas, conforme visto no caso em análise, e uso do processo judicial como subterfúgio para obrigar um acordo. De fato, a argumentação utilizada deu ênfase aos aspectos emocionais do conflito, inclusive como justificação para simulações, demonstrando, a todo tempo, a existência do conflito de fundo.

 

Quanto a isso, a despeito de ainda hoje a mediação judicial seguir principalmente o modelo tradicional linear, parece que a mediação tal como vista por Sara Cobb e Bush e Folger parece ser a mais completa para esse tipo de conflito. De fato, para Bush e Folger (2006, p. 144), a mediação deve permitir que as partes possam resolver suas disputas construtivamente, fortalecendo as relações sociais, identificando interesses subjacentes ao conflito, promovendo relacionamentos cooperativos, explorando estratégias que venham a prevenir ou resolver futuras controvérsias, educando as partes para uma melhor compreensão recíproca. Já pela mediação circular-narrativa o conflito só poderia ser analisado tomando-se por base as pessoas envolvidas e sua história, não sendo visto isoladamente, mas dentro de um todo maior. Contudo, quanto a isso, ficará o questionamento sobre como essas modalidades poderiam ser institucionalizadas dentro de um ambiente formal como os Tribunais.

 

Seja como for, o caso em análise representou o início da mediação forense nos moldes do SEMFOR. Hoje, no entanto, a mediação dentro do TJDFT é uma realidade, sendo que, ao longo dos anos, os resultados apresentados consolidaram o processo, permitiram a construção de rotinas e procedimentos sólidos para atendimento de demandas e culminaram na expansão do serviço, por meio da Portaria GPR nº. 406, de 15 de junho, que instituiu o Centro de Resolução Não-Adversarial de Conflitos – CRNC. Diante disso, parece que um importante passo para a institucionalização de um sistema de resolução de conflitos foi dado. Contudo, é preciso considerar a importância da formação de profissionais que possam atuar frente a esses métodos, identificando conflitos maduros para a mediação, bem como de mediadores e programas de mediação aptos a compreender as lides e disputas como integrantes de um todo, e não apenas como o conflito em si, a fim de que o processo, além de institucionalizado, represente uma opção real de efetividade da Justiça.

 

 

6. CONCLUSÃO

 

A mediação, como forma de resolução de conflitos, institucionalizada no âmbito de tribunais, é uma realidade. Desde o caso atual, por exemplo, até os dias de hoje já se vão mais de cinco anos, tempo suficiente para a revisão de métodos e tecnologias. Ainda assim, o presente caso apresenta questões que auxiliam no debate sobre a aplicação da mediação como forma de resolução de conflitos.

 

Ele demonstra, por exemplo, a importância de que o modelo seja aplicado em todo o tribunal e a necessidade de uma atuação interligada entre as varas, sob o risco de que conflitos inter-relacionados não possam ser analisados efetivamente. Demonstra, ainda, que o objetivo da mediação não pode ser o simples encerramento de um processo judicial por meio de um acordo. Ao contrário, o objetivo da mediação deve ser a real diminuição da litigiosidade, o “empoderamento” das partes na resolução de seus conflitos e a percepção de que o conflito pode ser dirimido de forma autônoma, por cada um, sem se recorrer ao Poder Judiciário.

 

Quanto a isso, o presente caso sugere que a mediação tradicional linear pode apresentar pontos falhos quando o conflito tiver forte aspecto emocional e der origem a ramificações conflituosas. Em outras palavras, se a vertente transformativa não pode ser aplicada dentro do tribunal (pelas próprias características de formalidade existentes), é importante que o mediador seja formado para conceber o caso como integrante de um todo muito maior e questionar sobre outros processos relacionados às partes em mediação. 

 

O caso leva, ainda, ao questionamento sobre a atuação do advogado em um fórum de múltiplas portas, pois decorridos cinco anos do início da mediação forense no TJDFT, não houve uma real e efetiva formação direcionada à atuação desses profissionais. Em outras palavras, advogados não são preparados para perceber se o caso é passível ou não de mediação, se há um conflito de fundo, como auxiliar seu cliente e nem como apresentar ao mediador a história do caso, pois, afeitos à técnica estatal, podem não compreender as peculiaridades do processo. No entanto, mesmo o advogado que percebe as nuances de um caso e está apto a atuar frente à mediação sofre a restrição da ausência de institucionalização do procedimento em todo o tribunal, o que o obriga a permanecer dentro do processo judicial. O resultado disso é a perpetuação de processos, estratégias e argumentações como os do caso em análise, ou seja, que utiliza o Poder Judiciário como peça de barganha em uma possível negociação e contribui para a percepção de crise dessa instituição.

 

Por fim, não se pode esquecer que toda a institucionalização da mediação forense tem se dado sem a existência de um marco regulatório, que conceitue, estabeleça procedimentos, código de ética e etc. para as pessoas envolvidas. Talvez o desenvolvimento que até aqui tenha se dado possa demonstrar a desnecessidade de uma maior regulação legislativa. Contudo, abre espaço para que, ao lado de experiências bem sucedidas como o SEMFOR, outras, sem garantias de efetividade ou sem uma atuação ética, possam prejudicar o sistema ou, pior ainda, as próprias partes em situação de conflito, em geral, mais fragilizadas.

 

Seja como for, o presente caso representa um importante passo no desenvolvimento de um sistema de resolução de conflitos no Brasil, tendo em vista que foi a primeira atuação prática de um projeto que antes dele já se estruturara e, depois dele, continuou a se desenvolver até os dias atuais, com a recente criação do Centro de Resolução Não Adversárias de Conflitos do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, abrindo, assim, espaço para a efetivação do direito básico de acesso à Justiça.

 

 

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* Advogada, mediadora, especialista em Advogado Cível pela Fundação Getúlio Vargas, Presidente do Instituto Pró-Mediação, Superintendente da Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial do Distrito Federal

 

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[1] Para a compreensão do caso, em Anexos há um gráfico apresentando a evolução do conflito principal, bem como os adjacentes. Todos os nomes foram trocados para preservar a identidade dos autores.

[2] Banco comercial, o BRB é uma sociedade de economia mista, cujo acionista majoritário é o Governo do Distrito Federal. O banco foi criado em 10 de dezembro de 1964 (Lei Federal 4545) obtendo, do Banco Central do Brasil, autorização para funcionar em 12 de julho de 1966. Em 1986 teve sua denominação alterada de Banco Regional de Brasília S.A. para Banco de Brasília S.A., permanecendo a sigla BRB.

 

[3] O conceito será explicado mais à frente, no item Análise e Discussão.

[4] Em vinte e um de maio de 2004, na audiência de instrução e julgamento da ação de despejo nº 19605-4/2004, Maria Da Silva declarara, sem prestar compromisso, em razão de parentesco, que o imóvel fora dado em garantia em um empréstimo bancário em razão de uma dívida da CJR.

[5]Esse posicionamento será confirmado pelo acórdão: “CIVIL. ANULAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA. COMPRA E VENDA. IMÓVEL. GARANTIA. ARRENDAMENTO MERCANTIL. CONSENTI-MENTO EXPRESSO. AUTORIZAÇÃO. VENDA A TERCEIRO. NULIDADES. SIMULAÇÃO. INEXISTÊNCIA. A simulação, vício capaz de nulificar ato jurídico, exige prova consistente de sua ocorrência, descartada aquela em que o interessado na nulidade tenha participado” (DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Acórdão. Apelação nº 2003.01.1.056668-7. Relator: Desembargador Getúlio Morais de Oliveira.Brasília. 26 abr. 2006. Disponível em: <http://tjdf19.tjdft.gov.br/cgi-bin/tjcgi1?DOCNUM=1&PGATU=1&l=20&ID=61053,33353,4020&MGWLPN=SERVIDOR1&NXTPGM=jrhtm03&OPT=&ORIGEM=INTER>. Acesso em 18 fev. 2007.

[6] Sob esse ponto, MOORE (1998, pp. 32-47) discorre sobre a origem da mediação, apresentando-a como um método originado nos primórdios da humanidade; XAVIER (2003, p. 426), após discorrer sobre métodos autocompositivos e a Fazenda Pública, conclui que a jurisdição é meio subsidiário de resolução de conflitos, sendo a autocomposição o método originário; AZEVEDO (2003, p. 153) discorre sobre a autotutela e a autocomposição, apresentando-as como formas originárias (primordiais) de resolução de conflitos; GRINOVER (1993,  p. 14) fala sobre a evolução do direito processual, iniciando sobre a autotutela e a autocomposição.

[7] É a que persiste mesmo após o término de um litígio em razão de questões não resolvidas pelo processo judicial e que permanecem criando condições para que o conflito se perpetue, repercutindo em aspectos econômicos e materiais de uma demanda (BARBADO, 2003, p. 374). Ela permanece, assim, em razão da existência de conflitos de interesses que não foram tratados, seja por não serem juridicamente tutelados (como questões sentimentais – a mágoa que se sente pelo término de um relacionamento, a necessidade de reconhecimento, a ira, a frustração e etc), seja porque a matéria não foi apresentada perante o Estado (AZEVEDO, 2003, p. 169). Podemos, contudo, estender o conceito a todas as abordagens de resolução de conflitos, e não só ao processo judicial, ao considerarmos que são todos os pontos que não são resolvidos e permanecem repercuntindo no conflito como um todo, criando novos focos de conflitos ou não permitindo que uma demanda se encerre.

[8] Gráfico desenvolvido a partir de Cooley (2001, p. 25)

[9] Essa expressão foi criada por Marinès Suares (2002, p. 59), mas o trecho a seguir foi elaborado a partir dessa obra, de Scripilliti (2004) e de Costa (2004, p. 175 a 177), conjuntamente.

[10] Texto elaborado a partir de Bush e Folger (2006), Costa (2004) e Almeida (s.d).

[11]“O pensamento sistêmico é uma disciplina para ver o todo. É um quadro referencial para ver inter-relacionamentos, ao invés de eventos; para se ver os padrões de mudança, em vez de ‘fotos instantâneas’. É um conjunto de princípios gerais – destilados ao longo do século XX, abrangendo campos tão diversos quanto às ciências físicas, sociais, a engenharia e a administração.” SENGE (2004, p. 99). Ou seja, o pensamento sistêmico não vê o conflito ou as pessoas em conflito como peças isoladas, mas como partes de um todo, como um conjunto de relações, como algo inter-relacionado com a dinâmica das pessoas envolvidas, cabendo ao mediador abordar esse todo. Assim, existe sempre um aspecto de fundo que deve ser abordado no processo para se chegar a um resultado satisfatório.

[12] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tribunal Pleno. Argüição Incidental em Agravo Regimental em Homologação de Sentença Estrangeira. SE-Agr nº 5206. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence em 12 dez 2001. Disponível em: < http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp>. Acesso em 18 fev 2008.

[13] Após junho de 2003, com a apresentação dos primeiros resultados, o serviço foi ampliado para todas as Varas Cíveis e de Família da Circunscrição Judiciária de Taguatinga. Atualmente, o SEMFOR é subordinado ao Centro de Resolução Não-Adversarial de Conflitos – CRNC, um setor específico, nascido a partir da Portaria GPR nº. 406, de 15 de junho de 2007, com capacidade de formar e desenvolver um número crescente de mediadores voluntários e realizar mediações em escala compatível com a demanda dos processos no TJDFT. Espera-se, assim, que a mediação forense seja expandida para os demais fóruns, pois apesar do desenvolvimento do SEMFOR, a expansão inicialmente prevista para o ano de 2004, havia sido suspensa por tempo indeterminado em razão de ausência de espaço físico e de contingenciamento de recursos. Disponível em: < http://www.tjdft.gov.br/tribunal/institucional/prog_estimulo_mediacao/mediacao.htm#>. Acesso em 18 fev 2008

[14] Disponível em: http://www.tjdft.gov.br/tribunal/institucional/prog_estimulo_mediacao/mediacao.htm#

[15] Vide gráfico Anexo-B.

[16] Slaikeu (2003, p. 86), um dos autores citados na bibliografia indicada pelo SEMFOR, afirma, sobre disposição de móveis, que o local deve reforçar a idéia de diálogo e cooperação e não representar um entrave às negociações, sendo importante, nesse ponto, que ele tenha uma mesa redonda e que as partes fiquem lado a lado e não de frente uma a outra.

[17] Apesar dos diversos modelos de mediação, todos parecem concordar nesse ponto.

[18] Mecanismo pelo qual “controvérsias são encaminhadas para diversos tipos de procedimentos com base na percepção de que determinados conflitos são solucionados de maneira mais eficaz por um procedimento adequado às suas características. Esse encaminhamento permite aproveitar as vantagens do método mais adaptado à controvérsia, ao mesmo tempo elidindo as desvantagens de métodos inadequados”, podendo ser feito por funcionários do tribunal, juízes ou ainda pelas próprias partes ou seus advogados (Barbosa, 2003, p. 261).

[19] É preciso considerar que o caso é de 2002 e se refere ao projeto piloto, sendo que, após sua criação passaram-se cinco anos e os resultados positivos permitiram a criação do CRNC – Centro de Resolução Não Adversarial de Conflitos, setor que abarcou o SEMFOR.

 

Como citar e referenciar este artigo:
DINIZ, Bárbara. Mediação Judicial. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/judiciario/mediacao-judicial/ Acesso em: 29 mar. 2024