Judiciário

A tímida Súmula Vinculante brasileira

 

(Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora – MG)

 

Infelizmente, o alcance da Súmula Vinculante é mínimo, conforme estampado na CF, art. 103-A.

 

O sistema representará uma gradativa evolução para a Justiça e o Direito. Com isso, nosso país se aproximará do nível dos países mais adiantados, onde, antes de alguém ajuizar uma ação, já tem condições de saber se dará certo ou não. As súmulas devem interpretar o Direito e ser vinculantes.

 

Os opositores têm-se dito que a SV irá limitar o trabalho dos Juízes, prejudicará a liberdade de convicção dos magistrados os Juízes perderão sua autonomia. No entanto, nenhum desses argumentos procede.

 

Com a adoção da SV, o esforço laborativo do Judiciário será canalizado de forma muito mais produtiva. O tempo que se perde atualmente num verdadeiro bate-cabeça de entendimentos divergentes, será empregado na solução de muito mais processos. A uniformização existe nos países evoluídos de common law (EUA, Grã-Bretanha etc.) como também nos de civil law (França, Alemanha etc.). Os Juízes não serão desvalorizados, mas serão coarctadas eventuais decisões que raiam pelo arbítrio. A liberdade quase irrestrita de decidir gera o quase caos jurisprudencial que vivenciamos. Sintoma claro do subdesenvolvimento jurídico do nosso país, realidade que nos desmerece no contexto mundial.

 

Não haverá prejuízo para o acesso do cidadão brasileiro à Justiça. Com o tempo, diminuirá o número de aventuras jurídicas, que atulham hoje a Justiça de processos que nada mais são que meras tentativas de ganhar algum dinheiro fácil.

 

A Súmula Vinculante, mesmo com o alcance exíguo que lhe dá a CF, vai desafogar o Judiciário e aumentar a velocidade de tramitação de matérias semelhantes. O número de processos que cada Juiz brasileiro tem que julgar é astronômico se comparado com Juízes franceses e alemães, por exemplo. Só não estranhamos a anomalia da nossa realidade porque sempre vivemos com as mesas e estantes abarrotadas e nos acostumamos com a crônica falta de solução dos nossos problemas.

 

Julgamentos distintos para casos “idênticos” representam coisa inconcebível no entendimento das pessoas leigas. Somente parece natural para nós, que nos habituamos ao caos jurisprudencial. Justiça não pode ser loteria, não pode depender de sorte ou azar.

 

O texto constitucional diz que a súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.

 

Como exemplos podem-se citar os recentes processos de consumidores contra a TELEMAR tratando de pulsos excedentes, ajuizados aos milhares em Minas Gerais. A divergência de entendimentos incentivou, indiretamente, a multiplicação dessas ações, quase inviabilizando as Varas Cíveis.

 

Segurança jurídica significa a uniformidade do Direito num determinado momento, que não se confunde com o imobilismo jurídico. Nos EUA, por exemplo, o sistema de common law não impede que as mudanças aconteçam.

 

O texto constitucional não deveria traçar limites à área de abrangência da SV. Conhecendo nosso amor ao debate bizantino, é certo que muita gente irá questionar a abrangência do texto constitucional em casos concretos…

 

De fato, o que estamos vivendo, até por influência dos EUA, é nossa gradativa passagem da civil law para common law. Mas isso não é de se lamentar, pois representa a autêntica valorização do Judiciário como o segmento mais acreditável da estrutura estatal.

 

Para que a SV seja realmente útil, é imprescindível que o Supremo Tribunal Federal mantenha íntegro seu compromisso de dedicação ao povo e à cidadania.

Como citar e referenciar este artigo:
MARQUES, Luiz Guilherme. A tímida Súmula Vinculante brasileira. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/judiciario/a-timida-sumula-vinculante-brasileira/ Acesso em: 29 mar. 2024