Direito Tributário

Os critérios material e pessoal do IPI sobre a importação de produtos industrializados do exterior

RESUMO

A União é a pessoa política de direito público interno competente para instituir o imposto sobre produtos industrializados nos termos do art. 153, IV, da Constituição Federal.

O objetivo do presente artigo é dispensar uma análise pormenorizada sobre os critérios material e pessoal da regra-matriz de incidência tributária do IPI sobre a importação de produtos industrializados do exterior.

Para alguns autores, o IPI incidente sobre a importação de produtos advindos do exterior seria apenas um mero adicional do imposto de importação. Entretanto, ainda que o Texto Maior se mostre insuficiente para a determinação das regras-matrizes da exação ora estudada, uma análise sistêmica do ordenamento pátrio, juntamente com as disposições de lei complementar, é possível afirmar tratar-se de uma regra-matriz autônoma e independente.

Também não há como desconsiderar que o IPI-importação possui uma importante característica extrafiscal, utilizado com a finalidade de prestigiar situação social, política ou econômica, ou seja, perseguindo objetivos alheios aos meramente arrecadatórios, protegendo o parque industrial nacional e assegurando o princípio da livre-concorrência.

No que diz respeito ao critério pessoal, o sujeito passivo do IPI-importação é o importador ou quem a lei a ele equiparar, nos termos do art. 51, I, do CTN.

Neste quesito, a questão ganha importância, sendo objeto de discussão doutrinária e jurisprudencial, apresentando interpretações divergentes, porque além do importador, poderá figurar como sujeito passivo da obrigação tributária o “equiparado ao importador”, ou seja, aquele sujeito que apresenta semelhanças com o importador, ainda que existam dissemelhanças secundárias.

Palavras-chave: IPI-importação. Extrafiscalidade. Critério Material. Critério Pessoal.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

1. O IPI NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

1.1 Breve análise histórica

1.2 Perfil Constitucional do IPI na Carta de 1988

2. A(S) REGRA(S) MATRIZ(ES) DE INCIDÊNCIA DO IPI

2.1 A regra-matriz de incidência tributária

2.2 A competência da União para tributar o IPI

3. NÃO-CUMULATIVIDADE E SELETIVIDADE COMO PRINCÍPIOS INFORMADORES DO IPI

3.1 O Princípio da não-cumulatividade

3.2 A Seletividade em função da essencialidade do produto

4. IPI SOBRE A IMPORTAÇÃO DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS DO EXTERIOR (IPI-IMPORTAÇÃO)

4.1 Critério Material do IPI-importação

4.2 Critério Pessoal

4.2.1 Importador equiparado ao industrial

4.2.2 Importador pessoa física

CONCLUSÕES

BIBLIOGRAFIA

INTRODUÇÃO

A Constituição não criou tributos, mas apenas distribuiu competência para as pessoas políticas fazerem por intermédio de Lei. Na verdade, o que se estabeleceu foi a regra-matriz de incidência de cada uma das exações que poderão ser criadas pelas pessoas políticas. O tributo irá nascer a partir da fenomenologia da incidência, com o surgimento da relação jurídico-tributária.

O tributo surgirá, in abstracto, quando editado mediante lei e, in concreto, quando se verificar, no plano da realidade social, acontecimento previsto no antecedente normativo.

As pessoas políticas, ao legislarem, criando tributos mediante lei, deverão manter-se fiéis à norma-padrão de incidência do tributo que foi pré-estabelecida na Constituição Federal.

A União, no exercício privativo de sua competência tributária, irá instituir o imposto sobre produtos industrializados (IPI) nos termos do que foi prescrito pela Constituição Federal, representando a vontade do legislador constituinte originário.

O presente artigo inicia-se com uma breve análise histórica do imposto sobre produtos industrializados, que tem suas origens no imposto sobre o consumo, instituído pela Constituição de 1934.

O imposto sobre produtos industrializados possui características próprias e marcantes delineadas pela Constituição Federal. Neste sentido, traçaremos o perfil constitucional do IPI à luz Carta de 1988, para em seguida estabelecermos as regras-matrizes de incidência da referida exação.

Nos estudos da materialidade do IPI, a partir do texto constitucional, do Código Tributário Nacional (CTN) e legislação ordinária, conclui-se que são três as hipóteses de incidência possíveis que estão abrangidas pela faixa de competência da União para instituir o IPI, tendo como ponto de referência “produtos industrializados”: (i) industrializar produtos; (ii) importação de produtos industrializados do exterior; e (iii) arrematar, em leilão, produtos industrializados que foram apreendidos ou abandonados.

O presente artigo irá analisar de forma minuciosa o IPI incidente sobre a importação de produtos industrializados do exterior, imposto que tem uma marcante característica extrafiscal, informado, dentre outros, pelos princípios da seletividade e não-cumulatividade.

Ambos os princípios são normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata, sendo de observância obrigatória pelo legislador infraconstitucional no momento de sua instituição.

O IPI-importação é regra-matriz autônoma da materialidade “industrializar produtos”, não se confundindo com o imposto de importação, conforme prescreve a legislação infraconstitucional, especificamente o art. 46, I do CTN e o art. 2º, I da Lei nº 4.502/64, que instituiu o IPI.

Por fim, trataremos do aspecto pessoal do IPI-importação que tem como sujeito passivo o importador ou quem a ele a lei equiparar.

Por força do Decreto nº 7.212/10, o importador é equiparado ao estabelecimento industrial, sofrendo a incidência do IPI no momento do desembaraço aduaneiro, bem como na saída do produto nacionalizado do estabelecimento importador.

Como veremos adiante, trata-se de uma equiparação inconstitucional que não encontra respaldo no ordenamento pátrio uma vez que o importador não realizou a conduta industrializar produtos, não podendo sofrer a incidência do IPI no momento da saída dos produtos importados para a comercialização.

1. O IPI NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.

1.1 Breve análise histórica.

O Imposto sobre produtos industrializados (IPI) teve sua origem no chamado Imposto sobre o Consumo, que surgiu com a Constituição de 1934. Este imposto era de competência privativa da União e foi mantido na Constituição Federal de 1937.

Prescrevia o art. 6º, I, “b”, da Constituição de 1934:

 Art 6º – Compete, também, privativamente à União: 

I – decretar impostos: 

[…]

b) de consumo de quaisquer mercadorias, exceto os combustíveis de motor de explosão;”

Em 30 de novembro de 1964, ainda sob a égide da Constituição de 1946, foi publicada a Lei ordinária nº 4.502 que dispunha sobre o imposto sobre o consumo e estabelecia, no seu art. 2º, que a referida exação teria como fato gerador (i) “quanto ao produtos de procedência estrangeira o respectivo desembaraço aduaneiro”; e (ii) “quanto aos de produção nacional, a saída do respectivo estabelecimento produtor.

A designação “impostos sobre produtos industrializados” surgiu com a Emenda Constitucional nº 18/65, que alterou a denominação “imposto sobre consumo”, além de prescrever, no seu art. 11, que a referida exação seria informada pela seletividade e não-cumulatividade.

Esta designação foi mantida pelo Código tributário Nacional (Lei nº 5.172/66), pela Constituição de 1967 (e Emenda nº 01/69) e mantida pela Constituição Federal de 1988, que prescreveu e manteve a competência da União para instituir o IPI nos termos do seu art. 153, inciso IV.

Vale destacar que a Lei nº 4.502/64, que instituiu o imposto sobre o consumo, e que deve sua denominação alterada para imposto sobre produtos industrializados por força da Emenda nº 18/1965, continua sendo a norma geral instituidora da referida exação até os dias atuais.

1.2 Perfil Constitucional do IPI na Carta de 1988.

A Carta Magna de 1988 é a lei tributária mais importante do nosso ordenamento pátrio e descreveu, de forma minuciosa e exaustiva, a competência legislativa tributária das pessoas políticas de direito público interno.

Neste sentido, o estudo do IPI deve partir das diretrizes traçadas pelo Texto Maior, que expressam a vontade do legislador originário e que fixou algumas características singulares e próprias desta exação.

Começaremos nossa análise pelo princípio da legalidade que estabelece que ninguém é obrigado a pagar tributo ou cumprir deveres instrumentais que não tenham sido criados por meio de lei da pessoa política competente. O tributo tem que nascer diretamente da lei, que deve indicar todos os elementos da norma jurídica tributária.

O contribuinte tem o direito constitucional subjetivo de só ser tributado mediante lei da pessoa política competente, observado a regra-matriz pré-estabelecida na Constituição Federal.

No que diz respeito ao IPI, temos uma flexibilização do princípio da legalidade por força do art. 153, § 1º, da CF, que estabelece que as alíquotas do IPI poderão ser alteradas por decreto do Poder Executivo, desde que atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei.

Trata-se de uma exceção aparente ao princípio da legalidade, uma vez que o Executivo, representado pela figura do Presidente da República, poderá apenas alterar as alíquotas dentro dos limites fixados por lei específica.

As alíquotas do IPI serão definidas por meio de lei ordinária da União, cabendo ao Executivo alterá-las dentro dos limites máximos e mínimos. Ou seja, o Executivo irá alterar algo que já existe e que foi posto por lei.

A União ao exercer sua competência tributária para instituir o IPI também deverá observar os princípios da seletividade e da não-cumulatividade que informam a tributação por meio desta exação.

O IPI será seletivo em função da essencialidade do produto industrializado, com a adoção de um sistema de alíquotas diferenciadas. Neste sentido, os produtos essenciais sofrerão uma tributação menos onerosa que aqueles considerados de consumo restrito.

Quanto mais essencial for o produto, menor será a alíquota aplicada para a determinação do quanto devido à título de tributo. Por outro lado, os produtos considerados supérfluos sofrerão a incidência de alíquotas mais altas, impactando no preço final dos produtos industrializados.

A seletividade é característica marcante do IPI. É norma constitucional cogente e deverá ser observada pelo legislador infraconstitucional no momento da criação deste imposto.

Além do acima exposto, o IPI deverá ser não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação, com o montante cobrado nas operações anteriores. É norma constitucional de eficácia plena e aplicação imediata, evitando, desta forma, a chamada tributação em cascata. Trataremos desses dois princípios de forma mais abrangente no decorrer deste artigo.

Por fim, mas não menos importante, destacamos que o IPI não se submete à chamada anterioridade anual prevista no art. 150, III, b, da CF, mas deve obedecer ao princípio da anterioridade nonagesimal, podendo ser cobrado após decorrido o prazo de noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou (art. 150, III, c, da CF).

2. A(S) REGRA(S) MATRIZ(ES) DE INCIDÊNCIA DO IPI.

2.1 A regra-matriz de incidência tributária

Toda norma jurídica, em particular, toda a norma jurídico-tributária é passível de ser desdobrada em elementos comuns e que foram eleitos pelo legislador para a identificação do fato e da relação que irá se instaurar.

Temos assim uma estrutura lógica que se repete, qual seja, uma hipótese e um conseqüente, ligados por um modal deôntico não modalizado (dever-ser neutro). A relação prestacional que identificamos no prescritor possui uma lógica deôntica modalizada (dever-ser – proibido, permitido e obrigatório). Tanto a hipótese quanto o conseqüente fazem referência a um possível evento e a uma relação futura e incerta.

Observando-se as normas instituidoras de tributos, verificou-se que o legislador obedece a certos critérios que se repetem, para a delimitação do fato descrito no antecedente e para a caracterização da relação que se instaura no consequente.

Desta forma, chamamos de regra-matriz de incidência tributária o enunciado lógico-semântico, formado e identificado por um conjunto de critérios que caracterizam e delimitam as propriedades do fato (hipótese) e da relação (consequente), e que se verifica em toda a norma jurídica tributária.

Falamos de critérios material, espacial e temporal no antecedente; e de critérios pessoal e prestacional no consequente. Por tratar a norma tributária de uma obrigação de entregar certa quantia em dinheiro aos cofres públicos, ao invés de falarmos em um critério prestacional, falaremos em um critério quantitativo, aonde identificamos a base de cálculo e alíquota.

A hipótese ou antecedente da norma-padrão traz as propriedades eleitas para a identificação do fato, que se verificado na realidade social, tornar-se-á um fato jurídico, desencadeador de uma relação prestacional jurídico-tributária.

Existem três critérios que formam o antecedente normativo: (i) critério material, (ii) critério espacial; e (iii) critério temporal. Desta forma, é possível a identificação do momento, local e da materialidade do fato.

O critério material é o núcleo da hipótese de incidência. Formado por um verbo pessoal, que exprime ação ou estado de uma pessoa, de predicação incompleta, o que importa a presença de um complemento.

É a expressão, ou enunciado, da hipótese que delimita o núcleo do acontecimento a ser promovido à categoria de fato jurídico.[1]

O critério espacial é a expressão do antecedente que nos possibilita a identificação do local do evento onde o fato futuro e abstrato será promovido à fato jurídico. Este critério poderá aparecer de forma explícita ou implícita, podendo ser dividido em pontual, regional ou territorial.

Já o critério temporal é a expressão do antecedente que nos possibilita a identificação do momento do evento onde o fato futuro e abstrato será promovido à fato jurídico (antecedente de uma norma individual e concreta).

O prescritor ou consequente da regra-matriz traz os elementos necessários e suficientes para a identificação da relação jurídico-tributária que irá se instaurar uma vez observado, no campo da linguagem social, o fato descrito no antecedente normativo.

Assim, ainda que em caráter abstrato, observamos elementos que serão utilizados para a identificação do sujeito passivo da obrigação, do sujeito ativo, bem como os direitos subjetivos e deveres decorrentes.

O consequente delimita os efeitos a serem atribuídos ao fato jurídico. Existem dois critérios que caracterizam o prescritor da norma: (i) critério pessoal; e (ii) critério prestacional.

O critério prestacional é caracterizado pela relação jurídica estabelecida entre o sujeito ativo e passivo. Esta relação só vai existir uma vez verificado, no plano da realidade social, o fato descrito na hipótese. Ela é uma criação do direito, uma relação contemplada pelo legislador.

Nas palavras do mestre Paulo de Barros Carvalho:

“(…) relação jurídica é definida como um vínculo abstrato, segundo o qual, por força da imputação normativa, uma pessoa, chamada de sujeito ativo, tem o direito subjetivo de exigir de outra, denominada sujeito passivo, o cumprimento de uma prestação. (…) o que equivale a afirmar que emerge o vínculo, apenas e tão-somente por virtude da imputação normativa, indiferente à existência ou não de um laço de caráter sociológico, político, econômico, ético, religioso ou biológico, anterior à disciplina jurídica.”. [2]

Uma vez estabelecida a relação jurídica, o objeto desta relação pode ter um cunho obrigacional ou não-obrigacional. Falamos em relação jurídica obrigacional quando o seu objeto tiver conteúdo patrimonial, podendo ser quantificado. Caso contrário, falaremos em relação jurídica não-obrigacional, que veicula apenas deveres instrumentais.

A funcionalidade da regra matriz é a possibilidade de identificarmos, com precisão, quais os fatos e as relações do mundo social serão relevantes juridicamente. Além do mais, é possível exercer um controle legal e constitucional das normas jurídicas.

2.2 A competência da União para tributar o IPI.

Prescreve a Constituição Federal no seu art. 153, IV:

“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

[…]

IV – produtos industrializados;

§3º – O imposto previsto no inciso IV:

I- será seletivo, em função da essencialidade do produto;

II-será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores;”

Por força do mandamento constitucional, compete à União instituir impostos sobre os produtos industrializados, devendo-se observar os princípios da não-cumulatividade e da seletividade que informam a tributação por meio do IPI.

Já o Código Tributário Nacional, no seu artigo 46, estabeleceu três acontecimentos como possíveis de ensejar a tributação por via do IPI: (i) o desembaraço aduaneiro de produtos industrializados advindos do exterior; (ii) a saída do produto industrializado do estabelecimento; e (iii) arrematação, em leilão, de produto abandonado ou apreendido.

Podemos afirmar que, a partir de uma análise do Texto Maior, este se mostra insuficiente para determinarmos as regras-matrizes de incidência tributária do IPI, sendo necessário a conjugação com aquilo que foi disposto pela norma infraconstitucional.

Neste sentido, são três as hipóteses de incidência possíveis que estão abrangidas pela faixa de competência da União para instituir o IPI, tendo como ponto de referência “produtos industrializados”: (i) industrializar produtos; (ii) importação de produtos industrializados do exterior; e (iii) arrematar, em leilão, produtos industrializados que foram apreendidos ou abandonados.

Nos ensinamentos do mestre Paulo de Barros Carvalho:

“De ver está, como o constituinte não determinou a conduta ligada a produtos industrializados, o legislador infraconstitucional, exercendo a competência que lhe fora deferida, escolheu três tipos de ação: industrializar produtos, importar produtos industrializados e arrematar em leilão produtos industrializados (encontrando-se este último atualmente desativado). O núcleo comum, obrigatório, portanto, é o complemento “produtos industrializados”. O binômio hipótese de incidência/base de cálculo indica trata-se de impostos diferentes, sob a mesma denominação – IPI.”[3]

Assim, de acordo com a vontade do constituinte originário, o IPI será instituído sobre produtos industrializados. Entretanto, não estipulou as condutas relacionadas com a materialidade da exação em tela, permitindo que o legislador ordinário o fizesse. Coube ao legislador da União a escolha da conduta que será somada ao núcleo comum produtos industrializados.

Ainda que exista previsão legal, o legislador ordinário da União, no exercício de sua competência tributária, não instituiu o IPI referente a arrematação em leilão, conforme se depreende da Lei nº 4.502/64:

“Art. 2º Constitui fato gerador do imposto:

I- quanto aos produtos de procedência estrangeira o respectivo desembaraço aduaneiro;

II- quanto aos de produção nacional, a saída do respectivo estabelecimento produtor.”

Sendo assim, analisaremos a regra-matriz de incidência que onera a industrialização de produtos e aquela sobre a importação de produtos industrializados do exterior.

Na materialidade industrializar produtos, temos dois momentos: (i) uma obrigação de fazer, consubstanciada na industrialização de um produto, conjugada com (ii) uma obrigação de dar, ou seja, a realização de uma operação jurídica que implique na saída do produto do estabelecimento. Assim, da conjugação indissociável entre a obrigação de fazer e a obrigação de dar nasce para o industrial a obrigação tributária.

Neste sentido, o IPI irá incidir sobre operações jurídicas realizadas com produtos industrializados que transfiram a posse ou a propriedade. Nos ensinamentos do mestre Eduardo Domingos Bottallo:

“Conforme decorre de sua regra-matriz, o IPI incide sobre operações jurídicas com produtos industrializados, vale dizer, ele é devido quando ocorrer o fato de um produto sair do estabelecimento produtor (estabelecimento industrial ou equiparado) em razão de um negócio jurídico, real ou ficto, translativo de sua propriedade.”[4]

Produto industrializado, nos termos do parágrafo único do art. 46 do CTN, é aquele produto que foi submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo.

Já o art. 4º da Decreto nº 7.212/10 (Regulamento do IPI) estabeleceu que “caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para o consumo, tal como” a transformação, beneficiamento, montagem, acondicionamento ou reacondicionamento, renovação ou recondicionamento.

Neste sentido, o processo de industrialização é caracterizado por qualquer operação que agregue qualidades, importando na obtenção de um novo produto.

Nas palavras do mestre Eduardo Domingos Bottallo:

“Desse preceito extrai-se que, para fins de incidência tributária, nem toda a operação exercida sobre matéria-prima tipifica processo de industrialização. A caracterização deste processo exige a obtenção de uma “espécie-nova”, ou seja, de um novo produto, apto, de per si, a atender uma necessidade de consumo. Ausente tal aptidão, não há de se falar em tributação por meio de IPI.”[5]

No que diz respeito ao critério espacial, este coincide com o âmbito de vigência territorial da lei, ou seja, confunde-se com a própria extensão do Estado brasileiro.

A lei poderá tratar este critério de modo mais específico, indicando como coordenada do espaço o estabelecimento industrial (onde houver a industrialização de produtos) ou o equiparado.

Já o critério temporal será a saída do produto do estabelecimento industrial demarcada por meio de uma operação jurídica (negócio jurídico). Ou seja, o momento de ocorrência do fato jurídico tributável escolhido pelo legislador ordinário é a saída do produto do estabelecimento, já que o industrial produz para colocar o produto à venda no mercado.

Por fim, a regra-matriz de incidência sobre a importação de produtos industrializados será tratada, de forma mais detalhada, na parte final deste artigo. Resumidamente, temos como critério material: verbo = importar e o complemento = produtos industrializados do exterior, sendo as repartições alfandegárias (aduanas) os locais específicos de ocorrência do fato imponível e o momento do desembaraço aduaneiro como critério temporal da hipótese de incidência.

3-NÃO-CUMULATIVIDADE E SELETIVIDADE COMO PRINCÍPIOS INFORMADORES DO IPI.

3.1 O Princípio da não-cumulatividade.

O princípio da não-cumulatividade irá informar a tributação por meio do IPI conforme a previsão constitucional do art. 153, § 3º, II, que prescreve que a referida imposto “será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores.”

Trata-se diretriz constitucional imperativa, dirigida ao legislador infraconstitucional, bem como ao intérprete e aplicador do direito. Ela possui eficácia plena e aplicabilidade imediata.

A não-cumulatividade não é uma mera técnica arrecadatória, representando uma simples fórmula de apuração do quantum devido à título de tributo.

É princípio constitucional que se volta à realização de alguns valores desejados pelo o constituinte originário, como a justiça tributária, o respeito à capacidade contributiva do administrado e a uniformidade de distribuição da carga tributária.

Como princípio que é, desfruta de um status privilegiado, não podendo sofrer qualquer alteração por força de norma infraconstitucionais, sendo, portanto, uma norma autoaplicável, prescindindo de outras regras concretizadoras para produzir seus efeitos.

O objetivo pretendido com o princípio da não-cumulatividade é evitar a tributação em cascata, buscando a desoneração do ciclo produtivo, resultando em um menor custo da produção para o industrial.

Promove-se, também, a fomentação da produção de bens, gerando mais empregos, fazendo com que haja a circulação de riquezas e permitindo ao consumidor final um produto mais acessível, já que é este quem irá suportar todo o encargo econômico (contribuinte de fato do imposto).

Nas palavras do mestre Eduardo Domingos Bottallo:

“Ao instituir tal sistema, o legislador constituinte teve em mira favorecer o contribuinte (de direito) deste tributo, aliviando a pressão sobre os custos de produção, o que, em última análise, reverte em prol do consumidor final (contribuinte de fato), mediante a determinação de preços menos onerados pela carga fiscal.”[6]

O princípio da não-cumulatividade pressupõe a existência de etapas de ciclo produtivo, onde há operações sucessivas caracterizadoras da hipótese de incidência do tributo (impostos plurifásicos).

O princípio da não-cumulatividade irá se operacionalizar a partir do surgimento de um direito à compensação, sendo este o meio mais efetivo para se afastar a cumulatividade.

Neste sentido, o Estado possui o dever/poder de garantir ao sujeito passivo o direito subjetivo constitucional de compensar, em cada operação, o montante cobrado (devido) na operação anterior.

O contribuinte tem o direito de efetuar o pagamento apenas da diferença apurada, se existir, a partir da compensação de créditos e débitos escriturados. Ou seja, o valor devido à título de tributo será um valor resultante de uma subtração entre o montante de imposto devido e o montante de imposto cobrado na etapa anterior.

Surgirá, para o sujeito passivo, um direito ao crédito correspondente ao valor do imposto cobrado na etapa anterior e que poderá ser abatido do montante devido na etapa subsequente (débito).

O direito a compensação surge independentemente do pagamento, cobrança ou incidência nas operações anteriores. Assim, se o sujeito passivo da operação anterior não efetuou o pagamento do imposto, ou se este não foi lançado pela Fazenda Pública, isto não irá prejudicar ou impedir o direito à compensação, devendo o abatimento ser observado mesmo nessas hipóteses.

Nas palavras do mestre José Eduardo Soares de Melo:

“Considerando os diversos motivos pelos quais um contribuinte deixa de recolher o IPI (esquecimento, ausência de suporte financeiro, questionamento), ou o Fisco de lança-lo (prazo decadencial), entende-se que a prévia “cobrança” (ou a liquidação do tributo) não constitui pressupostos essencial do direito ao crédito. Deve-se compreender a existência de uma anterior operação, sendo irrelevante exigir-se ato de cobrança, ou prova de extinção da obrigação (…).”[7]

Neste sentido, basta a existência de uma operação anterior que poderia estar sujeita a incidência por via do IPI, para o surgimento do direito ao crédito com aproveitamento em sua escrituração fiscal. Ou seja, que tenha ocorrido um episódio suscetível de ser tributado pela referida exação, independente de cobrança ou pagamento.

O direito à compensação está presente independente da proveniência e origem dos insumos (matéria-prima, materiais de embalagens ou produtos intermediários) e deve ser apurado levando-se em consideração as operações realizadas em um dado período de tempo.

O direito ao crédito é uma regra-matriz independente, que não se confunde com a regra-matriz de incidência tributária. Assim, o direito ao crédito irá surgir independentemente da operação anterior ser isenta, não-tributada ou sujeita à alíquota zero.

Temos duas relações jurídicas distintas. Em uma, temos o Estado como sujeito ativo de um direito subjetivo de exigir o adimplemento da obrigação tributária. Em outra, o Estado é o sujeito passivo devendo garantir ao contribuinte o direito à compensação. A posição dos sujeitos se invertem nessas duas relações.

Neste sentido, o direito ao crédito nasce independentemente do surgimento da obrigação tributária uma vez que a regra-matriz do crédito tributário é autônoma, não se confundindo com a norma padrão de incidência.

Nas palavras do mestre Paulo de Barros Carvalho:

“Cabe salientar, enfim, que a regra que estipula o nascimento do direito ao crédito goza de autonomia, relativamente à norma que cuida da imposição tributária. Portanto, se para a formação do direito ao crédito é irrelevante o próprio nascimento da obrigação, muito mais ainda será a circunstância de ter sido ou não extinta essa mesma relação: a cobrança do tributo na operação anterior torna-se irrelevante para a formação do direito ao crédito.”[8]

Desconsiderar a autonomia da regra-matriz do direito ao crédito, vinculando-a à norma padrão de incidência tributária, consubstanciaria uma violação ao princípio constitucional da não-cumulatividade prescrito ao IPI.

As desonerações tributárias não têm o condão de impedir o real aproveitamento do crédito tributário, sob pena de caracterizar-se uma restrição ao princípio da não-cumulatividade, não prevista na Carta Maior.

A Constituição Federal, no que diz respeito à tributação por meio do IPI, não traçou nenhum limite ou exceção ao surgimento do direito do crédito pelo sujeito passivo. Neste sentido, não pode o legislador infraconstitucional criar barreiras ao aproveitamento do crédito que não foram previstas em normas constitucionais.

Caso contrário, estaríamos diante de um diferimento da incidência do imposto, com mais imposto a pagar à Fazenda Pública e elevação do preço final do produto que será suportado pelo consumidor.

Como nos ensina o mestre Eduardo Domingos Bottallo:

“Do contrário, o incentivo (a isenção) não passaria de mero diferimento da incidência do imposto, uma vez que o contribuinte sofreria gravame equivalente ao que suportaria caso não existisse a exoneração. Em outras palavras, o adquirente de matérias-primas e de insumos isentos, conquanto viesse a pagar preço aparentemente menor por estes itens, acabaria suportando carga tributária superior (em virtude de não poder creditar-se), resultando anulado, por completo, o efeito buscado pela norma liberatória.”[9]

O direito ao crédito do IPI dos valores relativos às operações anteriores, prescrito no ar.t 153, § 3º, II, da Constituição Federal, é um direito do contribuinte que não encontra ressalvas constitucionais, ao contrário do ocorre com o ICMS. Neste sentido, não caberá ao legislador ordinário, ou mesmo complementar, dispor sobre possíveis restrições que a Lei Maior não fez.

O problema que se apresenta com a existência de benefícios fiscais na operação anterior, diz respeito a qual alíquota deverá ser utilizada para a tomada de créditos.

Entendo que a alíquota a ser utilizada é a mesma que será aplicada na saída tributada pelo IPI do produto que foi industrializado, devendo prevalecer a equivalência de alíquotas entre os créditos e os débitos.

3.2 A Seletividade em função da essencialidade do produto.

O imposto seletivo é aquele que, utilizando determinados critérios de discriminação, onera diferentemente os bens sobre os quais incide. A seletividade implica em uma distinção de alíquotas em função do tipo de produto.

O princípio da seletividade em função da essencialidade do produto informa a tributação por meio do IPI. Tem previsão legal no art. 153, §3º, I, da Constituição Federal e no art. 48 do CTN.

Prescreve o art. 153, §3º, I, CF, que o IPI “será seletivo, em função da essencialidade do produto.” Trata-se de um mandamento constitucional dirigido ao legislador infraconstitucional, de eficácia plena e aplicabilidade imediata. Consubstancia-se em um verdadeiro poder/dever.

O princípio da seletividade é uma das formas de se instrumentalizar a extrafiscalidade do IPI, através da adoção de um sistema de alíquotas diferenciadas em função da essencialidade, permitindo diminuir o ônus tributário sobre os produtos que são imprescindíveis aos indivíduos e à sociedade.

Nos ensinamentos do mestre Eduardo Domingos Bottallo:

“Para sua efetiva realização, a seletividade, no IPI, poderá ser buscada mediante a utilização de quaisquer técnicas que possam redundar na modificação quantitativa da carga tributária: sistema de alíquotas diferenciadas, variação de bases de cálculo, criação de incentivos fiscais e semelhantes. Contudo, acaba sendo confirmado, na prática, que, por intermédio da manipulação das alíquotas, mais facilmente se alcança a seletividade no IPI.”[10]

Ao instituir tributos, exercendo sua competência tributária, o legislador imprime, na sua atividade legiferante, valores e objetivos que pretende alcançar com a criação de determinada exação.

Se seu fim for prestigiar situação social, política ou econômica, ou seja, perseguindo objetivos alheios aos meramente arrecadatórios, falamos de extrafiscalidade, ou seja, “tributação com outros fins que não a obtenção de receita, constituindo um recurso técnico muito usado pelo governo como intervenção do Estado no meio social e na economia.”[11]

Neste sentido, o IPI é um imposto extrafiscal usado como instrumento para induzir comportamentos, estimulando ou desestimulando condutas. É utilizado como forma de intervenção estatal nos campos político, social e econômico, a fim de viabilizar a implementação de políticas públicas.

O princípio da seletividade no IPI é uma norma tributária extrafiscal que visa à realização de objetivos de justiça social. Neste sentido, deve ser observada pelo legislador ordinário, no exercício de sua competência tributária e, pelo Poder Executivo, ao alterar as alíquotas dentro dos parâmetros legais.

Os produtos considerados essenciais ou de primeira necessidade sofrerão uma incidência tributária mais branda com a aplicação de alíquotas menores para cálculo do montante devido à título de IPI.

Já os produtos suntuários ou de consumo restrito serão tributados de maneira mais onerosa, com a aplicação de alíquotas maiores a fim de se determinar o quantum debeatur.

Assim, as alíquotas do IPI poderão variar para mais, na razão inversa da essencialidade do produto industrializado; ou para menos, inclusive chegando a zero, quando tratar-se de produtos considerados de alta significação social e essenciais para a coletividade.

O princípio da seletividade leva em consideração um outro princípio constitucional: o da capacidade contributiva. Como o princípio da não-cumulatividade, ambos buscam a adequação do IPI à capacidade econômica do adquirente do produto, que é quem suporta todo o ônus do imposto em questão.

Neste sentido, os indivíduos que apresentam maior poder econômico (fatos-signos presuntivo de riqueza) deverão ser tributados de forma mais onerosa do que aqueles que possuem rendimentos parcos, que sofrerão uma incidência tributária mais branda ou até mesmo serão desonerados.

O princípio da capacidade contributiva impõe limites à extrafiscalidade do IPI que se manifesta por meio do princípio da seletividade em função da essencialidade do produto industrializado.

Como ensina o mestre Ricardo Lobo Torres:

“O legislador tem ampla possibilidade de procurar a norma justa para fazer atuar o princípio da seletividade segundo a essencialidade. Mas encontra limitações nos direitos fundamentais e no próprio princípio da capacidade contributiva que governa a incidência tributária sintetizados na igualdade fiscal.”[12]

O princípio da seletividade permite adequação do IPI aos critérios da justiça fiscal, levando-se em consideração os interesses dos consumidores finais (contribuintes de fato), que suportam a carga econômica do IPI.

Neste sentido, quem pode adquirir produtos supérfluos apresenta uma capacidade contributiva maior, devendo, proporcionalmente, ser mais onerado do que aquele que compra um produto dito essencial, onde a rigor, não há liberdade de consumo.

Essencialidade é aquilo que constitui a essência, sendo necessário, indispensável e importante. É um conceito que deve adequar-se ao momento histórico, levando-se em consideração às necessidades da coletividade. O princípio deve, neste sentido, moldar-se às transformações sociais e econômicas verificadas em uma sociedade em um certo espaço de tempo.

Existem alguns critérios que podem ser adotados pelo legislador ordinário para definir um produto como essencial: (i) a adequação do produto à vida do maior número de habitantes de um país; (ii) destinação ou a finalidade que será dada ao produto; e (iii) processo de comparação entre produtos.

Os chamados bens imprescindíveis não deixam margem de liberdade para o consumo, sendo produtos necessários à maior parte da população e, justamente por isso, devem receber um tratamento fiscal mais brando.

Aprofundando a questão, podemos dizer que o chamado mínimo vital é insuscetível de tributação. Neste sentido, os produtos considerados essenciais à manutenção da vida, saúde, vestuário, moradia e alimentação, dentre outros, não devem, ou pelo menos, não deveriam sofrer a incidência do IPI.

Neste sentido, nos ensina o mestre Roque Antonio Carrazza:

“É tarefa difícil precisar o que vem a ser mínimo vital. É certo, porém, que ele gravita em torno de bens mais preciosos do ser humano: a vida, a saúde, a cultura, quer próprias, quer familiares e dependentes. Minudenciando a asserção, os valores monetários ou operações jurídicas que garantem o direito à vida, à saúde, ao bem-estar, à educação, à moradia, ao lazer etc., do contribuinte ou de seus familiares e dependentes, devem, o mais possível, passar a largo da tributação.”[13]

Uma outra questão que se coloca em relação ao princípio da seletividade diz respeito a possibilidade de controle por parte do Poder Judiciário no que diz respeito ao conteúdo mínimo da expressão “essencialidade do produto”.

Neste sentido, ainda que o referido princípio seja dirigido ao legislador ordinário da União, entendemos que existe a possibilidade do Poder Judiciário exercer o controle sobre a aplicação do princípio, verificando se o Poder Legislativo adotou critérios técnicos e racionais para definir um produto como essencial.

Nas palavras do mestre Eduardo Domingos Bottallo:

“Com efeito, o Poder Judiciário não está menos autorizado do que o Poder Legislativo a investigar o alcance da expressão em foco. Isto significa que o Judiciário pode -e deve- averiguar se os critérios adotados pelo Legislativo foram adequados e racionais. Se concluir que a legislação ultrapassou as fronteiras da razoabilidade e do bom senso, poderá perfeitamente restabelecer o benefício fiscal.”[14]

Ainda que o legislador ordinário tenha uma margem de liberdade, podendo atuar com certa discricionariedade no momento de definir o sentido e o alcance da expressão “essencialidade do produto”, o contribuinte, sentindo-se lesado, tem o direito de provocar o judiciário para que este se manifeste à luz de critérios técnicos.

Por fim vale destacar que, o princípio da seletividade exerce uma força de atração no que diz respeito aos componentes e acessórios que se agregam ao produto final, de tal sorte que aqueles devem receber o mesmo tratamento tributário, sujeitando-se às mesmas normas que alcançam a comercialização dos produtos aos quais se incorporam.

4. IPI SOBRE A IMPORTAÇÃO DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS DO EXTERIOR (IPI-IMPORTAÇÃO).

4.1 Critério Material do IPI-importação.

O critério material do IPI-importação é importar produtos industrializados advindos do exterior. Para alguns autores, trata-se de um mero adicional do imposto de importação, sendo que a materialidade constitucionalmente eleita para o IPI seria a conduta “realizar operações jurídicas com produtos industrializados”.

Nos ensinamentos do mestre Eduardo Domingos Bottallo:

“Embora, à primeira vista, aparente ser mera “variante operacional” do IPI, a exação que, nos termos do art. 46, I, do CTN, incide sobre a importação de bens industrializados no exterior, confunde-se com o imposto sobre a importação, também incluído na esfera de competência tributária da União, nos termos do art. 151, I, da Lei Maior. Daí concluirmos que, no contexto ora considerado, o IPI equivale a mero adicional do imposto de importação.”[15]

Neste sentido, parte da doutrina entende tratar-se de uma superposição do IPI-importação e do Imposto de Importação (II).

Entretanto, deve-se falar em uma superposição parcial porque o campo de incidência do imposto de importação não abrange a importação de produtos brasileiros exportados.

Assim, o IPI-importação desempenha um papel importante de proteção da Fazenda Nacional contra a fraude e a evasão fiscal, já que o imposto de importação só pode incidir sobre a importação de produtos estrangeiros, não abarcando os produtos nacionais ou nacionalizados que, enviados ao exterior, venham a ser introduzidos em território nacional.

Nesta linha, ensina o mestre Hugo de Brito Machado:

“Como o imposto de importação não pode incidir em tal caso, posto que não se trata de importação de produtos estrangeiros, e a exportação dos produtos brasileiros ocorre sem a incidência de impostos, poderia a exportação destes ser feita com o propósito de sua posterior importação, simplesmente como uma forma de fugir dos impostos.”[16]

Para outra parte da doutrina, que é também nosso entendimento, trata-se de uma regra-matriz de incidência autônoma e distinta da materialidade “industrializar produtos”, não se confundindo com o imposto de importação, conforme prescreve a legislação infraconstitucional, especificamente o art. 46, I do CTN e o art. 2º, I da Lei nº 4.502/64, que instituiu o IPI.

Prescreve o art. 46, I, do CTN:

“O imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato gerador:

I-o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira;”

Neste mesmo diapasão, prescreve a Lei nº 4.502/64 no seu art. 2º, I:

“Art. 2º Constitui fato gerador do imposto:

 I – quanto aos produtos de procedência estrangeira o respectivo desembaraço aduaneiro;”

O constituinte originário, ao descrever a competência da União para legislar sobre o IPI, prescreveu que a referida exação poderia ser instituída sobre “produtos industrializados”, não existindo qualquer outro limite constitucional direcionado ao legislador ordinário para eleger as hipóteses tributárias, dede que preservada o núcleo de incidência, qual seja, produto industrializado.

Temos, portanto, uma hipótese de incidência autorizada pelo ordenamento pátrio, uma vez que a Lei Maior não restringiu a expressão produtos industrializados com outros elementos, podendo o legislador ordinário da União instituir o IPI-importação, não se confundindo com o regra-matriz do IPI que incidente sobre as operações realizadas com produtos industrializados.

Além do mais, não podemos desconsiderar que o IPI possui uma importante função extrafiscal, sendo utilizado para induzir comportamentos, estimulando ou desestimulando condutas.

É instrumento para implementação de políticas econômicas que buscam não só proteger o parque industrial nacional, mas também visa assegurar os princípios da isonomia e da livre-concorrência, uma vez que submete o produto importado ao mesmo tratamento tributário dispensado ao produto industrializado nacional.

Neste sentido, ensina Misabel Derzi:

“ (…) a norma adotada no mercado internacional é aquela de desoneração das exportações, de tal modo que os produtos e serviços importados chegam ao país do destino livres de todo imposto. Seria agressivo à regra da livre concorrência e aos interesses nacionais pôr em posição desfavorável a produção nacional, que sofre a incidência do IPI e do ICMS. Daí a necessidade de se fazer incidir o IPI sobre a importação de produtos industrializados.”[17]

Se o produto nacional sofre a incidência do IPI no mercado interno, não poderá o produto industrializado de procedência estrangeira sofrer um tratamento distinto, sob pena de violar o princípio da equidade concorrencial.

O produto estrangeiro deverá sofrer a mesma incidência que está sujeita o produto nacional, visando garantir os interesses da industrial nacional, buscando condições de igualdade entre o produto industrializado nacional e o estrangeiro.

Caso não haja a incidência do IPI na importação, os produtos estrangeiros entrariam no país com preços inferiores aos nacionais, já que apenas estes últimos seriam tributados por meio do IPI. Neste caso, teríamos uma violação ao princípio da livre-concorrência.

Além do mais, como as exportações estão imunes à incidência do IPI, o industrial poderia exportar o produto industrializado, para logo depois, importá-lo, sem que fosse alcançado pela incidência do IPI, caracterizando um mecanismo de evasão fiscal.

4.2 Critério Pessoal.

4.2.1 Importador equiparado ao industrial.

Conforme prescreve o art. 153, IV, da Constituição Federal, o sujeito ativo do IPI é a União. Neste sentido, caberá a União a competência tributária para instituir o IPI-importação nos termos da Lei nº 4.502/64 c/c art. 46, I do CTN.

Já o sujeito passivo do IPI-importação é o importador ou quem a lei a ele equiparar, conforme prescreve o art. 51, I, do CTN.

O importador é aquele que mantém relação direta e pessoal com o critério material da hipótese de incidência. É quem realiza o fato imponível.

No entanto, este quesito questão ganha importância porque além do importador, poderá figurar como sujeito passivo da obrigação tributária o “equiparado ao importador”, ou seja, aquele sujeito que apresenta semelhanças com o importador, ainda que existam dissemelhanças secundárias.

Neste sentido, ensinam Roque Antonio Carrazza e Eduardo Domingos Bottallo:

“ (…) equiparação é um artifício, usado pelo legislador, para igualar situações que, posto dissemelhantes, apresentam pontos de identificação. Trata-se, pois, de um artifício, que busca equalizar, sob a ótica do Direito, coisas diferentes, dispensando-lhes o mesmo tratamento.”[18]

A questão ganha importância porque o Decreto nº 7.212/10, no seu art. 9º, I, equipara ao estabelecimento industrial “os estabelecimentos importadores de produtos de procedência estrangeira, que derem saída a esses produtos”.

Assim, o importador sofrerá a incidência do IPI em dois momentos: (i) no desembaraço aduaneiro; e (ii) na saída do produto nacionalizado do estabelecimento importador.

Não se trata aqui de uma equiparação legal, mas de uma ficção jurídica, uma vez que o importador não guarda qualquer identificação com o estabelecimento industrial.

Nos ensinamentos dos mestres Roque Antonio Carrazza e Eduardo Domingos Bottallo:

“(…) na ficção, o ato, mais que improvável ou inverossímil, é falso e, nesta medida, jamais será real. É um artifício do legislador, que transforma uma impossibilidade material numa possibilidade de natureza jurídica. Neste sentido, é uma criação do legislador, que faz nascer uma verdade jurídica diferente da verdade real.”[19]

Veja, o importador não realizou qualquer processo de industrialização, não guardando nenhuma relação com o comportamento “industrializar produtos”. Assim, não pode sofrer a incidência do IPI no momento da saída dos produtos importados para a comercialização. Neste sentido, esta equiparação é absolutamente inconstitucional.

Na industrialização, um produto deve ser submetido a uma operação que modifique sua natureza, sua finalidade ou que o aperfeiçoe para o consumo. No caso do importador, o produto não passou por qualquer processo de industrialização, não podendo ser equiparado ao estabelecimento industrial, já que nada industrializou.

A atividade desenvolvida pelo importador no mercado interno em nada se assemelha com as atividades típicas de um industrial, não existindo semelhanças que fundamentem a equiparação. O que ocorre é uma ficção jurídica inidônea e não autorizada.

Como nos ensina o mestre Eduardo Domingos Bottallo:

“De feito, o comerciante-importador não submete produtos a processo de industrialização; tampouco, pratica atos visando sua disponibilização no mercado interno, eis que isso já ocorreu ao ensejo do desembaraço aduaneiro das mercadorias importadas. Como se vê, nem instrumental, nem finalisticamente, suas atividades, no mercado interno, podem ser identificadas com as típicas de um industrial. Daí não estarem presentes, os imprescindíveis pontos de aproximação, entre o comerciante-importador e o industrial, capazes de tornar tributariamente irrelevantes, as diferenças que entre eles existem.”[20]

A única incidência juridicamente possível é aquela que se verifica por ocasião do desembaraço aduaneiro, não podendo existir a tributação por via do IPI na saída do produto importado para revenda, já que os produtos nacionalizados não foram submetidos a nenhum tipo de processo de industrialização.

Assim, os produtos destinados à revenda no mercado interno não podem sofrer, novamente, a incidência do IPI, por ocasião da saída do estabelecimento importador.

Neste sentido, o referido Decreto inovou o ordenamento jurídico, alargando, de maneira indevida, o campo de incidência tributária da referida exação, alterando a regra-matriz de incidência que foi constitucionalmente definida.

As competências tributárias forma discriminadas pelo Texto Maior de maneira minuciosa e exaustiva. Neste caso, significaria dizer que a Constituição Federal não é rígida e que as faixas de competência poderiam ser alteradas pela legislação infraconstitucional.

Assim, a legislação ordinária, ao determinar que o IPI deva incidir sobre a saída do produto do estabelecimento importador, cria uma obrigação tributária ao sujeito passivo que não deveria existir, violando direito fundamental do contribuinte.

Vale destacar que o importador-comerciante, ao sofrer novamente a incidência do IPI no momento da saída do produto nacionalizado do estabelecimento importador, encontra-se em situação de desigualdade em relação ao comerciante que adquire um produto similar nacional, caracterizando-se uma violação ao princípio da igualdade e da isonomia tributária, uma vez que estamos diante de uma situação em que o produto industrializado importado sofreu uma tributação mais onerosa que o similar nacional.

Como o importador não é o sujeito passivo que realiza o ato de industrialização, não poderá sofrer a incidência do IPI no momento da saída da mercadoria do estabelecimento importador. A revenda, no mercado interno, do produto nacionalizado não é materialidade que enseja a incidência da referida exação.

O Decreto nº 7.212/10 criou situação de bitributação, autorizando a duplicidade de incidência do IPI, primeiro no desembaraço aduaneiro e depois na saída da mercadoria do estabelecimento importador.

O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de afastar a incidência tributária na saída do estabelecimento importador por inexistirem atos de industrialização, uma vez que o importador não realizou o fato imponível “industrializar produtos”.

EMPRESA IMPORTADORA. FATO GERADOR DO IPI. DESEMBARAÇO ADUANEIRO.

I – O fato gerador do IPI, nos termos do artigo 46 do CTN, ocorre alternativamente na saída do produto do estabelecimento; no desembaraço aduaneiro ou na arrematação em leilão.

II – Tratando-se de empresa importadora o fato gerador ocorre no desembaraço aduaneiro, não sendo viável nova cobrança do IPI na saída do produto quando de sua comercialização, ante a vedação ao fenômeno da bitributação.

III – Recurso especial provido.[21]

A revenda de um produto que não tenha sido objeto de qualquer nova etapa de industrialização não poderia ser alvo de nova incidência do IPI, uma vez que o referido tributo não visa tributar o simples comércio, mas a operação jurídico-mercantil com produto industrializado que se dá entre o industrial e um terceiro.

Além do mais, vale destacar que esta bitributação imposta ao importador-comerciante viola os princípios da capacidade contributiva e do não-confisco.

O princípio da capacidade contributiva é mandamento constitucional previsto no art. 145, § 1º, da Constituição Federal que prescreve que “Sempre que possível os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte (…)”.

Este princípio se encontra nas dobras do princípio da igualdade e ajuda a realizar, no campo tributário, os ideais republicanos. É uma das formas de se instrumentalizar a justiça fiscal, levando-se em consideração dos signos de riqueza dos contribuintes.

Por outro lado, é vedado a União utilizar tributo com efeito de confisco, ou seja, é confiscatório o tributo que esgota ou tem potencialidade para esgotar a riqueza tributável das pessoas, impedindo ou dificultando o exercício de suas atividades habituais.

No caso do importador, que já recolheu o IPI no momento do desembaraço aduaneiro, não poderia ser alcançado novamente pela referida exação quando revender, no mercado interno, os produtos nacionalizados, já que esta sobretaxação absorveria, sem causa, parte de sua propriedade.

Assim, esta dupla incidência imposta ao importador de produtos industrializados, significaria exigir o IPI fora de sua regra-matriz constitucional, violando o princípio da capacidade contributiva, além de imprimir-lhe feições confiscatórias.

Por fim, vale acrescentar que os argumentos acima expostos podem ser aplicados aos estabelecimentos atacadistas e varejistas que adquirem produtos importados por conta e ordem de terceiros ou por encomenda.

Por força da Lei 11281/96, estes estabelecimentos foram equiparados a industriais, fazendo nascer a obrigação tributária de pagar IPI, ainda que não realizem nenhum processo de industrialização.

4.2.2 Importador pessoa física.

Trataremos agora da importação de produto industrializado por pessoa física que adquire o produto para uso próprio. A questão tem gerado grandes discussões na Justiça Federal e sempre foi objeto de discordância entre Tribunais Regionais Federais, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal.

A questão, em particular, versa sobre a aquisição de veículo automotor para uso próprio da pessoa física. No âmbito do STF, o Plenário não havia apreciado a questão a fundo, existiam apenas julgamentos da Primeira e da Segunda Turma, referentes a agravos regimentais, que consolidaram o entendimento no sentido da não incidência do IPI na importação de veículo automotor por pessoa física.

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. IPI. IMPORTAÇÃO DE VEÍCULO PARA USO PRÓPRIO NÃO INCIDÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO. I – Não incide IPI em importação de veículo automotor, por pessoa física, para uso próprio. Aplicabilidade do princípio da não cumulatividade. Precedentes. II – Agravo regimental improvido.[22]

O STF havia se posicionado no sentido da não incidência do IPI sobre a importação de veículo automotor por pessoa física já que o sujeito não teria como repassar o ônus econômico, o que violaria o princípio da não cumulatividade.

Neste caso, as pessoas físicas ou jurídicas não seriam contribuintes do IPI, não existindo etapas subsequentes, o que implica dizer que deveriam suportar todo o ônus econômico decorrente da tributação por via do IPI. Seriam os consumidores finais do produto.

Não obstante o acima exposto, o IPI-importação possui uma função extrafiscal, visando garantir os princípios da isonomia e da livre-concorrência, na medida em que o produto industrializado importado deve receber o mesmo tratamento tributário que o produto industrializado nacional.

Neste sentido, o objetivo da incidência do IPI-importação é manter a igualde de preços entre o produto importado e o similar nacional, resguardado o princípio da igualdade e da isonomia tributária.

Também não há de se falar em violação ao princípio da não-cumulativadade. O referido princípio pressupõe a existência de etapas de um ciclo produtivo, situação em que o produto industrializado percorre mais de uma etapa.

No caso da importação de veículo automotor por pessoa física, trata-se de uma incidência monofásica. Portanto, não há de se falar em não-cumulatividade e muito menos em violação do princípio em pauta porque a operação jurídica se implementa em uma única fase.

Para que o princípio da não-cumulatividade fosse violado, necessário seria a existência de várias etapas, sem o surgimento do direito à compensação. O caso em tela, trata-se de uma única incidência a cargo do consumidor final.

Em 04/02/2016, o Plenário do STF, por maioria, apreciando o tema da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário, e fixou a seguinte tese:

Incide o imposto de produtos industrializados na importação de veículo automotor por pessoa natural, ainda que não desempenhe atividade empresarial e o faça para uso próprio” (RE 723651, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 04/02/2016, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-164 DIVULG 04-08-2016 PUBLIC 05-08-2016).

Neste sentido, no julgamento do RE 723.651/PR restou definida a incidência do IPI na importação de veículos automotores por pessoas físicas, posição que se contrapõe ao longo período de decisões proferidas de forma favorável aos contribuintes.

CONCLUSÕES

O imposto sobre produtos industrializados é de competência da União e foi criado pela Constituição de 1934 com a denominação imposto sobre o consumo. Somente com a Emenda Constitucional nº 18/65 passou a denominar-se IPI.

Entretanto, a Lei nº 4.502/64, que instituiu o imposto sobre o consumo, continua sendo a norma geral que disciplina a referida espécie tributária, atualmente denominada imposto sobre produtos industrializados.

No que diz respeito ao perfil constitucional do IPI, traçado pela Carta Magna de 1988, a referida exação é informada, dentre outros, por dois princípios de altíssima relevância e que devem ser observados pelo legislador infraconstitucional no exercício de sua atividade legiferante, bem como pelo intérprete e operador do direito: tratam-se dos princípios da seletividade e o da não-cumulatividade.

O princípio da não-cumulatividade instrumentaliza-se pelo direito à compensação, surgindo para a Estado um dever/poder de garantir ao contribuinte o direito de efetuar o pagamento, à título de tributo, apenas da diferença apurada em determinado período, a partir de uma conta corrente de créditos e débitos.

Já o princípio da seletividade prescreve que o IPI será seletivo em função da essencialidade do produto e é uma das formas de se instrumentalizar a extrafiscalidade do referido imposto.

A partir da adoção de um sistema de alíquotas diferenciadas, os produtos industrializados, considerados essenciais, sofrerão uma tributação menos onerosa, com a aplicação de alíquotas menores para o cálculo do quantum debeatur, do que aqueles produtos considerados de consumo restrito, sobre os quais incidirão alíquotas maiores para o cálculo do valor a ser pago à título de IPI.

Da conjugação entre os mandamentos constitucionais e a legislação infraconstitucional, conclui-se que são três as regras-matrizes do IPI: (i) operações com produtos industrializados; (ii) arrematação, em leilão, de produtos industrializados abandonados ou apreendidos; e (iii) a importação de produtos advindos do exterior, sendo esta última objeto de análise do nosso artigo.

Neste sentido, no que diz ao presente estudo, a materialidade do IPI é a conduta importar produtos industrializados do exterior, sendo regra-matriz autônoma autorizada pelo ordenamento pátrio, uma vez que a nossa Constituição Federal não restringiu a expressão produtos industrializados com outros elementos, podendo o legislador ordinário da União instituir o IPI-importação.

Além do mais, o IPI possui uma função extrafiscal no sentido de que dispensar ao produto importado o mesmo tratamento tributário que sofre o similar nacional, preservando os interesses econômicos nacionais e assegurando o princípio da livre-concorrência e da isonomia tributária.

Por fim, no que diz respeito ao critério pessoal do IPI-importação, o sujeito passivo, por força do art. 51, I, do CTN, será o importador ou quem a lei a ele equiparar.

O equiparado ao importador é aquele que apresenta semelhanças ainda que existam dissemelhanças secundárias. Ou seja, é o sujeito passivo que mantém uma relação, ainda que indireta, com a materialidade do referido imposto.

Entretanto, o Decreto nº 7.212/10 equiparou ao estabelecimento industrial o estabelecimento importador que der saída aos seus produtos.

Trata-se não de uma equiparação, mas de uma ficção jurídica inidônea que não passa no teste da constitucionalidade, uma vez que a atividade desenvolvida pelo importador no mercado interno em nada se assemelha com as atividades típicas de um industrial, uma vez que o importador nada industrializou.

Além do mais, caracteriza-se uma violação ao princípio da livre-iniciativa e da isonomia tributária, uma vez que o importador estaria submetido a uma bitributação, ocorrida no momento do desembaraço aduaneiro e na saída do produto do estabelecimento importador, significando um produto importado mais oneroso, pela dupla incidência do IPI, que o similar nacional.

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[1] CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito. 2º ed. São Paulo: Noeses, 2010, p.382.

[2] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 27º ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p.291.

[3] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário Linguagem e Método. 4º ed. São Paulo: Noeses, 2011, p.688.

[4] BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI-Princípios e Estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p.32.

[5] BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI-Princípios e Estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p.29.

[6] BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI-Princípios e Estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p.35.

[7] MELO, José Eduardo Soares de. IPI-Teoria e Prática. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p.171.

[8]CARVALHO, Paulo de Barros. Isenções tributárias do IPI, em face do princípio da não-cumulatividadde. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, n. 33, 1998, p.160.

[9] BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI-Princípios e Estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p.41.

[10] BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI-Princípios e Estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p.56.

[11] Conceito dado por Geraldo Ataliba, citado por Maria Helena Diniz. Dicionário Jurídico. Vol. II, 1998, p.491-492.

[12]TORRES, Ricardo Lobo. O IPI e o princípio da seletividade. Revista Dialética de Direito Tributário nº 18. São Paulo: Dialética, 1997, p. 98.

[13]CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 15 ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 496.

[14] BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI-Princípios e Estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p.58.

[15] BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI-Princípios e Estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p.23.

[16] MACHADO, Hugo de Brito. O IPI e a importação de produtos industrializados: In: FILHO, OSWALDO Othon de Pontes Saraiva; VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira (Coords.). IPI Temas Constitucionais Polêmicos. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009, p. 287.

[17]BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Atualizado por Misabel Abreu machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

[18]CARRAZZA, Roque Antonio; BOTTALLO, Eduardo Domingos. A não-incidência do IPI nas operações internas com mercadorias por comerciantes (um falso caso de equiparação legal). Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, nº 140, 2007, p.98.

[19]CARRAZZA, Roque Antonio; BOTTALLO, Eduardo Domingos. A não-incidência do IPI nas operações internas com mercadorias por comerciantes (um falso caso de equiparação legal). Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, nº 140, 2007, p.98

[20] BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI-Princípios e Estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p.24.

[21]BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 841.269/BA. Relator: Ministro Francisco Falcão. Julgamento: 28 nov. 2006. Órgão julgador: Primeira Turma. Publicação: DJ 14 dez. 2006, p. 298.

[22]BRASIL. Superior Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 550170. Agravo Regimental não provido. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski. Julgamento:07 jun. 2011. Órgão julgador: Primeira Turma. Publicação: DJe-149, 04 nov. 2011, p.291.

Como citar e referenciar este artigo:
TOLEDO, Ricardo Runavicius. Os critérios material e pessoal do IPI sobre a importação de produtos industrializados do exterior. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2019. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-tributario/os-criterios-material-e-pessoal-do-ipi-sobre-a-importacao-de-produtos-industrializados-do-exterior/ Acesso em: 29 mar. 2024