Direito Tributário

Taxa de Iluminação Pública

Taxa de Iluminação Pública

 

 

Fernando Machado da Silva Lima*

 

 

22.03.2000

 

 

      Desde 1.986, o Supremo Tribunal Federal tem julgado inconstitucional a cobrança da Taxa de Iluminação Pública (TIP), com fundamento no art. 145, inciso II da Constituição Federal, que permite a cobrança de taxas apenas

 

“em razão do exercício do poder de polícia, ou em decorrência da utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição”.

 

      Dispõe o Código Tributário e de Rendas do Município de Belém (Lei 7.056/77), em seu artigo 114, que o fato gerador dessa taxa é a prestação, pela Prefeitura, do serviço de iluminação pública de vias, ruas, praças, parques, estradas e demais logradouros.

 

 O art. 115, com a redação que lhe foi dada pelo art. 9o da Lei 7.473/89, estabelece que essa taxa será cobrada, para os terrenos edificados, de acordo com as alíquotas fixadas na Tabela VII, aplicadas sobre o valor da tarifa de iluminação pública estabelecida pelo poder concedente. Essa taxa é arrecadada pela Celpa, de acordo com o art. 116. Quanto aos terrenos não edificados, porém, a taxa de iluminação é cobrada na guia do IPTU, e seu valor anual é fixado levando em conta a metragem linear da testada do imóvel.

 

      É evidente, assim, a inconstitucionalidade dessa legislação, porque os serviços de iluminação pública não são específicos e divisíveis, conforme exige o inciso II do art. 145 da CF, acima referido. Além disso, quanto aos terrenos não edificados, a lei fere também o § 2o do mesmo artigo 145, que proíbe que as taxas tenham base de cálculo própria de impostos.

 

As leis municipais 7056/77 e 7473/89, que tratam da TIP, conflitam ainda com a Constituição do Estado do Pará (art. 217, II e § 2o), com a Lei Orgânica do Município de Belém (art. 100, V e § 3o ), e com o próprio Código Tributário Nacional (arts. 77 e 79).

 

      Em recente decisão (10.03.99), no Recurso Extraordinário 233.332-6/RJ, o STF declarou inconstitucionais, por unanimidade de votos, os arts. 176 e 179 da Lei 480/83, do Município de Niterói, RJ, com a redação da Lei 1244/93, porque a TIP é

 

“tributo de exação inviável, posto ter por fato gerador serviço inespecífico, não mensurável, indivisível e insuscetível de ser referido a determinado contribuinte, a ser custeado por meio do produto da arrecadação dos impostos gerais”.

 

Em seu relatório, o Ministro Ilmar Galvão opinou pela declaração de inconstitucionalidade das normas municipais, porque os serviços de iluminação pública constituem

 

“atividade estatal de caráter uti universi, destinada a beneficiar a população em geral, não podendo ser destacada em unidades autônomas nem permitida a individualização de sua área de atuação, além de não se apresentar suscetível de utilização separada por parte de cada um dos usuários do serviço”.

 

 O Ministro Carlos Velloso pediu vista dos Autos, para apresentar um voto muito bem fundamentado, desde o exame da Emenda Constitucional 18/65, que deu status constitucional ao conceito de taxa. Citou Roque Carrazza, para dizer que

 

 “os serviços públicos gerais, como os de iluminação pública, segurança pública, diplomacia, defesa externa do País e outros, são prestados uti universi, ou seja, a todos os cidadãos, indistintamente, alcançando assim a comunidade, considerada como um todo, beneficiando um número indeterminado, ou pelo menos indeterminável, de pessoas. Por essa razão, devem ser custeados pelos impostos. A especificidade e a divisibilidade são, portanto, requisitos essenciais dos serviços públicos remunerados através de taxas”.

 

No mesmo sentido, o Ministro citou ainda Hely Lopes Meirelles e Aliomar Baleeiro, para mostrar que o serviço

 

“é divisível quando possa funcionar em condições tais que se apure a utilização individual pelo usuário, como na expedição de certidões, na concessão de porte de armas, na aferição dos pesos e medidas, etc.”

 

 

 

O Ministro Carlos Velloso defendeu ainda, de acordo com a opinião de Sacha Calmon, a remuneração dos serviços públicos prestados pelo Estado através da cobrança de preços, nos termos do § 3o do art. 150 da Constituição Federal,

 

“faltando apenas editar a lei requerida pela Constituição, necessária a uma segura política tarifária, em prol dos usuários”.

 

Citou ainda, em seu voto, além de fartos precedentes jurisprudenciais, como o do Recurso Extraordinário referente à TIP do Município de Vitória, ES, a opinião de Ruy Barbosa Nogueira, para concluir que a iluminação pública é um serviço de uso comum (uti universi),

 

“favorecendo a todas as pessoas que passam na rua e também aos donos de imóveis, porém não é possível individualizar a quantidade de luz que cada um gasta, para ser possível a cobrança da taxa”.

 

      Ficou evidente, assim, a inconstitucionalidade da cobrança da TIP em Belém, porque a doutrina e a jurisprudência unânime do Supremo não admitem a instituição desse tipo de taxa pelas leis municipais, pelo simples fato de que não se trata de serviço público específico e divisível.

 

      Infelizmente, os atentados contra os princípios fundamentais de nosso ordenamento jurídico se multiplicam, no âmbito federal, nos Estados e nos 5.500 Municípios, sem que os mecanismos jurídicos destinados a evitar a prevalência das leis inconstitucionais demonstrem a mínima eficácia.

 

Há mais de dez anos, os contribuintes de Belém pagam o IPTU em alíquotas progressivas, e são obrigados a pagar, também, a Taxa de Limpeza Pública e a Taxa de Urbanização, cobradas juntamente com o IPTU, e a Taxa de Iluminação Pública, cobrada na conta da Rede Celpa.

 

Também há quase dez anos, os pensionistas do Município recebem apenas 60% do valor a que teriam direito, em decorrência das normas da Constituição Federal, repetidas na Constituição Estadual e na Lei Orgânica do Município de Belém, apesar da copiosa jurisprudência que reconhece o direito à integralidade das aposentadorias e pensões. A lei municipal é inconstitucional, a Justiça tem reconhecido esse direito, mas o IPMB continua pagando apenas 60%, e as autoridades que teriam competência para evitar esse atentado contra os direitos dos pensionistas permanecem omissas.

 

No âmbito estadual, a situação é um pouco melhor, porque a lei inconstitucional manda que o IPASEP pague 70% do valor a que os pensionistas teriam direito.

 

Mas o desrespeito aos princípios constitucionais já está tão arraigado entre nós, passando mesmo a fazer parte de nossa cultura, que as autoridades têm deixado, nos últimos anos, que os interessados recorram ao Judiciário, tradicionalmente lento, causando prejuízos a inúmeros contribuintes e pensionistas.

 

 

* Professor de Direito Constitucional da Unama

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Como citar e referenciar este artigo:
LIMA, Fernando Machado da Silva. Taxa de Iluminação Pública. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-tributario/taxa-de-iluminacao-publica-2/ Acesso em: 18 abr. 2024