Direito Tributário

A polêmica sobre o abrandamento da fase de produção de prova documental no Processo Administrativo Tributário

A polêmica sobre o abrandamento da fase de produção de prova documental no Processo Administrativo Tributário

 

 

Luiz Cláudio Barreto Silva*

 

 

A produção de prova documental no processo administrativo tributário federal não se limita ao momento da impugnação. É que em nome dos princípios da ampla defesa, legalidade, oficialidade e verdade material, dentre outros,  não se pode negar ao Administrado a produção de prova em outra fase. Além disso, a legislação disciplinadora do Processo Administrativo Federal [1] admite sejam produzidas provas antes da tomada de decisão. [2] 

 

É certo que se examinado com rigor o Decreto [3] que disciplina o Processo Administrativo tributário,  a possibilidade de produção de provas em outra fase não é concebível, excetuadas as situações previstas  naquele comando regulamentar. [4]  

 

Sobre o descabimento de produção de prova documental pelo Administrado em outra fase, precedente do Segundo Conselho de Contribuintes, da relatoria do Conselheiro Damião Cordeiro de Moraes, com fragmento de ementa nos seguintes termos:   

 

“A legislação que rege o contencioso administrativo prevê que, salvo exceções, a prova documental deverá ser apresentada no momento da impugnação, precluindo o direito de o contribuinte fazê-lo em outro momento processual” [5]  

 

No entanto, em sentido diverso, vale dizer, posicionando-se pela admissibilidade de produção de prova documental em fase seguinte à impugnação,  identificam-se na doutrina e na jurisprudência numerosos entendimentos. Neles,  existe expressa referência ao comando da Lei 9784/99, e aos princípios da legalidade, da oficialidade e da verdade material, dentre outros.

 

No que diz respeito ao temperamento do comando do  Decreto 70.235/72 com o advento da Lei 9.784/99,  a lição de Leandro Paulsen e Renê Bergmann Ávila:

 

“Juntada de documentos e preclusão (§ 2º). A regra do § 2º que veda a juntada de provas e documentos após a impugnação merece atenção. A jurisprudência do Conselho de Contribuinte, com acerto, tem abrandado o aparente rigor da regra, que viola frontalmente o princípio da ampla defesa e impede que se alcance a verdade material, sob o pretexto de acelerar a tramitação do processo. Tel relevância o inciso III do art. 3º da Lei 9784/99, editada posteriormente ao § 4º do presente artigo, introduzido pela Lei nº 9.532/97. Dispõe o mais recente artigo que é direito do administrado a apresentação de alegações e juntada de documentos a qualquer tempo, antes da decisão. Temos, por isso, que a disposição do Decreto não subsiste perante a garantia constitucional da ampla defesa e do contraditório, ambos reiterados como garantia do contribuinte no art. 2º da Lei 9.789/99, que apenas positivou o que antes era vedado inconstitucionalmente pelo Decreto 70.235/72, em violação direta à garantia prevista na Carta da República. O disposto no inciso III agora permite ao contribuinte formular alegações e apresentar documentos antes da decisão. Em síntese: a restrição que antes era inconstitucional (embora com base legal), agora deixou de existir em todas as esferas da administração federal, segundo nosso entendimento”. [6] 

 

Em sede de jurisprudência administrativa, precedente do Primeiro Conselho de Contribuintes, da relatoria do Conselheiro Maurício Prado de Almeida, com trecho de ementa reportando-se ao artigo 2º, da lei 9784/99,  com o seguinte teor:

 

“Em obediência ao princípio da verdade material, orientador do processo administrativo tributário e, também, aos princípios da razoabilidade, ampla defesa e contraditório previstos no artigo 2º da Lei nº 9.784, de 1999, que regula o processo administrativo da Administração Pública Federal, a autoridade julgadora deve apreciar a prova documental apresentada após a impugnação, mas em data anterior à do julgamento de primeira instância”. [7]  

 

Em igual sentido, embora sem se reportar expressamente ao comando da Lei do Processo Administrativo no âmbito federal, mas  referindo-se aos princípios da verdade material e legalidade,  precedente da CSRF, da  relatoria do Conselheiro Luiz Sérgio Fonseca Soares, assim ementado:

 

“PROCESSUAL. PROVA. PRECLUSÃO. PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA VERDADE MATERIAL.

A apresentação de prova documental, após o decurso do prazo de impugnação, pode ser admitida excepcionalmente, a fim de que a decisão não contrarie os princípios da legalidade e da verdade material, que prevalecem sobre o formalismo processual”. [8] 

 

Portanto, e sem desmerecer os entendimentos em sentido contrário, é plenamente justificável e admissível o temperamento no que diz respeito ao momento da produção de prova documental no Processo Administrativo Tributário, que à luz de forte vertente doutrinária e jurisprudencial não deve se limitar a fase de impugnação.

 

 

 

Notas e referências bibliográficas

 

[1] BRASIL. lei n.  9.784, de 29  jan. 1999.  Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9784.htm> . Acesso em: 2 dez. 2008.

 

[2] Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

 

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

 

X – garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio;

 

XII – impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados;

 

Art. 3o O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados: 

 

III – formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente;

 

Art. 38. O interessado poderá, na fase instrutória e antes da tomada da decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo.

 

[3] BRASIL. Decreto n.  70.235, de 6  mar. 1972.  Dispõe sobre o processo administrativo fiscal, e dá outras providências.  Disponível em: < http://www010.dataprev.gov.br/sislex/paginas/23/1972/70235.htm> . Acesso em: 2 dez. 2008.

 

 

[4] Art.16. A impugnação mencionará:

 

I – a autoridade julgadora a quem é dirigida;

 

II – a qualificação do impugnante;

 

III – os motivos de fato e de direito em que se fundamenta, os pontos de discordância e as razões e provas que possuir; (Redação dada pela Lei nº 8.748, de 9/12/93) 

 

 

§ 4º A prova documental será apresentada na impugnação, precluindo o direito de o impugnante fazê-lo em outro momento processual, a menos que: (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 9.532, de 10/12/97).

 

a) fique demonstrada a impossibilidade de sua apresentação oportuna, por motivo de força maior; (acrescentado pela Lei nº 9.532, de 10/12/97)

 

b) refira-se a fato ou a direito superveniente; ( acrescentado pela Lei nº 9.532, de 10/12/97)

 

c) destine-se a contrapor fatos ou razões posteriormente trazidas aos autos. ( acrescentado pela Lei nº 9.532, de 10/12/97) 

 

 

§ 5º A juntada de documentos após a impugnação deverá ser requerida à autoridade julgadora, mediante petição em que se demonstre, com fundamentos, a ocorrência de uma das condições previstas nas alíneas do parágrafo anterior. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 9.532, de 10/12/97)

 

§ 6º Caso já tenha sido proferida a decisão, os documentos apresentados permanecerão nos autos para, se for interposto recurso, serem apreciados pela autoridade julgadora de segunda instância. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 9.532, de 10/12/97) 

 

[5]  2º Conselho de Contribuintes. Recurso n. 142735. Relator: Damião Cordeiro de Moraes Disponível em:  http://161.148.1.141/domino/Conselhos/SinconWeb.nsf/Ementa/7AF2062437E14536032573F8001A88C8?OpenDocument&posicao=DADOSA3A64A. Acesso em: 2 dez. 2008.   

 

 

[6] PAULSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann. Direito Processual tributário: processo administrativo fiscal e execução fiscal à luz da doutrina e da jurisprudência. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 47.    

 

 

[7] 1º Conselho de Contribuintes. Recurso n. 138692. Relator: Cons. Maurício Prado de Almeida. Disponível em: 

 

http://161.148.1.141/domino/Conselhos/SinconWeb.nsf/Ementa/1457023D03E2364303257027000504ED?OpenDocument&posicao=DADOS510FDE. Acesso em: 2 dez. 2008. 

 

 

[8] CSRF. Recurso n. 123062. Relator: Cons. Luiz Sérgio Fonseca Soares. Disponível em: <http://161.148.1.141/domino/Conselhos/SinconWeb.nsf/Ementa/62F95263072822EB03256DC600158A75?OpenDocument&posicao=DADOS1C8C36>>. Acesso em: 2 dez.2008.    (Destacou-se).

 

 

* Advogado, escritor, pós-graduado em Direito do Trabalho e Legislação Social, ex-Diretor Geral da Escola Superior de Advocacia da 12ª Subseção de Campos dos Goytacazes e Professor Universitário.

 

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Como citar e referenciar este artigo:
SILVA, Luiz Cláudio Barreto. A polêmica sobre o abrandamento da fase de produção de prova documental no Processo Administrativo Tributário. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-tributario/a-polemica-sobre-o-abrandamento-da-fase-de-producao-de-prova-documental-no-processo-administrativo-tributario/ Acesso em: 29 mar. 2024