Direito do Consumidor

A vulnerabilidade do consumidor perante o consumo contemporâneo

Alessandro Matarredona Pellizzari[1]

Rubens Vicente Rodrigues Vasconcelos[2]

Após a Revolução Industrial, a publicidade passou a ser uma estratégia de venda utilizada pelo marketing do fornecedor. A partir disso, percebe-se a necessidade de proteção contra as práticas de publicidade abusivas e enganosas do fornecedor e produtor de produtos e serviços. O presente trabalho destina-se a analisar a responsabilidade jurídica do fornecedor pela diante da necessidade de proteger o consumidor, lado hipossuficiente da relação de consumo que lesado por uma publicidade ilícita possui o direito e o poder de exigir que seja reparado o seu dano. O consumo contemporâneo está em crescimento acentuado nas compras realizadas pela internet, logo se observa a necessidade de adaptação do direito diante dos avanços tecnológicos e de novas práticas que afetam os direitos básicos do consumidor.

Palavras-Chave: Publicidade, Consumidor, Fornecedor, Responsabilidade, Vilnerabilidade

After the Industrial Revolution, publicity began to be a sales strategy used in the consumption market. After that, became clear the need to protect the consumer due to false and abusive publicity made by the sellers of goods and services. This study aims to analyze the legal responsibility of the supplier towards the need to protect the consumer, which is the vulnerable part in the consumption relationship and, in case of injury caused by an illegal advertising, has the right and power to demand that this damage be repared. Nowadays, consumption is growing especially due to the internet shopping, and all of that technological advancements and new techniques that affect the basic consumers rights show the necessity that the law adapts to this situations.

Key-words: Advertising, Consumer, Supplier, Responsibility, Vulnerability

1.O PAPEL E A DEFINIÇÃO DA PUBLICIDADE NAS RELAÇÕES DE CONSUMO CONTEMPORÂNEA

A publicidade desempenha o papel de influenciar a vida em sociedade. Isso percebesse através das grandes campanhas desenvolvidas por uma série de profissionais altamente especializados e preparados para envolver as necessidades e desejos do público, além de utilizar essa ferramenta para divulgar as marcas, produtos ou serviços. Os fornecedores fazem o uso de todos os meios de comunicação existentes no mercado não vai vírgulacom a finalidade de fazer uma publicidade massiva seja ela na televisão, internet, rádio, jornais, revistas ou até mesmo o uso de personalidades artísticas.

No estudo, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin[3] denomina essa relação de consumo na sociedade contemporânea:

A sociedade de consumo é, antes de tudo um movimento coletivo, em que os indivíduos (fornecedores e consumidores) e os bens (produtos e serviços) são engolidos pela massificação das relações econômicas: produção em massa, comercialização em massa, crédito em massa e consumo em massa.

Os meios de comunicação em massa deveriam repassar aos consumidores informações precisas sobre as utilizações dos produtos e as vantagens que oferecem aos compradores.

Para proteger o consumidor, diversos países adotaram a publicidade como objeto de estudos e leis especiais para combater as informações dúbias que são divulgadas para o consumidor. Vejamos alguns exemplos de medidas adotadas em alguns países[4]:

Inglaterra – Acts of Parliament são normas emendas do Parlamento e cuidam, especificamente, da atividade publicitária. Derrogam o common law. A publicidade nesse país sujeita-se, rigorosamente, aos princípios da legalidade, veracidade e autenticidade. Os anunciantes ingleses têm de respeitar estatutos como Merchandise Marksacts e Food y Drugs Acts.

Itália – Tem o Direito publicitário italiano todas as características de um direito especial que, no dizer de Tulio Ascarelli […] é aquele que resulta da importância que resulta da importância que, em dado momento, adquire no seio da sociedade e não como consequência da especialidade da matéria de que se trata.

Estados Unidos da América do Norte – São os pioneiros de técnicas publicitárias. Nesse país não há uma unificação das leis e regulamentos atinentes à atividade publicitária. Nessa legislação multifária, destacam-se: O Código Publicitário da Empresa Americana, o Código de Criatividade de Associação Americana de Agências de Publicidade, O Código de Práticas de Associação de Executivos de Jornais em matéria publicitária e o código de TV da associação de TV da Associação Nacional De Emissoras.

A publicidade é um dos elementos que mais se destaca na informação estando ligada diretamente a uma prática comercial com o objetivo de aumentar o consumo de produtos ou prestações de serviços em grande escala.

O conceito de publicidade não é fácil de definir, seja pelo vasto campo de atividade que exerce ou pela extensão na área comercial e jurídica.

Nesta mesma ideia, vários doutrinadores variam o conceito de publicidade, no qual Fabrício Bolzan de Almeida[5] conceitua como “a informação veiculada ao público consumidor com o objetivo de promover comercialmente e, ainda que indiretamente, produto ou serviço disponibilizado ao mercado de consumo”.

No mesmo sentido, Claudia Lima Marques[6] discorre que:

Toda informação ou comunicação difundida com o fim direto ou indireto de promover junto aos consumidores aquisição de um produto ou a utilização de um serviço, qualquer que seja o local ou meio de comunicação utilizado.

Ademais, a publicidade pode ser considerada como um marco da sociedade moderna. Nas palavras de Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin[7] o devido destaque à publicidade:

Como decorrência de sua importância no mercado, surge a necessidade de que o fenômeno publicitário seja regrado pelo Direito, notadamente pela perspectiva da proteção do consumidor, o ente vulnerável da relação jurídica de consumo.

O conceito geral que pode ser utilizado na concepção jurídica é retirado do artigo 6.º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor[8], o qual garante ao consumidor seus direitos básicos. Outro direito importante diz respeito às relações de práticas de mercado:

Art. 6.º São direitos básicos do consumidor:

[…]

III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços.

Segundo Valéria Chaise[9], o conceito de publicidade para o direito do Consumidor tem relevância jurídica em três situações:

A primeira, quando se apresenta como veículo, como forma, de uma oferta de consumo, hipótese em que produz efeito de vinculação do fornecedor que a promove, na condição de negócio jurídico unilateral.  A segunda quando viola deveres estabelecidos pelo CDC, caracterizando-se como umas das figuras típicas de publicidade ilícita, prevista nas normas do artigo 37 deste diploma, como publicidade enganosa ou publicidade abusiva. E a terceira, quando se apresente com espécie de contato de consumo.

2. A VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR NAS RELAÇÕES DE CONSUMO

Ao analisar o marketing, observamos que este faz uso da publicidade como a principal ferramenta para atingir o maior número de consumidores, sendo que por muitas vezes não mede esforços para alcançar o seu objetivo através de campanhas publicitárias apelativas, no qual faz uso de imagens e vídeos para persuadir o consumidor através de estímulos. A partir do momento que ficou evidenciada essa fragilidade do consumidor, o CDC[10] reconheceu a vulnerabilidade na relação de consumo através do seu artigo 4º, inciso I, o qual elenca como um dos princípios o “reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo”.

É evidente que, antes de discorrer sobre a vulnerabilidade neuropsicológica, é necessário brevemente adentrar no princípio da vulnerabilidade. Tecnicamente, este pode ser considerado o princípio básico do direito do consumidor. Neste sentido, Bruno Miragem[11] dispõe:

A vulnerabilidade do consumidor constitui presunção legal absoluta, que informa se as normas do direito do consumidor devem ser aplicadas e como devem ser aplicadas. Há na sociedade atual o desequilíbrio entre dois agentes econômicos, consumidor e fornecedor, nas relações jurídicas que estabelecem entre si. O reconhecimento desta situação pelo direito é que fundamenta a existência de regras especiais, uma lei ratione personae de proteção do sujeito mais fraco da relação de consumo.

Neste entendimento, estabelece-se a proteção do sujeito mais fraco da relação de consumo, o qual não se confunde com a sua possível hipossuficiência, estabelecida no artigo 6º, inciso VIII do CDC, pelo qual tem a possibilidade de inverter o ônus da prova em favor do consumidor. Desta forma, é importante ressaltar o texto legal do citado artigo[12]:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[…]

  1. – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.

A diferenciação é analisada pelo autor Fabrício Bolzan de Almeida[13], o qual entende que a vulnerabilidade se trata da fragilidade ou debilitação do consumidor e a hipossuficiência versa sobre o elo mais fraco da relação no sentido processual:

Apesar de ambos os institutos estarem relacionados com a fraqueza do consumidor perante o fornecedor em suas relações no mercado de consumo, a vulnerabilidade é fenômeno de direito material – com presunção absoluta – e a hipossuficiência é fenômeno de direito processual – com presunção relativa. Desta forma, no plano do direito material, todos os consumidores pessoas físicas são considerados vulneráveis, mas na via processual nem todos são hipossuficientes, devendo a fragilidade ser demonstrada no caso concreto. É o que ocorre com a inversão do ônus da prova.

Portanto, todos os consumidores são vulneráveis, mas nem todos são hipossuficientes. Percebe-se que todos os consumidores são vulneráveis, pois têm como qualidade íntima a condição de destinatário final do produto ou do serviço.

Com relação a hipossuficiência aduz Daniel Amoriam e Flávio Tartuce(2014, p.45) no seguinte sentido:

Concluindo o presente ponto, pode-se dizer que a hipossuficiência do consumidor constitui um plus, um algo a mais, que traz a ele mais um benefício, qual seja a possibilidade de pleitear, no campo judicial, a inversão do ônus de provar, conforme estatui o art. 6º, VIII, da Lei 8.078/1990. Nesse ponto, cumpre repisar mais uma vez, diferencia-se da vulnerabilidade, conceito jurídico indeclinável que justifica toda a proteção constante do Código do Consumidor, em todos os seus aspectos e seus preceitos.

Assim a publicidade, e os demais métodos de oferecimento do produto e serviço estão diretamente relacionados à vulnerabilidade, pois o consumidor fica condicionado as vantagens tentadoras impostas pelos veículos de comunicação e pelos veículos de informação e pode-se concluir que todos os consumidores pessoas físicas são considerados vulneráveis. A vulnerabilidade desse sujeito é caracterizada no tocante a ausência de conhecimento técnico e científico no tocante aos serviços e produtos adquiridos. Nesse sentido vulnerabilidade é um fenômeno de direito material. Alguns autores defendem a hipervulnerabilidade do consumidor, nesse sentido trata Fábio Bolzan(2013, P.297/298):

A doutrina e a jurisprudência pátrias vêm reconhecendo que determinado grupo de consumidor, em razão do alto nível de fragilidade em que se encontra no mercado de consumo, é merecedor de maiores cuidados em relação aos demais consumidores em geral.

Isto é, se já existe uma presunção legal de que os consumidores não profissionais são os vulneráveis da relação jurídica de consumo, foi identificada mais recentemente uma nova categoria de pessoas que se encontram na condição de hipervulneráveis, ou seja, aqueles cuja fragilidade se apresenta em maior grau de relevância ou de forma agravada.

Alguns exemplos de consumidores hipervulneráveis são a gestante, e os portadores de necessidades especiais, a criança, o idoso, os enfermos, os portadores de necessidades especiais, os analfabetos. Assim o Superior Tribunal de Justiça vem reconhecendo a hipervulnerabilidade conforme observa-se no RESP 586.316 de Minas Gerais tendo como Relator o Ministro Herman Benjamin.

A hipossuficiência do consumidor ultrapassa os limites da condição social e financeira, sendo um conceito amplo e devendo ser apreciado pelo juiz de direito no caso concreto. Dessa forma, hipossuficiência é um fenômeno de direito processual.

3.RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR NAS PRÁTICAS ABUSIVAS

3.1 AS PRÁTICAS ABUSIVAS

As práticas abusivas nas relações de consumo tem relação com o contexto histórico pelo qual o fornecedor possui uma posição de superioridade frente ao consumidor. Assim, infere-se que práticas comerciais abusivas ultrapassam os limites das condutas lícitas previstas tanto na legislação consumerista como no Código Civil. Segundo Daniel Amorim, e Flávio Tartuce(2014, p.293) “Deve-se entender que constitui prática abusiva qualquer conduta ou ato em contradição com o próprio espírito da lei consumerista.” O Código de Defesa do Consumidor por meio do art.6°, inciso V, combate as violações contratuais nas relações de consumo oferecendo ao consumidor o direito de alteração das cláusulas contratuais que instituem um situação desfavorável ao consumidor. Ademais, o art.51, IV do CDC considera nulas as cláusulas abusivas que dispõe ao consumidor uma prejuízo acentuado e desfavorável.

Com isso percebe-se que o fornecedor durante a prática do ato comercial sempre deve respeitar o princípio da boa-fé como observa Pablo Stolze( 2012, p.112) “Assim, em uma dada relação jurídica, presente o imperativo dessa espécie de boa-fé, as partes devem guardar entre si lealdade e o respeito que se esperam do homem comum.”

O Código de Defesa do Consumidor traz um rol exemplificativo de práticas abusivas em seu art.39 e respectivos incisos, considerando como abuso de direito: condicionar o fornecimento de produto ou serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem, como sem justa causa, a limites quantitativos; assim como recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes; bem como enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço; e prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços; exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes; repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos; colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro); recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais; elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços; dente outros.

3.2 BREVE ANÁLISE DAS PRÁTICAS ABUSIVAS ELENCADAS PELO ART.39 DO CDC

O art.39, inciso I do Código de Defesa do Consumidor, que tange ao condicionamento do fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos trata da proibição de venda casada, ou seja, o fornecedor não pode condicionar a compra de um produto ou a aquisição adicional de outro produto ou serviço.

Assim aduz Flávio Tartuce e Daniel Amorim(2014, p.293/294) “Ampliando-se o sentido da vedação, conclui-se que é venda casada a hipótese em que o fornecedor somente resolve um problema quanto a um produto ou serviço se um outro produto ou serviço for adquirido.”

A resolução do Banco Central n°2878/01(alterada pela n°2892/01) , art.17° menciona que é proibida a contratação de produtos ou serviços condicionados a aquisição de outros bens ou serviços.

Alguns exemplos de venda casada podem ser observados nas situações em que o interessado em contratar empréstimos financeiros para compra da casa própria é condicionado e obrigado a aderir ao seguro habitacional pela instituição financeira. Outro exemplo se caracteriza nas situações de venda de produtos leve 3 pague 2, onde o fornecedor é obrigado a disponibilizar a compra de apenas um produto.

Outrossim, se observa quando o consumidor possui os serviços de cartão de crédito e a instituição financeira cobra indevidamente o item “seguro perda e roubo”, sendo que a instituição bancária sequer informa o consumidor da adesão do seguro de perda e roubo na aquisição dos cartões de crédito.

Outra situação percebida se dá no momento de aluguel de salão de festas para casamento ou formaturas na qual a decoração, filmagens, ou fotos somente poderão ser realizadas pela empresa responsável pelo salão de festas.

O art.39, inciso II do CDC, traz como prática abusiva o recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes.

Com relação, a limitação para a aquisição de produtos, por exemplo, ofertados em supermercados nos dias de promoção é possível tal restrição a compra desde que se observe um limite razoável segundo para Daniel Amorim E Flávio Tartuce(2014, p.296):

Os parâmetros descritos na norma são levados em conta no problema relativo à limitação para aquisição de produtos, especialmente em supermercados em dias de promoção. Na opinião do presente autor, a restrição para a aquisição é possível desde que haja comunicação prévia dos estoques, dentro de um limite razoável, o que atende ao dever de informar decorrente da boa-fé objetiva. Porém, mesmo não havendo tal comunicação, a jurisprudência superior posiciona-se no sentido de que o consumidor não tem o direito de exigir o produto que está em promoção em quantidade incompatível com o consumo pessoal ou familiar.

Nesse mesmo sentido o STJ no RESP 595.734/RS, da terceira turma proferiu decisão contrária à ofensa da dignidade ou ao foro íntimo do consumidor quando o mesmo adquire quantidade exigida incompatível com o consumo pessoal e familiar. Entretanto, acertadamente conforme o entendimento dos presentes autores desse artigo científico o PROCON do Rio de Janeiro autuou o supermercado Guanabara por limitar a quantidade de produtos vendidos por cliente conforme notícia localizada no “site”: (Em : <http://www.procon.rj.gov.br/index.php/publicacao/detalhar/1366. Acesso em: 17/10/2014.)

Segundo o PROCON do Rio de Janeiro a decisão de autuar o estabelecimento comercial se encontra de acordo com o agravo de instrumento n°0016631-29.2014.8.19.0000 julgado pela Desembargadora Jaime Dias Pinheiro Filho, da 12° Câmara Cível do Estado do Rio de Janeiro.

A prática abusiva de enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia qualquer produto ou fornecer qualquer serviço(art.39, inciso III do CDC) é bem regular dentro das praticas comerciais. Isso é bem visível no que se refere ao envio de cartões de créditos sem autorização por parte do consumidor, que a posteriori fica incumbida de realizar pagamentos de anuidades sem sequer desbloquear o cartão de crédito. Assim, o art.39, parágrafo único, menciona que os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor na hipótese prevista do inciso III equiparam-se a amostra grátis inexistindo obrigação de pagamento.

Nesse sentido, garantindo a prática abusiva e a desnecessidade de pagamento de cobranças indevidas de anuidade, aduz Fabrício Bolzan(2014, p.735):

Trata-se de comportamento abusivo, despido de qualquer justificativa e merecedor da consequência que equipara o produto ou o serviço fornecido nestes termos a amostras grátis.

Assim, no caso do recebimento de um cartão de crédito sem solicitação, geralmente acompanhado de uma carta do gerente do banco, parabenizando-o pela contratação do serviço, não haverá a necessidade de pagar a anuidade.

É evidente mencionar que o consumidor que aceita o cartão de crédito mesmo enviado sem autorização e utiliza-o tem a obrigação de realizar o pagamento de faturas posteriores não estando sob a égide do art.39, inciso III do Código de Defesa do Consumidor.

O próprio Superior Tribunal de Justiça no RESP 1102787/PR em 16/03/2010 julgou a favor da afronta ao art.39, parágrafo único do CDC a assinatura de revistas realizadas unilateralmente por empresa editorial contra pessoa idosa enquadrada no grupo de consumidores hipervulneráveis. Nesse sentido, Daniel Amoriam e Flávio Tartuce(2014, p.298) “Seguindo na análise de concretizações da norma, o Superior Tribunal de Justiça deduziu que a assinatura de revistas efetuada automaticamente pela empresa editorial representa afronta ao dispositivo ora estudado, ensejando a consequente responsabilização civil do fornecedor em caso envolvendo idoso (hipervulnerável)(…)”.

Em relação à prática abusiva prevista no art.39, inciso V do CDC que menciona que “exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva” caracteriza a lesão objetiva e a onerosidade excessiva do consumidor.

4. O CONSUMO CONTEMPORÂNEO

4.1.CONSUMO PELA INTERNET

É inegável a percepção do aumento das compras realizadas pela internet pela facilidade de acesso, pela rapidez no atendimento, bem como na agilidade de entrega e outros fatores que atraem o consumidor em potencial. 

Com isso, cresce o mercado de produtos vendidos pela internet juntamente com as práticas abusivas da empresas. As compras realizadas nos estabelecimentos virtuais são regulamentadas pelo Código de Defesa do Consumidor.

O consumo contemporâneo no na internet Brasil pode ser associado ao grande alcance que os fornecedores adquiriam através da incorporação de publicidade nas redes sociais para atingir o maior número de consumidores.

4.2.CONSUMO NAS REDES SOCIAIS

As redes sociais no Brasil possuem um número altíssimo de usuários que cresce gradativamente. Assim, é um fenômeno social emergente, cujo componente tecnológico está em constante evolução e que alterou o modo como às pessoas se relacionam a interagem umas com as outras através da internet. Algumas redes sociais importantes nas relações de consumo são Twitter, Facebook, Youtube, blgs, Formspring, Foursquare, Linkedin, Tumbir.

As redes sociais são uma importante ferramenta de informação de direitos para os quais o consumidor pode se resguardar.

Uma das redes sociais observadas é o Facebook, sendo que nele podemos citar como um exemplo claro de ferramenta usada pelos fornecedores para atrair os usuários da rede social através de publicidade com o objetivo de torná-lo consumidor de sua marca, pois cada usuário do Facebook é submetido ao termo de uso.

Segundo Raquel Recuero(2009, p.171) “O Facebook funciona através de perfis e comunidades. Em cada perfil, é possível acrescentar módulos de aplicativos(jogos, ferramentas, etc.). O sistema é muitas vezes percebido como mais privado que outros sites de redes sociais, pois apenas usuários que fazem parte da mesma rede podem ver o perfil uns dos outros.”

Dessa forma as redes sociais alteraram as forma com que as pessoas se relacionam como influenciam o que elas consomem. Nesse sentido, o impacto na decisão de compra do consumidor é elevado no que tange a utilização das redes sociais. As redes sociais tem importante papel nas  decisões de compra do consumidor.

Assim as empresas utilizam as redes sociais para realizarem a promoção dos seus produtos ou serviços complementando o lucro, com isso configurando uma relação de consumo, e, portanto, sobre essas relações de consumo incidem as regras do Código de Defesa do Consumidor e consequentemente aplicando-se o Princípio da Reparação Integral de Danos que acarreta a responsabilidade objetiva dos fornecedores e prestadores de serviços em benefício do consumidor.

5.CONCLUSÃO

O artigo apresentado buscou aprofundar o estudo da vulnerabilidade do consumidor perante o consumo contemporâneo, na intenção de evidenciar as praticas abusivas adotadas pelo fornecedor no objetivo de tornar os serviços e produtos de suas marcas essenciais de forma que o consumidor os utilizem.

Portanto, o principio da publicidade transforma o consumo desenfreado supérfluo em essencial. Conforme analisado o consumidor se tornou ainda mais vulnerável, perante o fornecedor decorrente a essas ferramentas adotadas, inclusive em páginas eletrônicas pessoais, como as redes sociais, que através do termo de uso, aplica os dados pessoais em referências para os seus anunciantes, para que assim, aumente a compulsividade de compra, consequentemente, gerando números astronômicos de lucro.

A legislação brasileira, não tem acompanhado a velocidade e a praticidade que é fornecida para o consumidor no ato da compra seja ela realizada dentro do estabelecimento ou via Internet. No entanto, há mudanças significativas a serem realizada, na relação entre consumidor e fornecedor, principalmente, no que versa sobre o consumo contemporâneo, que irá aumentar o rol dos artigos que regulamenta a compra via internet e maior controle sobre as práticas abusivas perante o consumidor. Os projetos citados ainda dependem de aprovação e estão sujeitos a novas emendas até chegar ao final, reformando, de fato, o Código de Defesa do Consumidor. A problemática do tema não vai ser resolvida apenas com mudanças no Código de Defesa do Consumidor, mas com decisões do judiciário, proibindo de maneira mais eficaz os fornecedores que utilizam métodos publicitários sobre vulnerabilidade do consumidor para obter maior lucro, assim como, a proibição total de publicidade para os hipervulneráveis, no qual se enquadram as crianças e os idosos.

Por fim, cabe ressaltar a luta dos órgãos que são direcionados a proteção dos consumidores, que por diversas vezes ficam impossibilitados de ter maior atuação em sua defesa, por questões burocráticas ou por não condescendência do setor privado ao sanar o litígio administrativo.

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[1] Graduado no curso de ciências jurídicas, econômicas e sociais pela Universidade Católica de Pelotas, funcionário público da Prefeitura Municipal de Pelotas lotado no PROCON de Pelotas/RS, email: lp_alessandro_lp@hotmail.com.

[2] Graduado no Curso de Direito da Universidade Federal de Rio Grande, Pós Graduando em Direito Previdenciário pelo Damásio Educacional S.A, funcionário público da Prefeitura Municipal de Pelotas, lotado no PROCON de Pelotas/RS, email: rubensvrv@yahoo.com.br.

[3] GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos e; FINK, Daniel Roberto; FILOMENO, José Geraldo Brito; WATANABE, Kazuo; NERY JÚNIOR, Nelson; DENARI, Zelmo. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 218.

[4] SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor e sua jurisprudência anotada. 6. ed. rev e ampl. São Paulo: LTr, 2006. p. 489.

[5] ALMEIDA, Fabrício Bolzan de. Direito do Consumidor Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2013, p.431

[6] MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 138.

[7] GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos e; FINK, Daniel Roberto; FILOMENO, José Geraldo Brito; WATANABE, Kazuo; NERY JÚNIOR, Nelson; DENARI, Zelmo. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 263.

[8] BRASIL. Lei n.º 8.078/90. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm>. Acesso em: 15 jun. 2014.

[9] CHAISE, Valéria. A publicidade em face do Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 68-70.

[10] BRASIL. Lei n.º 8.078/90. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: <http://w<a< a=””> name=”_GoBack”>ww.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm>. Acesso em: 16 jun. 2014.

[11] MIRAGEM, Bruno. Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 61-62.

[12] BRASIL. Lei n.º 8.078/90. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm>. Acesso em: 16 jun. 2014.

[13] ALMEIDA, Fabrício Bolzan de. Direito do Consumidor Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2013, p.197

Como citar e referenciar este artigo:
PELLIZZARI, Alessandro Matarredona; VASCONCELOS, Rubens Vicente Rodrigues. A vulnerabilidade do consumidor perante o consumo contemporâneo. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2016. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-do-consumidor/a-vulnerabilidade-do-consumidor-perante-o-consumo-contemporaneo/ Acesso em: 20 abr. 2024