Direito Constitucional

Descontos Sexuais: A Efetivação da Isonomia e a Ponderação de Princípios

 

Anne Carolinne Batista*

Gustavo Henrique Carvalho Schiefler**

Luiza Lange Rosa***

Ricardo de Holanda Janesch ****

 

 

 

INTRODUÇÃO 

 

A necessidade de uma regulamentação para a sobrevivência em comunidade já era prevista desde os primórdios da civilização, onde o próprio Direito consuetudinário, local, servia como base para toda a harmonização, ainda precária, das grandes tribos. Com o passar dos tempos, adicionaram-se reestruturações e complementações, que culminaram no desenvolvimento do Direito e do complexo normativo que temos hoje.

 

Os grandes contratualistas previram bem essa necessidade, uma vez que, nas palavras de Hobbes, os homens sem uma lei maior, sem um poder comum, que intervenha coercitivamente, vivem em um estado de natureza, que nada mais gera do que uma guerra de todos contra todos. Essencialmente, o ser humano não consegue respeitar o direito do outro, há uma certa individualização, que ultrapassou os tempos e até mesmo o contrato social.

 

A Constituição surgiu então com esse papel de Lei maior e na qualidade de representante da unidade do povo. Nela estão firmados os preceitos e resguardados os direitos individuais e principalmente, os sociais. Não basta, porém, se ter uma Constituição firmada pelo povo e para o povo, há que se promover a efetivação da sua substância, da sua essência enquanto tal. Isso se faz, além disso, a fim de afastar a individualização nociva da estrutura social que vige e as interpretações baseadas no jogo de interesses para que se possa, assim, privilegiar o todo como uno, porque sem isso a sociedade não convive, nem sobrevive.

 

É nesse sentido de dar eficácia às regras e, neste caso, aos princípios constitucionais, que o presente trabalho discute um fato muito comum e que apesar de já fazer parte da tradição, sendo, talvez, a priori, benéfico a tantos, traz consigo um véu que esconde o que há séculos se combate: a discriminação entre os sexos.

 

 

1 O FATO 

       

Uma prática muito comum dentre as casas noturnas, boates e danceterias, são os descontos no pagamento da entrada por parte das mulheres. Esses descontos variam, desde o não pagamento da entrada (por vezes fixado a um determinado horário da noite) até as mais diferenciadas porcentagens. Mas o que se percebe é que os homens, graças a essa “política favorável às mulheres”, acabam sempre pagando mais caro para se divertir nos mesmos ambientes. A única regalia a eles concedida em algumas festas é uma determinada quantia de consumação a que os pagantes do sexo masculino tem direito.

 

Essa prática tornou-se uma espécie de tradição, tradição essa que tenta esconder a nefasta realidade implícita nessa simples “política de privilégios às mulheres”. Fixam-se valores diferenciados sem qualquer tipo menção e explicação, no qual cabe ao homem arcar com a custa.

           

            O que se pretende é de fácil percepção. Os homens são os maiores consumidores dentro das festas e sem dúvida os fiéis freqüentadores, entretanto não têm a intenção de ir a locais onde existem apenas homens. Vale mencionar que na sociedade contemporânea, mudam-se os valores e se intensificam os sentimentos, entre eles a diversão e a atração. Desse modo, proporcionar-se preços mais baixos às entradas para as mulheres, a fim de que essas compareçam as festas e acabem de forma indireta atraindo os homens consumidores e geradores de lucro.

 

Evidencia-se, então, um fato e suas funções, o que resta é observar se se trata de uma tradição legítima e legal, ou seja, conforme os preceitos estabelecidos pela Constituição Federal brasileira.

 

 

2 Com a palavra: a constituição

 

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º estabelece:

 

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição. […] (BRASIL, 2006, p.15)

 

Este é, pois, o mítico princípio da isonomia. Ele torna todos iguais, independente de etnias, credos, cultura, sexo. Todos têm os mesmos direitos e, sobretudo, as mesmas obrigações frente à sociedade e à lei.

 

A Magna carta também estabelece, por meio do artigo 6º, uma série de direitos sociais, dentre os quais está o direito ao lazer:

 

São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 2006, p.15. Grifo nosso)

 

Dadas as premissas acima, entende-se que tudo que é feito para promover o lazer, um direito resguardado constitucionalmente, é possível, desde que não desrespeite a forma da constituição, tampouco seus princípios, destacando-se, nessa matéria o princípio da igualdade.

 

 

3 CONSTITUCIONALIDADE DE PRINCÍPIOs 

           

            Para averiguar a constitucionalidade ou não dessa prática dos proprietários de casas noturnas, vale examinar a forma pela qual a Suprema Corte Americana examina as questões referentes à sua Carta Magna. Para que algo seja considerado como constitucional é necessário que cumpra a dois requisitos: ser um propósito público válido e ser um meio razoável para se atingir esse propósito.

 

Por meio desse método, analisar-se-á a questão dos “descontos sexuais”:

 

            1. Ser um propósito público válido. A intenção do emprego de valores diferenciados aos sexos nas entradas em festas não pode ser evidenciada com tendo um propósito público inválido, eis que cumpre a sua função de trazer a diversidade dentro do local e com isso auxiliar na continuidade da prestação de serviço a população, salientando que se trata de uma prestação um tanto essencial, uma vez que um dos direitos fundamentais do homem é o lazer.

 

Como já mencionado, os homens são os maiores consumidores desses locais, mas para que freqüentem há a necessidade que tenham mulheres, como uma espécie de fator atrativo. A diversidade, no sentido de haver homens e mulheres é, então, essencial para que se conquiste um público considerável. Por conseguinte, como consumo é lucro, as empresas precisam dessa heterogeneidade, para dar continuidade ao empreendimento, que nada mais é do que um serviço cujo exercício tem uma função dentro da sociedade: trazer diversão às pessoas.

 

Acrescenta-se a essa questão a desigualdade real que ainda permeia a sociedade brasileira no que concerne aos salários. As mulheres recebem, trabalhando no mesmo cargo, com a mesma instrução, cerca de 30% a menos que os homens. Analisando-se sob essa perspectiva, seriam justos os descontos.

 

                        2. Ser um meio razoável. Quando se retira o véu que encobre essa política se evidencia a forte infração ao artigo 5º, inciso I da Constituição, ao se conceder benefícios a um dos sexos em detrimento do outro, tratando-os de forma absolutamente desigual.

 

            Cabe mencionar as palavras de Uadi Lammêgo BULOS:

 

         O constituinte, ao igualar homens e mulheres, acatou uma solicitação há muito reclamada. Expressou em termos constitucionais as longas lutas travadas contra a discriminação do sexo feminino. Ao fazê-lo garantiu muito mais do que a igualdade perante a lei. Assegurou-se a igualdade em direitos e obrigações.

 

         Logo, homens e mulheres, que tiverem em situação idêntica, não poderão, seja qual for o argumento, sofrer qualquer cerceamento em suas prerrogativas e nos seus deveres, sob pena de infringir a manifestação constituinte originária. (BULOS, p. 82, 2001)

 

            E complementa afirmando que “só valem as discriminações contidas na própria Constituição”, que por sua vez possuem fundamento substancial para tal.(BULOS, p. 82, 2001)

 

            Dessa maneira, ao se resgatar todo o passado de luta do movimento feminista, buscando efetivar a igualdade entre os sexos, firmar a mulher como capaz, competente, auto-determinante, pode-se perceber o quão importante é esse principio da isonomia. Uma vez que durante muitos séculos se trabalha arduamente para que o “sexo frágil” ganhe força e independência dentro da sociedade ainda machista na qual se vive.

 

            Ao conceder descontos nos ingressos femininos com o intuito de chamar mais homens consumidores, está se tratando as mulheres como um objeto posto nas mãos dos capitalistas e assim, como um atrativo aos homens, deixando cair por terra toda a luta travada no sentido de erguer a auto-estima e o autocontrole feminino alheio as vontades masculinas, estas que eram determinantes nos séculos passados, além de, é claro, romper com o principio isonômico.

 

A igualdade, tão almejada pelas mulheres, não pode ser restrita aos privilégios. A construção real dessa só é possível por meio de um processo gradual, que envolva relativas perdas, para se conquistar o bem maior. Essa verdadeira tradição de pagar menos aparenta, num primeiro momento, vantajoso, à medida que representa um afago àquelas que são discriminadas pelo mercado de trabalho recebendo menos. Para os homens, também não parece de todo o mal, já que são elas o grande motivo pelo qual eles se dirigem às festas.

 

 

Entretanto, aceitar isso, é aceitar um revés nas conquistas feministas, visto que representa a materialização da abdicação das mulheres por “conveniência”, do tão sonhado princípio da isonomia. Se elas abrem mão da suas lutas em situações de relativa vantagem, por que terão os homens que aceitar uma igualdade plena naquilo que eles tem maior ganho? 

 

            Percebe-se, então, que a forma com que esse propósito de diversificação e de continuidade do empreendimento vem acontecendo não é razoável, uma vez que vai de encontro com o complexo processo de estruturação social, que necessita que todas as suas variáveis sejam atingidas para que ganhe êxito, que tem como finalidade estabelecer a mulher com um ser igualmente atuante na sociedade.  Aliado a esse fato está a possibilidade de serem implantados outros meios para a obtenção do fim esperado, como a promoção de shows e festas que despertem na mulher o interesse pelo evento, com atrativos especiais, que não a gratuidade do seu ingresso.

 

 

4 a colisão de princípios

           

            Um outro meio para examinar a questão da aplicabilidade dos princípios é através do texto de Robert Alexy, que trata da “Colisão de Direitos Fundamentais e realização de Direitos Fundamentais no Estado de Direito Democrático”, já que no caso em questão há uma colisão de Direitos Fundamentais.

 

De um lado se tem a igualdade, motivo de inúmeras lutas que buscavam prover sua efetivação, de extrema importância para o povo, e que somente por meio de um processo gradativo pode avançar e chegar mais perto de sua preensão.

 

            Na outra extremidade, encontra-se também um direito social: o lazer. Também esse tem um importante papel na sociedade, afinal e um significativo colaborador do bem-estar social. Acrescenta-se ainda a questão da liberdade do comércio, não menos protegido pela Constituição Federal brasileira.

 

            No decorrer de sua abordagem Alexy evidencia que de fato essas colisões ocorrem constantemente e que, portanto, se faz necessário saber como solucionar esses conflitos. Primeiro deve se partir do pressuposto que esses direitos são na verdade princípios, que devido a esse fato, a sua intervenção deve ser justificada por meio de ponderações. E assim esclarece: “quanto mais intensa é uma intervenção em um direito fundamental, tanto mais graves devem ser as razões que a justificam” (ALEXY, 1999, p. 278).

 

            Fazendo o acompanhamento do fato à teoria, ocorre que para que haja a ponderação deve haver uma proporcionalidade entre de que forma se intervém no princípio da igualdade entre os sexos, ou seja, o grau de intensidade na qual se dá essa interferência, e a razão para se ferir esse princípio, que seria a de promover à diversidade dentro das casas noturnas e com isso dar continuidade à prestação do serviço à população.

 

      Assim, ao se partir do pressuposto, já evidenciado, de que essa diferenciação tem um fundo social, eis que, além do fato de se privilegiar a liberdade de mercado, de expressão, de escolhas na formas de se gerir o negócio, está se dando continuidade a um serviço que tem uma razão de ser. Esses tipos de festas promovem o lazer, o qual é um direito consagrado na Carta Maior.

  Quando se olha a outra face da questão, porém, percebe-se um desequilíbrio, eis que a intervenção ao princípio da igualdade se mostra muito mais forte e desestruturadora. Não obstante se pense haver uma ponderação, por esse motivo, ela não ocorre.

 

Com relação à liberdade do comerciante, observa-se no decorrer da Constituição, bem como em outras legislações ordinárias, muitas normas que “ferem”, ou melhor, que regulam esse princípio. No Código de defesa do Consumidor, por exemplo, percebe-se que existem inúmeras políticas consideradas abusivas ou práticas proibidas, que vão de encontro a esse princípio. Considera-se, então que deve existir esse direito, mas que ele deve estar cerceado ou limitado pelos outros direitos, ou seja, devem coexistir a liberdade e a igualdade. Pode-se fazer tudo, desde que não se promova a desigualdade.

 

No que concerne ao lazer, destaca-se que a Constituição evidencia esse princípio, mas acrescenta que é um direito resguardado na forma Carta Magna. Isso significa que é um direito que não pode ser utilizado como argumento para colaborar com o esfacelamento de um outro princípio. Além disso, ela não restringe e nem fixa as formas de lazer. Acredita-se, pois, que existem outros meios de se conseguir que o empreendimento continue existindo, mesmo através da diversidade, mas atingida de maneiras diferentes àquela, mais imediata, de conceder descontos, como já mostrado.

 

            Essa política de diferenciação entre os sexos no pagamento de entradas nas festas em geral, portanto, mostra-se inconstitucional, uma vez que fere o princípio isonômico sem ter uma razão considerável de ser. Todavia, percebe-se constantemente essa prática, tolerada por todos e que acabou virando uma espécie de tradição na sociedade.

 

 

5 Normalidade vs normatividade

 

O problema da realidade e da Constituição acompanha o desenvolvimento da Teoria Constitucional. Será ela regulada, reguladora, ou parte da Magna Carta de uma nação?

 

Há implícito na questão dos descontos sexuais o debate entre normatividade (Constituição) e normalidade (realidade): tem-se aquilo que é “normal”, no caso o emprego de descontos das entradas das mulheres, contra o que é resguardado pela norma, a igualdade.

 

 

5.1  Heller e Hesse

Dois autores alemães, dentro da Teoria Constitucional se destacam no que concerne a essa matéria: HELLER e HESSE. Ambos têm visões totalmente distintas. Passar-se-á a analisar a problemática dos descontos sexuais sob a égide das duas teorias.

 

HERMANN HELLER, segundo CECÍLIA CABALLERO LOIS, apresentou um conceito intermediário para a Constituição entre as duas posturas teóricas dominantes: Schmittiana, que vê a Magna carta unicamente como fruto da vontade soberana, e Kelseniana, que despe a Constituição de todo cunho material, simplificando-a a norma.

 

Para HELLER, a Constituição é formada por duas partes: uma normatizada (jurídica ou extrajurídica) e uma não normatizada. No que concerne a Constituição normatizada, CECÍLIA diz que:

O relevante, […], é perceber que, para HELLER, o papel da constituição está em valorar condutas consideradas socialmente positivas, e não somente as que ocorrem com certa regularidade. (LOIS, 2001)

 

É fato que a prática dos descontos ocorre regularmente, entretanto à Constituição cabe a função de valorar essa conduta, de acordo com aquilo que é proveitoso para a sociedade como um todo. À medida que essa prática representa uma afronta a uma das mais importantes matérias de que trata a Carta Maior, deve ser ela condenada, a fim de que se promova o bem comum. 

 

Entretanto, no embate entre Normalidade e Normatividade, representadas, nessa ordem, pela realidade (o poder, para Heller) e a Lei (constituição), acreditava HERMANN que a Lei sempre sucumbiu e  sempre sucumbiria à realidade.   

 

            HESSE, no texto “A força normativa da Constituição”, vem questionar a “eterna” vitória da realidade sobre a Lei. Para ele a Constituição tem a sua força enquanto norma e deve se fazer valer como tal, não se deixando vencer pelo poder da decisão, da normalidade, no caso, da tradição.

Uma das formas de dar Força Normativa à Constituição, segundo ele, é por meio da prática. Só colocando o seu conteúdo em exercício a Magna Carta crescerá enquanto norma, poder frente à realidade.

 

Existe de fato, essa prática rotineira de discriminação, eis que a sociedade já a incorporou como algo absolutamente normal e aplicável, entretanto ela vai de encontro ao que norma prega, com a essência da Constituição.

 

      Assim, é de extrema importância que essa força normativa se revele e venha à tona no sentido de transformar essa realidade, adequando-a a seus preceitos, dando efetividade aos seus princípios, fazendo jus a sua hierarquia.

 

Afinal, se a Constituição nasceu como símbolo de uma união nacional, como algo com força suficiente para regular o Estado e o povo, não pode sucumbir a uma realidade que só faz atrasar a construção da sociedade no seu sentido mais pleno.

 

 

5.2 Uma nova concepção

 

ALEXY, além de sua contribuição, já citada, no que concerne a classificação das normas constitucionais em Regras e Princípios, bem como a solução das colisões por meio da Ponderação, também a deu com relação ao debate de Normalidade e Normatividade. Para ele, a realidade era um meio de interpretação da Constituição.

 

Os princípios são caracterizados pelo seu alto grau de generalidade e ainda por serem Mandamentos de Otimização, ou seja, determinar o que ele quer dizer é difícil, há que se relacionar com a realidade. Por exemplo: o que é a igualdade? O real significado desse princípio só é possível de ser vislumbrado por meio da vida real, da materialização dessa nos pequenos casos.

 

No caso em questão, a igualdade seria a paridade em se tratando de valor pago pelo ingresso. Percebe-se, pois, que a prática dos proprietários de casa noturna, não reflete o real significado desse principio constitucional, sendo, portanto, inconstitucional.

 

 

5.3 Schmitt e o Controle de Constitucionalidade

 

Schmitt, um dos maiores ícones em matéria de Teoria Constitucional, já alertava que a materialidade da Constituição estava nas mãos do detentor do poder Soberano, que para ele era o Chefe de Estado, o Fürer.

 

Com a teoria de Alexy, na qual ele defendia que a realidade era um meio de interpretação da Constituição, deu-se a materialização do que o ícone alemão pregava.

 

 A realidade, por ser plural, não objetiva, exige que se designe alguém que possa interpretar a realidade, para que essa, por sua vez, interprete a constituição. E, nas atuais circunstâncias, o detentor desse poder Soberano é o poder Judiciário. Ao Poder Judiciário cabe o que se chama hoje de Controle de Constitucionalidade. 

 

A Constituição, atualmente, deixou de ter um sentido próprio, passando a ter aquele que os juízes lhe atribuem. Por conseguinte, imprescindível é que os magistrados decidam de acordo com a essência da Carta Maior, atendendo às aclamações de uma maioria que padece diante das marcas da desigualdade, e não de uma minoria que nada vê além de vantagens restritas a eles próprios.

 

 

Ao analisar-se a história da humanidade, nota-se que todos os movimentos de cunho social que se deram, estiveram calcados na fraternidade, na liberdade e, principalmente na igualdade. A raiz de grande parte dos problemas que afligem o povo é a desigualdade. E, como já foi exaustivamente dito no presente trabalho, a promoção da isonomia exige uma série de atitudes, começando pelas decisões judiciais de acordo com esse princípio.

 

 

6 ABRANGÊNCIA DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE

 

O princípio jurídico da igualdade estabelece, conforme supracitado, a isonomia no tratamento de todos conforme a lei. Ou seja, ninguém pode ter privilégios ou ser perseguido por nossa legislação, a preço de ferir nossa Lex Magna.

 

Deve-se atentar a quem esse preceito e qualquer outro constitucional quer atingir: o legislador e o aplicador da lei. Estes têm o dever de assegurar a todos os abrangidos pela lei um tratamento paritário.

 

Destarte, fica evidenciado a responsabilidade e o dever das nossas casas legislativas em seguir esse princípio e dos operadores do direito, em especial os magistrados, em trabalhar e decidir em consonância com o mesmo. Precisa-se, pois, descobrir quando se descumpre a igualdade legal.

 

 

6.1 Quando se descumpre a Doutrina da Equiparação

 

“Seguir o princípio da igualdade é tratar todos sempre de forma igual.” Isso é uma grande falácia. Não há como negar que é impossível tratar todos sempre isonomicamente.  É como diz o grande jurista BANDEIRA DE MELLO:

 

[…] as leis nada mais fazem senão discriminar situações para submetê-las à regência de tais ou quais regras – sendo esta mesma sua característica funcional – é preciso indagar quais as discriminações juridicamente intoleráveis. (2004, p. 11)

 

Sabe-se que entre as pessoas existem uma série de diferenças, perceptíveis a olho nu, sem maiores análises. É também evidente que há casos em que se tem a necessidade de tratar as pessoas de maneira díspar. Vejamos um exemplo, também baseado na obra de BANDEIRA DE MELLO.

 

Um concurso foi aberto para enfermeiros e só se aceitam os homens de ascendência indígena. As mulheres e os não-silvícolas poderiam, então, argüir que tal processo seletivo é inconstitucional. Esse argumento seria perfeitamente viável caso não houvesse uma razão maior para tal discriminação. Essa diferenciação se deu em virtude de uma epidemia fortíssima que vitimou milhares de pessoas, inclusive muitos médicos e enfermeiros que tratavam dos doentes. Só que se descobriu que os descendentes dos nativos do sexo masculino têm imunidade a tal enfermidade e, por isso, foram esses os convocados.

 

Aqui fica nítido que houve uma razão maior para a diferenciação, uma questão que torna o caso totalmente ímpar e especial. Então se pode considerar que há casos nos quais se discrimina sem violar a isonomia legal. Resta saber, quando é que se viola tal princípio.

 

Para responder essa indagação é preciso ir aos poucos. Iniciando-se por aquilo que se considera como o intuito do princípio da isonomia: impossibilitar desequiparações fortuitas, injustificadas ou arbitrárias, através de regras e preceitos genéricos que não dêem bônus ou ônus indevidamente a um cidadão ou a um grupo. Vale ressaltar que qualquer especificação deve ser muito bem fundamentada e valiosa para o bem público a fim de espantar sua inconstitucionalidade.

 

Posto isso, pode-se, agora, ver os critérios por que se constata o desrespeito à isonomia. De modo geral, eles tratam de investigar aquilo que é adotado como discriminatório, se tem justificativa racional e se o fundamento está em harmonia com os ditames constitucionais. Outra questão pertinente é que na discriminação não se pode singularizar um destinatário, ou seja, visar única e especificamente uma pessoa.

 

Voltando ao caso concreto, analisar-se-á conforme os apontamentos feitos. Não há nada que obrigue, ou seja uma necessidade, ou ainda um interesse maior em conformidade com nossa Lei Maior.

 

Os descontos sexuais representam uma forma de manter o ramo do entretenimento. Entretanto, essa não é, nem de longe, a única maneira (apesar de ser a mais simples) de se promover o sucesso dos proprietários das casas noturnas. Não há, portanto, uma razão maior que justifique essa prática discriminatória.

 

 

Conclusão

 

A prática dos descontos femininos em casas noturnas, bares e boates é, portanto, inconstitucional. O princípio contido na Constituição relativo à igualdade entre homens e mulheres é ofendido, sem legitimidade para tal. Tal tradição se espalha de maneira exorbitante. Pra se ter idéia de como essa cultura já é aceita como normal dentre a sociedade, em alguns casos, no flyer (propaganda) da festa, os organizadores simplesmente divulgam dois valores de ingresso, sem precisar fazer a distinção de sexos, o que é o suficiente para ser entendido pela população. Tal conduta por parte dos responsáveis pelos eventos é, além de polêmica, absurda, cujo intuito é o mero multiplicar dos lucros. A aceitação de um paradoxo como tal é uma aberração tradicional.

                  

                   A mulher não deve ser o objeto atrativo das noites brasileiras, já é um costume a contratação de dançarinas que vão às casas noturnas “à paisana”, para embelezar o local e dar a sensação de alto nível de freqüentadores em tal local. Esta é uma barreira que deve ser transcendida, um costume a ser apagado, a extinção do termo “sexo frágil”. É a única maneira pela qual se poderá verificar uma efetiva igualdade dos sexos, social, sem distinção e preconceitos.

                  

                   Como já dito, ninguém poderá sofrer distinções de maneira a receber privilégios ou desvantagens. Dever-se-á respeitar a norma constitucional, a Carta Magna. Assim, a proibição da diferenciação de preços em casas noturnas deverá acontecer, para que, de maneira gradual, a verdadeira isonomia seja atingida e respeitada, e sobretudo, a fim de que a Constituição se mostre como um ente que serve a todos, e não a uma minoria quando bem lhes aprouver.

 

 

ANEXOS

 

 

 

Anexo 1

 

 

 

 

 

 

 

  

 

Anexo 2

 

 

Anexo 3

 

 

Anexo 4

 

 

 

Anexo 5

 

 

 

  

 

HIP HOP CHIC – DJ CIA

Oculto e El Divino realizam a original festa de Hip Hop da Ilha, todas as quintas-feiras. Nesta edição, assumindo as pick-ups os Dj´s Léo (Oculto) e seu convidado Dj Cia. Lançamento da coleção 2008 Alice Martinelli, com desfile as 22hs. Special Birthday by Erik Meyer.  

 

Apresentando os convites bônus, até a meia-noite, as mulheres têm entrada free e os homens pagam R$ 25,00 de ingresso. Após a meia noite, ainda com o bônus, as mulheres pagam R$ 20,00 de ingresso e os homens R$ 30,00. Ingresso na hora: feminino R$ 25,00 e masculino R$ 35,00. Valores sujeitos a alterações. Neste dia não haverá a opção de consumação mínima.  

 

   

 

  

WOMAN’S DJS SPECIAL

 

 

Neste sábado acontece a festa de lançamento da 7ª edição da Revista Clic Vip com a presença das misses Santa Catarina, Bárbara Erig, Beatriz Neves e Carina Beduschi. No line-up a integrante do Female Angels, Dj Bibba Pacheco (Play), que retorna da Europa prometendo incendiar as pistas do El Divino Lounge, com glamour e sensualidade.

 

Ingressos antecipados à venda no escritório do El Divino Lounge: feminino R$ 20,00 e masculino R$ 30,00. Ingressos na hora: feminino R$ 25,00 e masculino R$ 35,00. Valores sujeitos a alterações. Clientes El Divino Restaurante e Setai Sushi Bar, das 20h às 23h, têm opção de consumação mínima (R$ 20,00 feminino e R$ 40,00 masculino), ficando livre de ingresso para acesso à boate.

   

 

 

 REFERÊNCIAS 

 

 

ALEXY, Robert. Colisão de Direitos Fundamentais e Realização de Direitos Fundamentais no Estado de Direito Democrático. Revista da Faculdade da de Direito da UFRGS, v. 17. Porto Alegre: Síntese, 1999.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. O conteúdo jurídico da igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 24. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2006.

BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 3 ed. Editora Saraiva, 2001.

HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Editora Safe, 1991.

HOBBES, Thomas. O Leviatã. São Paulo: Ícone, 2000.

LOIS, Cecília Caballero. Uma Teoria da Constituição. Tese de Doutorado. CPGD – UFSC, nov. 2001.

<http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u94093.shtml> Acesso em 1 Dez. 2007 às 11h35min.

 

 

 

* Acadêmica de Direito na UFSC.

 

** Acadêmico de Direito na UFSC. Integrante de Grupo de Pesquisa sobre Governo Eletrônico e Diretor do Portal Jurídico Investidura.

 

*** Acadêmica de Direito na UFSC.

 

**** Acadêmico de Direito na UFSC. Integrante de Grupo de Pesquisa sobre Governo Eletrônico e Diretor do Portal Jurídico Investidura.

 

Como citar e referenciar este artigo:
BATISTA, Anne Carolinne; SCHIEFLER, Gustavo Henrique Carvalho; ROSA, Luiza Lange; JANESCH, Ricardo de Holanda. Descontos Sexuais: A Efetivação da Isonomia e a Ponderação de Princípios. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/descontos-sexuais-a-efetivacao-da-isonomia-e-a-ponderacao-de-principios/ Acesso em: 18 abr. 2024