Direito Constitucional

Município Putativo – o Município de Luís Eduardo Magalhães

Município Putativo – o Município de Luís Eduardo Magalhães

 

 

Ravênia Márcia de Oliveira Leite*

 

 

A análise da questão em torno do denominado município putativo iniciou-se com o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo Partido dos Trabalhadores em detrimento da Lei Estadual Bahiana n.° 7.619/2000, que criou o Município de Luís Eduardo Magalhães tendo em vista o desmembramento do Município de Barreiras (Informativo 427/Supremo Tribunal Federal).

 

Alega-se, na espécie, ofensa ao art. 18, § 4º, da CF, porquanto o referido ente fora criado em ano de eleições municipais, sem que existisse a lei complementar federal prevista no texto constitucional, a qual compete definir o período em que os municípios poderiam ser instituídos.

 

Sustentou-se, ainda, que o preceito da Constituição baiana que atribuíra à lei complementar estadual os requisitos para a criação de municípios teria sido revogado com o advento da EC 15/96 e que a lei impugnada viola o regime democrático, uma vez que a consulta prévia constitucionalmente exigida, por meio de plebiscito, não fora realizada com a totalidade da população envolvida no processo de emancipação, tendo apenas determinado distrito se manifestado. Ademais, os estudos de viabilidade municipal foram publicados em data posterior ao citado plebiscito.

 

Entende-se que município putativo à semelhança do que acontece com o casamento putativo e a sociedade de fato, com base nos princípios da reserva do impossível, da continuidade do Estado, federativo, segurança jurídica, confiança, força normativa dos fatos e situação excepcional consolidada, deve continuar a existir e repercutir seus efeitos jurídicos como se criado com base na norma constitucional.

 

Nos termos do art. 18, §4°, da Constituição da República Federativa do Brasil, in verbis:

 

“Art. 18.  A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

 (..)

§ 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por lei complementar federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei. (Parágrafo com redação dada pela  Emenda Constitucional nº 15, de 1996).”

 

Todavia, em considerando a excepcionalidade do caso, apesar da clara e frontal a violação do novo município em detrimento do citado dispositivo constitucional, O Ministro Eros Grau julgou improcedente o pedido, nos seguintes termos:

 

“Asseverou que o aludido Município fora efetivamente criado a partir de uma decisão política, assumindo existência de fato como ente federativo dotado de autonomia há mais de 6 anos e que esta realidade não poderia ser ignorada. Afirmou, no ponto, que esse ente assumira existência e, desta, resultaram efeitos jurídicos. Ressaltou, ainda, que a situação existente no momento da criação do citado Município era anormal, haja vista a não edição de lei complementar dentro de prazo razoável. Ponderando aparente conflito de inconstitucionalidades, quais sejam, ofensas ao § 4º do art. 18 da CF ou ao princípio federativo, entendeu que a existência válida do Município deveria ser reconhecida, para que afastar a ofensa à federação. Nesse sentido, considerou os princípios da segurança jurídica e da continuidade do Estado. Salientando que, não obstante a criação desse ente tenha implicado situação excepcional não prevista pelo direito positivo, aduziu que a declaração de improcedência do pedido não servirá de estímulo à criação de novos municípios indiscriminadamente, mas, ao contrário, servirá de apelo ao Poder Legislativo, no sentido de suprir a omissão constitucional reiteradamente consumada. Após, o Min. Gilmar Mendes pediu vista. (Informativo 427/Supremo Tribunal Federal)

 

O Supremo Tribunal Federal ainda decidiu que: “a mesma proclamação acima vale para outras duas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas pelo Procurador-Geral da República contra, respectivamente, a Lei 6.983/98, do Estado do Mato Grosso, que cria o Município de Santo Antônio do Leste, a partir de área desmembrada do Município de Novo São Joaquim, e contra a Lei 12.294/2002, do Estado de Santa Catarina, que anexa ao Município de Monte Carlo a localidade Vila Arlete, desmembrada do Município de Campos Novos. Em ambas as ações, também se sustenta ofensa ao art. 18, § 4º, da CF, sob a alegação de que o desmembramento ocorrera quando ainda pendente a lei complementar federal mencionada no texto constitucional e, quanto à última, aduz-se, ainda, que apenas a população do Distrito de Vila Arlete manifestara-se sobre o referido desmembramento.”

 

            Entretanto, existem vozes dissonantes na doutrina, como o Ilustre Dr. Pedro Lenza que afirma: “embora bastante sedutora a tese, com o máximo respeito, não entendemos razoável a construção, o que poderia abrir precedentes para novas violações ao art. 18, §4°”.

 

O STF ao final do julgamento da ADI n.° 2.240/BA, à unanimidade, julgou procedente a ação direta, e, por maioria, ao não pronunciar a nulidade do ato impugnado, manteve sua vigência pelo prazo de 24 (vinte e quatro) meses até que o legislador estadual estabeleça novo regramento, nos termos do voto reajustado do Senhor Ministro Eros Grau (Relator) e do voto-vista do Senhor Ministro Gilmar Mendes, vencido, nesse ponto, o Senhor Ministro Marco Aurélio, que declarava a nulidade do ato questionado. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Plenário, 09.05.2007.

 

 

* Delegada de Polícia Civil em Minas Gerais. Bacharel em Direito e Administração – Universidade Federal de Uberlândia. Pós graduada em Direito Público – Universidade Potiguar. Pós-graduanda em Direito Penal – Universidade Gama Filho.

 

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. Município Putativo – o Município de Luís Eduardo Magalhães. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/municipio-putativo-o-municipio-de-luis-eduardo-magalhaes/ Acesso em: 28 mar. 2024