Direito Constitucional

Constitucionalismo Whig: Fundamento Histórico para os Direitos e Garantias Fundamentais da Atualidade

Constitucionalismo Whig: fundamento histórico para os direitos e garantias fundamentais da atualidade

 

 

Ravênia Márcia de Oliveira Leite*

 

 

Conforme prelecionam Joana Galvão de Mello e Leonor Ramires Pinto, em estudo sobre o constitucionalismo britânico, em 1679 haviam dois partidos: os tories e os whigs. Os tories originaram o partido conservador e os whigs o partido liberal.

 

Os acontecimentos políticos que se deram na Inglaterra nos anos de 1688 e 1689 receberam o nome de Glorious Revolution ou Bloodless Revolution. Os dois partidos políticos – Tory e Whig – se uniram para depor James II, convidando William of Orange e sua mulher Mary (filha de James), que era protestante, para assumirem o trono inglês.

 

William desembarcou em Devonshire. James fugiu para a França. Discutiu-se, a seguir, a que título o casal assumiria o trono. A corrente que considerava a fuga de James como “abdicação” acabou por prevalecer. Foi elaborado o Bill of Rights, que estabeleceu as bases da transição, firmando o primado do Parlamento (Disponível em: The Columbia Encyclopedia. 6th ed., 2001, http://www.bartleby.com/65/gl/Glorious.html. Acesso em 15.11.2002. Ver, ainda, MAUROIS, André. História da Inglaterra. Trad. Carlos Domingues. Rio de Janeiro: Irmãos Pongetti, p. 338 e segs.)

 

No parlamento inglês, em 1714, durante um governo whig, portanto, de visão liberal, surgiu a figura do primeiro ministro, ou seja, até então, de maneira conservadora, apenas o monarca liderava as reuniões parlamentares, dessa forma, pode-se compreender que houve uma grande evolução e modernização na elaboração política de então, a qual prevalece até a modernidade, prevalecendo a democracia.

 

O Exmo. Ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça Adhemar Ferreira Filho, preleciona, que deve-se “registrar que embora não se confundindo com o Constitucionalismo, o liberalismo com ele tem muitos pontos em comum. Ambos andaram juntos a partir do final do século XVII. Filho do Iluminismo, o liberalismo foi uma reação burguesa ao Estado absolutista. O governante não devia mais ser legibus solutus, isto  é, estar acima da lei. Como qualquer cidadão, tinha de estar preso às normas legais. A Glorious Revolution inglesa (1688/9) é sem dúvida um bom marco para fixação do advento das idéias liberais.

 

Conforme alhures esclarecido, e muito bem resumido pelo ilustre Ministro aposentado do STJ, “a Coroa havia cedido espaço ao Parlamento e ao common law. Pensadores, filósofos e políticos ingleses já vinham, em parte embalados por teólogos e escritores medievais (Agostinho, Aquino, Marsílio de Pádua), defendendo o governo consentido. Essas idéias estão disseminadas nas obras de Richard Hooker (1554-1600), John Milton (1608-1674), Algernon Sidney (1622-1683), e John Locke (1632-1704). Locke, como antes dele Sidney e Milton, também escreveu para combater o pensamento absolutista de Robert Filmer (The Patriarcha).

 

Continua o ilustre jurisconsulto, “no Second Treatise, Locke mostra que o monarca não governava por direito próprio ou direito divino, mas por assentimento dos governados. O homem, que antes vivia em estado de natureza, alienou a favor do governo civil alguns direitos; outros direitos, como a liberdade, a vida, não tinham como ser negociados, pois não lhes  pertenciam especificamente: eram de todos os homens. Por outro lado, o governado sempre conservou ínsita a possibilidade de derrubar o governo quando esse governasse contra o interesse do povo. O liberalismo, como de resto o Constitucionalismo, começou a se preocupar com instrumentos jurídicos que pudessem garantir as liberdades fundamentais do cidadão contra o Estado e contra grupos sociais. Assim, surge a idéia da separação  de poderes políticos, do controle da constitucionalidade das leis, da criação de tribunais constitucionais etc. (grifo nosso)”.

 

Ana Maria Brito Sanches afirma que “no pensamento colonial esses fundamentos se articulavam do seguinte modo: os grandes princípios do direito natural eram mais bem protegidos pelo constitucionalismo inglês, de inspiração Whig, isto é, a forma de organização do governo inglês, cujas funçõe seram confiadas a três diferentes ramos ou branches of government; o Rei, o Parlamento e as Cortes do Direito Comum. O governo assim constituído assegurava a todos os homens livres sob o reino da Grã-Bretanha o direito de escolher seus representantes. Pela lei comum, ou common law, isto é, a lei da terra segundo os costumes, e pelas leis de Deus, todo homem do povo (exceto os insanos, os infantes e os criminosos) era considerado livre e tinha direito ao gozo da liberdade (grifo nosso). A supremacia residia no reino e na lei da terra. Como muitos jovens de origem puritana, Franklin aprendeu em centenas de exemplos que “antes que um homem pudesse se tornar útil na vida era necessário ser treinado nas virtudes pessoais e era uma quimera pensar que uma pessoa má pudesse ser um bom político”(http://74.125.47.132/search?q=cache:l1C1n7BJ:www.fflch.usp.br/df/site/posgraduacao/2006_mes/anamariabritosanches.pdf+Constitucionalismo+Whig&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br).

 

Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, Procurador Nacional da Fazenda, resume, de maneira clara, que “o constitucionalismo inglês centra-se na expressão dos direitos individuais de modo negativo, isto é, não há texto explícito que os sustentem. Porém, todos os textos e julgados não os proíbem. As normas de direitos individuais não são fontes, são conseqüências dos direitos individuais” (http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10394).

 

Enfim, a revolução constitucional promovida pelo denominado constitucionalismo whig, alterou, perpetualmente, a visão de participação popular nas decisões políticas, de tal modo que, em conclusão: só o povo real – concebido como comunidade aberta de sujeitos constituintes que entre si pactuam e consentem o modo de governo da cidade, tem o poder de disposição e conformação da ordem político-social.

 

 

* Delegada de Polícia Civil em Minas Gerais. Bacharel em Direito e Administração – Universidade Federal de Uberlândia. Pós graduada em Direito Público – Universidade Potiguar. Pós-graduanda em Direito Penal – Universidade Gama Filho.

 

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. Constitucionalismo Whig: Fundamento Histórico para os Direitos e Garantias Fundamentais da Atualidade. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/constitucionalismo-whig-fundamento-historico-para-os-direitos-e-garantias-fundamentais-da-atualidade/ Acesso em: 28 mar. 2024