Direito Constitucional

Educação que liberta

EDUCATION THAT RELEASES

EDUCACIÓN QUE LIBERTA

NOVO, Benigno Núñez[1]

RESUMO

Este artigo tem por objetivo demonstrar a relevância da educação como instrumento de ressocialização e de desenvolvimento de habilidades e de educação para a empregabilidade é notória no sentido de auxiliar os reclusos a reconstruir um futuro melhor durante e após o cumprimento da sentença. Os objetivos de encarceramento ultrapassam as questões de ‘punição, isolamento e detenção. A educação auxilia e permite a obtenção dos objetivos centrais de reabilitação que incidem em resgate social e educação libertadora numa dimensão de autonomia, sustentabilidade e minimização de discriminação social.        

Palavras-chave: Educação; Instrumento; Ressocialização; Libertação.

ABSTRACT

This article aims to demonstrate the relevance of education as a tool for resocialization and skills development and education for employability is notorious in helping prisoners to rebuild a better future during and after compliance with the sentence. Incarceration goals go beyond the issues of ‘punishment, isolation and detention. Education helps and enables the attainment of the central objectives of rehabilitation that focus on social rescue and liberating education in a dimension of autonomy, sustainability and minimization of social discrimination.

Keywords: Education; Instrument; Ressocialização; Release.

RESUMEN

Este artículo tiene por objetivo demostrar la relevancia de la educación como instrumento de resocialización y de desarrollo de habilidades y de educación para la empleabilidad es notoria en el sentido de ayudar a los reclusos a reconstruir un futuro mejor durante y después del cumplimiento de la sentencia. Los objetivos de encarcelamiento sobrepasan las cuestiones de castigo, aislamiento y detención. La educación ayuda y permite la obtención de los objetivos centrales de rehabilitación que inciden en rescate social y educación liberadora en una dimensión de autonomía, sostenibilidad y minimización de discriminación social.

Palabras clave: La educación; Instrumento; Rehabilitación; La libertación.

1 INTRODUÇÃO

A educação tem caráter permanente. O Ser Humano, como ser inacabado, busca constantemente se conhecer, informar-se, superar-se e se tornar autônomo, dono de sua própria história.

O direito à educação escolar como “condição ineliminável de uma real liberdade de formação (desenvolvimento da personalidade) e instrumento indispensável da própria emancipação (progresso social e participação democrática)” é um direito humano essencial para a realização da liberdade e para que esta seja utilizada em prol do bem comum. Desta forma, ao abordarmos a educação nas prisões é importante ter claro que os reclusos, embora privados de liberdade, mantêm a titularidade dos demais direitos fundamentais. O acesso ao direito à educação do recluso deve ser assegurado universalmente, a todos e todas, dentro da perspectiva acima delineada e em respeito às normas que o asseguram.

Em documentos internacionais mais recentes, tal como Declaração de Hamburgo, de 1997, a abordagem do direito à educação de pessoas presas avançou, afirmando-se expressamente na Declaração a “preocupação de estimular oportunidades de aprendizagem a todos, em particular, os marginalizados e excluídos” (item 11) e no “Plano de Ação para o futuro”, aprovado neste encontro, no item 47, o reconhecimento do direito de todas as pessoas encarceradas à aprendizagem: a) proporcionando a todos os presos informação sobre os diferentes níveis de ensino e formação, e permitindo-lhes acesso aos mesmos; b) elaborando e implementando nas prisões programas de educação geral com a participação dos presos, a fim de responder a suas necessidades e aspirações em matéria de aprendizagem; c) facilitando que organizações não-governamentais, professores e outros responsáveis por atividades educativas trabalhem nas prisões, possibilitando assim o acesso das pessoas encarceradas aos estabelecimentos docentes e fomentando iniciativas para conectar os cursos oferecidos na prisão aos realizados fora dela. (Declaração de Hamburgo, 1997, tema 8, item 47)”.

As pessoas privadas de liberdade constituem um dos grupos severamente marginalizados que estão submetidos à violação endêmica de seu direito a educação.

A educação é um direito social assegurado pela Constituição Federal e consagrado na legislação internacional. No entanto, quando se trata da população encarcerada, tal direito parece não ter o mesmo grau de reconhecimento. Se é fato que as camadas pobres da população são privadas de vários direitos, entre eles, o direito a uma educação de qualidade, essa realidade torna-se ainda mais contundente e pior – mais invisível ou naturalizada – em se tratando de pessoas condenadas pelo sistema de justiça penal. No Brasil, em muitas instituições penais, a oferta de serviços educacionais é inexistente, insuficiente ou extremamente precária, o que se soma a regimes disciplinares e legais que não incentivam ou mesmo inviabilizam o engajamento de pessoas presas em processos educacionais.

2 DESENVOLVIMENTO

A educação pode ser considerada, entretanto, um caminho promissor para a reintegração social da pessoa condenada à pena de prisão. Mas, além disso, e antes de tudo, é um direito humano universal que deve ser assegurado a todas as pessoas, independentemente de sua situação; é um direito que, ademais, potencializa o exercício de outros direitos como o trabalho, a saúde e a participação cidadã. A extensão dos serviços de educação a grupos historicamente marginalizados – como as pessoas privadas de liberdade – é, portanto, parte essencial na luta pela afirmação dos Direitos Humanos em sua universalidade. Os poucos dados existentes a respeito da escolaridade das pessoas presas no Brasil apontam que, apesar de mais de 70% delas não terem concluído o ensino fundamental e de 10,5% serem analfabetas, apenas 17% estudam. Os números, bastante eloquentes, mostram que é urgente a mobilização dos órgãos governamentais e da sociedade civil para que se cumpra no Brasil a Constituição, que garante a todos os brasileiros, independentemente da idade, o direito ao ensino fundamental e obriga o Estado a ofertá-lo, assim como a Lei de Execução Penal, que garante ao preso o direito ao estudo.

Uma antiga máxima popular diz que “mente vazia é a oficina do diabo”. Este provérbio não poderia ser mais adequado quando se trata da vida carcerária. O indivíduo privado de sua liberdade e que não encontra ocupação, entra num estado mental onde sua única perspectiva é fugir. O homem nasceu para ser livre, não faz parte de sua natureza permanecer enjaulado. Algumas raríssimas cadeias ainda oferecem certas condições que superam a qualidade de vida do preso se estivesse do lado de fora. Ainda assim, o sentimento de liberdade sempre é maior e mesmo estas cadeias acabam vivenciando rebeliões de fuga. Preso que não ocupa seu dia, principalmente sua mente, é um maquinador de ideias, a maioria delas, ruins. O presídio é um sistema fechado onde o encarcerado é obrigado a conviver, permanentemente, com outros indivíduos, alguns de índole igual, melhor ou pior. Nem sempre há cordialidade e animosidade é algo comum, gerando um eterno clima de medo e preocupação constantes, pois o preso nunca sabe se “o seu dia vai chegar”. Grande parte desta angústia vivida pelo presidiário advém da falta de ocupação, de uma atividade que ocupe seu tempo, distraia sua atenção e que o motive a esperar um amanhã melhor. A ideia de todo presidiário é que sua vida acabou dentro das paredes da cadeia e que não lhe resta mais nada. Amparo psicológico é fundamental, pois nenhum ser humano vive sem motivação. Presídio sem ocupação se torna uma escola “às avessas”: uma formadora de criminosos mais perigosos.

Por não ter um estudo ou ocupação, consequentemente, carecer de um senso moral que a vida pré egressa não conseguiu lhe transmitir, a personalidade do preso passa a sofrer um desajuste ainda maior. Sua única saída é relacionar-se com os demais presos e intercambiar com ele suas aspirações, valores e visões de mundo, quase sempre distorcidas. Passa a adquirir novos hábitos, que antes não tinha, enfim transforma-se num indivíduo pior do que quando entrou. Além disso, distúrbios psicológicos que já possuía antes de vir para o presídio se agravam, justamente por se ver inserido num novo contexto social, repleto de hostilidades e desrespeito.

O homem, como forma de sobreviver em sociedade, sempre procurou agrupar-se ao fito de resistir às forças da natureza, e, desse modo, estabelecer ações de maneira cooperativa. Ao passo que desenvolveu a linguagem, dando-lhe a consciência reflexiva, propiciou a conjugação das atividades no esforço de transformar o mundo. Nesse contexto diversas culturas se originaram em cada comunidade de acordo com o modo de interpretar a realidade e transformá-la segundo suas necessidades. Cada cultura tem, portanto, suas construções próprias: alimentação, costumes, religião, arquitetura, política, valores, etc.

Na realidade, a “postura humana” é aprendida em comunidade. Tal assertiva implica reconhecer que não há seres humanos fora de um contexto social. Em decorrência de um processo educativo primário, cujo principal veículo é a linguagem, surge, no contexto sociocultural, o homem.

Segundo alguns autores, esse processo de educação primária (leia-se, aprender a ser humano) é chamado de socialização. Tomando-se por base o contexto sociocultural em que está inserida, a criança é socializada: “adquire uma linguagem e, com ela, uma determinada forma de falar, pensar e agir, segundo a cultura onde está (…). Pode-se então falar no ‘estilo de vida do chinês’, no ‘modo britânico de ser’, no ‘american way of life’ e no ‘jeitinho que o brasileiro sempre dá.”

Esse processo de “socialização” – quando se aprende a ser humano – também define o estilo de vida de uma comunidade; adquire-se, com ele, a personalidade cultural.

Esse mecanismo, pelo qual o indivíduo é iniciado no estilo de vida de uma cultura, é chamado de endoculturação. Pode-se afirmar, então, que endoculturação é o processo pelo qual todos os indivíduos passam “interiorizando” um estilo cultural de viver. É, o que, aliás, se constata na cultura do cárcere: o preso é submetido a um processo constante de interiorização de um estilo de vida muito peculiar e institucionalizado em face da nova realidade presente.

Nesse estágio de endoculturação o papel da educação e dos educadores (leia-se, também, os profissionais que atuam no Sistema penitenciário) constitui a viga mestra, o sustentáculo, para iniciar o preso no processo de ressocialização. Torna-se necessário desenvolver uma comunicação intensa ao fito de resgatar e elevar sua autoestima.

Os autores das análises antropológicas modernas convergem para um sentimento de reconhecimento dessa necessidade, de uma “comunicação mais intensa com a existência (…) de volta às origens, às raízes, à matriz, quer sob a forma simbólica e social de reencontro com a natureza, quer sob a forma histórico-antropológica. Assim poderá ser reencontrada a linguagem de grupos humanos reduzidos ao silêncio e resgatando tudo que a Cultura dominante absorve ‘tranquilamente’ (…)”.

A educação, no contexto sociocultural, que deveria significar o auxílio aos indivíduos para que pensem sobre a vida que levam; que deveria permitir uma visão do todo cultural onde estão, desvirtua-se na escola. Nesta, as pessoas são preparadas para executar trabalhos parcializados e mecânicos no contexto social. A escola mantém e estimulam a separação da razão e do pensamento, dês que sua finalidade é preparar mão-de-obra à sociedade industrial; transmitir conceitos desvinculados da vida concreta dos educandos, impondo desconsiderar o risco da visão de mundo das classes dominantes.

Com efeito, a educação precisa transmitir significados presentes na vida concreta de quem se pretendem educar ou reeducar; de modo diverso, não produz resultado, aprendizagem.

Mediante a consciência reflexiva, simbólica, o homem desenvolve a linguagem, utilizando-se da palavra; dá sentido à vida, segundo os significados que advêm fundamentalmente dos símbolos, das palavras, dos nomes. Assim, os conceitos (símbolos) são necessários às experiências dos indivíduos em conexão à realidade. Logo, o processo da aprendizagem precisa mobilizar tanto os significados, os símbolos, quanto os sentimentos, as experiências a que eles se referem.

A comunidade internacional se preocupa desde há muito tempo pela humanização da justiça penal, a proteção dos direitos humanos e a importância da educação no desenvolvimento da pessoa e da comunidade.

A Assembleia Geral da ONU em 1990 em sua resolução 45/111, aprovou os princípios básicos para o tratamento dos reclusos, dentre eles: a) Todos os reclusos serão tratados com respeito que merece sua dignidade e valor inerentes de seres humanos (art. 1); b) Com exceção das limitações que são evidentes e necessárias pelo fato do aprisionamento, todos os reclusos seguirão gozando dos direitos humanos e das liberdades fundamentais consagradas na declaração universal das direitas humanos e, quando o Estado de que se trate seja parte no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e seu Protocolo Facultativo, assim como todos os demais direitos estipulados em outros instrumentos das Nações Unidas (art. 5); c) Todos os reclusos terão direito a participar das atividades culturais e educativas direcionadas a desenvolver plenamente a personalidade humana (art. 6).

Presente desde os primórdios da prisão, a educação é arrolada como atividade que visa a proporcionar a reabilitação dos indivíduos punidos. Contudo, considerando que os programas da operação penitenciária se apresentam de forma premente a fim de adaptar os indivíduos às normas, procedimentos e valores do cárcere – afiançando, portanto, aquilo que se tornou o fim precípuo da organização penitenciária: a manutenção da ordem interna e o controle da massa carcerária – quais são as possibilidades para uma “educação autêntica, que não descuide da vocação ontológica do homem, a de ser sujeito” (Freire, 1979, p. 66).

No interior das prisões, as contradições do processo de ajustamento materializam-se nas possibilidades concretas dos indivíduos punidos preservarem-se como sujeitos; na resistência a subjugarem-se plenamente aos valores da instituição e do sistema social que lhe é inerente.

A educação formal não permanece, em absoluto, neutra nesse processo pleno de contradições de subjugação e resistência. “A característica fundamental da pedagogia do educador em presídios é a contradição, é saber lidar com conflitos, saber trabalhar as contradições à exaustão” (Gadotti, 1993, p. 143).

Nos estabelecimentos penais, a educação compõe a área de reabilitação, sendo a ela subordinada hierarquicamente. A manutenção de suas atividades, contudo, em todo o tempo, observou a participação de outras instituições não pertencentes propriamente à unidade prisional. Sua organização e funcionamento são decorrentes, dessa forma, das normas e diretrizes das instituições que as coordenaram, ao longo dos anos.

O tratamento reeducativo é o termo técnico usado no Direito Penitenciário, na Criminologia Clínica e na Legislação Positiva da ONU. Segundo a concepção científica, o condenado é a base do tratamento reeducativo e nele observa-se: sua personalidade, através de exames médico-biológico, psicológico, psiquiátrico; e um estudo social do caso, mediante uma visão interdisciplinar e com a aplicação dos métodos da Criminologia Clínica. É ponto de união entre o Direito Penal e a Criminologia.

Com efeito, o tratamento compreende um conjunto de medidas sociológicas, penais, educativas, psicológicas, e métodos científicos que são utilizados numa ação compreendida junto ao delinquente, com o objetivo de tentar modelar a sua personalidade para preparar a sua reinserção social e prevenir a reincidência.

Uma educação dentro do sistema penitenciário deve trabalhar com conceitos fundamentais, como família, amor, dignidade, liberdade, vida, morte, cidadania, governo, eleição, miséria, comunidade, dentre outros. Nesse aspecto, Gadotti (in: Educação, 1999, p. 62) salienta a necessidade de trabalhar no reeducando “[…] o ato antissocial e as consequências desse ato, os transtornos legais, as perdas pessoais e o estigma social.” Em outras palavras, desenvolver nos educandos a capacidade de reflexão, fazendo-os compreender a realidade para que de posse dessa compreensão possam então desejar sua transformação. Assim como saliente o artigo… “[…] uma educação voltada para a autonomia intelectual dos alunos, oferecendo condições de análises e compreensão da realidade prisional, humana e social em que vivem”.

O sistema penitenciário necessita de uma educação que se preocupe prioritariamente em desenvolver a capacidade crítica e criadora do educando, capaz de alertá-lo para as possibilidades de escolhas e a importância dessas escolhas para a sua vida e consequentemente a do seu grupo social. Isso só é possível através de uma ação conscientizadora capaz de instrumentalizar o educando para que ele firme um compromisso de mudança com sua história no mundo. Sobre isso, Gadotti (in: Educação, 1999, p. 62) diz que “Educar é libertar […] dentro da prisão, a palavra e o diálogo continuam sendo a principal chave. A única força que move um preso é a liberdade; ela é a grande força de pensar.”

Em sua análise Paulo Freire (1980, p. 26) afirma que:

A conscientização é […] um teste de realidade. Quanto mais conscientização, mais “desvela” a realidade, mais se penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por esta mesma razão, a conscientização não consiste em “estar frente à realidade” assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação-reflexão. Esta unidade dialética constituiu, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens.

Ressocializar é levar o presidiário a uma adaptação social, ou seja, tornar possível o seu retorno à sociedade sem que ele volte à criminalidade. É principalmente levar cidadania a essas pessoas, é mostrar para elas um caminho novo, e nada melhor do que educação como instrumento para esse processo, dar a esses seres humanos uma chance nesse mercado extremamente competitivo e tão assustador quanto eles o são para a maioria da sociedade.

Educação é um fenômeno de produção e apropriação dos produtos culturais, expresso por um sistema aberto de ensino e aprendizagem, constituído de uma teoria de conhecimento referenciada na realidade, com metodologias (pedagogia) incentivadoras à participação e ao empoderamento das pessoas, com conteúdos e técnicas de avaliações processuais, permeados por uma base política estimuladora de transformações sociais e orientados por anseios humanos de liberdade, justiça, igualdade e felicidade.

As ações de ressocialização de apenados buscam reduzir os níveis reincidência e auxiliam na consequente recuperação do detento através de sua educação, capacitação profissional e da assistência sistemática à sua condição psicológica e social. Uma das principais questões evidenciadas no estudo foi à forma pelas quais os diversos agentes envolvidos na execução penal compreendem a educação no Sistema Penitenciário. Todos os entrevistados, unanimemente, reconheceram a sua importância e creditam à educação o papel de contribuir com a “ressocialização” do interno penitenciário, conduzindo-o para a sua reinserção social. Muitos associam a educação ao trabalho, dizendo que somente através de uma educação profissional conseguiremos verdadeiramente reintroduzir o interno na sociedade.

O conceito ressocialização, assim como sua compreensão por parte de alguns dos entrevistados em uma avaliação superficial, sugerem proximidade com o senso comum. Tentando problematizar a questão, procuramos entender o significado que preside o uso desse conceito no contexto prisional, visto que é tão comumente utilizado pelos agentes operadores da execução penal quando falam sobre o papel da educação. Trata-se de um termo bastante complexo, que não pode ser definido simplesmente como, por exemplo, reinserção social.

Gadotti (in: Educação, 1999, p. 62) diz que “Educar é libertar […] dentro da prisão, a palavra e o diálogo continuam sendo a principal chave. A única força que move um preso é a liberdade; ela é a grande força de pensar.”

Mirabete mencionando o artigo 205 da Constituição Federal que elege “educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Fomentar a linguagem, mediante a combinação de seus valores e significados, implica em uma somatória e em um armazenamento de conceitos que o homem aprende; compreendendo-se por referência, as suas próprias experiências anteriores. “Este é então o mecanismo do conhecimento humano: um jogo (dialético) entre o que é sentido (vivido) e o que é simbolizado (transformado em palavras, ou outros símbolos)”, ou seja, a experiência social no desenvolvimento da aprendizagem e da linguagem admite analogia ao processo de imitação: quando a criança imita a forma pela qual o adulto usa instrumentos e manipula os objetos, ela está dominando o verdadeiro princípio que envolve uma atividade em particular. O uso dos instrumentos especificamente humanos conduz à dialética entre o sentir e o simbolizar.

A educação, no contexto sociocultural, que deveria significar o auxílio aos indivíduos para que pensem sobre a vida que levam; que deveria permitir uma visão do todo cultural onde estão, desvirtua-se na escola. Nesta, as pessoas são preparadas para executar trabalhos parcializados e mecânicos no contexto social. A escola mantém e estimulam a separação da razão e do pensamento, dês que sua finalidade é preparar mão-de-obra à sociedade industrial; transmitir conceitos desvinculados da vida concreta dos educandos, impondo desconsiderar o risco da visão de mundo das classes dominantes. Com efeito, a educação precisa transmitir significados presentes na vida concreta de quem se pretende educar ou reeducar; de modo diverso, não produz resultado, aprendizagem.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ressocialização de detentos é fator de segurança social. É dever do Estado e direito consagrado na Constituição Federal e na Lei de Execução Penal. Investir na educação de detentos é fator de humanização, diminui as rebeliões e ajuda a criar um clima de expectativa favorável para o reingresso na vida social, quando em liberdade.

A educação é um processo não acabado que necessita constantemente ser aprimorado com novos métodos e técnicas que façam com que os detentos tomem gosto pelo estudo para que cada vez mais adquiram o conhecimento para transformar sua realidade e propiciar uma vida mais digna.

A relevância da educação prisional como instrumento de ressocialização e de desenvolvimento de habilidades e de educação para a empregabilidade é notória no sentido de auxiliar os reclusos a reconstruir um futuro melhor durante e após o cumprimento da sentença. Os objetivos de encarceramento ultrapassam as questões de ‘punição, isolamento e detenção. A educação auxilia e permite a obtenção dos objetivos centrais de reabilitação que incidem em resgate social e educação libertadora numa dimensão de autonomia, sustentabilidade e minimização de discriminação social.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[1] Advogado, doutor em direito internacional pela Universidad Autónoma de Asunción. E-mail: benignonovo@hotmail.com

Como citar e referenciar este artigo:
NOVO, Benigno Núñez. Educação que liberta. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2018. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/educacao-que-liberta-2/ Acesso em: 29 mar. 2024