Direito Constitucional

A liberdade de expressão não é absoluta, mas não se pode limitá-la, arbitrariamente

Uma mulher de 87 anos foi condenada à prisão por negar o holocausto na Alemanha, pelo Tribunal de Hamburgo. Ursula Haverbeck, de 87 anos, considera o holocausto como a mentira duradoura da história da humanidade o Tribunal condenou-a por “incitar ao ódio”.

Porém, incitar ao ódio, de quem? Temos que analisar que neste século há o neonazismo. Mesmo para as pessoas que não são neonazistas, a imagem de Hitler representa autoridade potencial para resolver os problemas do planeta, os quais foram demonstrados durante a Segunda Guerra Mundial, pelos próprios nazistas. Hitler, sem sombra de dúvida, retirou a Alemanha do Abismo econômico, a custa de apropriações brutais. A humanidade também não pode esquecer que Hitler, juntamente com os médicos nazistas, incitaram ódios aos judeus, aos negros, às prostitutas, aos aleijados etc.

A eugenia não é algo recente, isto é, do mundo moderno. Ela existe desde os primórdios da humanidade. Contudo, a eugenia, nos primórdios da humanidade, era uma necessidade humana diante dos escassos alimentos, ou em decorrência de guerras, o que forçava alguns povos a permitirem o desenvolvimento da criança caso ela fosse “perfeita” — caso contrário, era exterminada —, enquanto a eugenia científica [século XVIII] serviu para interesses econômicos. A Teoria de Malthus inspirou Charles Darwin [seleção natural] que, por sua vez, inspirou cientistas e intelectuais à teoria do Darwinismo Social, o que ocasionou perseguições aos seres humanos não europeus. Ou, mesmo sendo europeus, mas por não estarem no patamar socioeconômico elevado, eram vistos como seres inferiores.

A eugenia serviu para interesses econômicos, por exemplo, a colonização. Conquistar novas terras através da ideologia da superioridade justificou o barbarismo. Povos dominados ou até dizimados eram considerados inferiores, sendo assim, as consequências advindas da dominação ou destruição de alguns povos se deveria a teoria do Darwinismo Social.

Por isso, o Tribunal condenou a senhora à prisão e limitou a sua liberdade de expressão. Como o planeta encontra-se em guerra, por várias ideologias, permitir a liberdade de expressão absoluta, principalmente quando há guerras ideológicas impostas com armas, verbais ou não, o que ocasiona, geralmente, confrontos físicos, a liberdade de expressão, e até de imprensa, não pode ser total.

Contudo, até em que momento pode-se impedir tais liberdades? Refutar teorias, em si, não é incitar ao ódio. Por exemplo, comparativo, na Alemanha se discute a possibilidade de divulgar conhecimentos médicos, dos experimentos nazistas, sendo as cobaias os “inferiores” [judeus, prostitutas, aleijados etc.]. Seria ético e moral divulgá-los, mesmo que tais descobertas científicas possam trazer avanços para a medicina humana?

O planeta saiu de duas Guerras Mundiais, as feridas ainda não estão totalmente fechadas. A humanidade do século XXI, em sua totalidade, ainda se assemelha às gerações bárbaras, cujas ações eram mais pela força física do que pelo diálogo. O verniz civilizatório do século XX se diluiu, consequentemente, ocasionando duas Guerras Mundiais. O mesmo verniz civilizatório encontra-se diluído, a qualquer momento a figura do troglodita pode se insurgir do âmago do homo sapiens.

Não obstante, censura à liberdade de expressão, pelos agentes políticos, não pode servir de justificativa protetiva às suas imagens pessoais, mesmo que não tenham esgotado todos os trâmites legais. No Brasil, projetos de leis tentam silenciar as empresas de jornalismo, blogues e sites de cidadãos brasileiros não jornalistas.

A liberdade de expressão, de pensamento e de imprensa, males aos olhos dos agentes políticos, não pode ser censurada previamente. Decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, quanto à honra dos políticos, não permite censura prévia, mas ulteriores condenações civis, não penais, por serem estas demasiadamente cerceadoras [intimidadoras] da liberdade de expressão.

Mesmo as condenações civis [pecuniárias], estas não podem servir de meio repressor à liberdade de expressão. Ou seja, criar uma expectativa de medo aos cidadãos [povo] de forma a limitar a liberdade de expressão. O direito de resposta também não pode servir de controle, da mesma maneira, as “negociações” de “retire que eu não lhe processarei” também constitui ditadura sobre à liberdade de expressão.

Outro fundamental requisito para a liberdade de expressão e de pensamento é “não se deve exigir que os intermediários controlem o conteúdo gerado pelos usuários e enfatizaram a necessidade de protegê-los em relação a qualquer responsabilidade, sempre que não intervenham especificamente nos conteúdos, nem se recusem a cumprir uma ordem judicial que exija a sua eliminação”.

Ordem judicial, a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão Comissão Interamericana de Direitos Humanos considera que qualquer ação, sem ordem judicial, para limitar ou proibir a liberdade de expressão e de pensamento é afrontar o Estado democrático. Ora, a internet é a voz universal dentro e fora de cada Estado. Através da internet se tem o pluralismo de opiniões, principalmente “a grupos vulneráveis ou que expressam visões críticas sobre assuntos de interesse público”.

A proteção da intimidade deve obedecer ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade, “as leis de privacidade não devem inibir nem restringir a investigação e a difusão de informação de interesse público”.

A internet é a pedra angular da democracia. Qualquer atuação arbitrária do Estado, e dos particulares, para limitar o acesso a ela, ou limitar a liberdade de expressão e de pensamento, não condiz com a democracia. A internet assegura a proteção dos Direitos humanos, “como o direito a participar na vida cultural e a gozar dos benefícios do progresso científico e tecnológico (artigo 14 do Protocolo de San Salvador), o direito à educação (artigo 13 do Protocolo de San Salvador), o direito à reunião e associação (artigos 15 e 16 da Convenção americana), os direitos políticos (artigo 23 da Convenção Americana) e o direito à saúde (artigo 10 do Protocolo de San Salvador), entre outros” [1].

Brasil

Projetos de Lei 141/2011, 1589/2015 e a Emenda à Constituição 206/12, intencionalmente são medidas covardes de e instituir a ditadura do silêncio em nosso país. Diante dos escândalos envolvendo agentes políticos, mais do que nunca, faz-se necessário a liberdade de expressão, de pensamento e de imprensa sobre atos imorais e ilegais. O direito de resposta já está normatizado na CF/88 “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”, contudo, conforme Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o direito de resposta não pode servir de controle impeditivo a plena democracia, pois o interesse público sobressai sobre o interesse individual, principalmente quando corrompe a democracia.

Nota:

Relator Especial das Nações Unidas (ONU) sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, Representante da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE) para a Liberdade dos Meios de Comunicação, Relatora Especial da Organização dos Estados Americanos (OEA) para a Liberdade de Expressão, e Relatora Especial da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos (CADHP) sobre Liberdade de Expressão e Acesso à Informação. 1º de junho de 2011. Declaração Conjunta sobre liberdade de expressão e internet.

Sérgio Henrique da Silva Pereira: jornalista, professor, produtor, articulista, palestrante, colunista. Articulista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Investidura – Portal Jurídico, JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação.

Como citar e referenciar este artigo:
PEREIRA, Sérgio Henrique da Silva. A liberdade de expressão não é absoluta, mas não se pode limitá-la, arbitrariamente. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2015. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/a-liberdade-de-expressao-nao-e-absoluta-mas-nao-se-pode-limita-la-arbitrariamente/ Acesso em: 20 abr. 2024