Direito Constitucional

As Defensorias da Ordem dos Advogados

As Defensorias da Ordem dos Advogados

 

 

Fernando Machado da Silva Lima*

 

 

17.11.2007

 

 

 

       A Defensoria Pública foi criada pela Constituição Federal de 1.988, cujo art. 134 dispõe que ela é uma “instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados…”

         Apesar disso, e como seria de esperar, também neste ponto a Constituição não está sendo respeitada.

 

A Ordem dos Advogados do Brasil noticiou, em sua página na internet, que:

 

         1. O Governo de Goiás liberou (27.09.2007) R$ 100 mil para o pagamento de honorários dos advogados dativos do Estado. (…) O repasse dos honorários dos advogados que prestam assistência judiciária no Estado é fruto das recorrentes reivindicações feitas pela Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil de Goiás ao governo estadual, que se comprometeu a efetuar regularmente o pagamento à advocacia dativa no Estado. O presidente da OAB-GO, Miguel Ângelo Cançado, reiterou o empenho da entidade: “O pagamento da categoria continuará entre as prioridades das gestões da Seccional, que se manterá firme na defesa pela valorização dos advogados que atuam na assistência judiciária”. Em 2007, já foram liberados R$ 500 mil de R$ 1 milhão anunciado em março último pelo governo. Fonte: http://www.oab.org.br/noticia.asp?id=11275 (VEJA TAMBÉM EM: http://www.profpito.com/EstadoliberaR.html)

 

         2. O governo de Santa Catarina repassou (09.10.2007) R$ 12,5 milhões para pagamento dos advogados dativos do Estado. (…) Segundo o presidente da Seccional da OAB de Santa Catarina, Paulo Borba, o repasse é resultado de um trabalho conjunto de toda a advocacia. “Nada mais justo que esses mais de cinco mil advogados recebam pelos bons serviços prestados à comunidade catarinense”, afirmou Paulo Borba. “É preciso honrar o abnegado trabalho desenvolvido por milhares de dativos, a maioria deles esperando há anos pelo repasse do Estado”. O governo do Estado retomou os repasses mensais de R$ 500 mil em abril deste ano e repassou também R$ 10 milhões em 20 de julho. Esse último pagamento estava incluído no termo de compromisso que foi assinado pelo governador catarinense na sede da OAB-SC, em Florianópolis. Fonte: http://www.oab.org.br/noticia.asp?id=11395 (VEJA TAMBÉM EM: http://www.profpito.com/GovernorepassaR.html)

 

         No Estado de Goiás, a Defensoria Pública já foi criada, pela Lei Complementar nº 51/2005, mas ainda não foi feito o concurso público para o preenchimento dos cargos de Defensores Públicos, e o convênio da OAB/GO continua florescendo e frutificando.  Em Santa Catarina, a Defensoria ainda nem foi criada. Em São Paulo, apesar de já ter sido criada, finalmente, com dezesseis anos de atraso, a Defensoria Pública, em janeiro de 2.006, o Convênio de Assistência Judiciária ainda emprega quase 50 mil advogados, indicados pela OAB e remunerados pelo Estado. E isso os dirigentes da OAB não acham inconstitucional, porque “os carentes precisam de defensores e a Defensoria ainda não tem condições de atender a todos”, conforme justificativa constante de mensagem eletrônica enviada por um eminente jurista, ligado à OAB/SP, que teve a gentileza de responder ao meu questionamento. Segundo ele, o Convênio somente poderá acabar quando a Defensoria de São Paulo tiver condições de atender a todos os carentes. Em primeiro lugar, portanto, o direito de acesso à Justiça, para todos os carentes.

 

Talvez fosse possível aceitar essa desculpa, embora pudéssemos até mesmo perguntar: e por que não aumentar o número de cargos na Defensoria e abrir concursos públicos, imediatamente? Afinal de contas, a Constituição Federal de 1.988 já vai completar vinte anos…

 

Tudo indica, portanto, que a OAB tem dois pesos e duas medidas, porque apesar de manter esses convênios, para dar emprego sem concurso público a milhares de advogados, a OAB federal ajuizou, em 20.06.2.000, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, no STF, questionando a Lei nº 6.094/2000, do Estado do Espírito Santo, que autorizava o Poder Executivo a contratar, temporariamente, 96 defensores públicos, para atender necessidades de caráter emergencial, pelo prazo máximo de 12 meses, prorrogáveis por igual período. Essa ADI, de nº 2229-6, foi julgada procedente, por unanimidade, pelo STF. Veja em: http://www.stf.gov.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=2229&processo=2229

 

Mais recentemente, já em 2.006, o Ministro Carlos Britto, que coincidentemente é tio do atual Presidente da OAB, foi designado relator da ADI nº 3.700, ajuizada também pelo Conselho Federal da OAB, contra a Lei nº 8.742, do Estado do Rio Grande do Norte, que dispõe sobre a contratação temporária de 20 advogados, para exercerem a função de defensor público. Essa ADI ainda aguarda julgamento. Veja em: http://www.stf.gov.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=3700&processo=3700

 

Assim, para os dirigentes da OAB, a contratação de 96 advogados pelo Estado do Espírito Santo e de 20 advogados pelo Estado do Rio Grande do Norte é inconstitucional, porque “a contratação sem concurso público contradiz o artigo 37 da Constituição Federal – caput, no que se refere à moralidade, e incisos I e IX” e ofende, também, o “artigo 134, que define a Defensoria Pública como instituição essencial à função jurisdicional, devendo o defensor ocupar cargo de carreira”. O Supremo Tribunal Federal, evidentemente, concorda com essas alegações.

 

No entanto, para os mesmos dirigentes da OAB, a contratação de 50 mil advogados, indicados pela própria OAB, em São Paulo, bem como os de Santa Catarina e os de Goiás, é necessária, porque “os carentes devem ter o direito de acesso à Justiça”.

 

Quando a Assembléia Legislativa de São Paulo estava discutindo a Lei da Defensoria Pública, em 2.006, os dirigentes da OAB conseguiram a inclusão de um artigo nessa Lei, para que o Convênio de Assistência Judiciária fosse mantido. Até quando, não se sabe.

Qual a razão desse tratamento diferenciado, que a OAB atribui ao seu Convênio? Se as leis do Espírito Santo e do Rio Grande do Norte são inconstitucionais, por que será que a OAB defende os seus convênios? Será em defesa dos carentes de advogados ou dos advogados carentes?

 

Será que os Estados do Espírito Santo e do Rio Grande do Norte deveriam assinar convênios com a OAB, também, para melhorar a assistência judiciária aos carentes?

 

 

 

* Professor de Direito Constitucional da Unama

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Como citar e referenciar este artigo:
LIMA, Fernando Machado da Silva. As Defensorias da Ordem dos Advogados. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/as-defensorias-da-ordem-dos-advogados/ Acesso em: 29 mar. 2024