Direito Constitucional

Duas hipóteses para Súmula Vinculante

Duas hipóteses para Súmula Vinculante

 

 

Ives Gandra da Silva Martins*

 

 

Nos últimos tempos, diversos juristas têm se manifestado sobre algumas súmulas da Suprema Corte, cunhadas acerca de questões polêmicas sem que uma sólida divergência tenha sido detectada.

 

Alegam que, ao sumular questões que ainda não passaram pela decantação propiciada pelas decisões de instâncias inferiores, transforma-se o STF em autêntico legislador positivo, visto que as súmulas obrigam os demais Poderes.

 

As críticas não me parecem procedentes.

 

Reza o artigo 103-A da C.F. que: “Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante …..”, continuando o § 1º a dispor que: “§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica” (grifos meus).

 

Como se percebe da leitura dos dois dispositivos, há duas claras hipóteses de aprovação de súmulas: aquela em que decorra de reiteradas decisões sobre matéria constitucional, com o que o verbete passará a representar a consolidação da inteligência dos Tribunais sobre a matéria; e aquela que objetiva eliminar divergência dentro do Poder Judiciário ou entre este e a Administração Pública em geral.

 

No primeiro caso, a vinculação objetiva, exclusivamente, reduzir a carga de trabalho dos Tribunais em questões repetitivas, atalhando o percorrer desnecessário de instâncias.

 

No segundo caso, não. A Súmula intenta pacificar divergências, não só internas, de interpretação no seio do próprio Poder Judiciário, mas também naquelas estabelecidas entre o Poder Judiciário e outros Poderes, com o que, se, no primeiro caso, a celeridade processual é o desiderato maior, no segundo, pacificar constitui o objetivo primeiro, impondo-se a interpretação definitiva.

 

Esta é a razão pela qual, no que diz respeito às algemas, cujo uso foi sumulado, a excessiva e desnecessária exibição de pessoas algemadas, nas operações cinematográficas realizadas pela polícia federal – com constrangimento, inclusive, ao cidadão comum, mais desejoso de ver a Justiça ser feita, do que exibições histriônicas de força – é que levou a Suprema Corte a dar a diretriz definitiva de como a ação policial deve ser realizada.

 

De comum, nas duas situações, há o aspecto que justifica a edição de súmulas, ou seja, evitar a insegurança jurídica, assim como a multiplicação de processos sobre idênticas questões.

 

No caso da referida Súmula, não só o receio de quem, sem possibilidade de exercer o direito de defesa venha a ser constrangido à humilhação de ser algemado, acarreta insegurança, como a multiplicação de episódios noticiados e fotografados pela imprensa impunha a manifestação da Suprema Corte.

 

Parece-me, pois, infundadas as críticas à correta postura do Supremo Tribunal Federal.

 

 

* Professor Emérito das Universidade Mackenzie e UNIFMU e da Escola de Comando e Estado maior do Exército. Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, da Academia Paulista de Letras e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: http://www.gandramartins.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Duas hipóteses para Súmula Vinculante. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/duas-hipoteses-para-sumula-vinculante/ Acesso em: 28 mar. 2024